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quarta-feira, 12 de agosto de 2009

JURID - Dono de mercado indenizado [11/08/09] - Jurisprudência


Proprietária de minimercado receberá danos morais de fabricante por venda de mortadela contendo larvas
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Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul - TJRS

Comarca de Arroio do Tigre

Vara Judicial

Processo nº:
143/1.07.0000783-3

Natureza:
Indenizatória

Autor:
Maria Rachor

Réu:
Cooperativa Languiru Ltda

Juiz Prolator:
Juiz de Direito - Dr. Gustavo Borsa Antonello

Data:
06/07/2009


1 RELATÓRIO

Vistos etc.

MARIA RACHOR, qualificada na inicial, ajuíza ação de indenização, pelo rito comum ordinário, em face de COOPERATIVA LANGUIRU LTDA, igualmente qualificada, dizendo-se proprietária do minimercado "MR", constituído sob a forma de firma mercantil individual. Conta que no dia 08 de novembro de 2006 adquiriu da ré um "tubo" de mortadela de carne de frango, com peso líquido de 3 kg. No dia 27 de novembro de 2006, ao atender clientes no balcão de venda de frios de seu estabelecimento, foi-lhe solicitada uma quantia de mortadela fatiada. Ocorre que, ao fatiar a parte inicial do "tubo", abrindo a embalagem plástica que envolve o produto, a autora e os presentes se depararam com uma cavidade na mortadela, na qual existiam larvas e moscas incorporadas à massa do produto. De imediato, a autora acionou o Departamento de Vigilância Sanitária desta cidade, sendo lavrados o Autos de Infração e de Apreensão nº 001/2006 e 03/2006, onde se encontra relatado todo o lamentável fato. Os agentes da Vigilância Sanitária também gravaram um vídeo, sendo algumas imagens impressas e anexadas à inicial, nas quais vê-se que o "tubo" já havia sido fatiado em sua extremidade e comercializado para clientes, que certamente consumiram a mortadela estragada. Sustenta que esse lastimável episódio causou extremo constrangimento perante seus clientes. Aduz que não mais comercializa produtos da empresa ré em seu estabelecimento. Pede, então, a condenação da ré ao pagamento de indenização por danos morais, em valor a ser arbitrado na sentença, mais custas e honorários de sucumbência. Junta documentos nas fls. 10/14 e 16/17. Vem em juízo ao abrigo da justiça gratuita (fl. 19).

Regularmente citada (fl. 20v), a ré apresenta, intempestivamente, contestação escrita na fl. 43, sendo-lhe decretada a revelia na fl. 90. Há recurso de agravo retido (fl. 99).

Audiência de conciliação marcada e realizada, não há acordo, sendo designada audiência de instrução (fl. 105).

Na instrução, são ouvidas a autora e três testemunhas (fls. 148-172). Uma testemunha é ouvida por carta precatória (fls. 190-195).

Encerrada a instrução, as partes apresentam memoriais escritos às fls. 203 e 210. A autora sustenta a comprovação da aquisição de produto junto à ré, contendo larvas e moscas em seu interior, sendo a empresa responsável por indenizar o abalo moral decorrente do constrangimento e vexame porque passou perante seus clientes, comprometida que foi a idoneidade de seu estabelecimento comercial em pequena comunidade. A ré, por sua vez, defende a ausência de responsabilidade em vista da abertura do produto já no estabelecimento da autora, inexistindo qualquer possibilidade de larvas e moscas terem sido incorporadas ao produto na fase de produção. Sempre primou pela qualidade de seus produtos, jamais ocorrendo fato igual. Por fim, não há caracterização de qualquer dano moral. Pugna pela improcedência.

Vêm os autos conclusos para sentença.

Nada mais, decido.

2 FUNDAMENTAÇÃO

As partes são capazes e estão devidamente representadas. Estão presentes os pressupostos objetivos e subjetivos de existência e de validade do processo.

2.1 Sobre o agravo retido: efeitos da revelia

Não paira dúvida de que a propositura de demanda contra si chegou ao conhecimento da ré. Tanto assim que contestou a ação, embora a destempo. E, quanto à citação realizada pela via postal, o AR assinado por pessoa sem comprovados poderes de representação da pessoa jurídica não é óbice à validade do ato. Jurisprudência pacífica, como se vê:

AGRAVO INTERNO (ART. 557, § 1º, DO CPC). ARGÜIÇÃO DE NULIDADE DE CITAÇÃO. PESSOA JURÍDICA. INOCORRÊNCIA. A citação postal entregue no domicílio da pessoa jurídica, recepcionada por funcionário da empresa, é válida e eficaz, não prosperando a arguição de nulidade. Desnecessário que o funcionário detenha poderes de representação. Teoria da aparência. Precedentes desta Corte e do STJ. NEGADO PROVIMENTO. UNÂNIME. (Agravo Nº 70028681963, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Tasso Caubi Soares Delabary, Julgado em 25/03/2009)

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE TÍTULO E SUSTAÇÃO DE PROTESTO. HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. IMPUGNAÇÃO. CITAÇÃO DE PESSOA JURÍDICA NA PESSOA DO EMPREGADO TERCEIRIZADO. POSSIBILIDADE. É válida a citação postal da pessoa jurídica quando a carta é entregue no endereço da ré, não se exigindo o recebimento por representante legal da empresa, conforme dispõe a Teoria da Aparência. A citação da empresa-ré pode ocorrer na pessoa de funcionário próprio ou de terceirizado, que é seu subordinado direto, por extensão. Na espécie, não tem lugar para a nulidade de citação da agravante, porque a carta foi recebida pelo porteiro da empresa, na condição de funcionário terceirizado. Mantida a decisão que rejeitou o incidente de impugnação ao cumprimento de sentença, prosseguindo-se a regular execução. NEGADO SEGUIMENTO ao recurso, por decisão monocrática. (Agravo de Instrumento Nº 70025677121, Décima Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Nelson José Gonzaga, Julgado em 03/10/2008)

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. CONEXÃO. JUNTADA DE AR. CONTESTAÇÃO INTEMPESTIVA. REVELIA. CITAÇÃO POR CARTA. PESSOA JURÍDICA. A contestação deve ser interposta dentro do prazo de 15 (dez) dias da juntada do AR de citação cumprido aos autos, conforme dispõe o art. 297 do CPC. Com fundamento na Teoria da Aparência, tem-se como válida a citação postal de pessoa jurídica, quando correto o endereço de recebimento, mesmo que tenha sido assinada por funcionário que não possua os poderes a que alude o artigo 223, parágrafo único, do Código de Processo Civil. A financiada deverá prestar compromisso como depositário judicial do bem nos autos principais e depositar judicialmente os valores que entende devidos, observado o valor principal (incluídas as parcelas vencidas e não pagas), juros de 12% ao ano e variação pelo IGP-M, dividido pelo número de parcelas faltantes. Agravo de Instrumento parcialmente provido. (Agravo de Instrumento Nº 70024661811, Décima Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Lúcia de Castro Boller, Julgado em 16/06/2008)

Válida é a citação de pessoa jurídica quando realizada na sede da firma, mesmo que empregado sem poderes de gerência ou administração firme o aviso de recebimento. É a teoria da aparência que se aplica na hipótese, porque, notadamente, embora não se saiba ao certo os poderes que detém o firmatário do aviso de recebimento da fl. 20v, o fato é que, considerando que o ato citatório fora perfectibilizado no estabelecimento comercial, não há razão para repetir-se o que cumpriu o objetivo de dar conhecimento da lide existente.

A intempestividade da defesa apresentada pela ré, por provável descuido, não pode justificar-se na nulidade de citação substancialmente válida.

Quanto aos efeitos da revelia já declarada, a intempestividade da contestação importa, efetivamente, no reconhecimento daquela e na incidência de seus efeitos no caso, por não se tratar de nenhuma das exceções previstas no artigo 320, do CPC. Todavia, dentre tais efeitos não se arrolam a retirada da peça defensiva dos autos e ou dos documentos que a acompanham, tampouco a inaplicabilidade da livre convicção pelo julgador, mas apenas o não conhecimento da matéria fática alegada na defesa serôdia e o enfrentamento de questões porventura ali arguidas.

Conforme a autorizada doutrina de Araken de Assis (in Doutrina e Prática do Processo Civil Contemporâneo. RT. 2001. p. 160)

o desentranhamento da contestação e dos documentos produzidos pelo réu, no caso de revelia, constitui sugestivo exemplo de seu mau uso, agravando, desnecessariamente, a posição já desconfortável do revel no direito pátrio.

Portanto, configurada a revelia quando o réu contesta intempestivamente, imperioso afirmar que o desentranhamento da contestação e, simultaneamente, da prova documental que a acompanha, carece de base legal. Da mesma forma, apresentando-se a ré ao processo, embora tardiamente, usou ela da faculdade processual de se fazer presente e de constituir procurador, razão pela qual não há se falar em decurso dos prazos sem intimação. Contexto em que se mostrou, então, regular o processamento do feito, com a intimação da ré para acompanhamento de todos os atos processuais que se seguiram à decisão de fl. 90.

Pelo exposto, mantenho a proclamação da revelia, não conhecendo da contestação e dos documentos que a acompanharam.

Passo ao exame do mérito.

2.2 Sobre o mérito

Cumpre observar, ab initio, que não se trata de relação de consumo regulada pelo CDC e, portanto, pela responsabilidade civil objetiva decorrente de fato do produto. É que a autora, na condição de comerciante que adquire produto do fabricante para comercialização futura, não assume a condição de destinatária final para fins de caracterização da condição de consumidora lesada. Ausente o requisito subjetivo para fins da constituição da relação consumerista no caso concreto.

Passo a analisar, portanto, a responsabilidade civil subjetiva por ato próprio do fabricante, em razão de negligência frente à autora, sua cliente.

Na medida em que a prova carreada aos autos demonstra que não houve qualquer adulteração do produto vendido no estabelecimento da autora, sem dano ao invólucro com o qual a mortadela saiu da linha de produção, não se imputa culpa à autora por contaminação posterior à compra. Neste sentido o relato da própria autora, em seu depoimento da fl. 151:

J: A senhora mesmo que achou as larvas?
A: Sim.
J: A senhora estava sozinha?
A: Não, tinha um monte de gente. Por que eu tenho um mini mercado e barzinho anexo. Ele aveio me pedir os frios e quando eu peguei pra cortar eu vi que ela tinha um buraco, eu peguei a faca e cortei e vi.
J: Só funcionários ou alguém de fora?
A: Não, eu e todos os meus clientes que estavam ali.
J: E eles viram?
A: Sim.
J: A senhora já tinha vendido parte daquele......
A: Não, só fatiado, quando eu cortei, por que eu abro ela na maquina.
J: Abriu naquele instante então?
A: Sim.
[...]
R: Se ela comprou diretamente de um vendedor da Cooperativa ou de algum distribuidor representante? A pessoa de quem ela comprou, se ela se recorda?
A: Do vendedor.
R: Nome, quem era?
A: Alexandre, o loirinho aquele.
R: E ele era da Cooperativa?
A: Mas com certeza, eu comprava dele.
R: Quanto tempo ela estava com o produto no mercado até constatar o problema?
A: No mesmo mês, no mês de novembro, tem as notas todas.
R: Pela inicial, ela relata, "Após já fatiar a parte inicial do tubo....."
A: Sim, eu fatiei ela.
R: Ela já tinha aberto o produto antes de ver o problema?
A: Ela vem embutida, eu pego a faca e corto a beiradinha pra colocar na maquina pra começar a fatiar. Quando eu tirei o...que eu tinha fatiado o suficiente que a freguesa me pediu, eu coloquei e passeia faca pra cortar.
R: Antes ela não tinha visto nada?
A: Na hora de abrir, quando eu comecei a fatiar ela com a faca.
R: Quando começou a fatiar já dava pra ver que tinha problema ou não?
A: Ela é assim, é aquela peça, passa a faca aqui e coloca naquela maquina pra cortar, logo acima, uns dois dedos acima tinha aquele buraco.
R: Mas já tinha fatiado uma parte antes de ver?
A: Quando eu fatiei na maquina.
R: Ela falou que havia larvas e moscas incorporadas à massa, se ela confirma isso?
A: Sim.
R: Se elas estavam prensadas, trituradas? Como estavam na massa?
A: Era um buraco assim, e ali dentro elas estavam.
R: Mosca inteira?
A: Sim.
R: Qual a temperatura da geladeira dela?
A: Mas daquelas geladeiras de gelar frios.
R: Fica ligado de noite?
A: Sim, direto, ela não desliga, ela não pode ser desligada.
R: Quantas moscas tinham?
A: Era uma porção assim.
R: Se quando ela recebeu a mercadoria ela constatou algum problema nela?
A: Ela é fechado, como eu ia abrir na frente.....
R: E tinha algum buraco no plástico?
A: No plástico não, ela era embutida.
R: Não tinha nenhum buraco no plástico?
A: O plástico estava inteiro, no plástico não tinha nada.
R: E quando recebeu não dava para ver nada?
A: Não, por que ela vem em uma caixa, eu olhei e eu vi que era a quantia que eu tinha comprado, assinei a nota e tranqüilo.

Conforme nota fiscal de fl. 11, a autora adquirira junto à Cooperativa Languiru Ltda, em data de 08 de novembro de 2006, 3 kg de mortadela de carne de frango, em tubo. E, pelo que se vê das imagens de fls. 14, não havia sinal de adulteração da embalagem do produto, situação confirmada pelo relatório do auto de infração n. 001/2006, da fl. 12. Recebeu a autora, então, o produto lacrado, não havendo nenhum indicativo de má conservação pela autora ou transporte deficiente do produto até o seu estabelecimento.

As testemunhas confirmam, em verdade, que o produto estava lacrado, sendo aberta a embalagem e fatiada a mortadela na presença de clientes, como se vê das declarações de Pedro Luis Brixner e Lúvio Pedro Rech:

Pedro Luis Brixner (fl. 156):

J: O senhor estava presente ali quando foi encontrado?
T: Eu tive lá, como de costume foi tomar uma cervejinha, tem um barzinho anexo e tem o mercado. Ela foi servir em fatias e ela mostrar pra nós, "Olhem aqui", por que no meio da massa tinham mosca e coisarada.
J: Ela ia servir para os senhores?
T: Não, era pra um outro cliente.
J: O senhor viu da onde ela retirou esse tubo de mortadela?
T: Ela tem aquele frigorífico.
J: É o que conta nas fotos de folhas 14? Confirma que era essa situação que o senhor viu?
T: Sim.
J: Quem mais viu ali? Tinha mais gente?
T: Tinha mais, só que quem eu saiba era o Lúvio que tava junto, outro freguês ali, não sei se tinha mais gente.
J: O senhor e o outro então que o senhor lembre?
T: É.
J: Qual foi a atitude dela? Da Maria.
T: Ela entrou meio em desespero, "Gente, olhem aqui, mais não pe possível". É a Languiru, a gente até compra mortadela e tudo e ter um troço desse na massa, fica ruim até que a gente como consumidor, é ruim olhar isso. Ela ficou, entrou em parafuso.
J: Mas ela tomou alguma atitude? Chamou alguém? Fez alguma coisa?
T: Na hora ali chamou nós. Eu acho que ela chamou o pessoal da saúde.
J: O senhor ficou lá pra ver eles chegarem?
T: Sim.
J: E o que eles fizeram?
T: Fizeram o laudo.
J: Teve mais alguém lá da empresa?
T: Que eu me lembre não.
J: O senhor já presenciou algum fato semelhante lá nesse local uma vez?
T: Foi uma vez em uma bebida, Brahma, uma cerveja, tinha uma perereca dentro, ela me mostrou.
J: Mas com relação a frios assim, o senhor ouviu falar de algum produto estragado lá que o mercado tinha vendido?
T: Que eu me lembro não.
J: O senhor compra lá?
T: Sim. Mas não sempre, a gente faz rancho nos mercados, ali é alguns frios algumas coisas mais rápidas.
J: E os produtos estão sempre em boas condições?
T: Sim, só aquele ali.
J: O senhor sabe se o freezer esta sempre ligado? O senhor viu alguma vez o freezer desligado?
T: Não, sempre ligado.
J: O senhor deixou de comprar lá por causa desse problema?
T: Não, só deixei de comer mortadela em função disso.
J: Pela autora.
Autora: Se o depoente pode descrever o mini mercado lá, se é lancheria a padaria e o setor de frios são todos juntos?
T: Fica assim nos fundos a bodeguinha pra tomar o trago e logo vem o mercadinho.
A: Se o depoente pode descrever quais são as condições gerais de higiene do estabelecimento?
T: É bem caprichado, é limpo.
A: Se o mercadinho da dona Maria é situado no Bairro Bela Vista, e se esse fato foi comentado no bairro?
T: Bastante.
A: Nada mais, doutor.
J: Pela ré.
Ré: Ele ficou sabendo dos fatos por que a autora foi falar pra ele?
T: Não, eu estava junto ali.
R: Mas eles que mostrou a mortadela o senhor não viu quando ela abriu?
T: Ela pegou, como a gente é cliente e compra mortadela e ela se desesperou e mostrou, "Olha aqui ó, que coisa".
R: Ele viu antes de ela abrir a mortadela?
T: Não.
R: Quando ela mostrou a mortadela já estava aberta?
T: Ela corta.
R: Mas já tava cortada?
T: Um pedacinho sim. Isso tava no meio.
R: Se ele conhece os produtos da Cooperativa?
T: Sim.
R: Consome?
T: Menos essa.
R: Mas o resto consome?
T: É.
R: Teve algum problema alguma vez com outro produto da Cooperativa?
T: Não.
R: Se chegou a ter conhecimento de algum outro reclamando dos produtos da Cooperativa?
T: Aqui no Arroio do Tigre não.
R: O balcão de frios é refrigerado ou é só uma parte pra expor o produto?
T: Não, é refrigerado.
R: Mas a pessoa por de ver o que esta comprando?
T: Sim, é refrigerado, inclusive do lado ela usa uma geladeira, por que mortadela não vai em freezer, ela coloca na geladeira grande que tem as outras coisas e aquele balcão que esta ali na frente se vê, é vidro, é um balcão com vidro refrigerado.
R: Se havia moscas inteiras no produto?
T: Morta sim.
R: Dava pra ver?
T: Sim, inclusive várias no meio da massa.
R: Sabe como é feita a mortadela? Sabe qual o procedimento pra fabricar a mortadela?
T: Não.
R: Se ele tinha visto a mortadela ali naquele balcão antes da autora mostrar?
T: Não, essa mortadela ela pegou e foi fatia, vender normal pro cliente.
R: Mas não estava no balcão de frios?
T: Tava.
R: Mas dava pra ver então antes dela te mostrar?
T: É que tem a capa por fora de plástico e na hora de cortar isso tem que ser arregaçado.
R: Mas quando ela lhe mostrou já tava fatiada uma parte?
T: Ela tava vendendo.

Lúvio Pedro Rech (fl. 160):

Juiz: O senhor estava presente lá no dia que a Maria encontrou uma mortadela estragada?
Testemunha: Sim, foi em novembro de 2006 se não me falhe a memória.
J: O que o senhor estava fazendo lá?
T: Nós tava tomando um aperitivo, por que detardezinha nós se reunimos ali por que é o lugar pra se reunir. Ela tava cortando e tinha moscas e larvas ali junto na massa.
J: Ela chamou vocês?
T: Sim.
J: Ela estava cortando pra outro cliente?
T: Eu não me lembro pra quem ela estava cortando mas ela mostrou pra nós.
J: Ela tinha cortado uma parte e na hora ali viu aquilo e mostrou pra vocês?
T: Sim.
J: Tinha ali um balcão com refrigeração ali que é pra guardar mortadela?
T: Sim.
J: Como é o estabelecimento dela lá higienicamente falando?
T: É muito bom.
J: O senhor compra lá?
T: Sim.
J: Comprou alguma coisa estragada alguma vez?
T: Não. Só mortadela depois disso eu não como mais.
J: O senhor continua comprando lá?
T: Sim.
J: Pela autora.
Autora: Se o local que a Maria corta é visível do bar, não é em uma sala separada é tudo na padaria do estabelecimento?
T: Isso.
A: Se no momento que a Maria constatou aquelas moscas, se ela ficou constrangida, se ela ficou meio desesperada? Qual a situação dela naquele momento ali?
T: Ficou constrangida, até nós ficamos meio assim, por que nunca atínhamos visto uma coisa assim.
A: Se no momento que ela fatiava a mortadela ela atendia clientes no balcão?
T: É.
A: Se o depoente é morador do Bairro Bela Vista?
T: Sou.
A: Se esse fato foi comentado sobre essa mortadela no mercado da Maria?
T: Até foi muito comentado.
A: Nada mais, doutor.
J: Pela ré.
Ré: Desde quando ele realiza compras li com a autora?
J: Olha, não sei precisar quanto tempo ela tem lá, mas desde o proprietário anterior eu já comprava lá.
R: Por causa desse fato não deixou de comprar com ela?
T: Não, só mortadela eu não comprei mais.
R: De ninguém?
T: Dela não.
R: Se ele conhece os produtos da Cooperativa?
T: Conhece vários produtos, essas moscas estavam, dentro da massa, pode ser até um padrão bom de higiene e coisa mas aquela hora ali era um desastre.
R: Se não tinha moscas inteiras?
T: Era varejeira também.
R: Mais inteira ou era um pedacinho de uma larva?
T: Mosca inteira.
R: Se ele consome os produtos da Cooperativa?
T: A gente compra ainda.
R: Deixou de comprar?
T: Mortadela da Languiru eu não compro mais.
R: Se ele teve algum problema com algum produto da Cooperativa?
T: Até hoje não.
R: Se ele sabe como eram conservados os produtos lá no estabelecimento da autora?
T: Na câmara fria, balcão com refrigerador esse.
R: Não era em freezer?
T: Não.
R: Ele teve conhecimento dos fatos por que a autora falou pra ele?
T: Não, eu tive lá na hora.
R: Mas o senhor que viu ou foi ela que mostrou?
T: Depois chamaram o fiscal da saúde até.
R: Se quando ele viu a mortadela ela estava inteira ou já estava fatiada uma parte?
T: Ela pegou e cortou e apareceu isso ai
R: Já viu ela fatiada então?
T: Não, ela pegou e cortou ela ali na frente.
R: Se foi esse o estado conforme as fotos de folhas 14, se foi assim que ele teve acesso pra ver ela?
T: Sim.
R: Uma parte então já estava cortada?
T: É, tinha cortado um pedacinho. Mas eu volto a frisar, eu também já fabriquei lingüiça e coisa, isso tava incorporado na massa.
R: Se é possível uma mosca se criar dentro da geladeira? Dentro da geladeira uma mosca pode deixar de virar larva e virar uma mosca?
T: Como entrou lá, deve ser na mistura da massa.
R: Mas ela pode se criar dentro do refrigerador?
T: Mas ta morta, como vai ta viva.
R: A mosca nasce larva, se ela poderia se criar dentro do refrigerador, se ele tem conhecimento?
T: Não sei.

As testemunhas são unânimes, como clientes do estabelecimento, em indicar que a autora sempre manteve os cuidados necessários com higiene, refrigeração e estocagem dos frios comercializados em seu estabelecimento. Também, afirmam que as moscas e larvas estavam incorporadas ao produto cortado, no interior da mortadela, sem qualquer demonstração no sentido de que havia rompimento anterior da embalagem que possibilitasse a invasão dos produtos pelos insetos. O próprio servidor da vigilância sanitária do município de Arroio do Tigre, em suas declarações em juízo diz que, da parte da autora, equipamentos, superfície, refrigeração, superfícies de inox, de madeira, sempre estiveram rigorosamente dentro das normas sanitárias (fl. 165).

Assim, não há como afastar a contaminação ainda na linha de produção. E disto exsurge a responsabilidade civil da fabricante, por negligência, nos termos do art. 927, do CCB, ao colocar em circulação produto impróprio para consumo ulterior.

Come efeito, cuida-se de falha da ré no dever de fiscalização de sua linha de produção, que trouxe transtornos à autora, consistentes em constrangimento perante seus clientes que presenciaram o fato grave e inegável comprometimento de sua idoneidade frente à comunidade que, como se vê das declarações das testemunhas, deixaram de adquirir dela produtos refrigerados após o ocorrido.

Nexo de causa presente, portanto.

Assim, impõe-se a fixação do montante indenizatório. E atento, para tanto, à gravidade da falta da ré na linha de produção e na colocação de seus produtos no mercado ainda que impróprios para consumo, com risco de contaminação para a parcela da população que lhe adquirisse. Também, levo em consideração o abalo à personalidade da autora, gerado pela inusitada e tormentosa visão de contaminação do produto por insetos e larvas, com todo o constrangimento decorrente da ocorrência diante de clientes, bem como o transtorno frente às autoridades sanitárias. Por fim, destaco também o sentimento de insegurança nos negócios e de desconsideração pelo fabricante. À vista desses critérios, arbitro o quantum em R$ 15.000,00 (quinze mil reais), que julgo razoável ao fato.

3 DISPOSITIVO:

ISSO POSTO, afastada definitivamente a preliminar de nulidade da citação e mantida a declaração de revelia, no mérito julgo procedente o pedido deduzido por MARIA RACHOR em face de COOPERATIVA LANGUIRU LTDA, para condenar a ré a pagar à autora, a título de indenização por danos morais, o valor de R$ 15.000,00 (quinze mil reais), corrigidos pelo IGP-M mais juros de mora de 1% ao mês, ambos a contar da sentença (Súmula 362, do STJ).

A ré arcará com o pagamento integral das custas e despesas processuais, e também dos honorários advocatícios devidos aos procuradores da autora que, atento aos critérios de complexidade da causa, tempo de tramitação e trabalho desempenhado (art. 20, § 3º, do CPC), arbitro em 20% (vinte por cento) sobre a condenação atualizada.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Arroio do Tigre, 06 de julho de 2009.

Gustavo Borsa Antonello,
Juiz de Direito



JURID - Dono de mercado indenizado [11/08/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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