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terça-feira, 18 de agosto de 2009

JURID - Direito tributário. ICMS. Demanda contratada de energia. [18/08/09] - Jurisprudência

Jurisprudência Tributária
Apelação cível. Direito tributário. ICMS. Demanda contratada de energia.
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Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul - TJRS.

APELAÇÃO CÍVEL Nº 70031322209

VIGÉSIMA SEGUNDA CÂMARA CÍVEL

COMARCA DE PORTO ALEGRE

APELANTE: ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

APELADO: BAR E CHURRASCARIA BARRANCO LTDA.

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO TRIBUTÁRIO. ICMS. DEMANDA CONTRATADA DE ENERGIA.

PROCESSUAL CIVIL. LEGITIMIDADE ATIVA. Possui a consumidora legitimidade para figurar no pólo ativo de demanda em que se busca a não incidência de ICMS sobre a chamada demanda reservada de energia e sobre o encargo de capacidade emergencial, uma vez que suporta a carga tributária repassada pela concessionária. Preliminar rejeitada.

DEMANDA CONTRATADA. O ICMS tem como fato gerador a efetiva circulação de mercadoria, sendo incabível sua cobrança sobre a energia reservada, a não ser quando esta é efetivamente consumida.

REPETIÇÃO DO INDÉBITO. Assumindo o ICMS, no caso em tela, a característica de imposto indireto, uma vez que o encargo financeiro é repassado àquele que adquire o produto, não feita a prova de que o valor do tributo não tivesse sido embutido no montante cobrado do tomador, é aplicável o disposto no art. 166 do CTN. Precedentes do STJ e desta Corte.

Caso em que o autor não se desincumbiu do seu ônus probatório (art. 333, inc. I, do CPC), não trazendo a comprovação do não repasse do encargo financeiro ou a autorização do contribuinte de fato.

ÔNUS SUCUMBENCIAIS. Hipótese de redimensionamento.

APELAÇÃO DO ESTADO PARCIALMENTE PROVIDA.

DECISÃO MONOCRÁTICA

Vistos.

Trata-se de apelação em ação ordinária em que o BAR E CHURRASCARIA BARRANCO LTDA. postulou contra o ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL a declaração da inexigibilidade da cobrança do ICMS sobre reserva de demanda de potência, porque sobre ela não poderia incidir o tributo, e a repetição dos valores recolhidos a este título nos anos de 2006 a 2008, ou sua compensação com créditos vencidos ou vincendos de ICMS.

A MM.ª Magistrada a quo, entendendo dever incidir o ICMS apenas sobre a energia efetivamente consumida, julgou procedente a demanda ordinária, com o seguinte dispositivo, in verbis:

Do exposto, JULGO PROCEDENTE O PEDIDO DA AUTORA, a fim de declarar a inexigibilidade da cobrança do ICMS sobre a demanda contratada de potência, e para determinar que o demandado restitua o valor indevidamente cobrado nos últimos cinco anos, contados do ajuizamento desta ação, devidamente corrigido monetariamente pelos mesmos índices aplicados pelo Fisco na cobrança.

Condeno o demandado no pagamento das custas processuais e honorários do patrono do demandante, fixados em 20% sobre o valor atualizado da causa.

Nas razões (fls. 173-93), suscitou o Estado do Rio Grande do Sul a ilegitimidade da parte autora para buscar a declaração de ilegalidade da incidência do ICMS sobre a reserva de demanda de potência, uma vez que não seria contribuinte do tributo, tendo apenas o dever de pagar a tarifa. Citou precedente do Eg. Superior Tribunal de Justiça. Com isso, pediu a extinção do feito com base no art. 267, inc. VI, do Código de Processo Civil. Sustentou a legalidade da cobrança em comento, por encontrar dita incidência amparo legal e constitucional, não estando sendo exigido ICMS a maior. Referiu que, forte na Resolução nº 456/00 da ANEEL, a demanda contratada é disponibilizada, e que, sendo ou não utilizada, deve ser paga, integrando, portanto, a base de cálculo do imposto em comento. Asseverou que a disponibilização da energia elétrica ao consumidor teria um custo para a concessionária, que deveria ser considerado. Defendeu que deveriam integrar a base de cálculo do ICMS tanto a energia consumida, quanto a demanda contratada, por aquela corresponder ao valor total da operação. Aduziu ser inviável o pleito de repetição de valores, já que o demandante seria parte ilegítima, não havendo relação jurídico-tributária com o ente público a ensejar a restituição. Colacionou julgados. Alegou que o provimento do pleito da apelada teria implicado violação aos arts. 146, inc. III, 155, inc. II e §3º, da Carta da República, 2º, 3º e 23 da Resolução nº 456/00 da ANEEL e à Lei Complementar nº 87/96. Pediu a reforma integral da sentença.

Com resposta e parecer do Ministério Público de primeiro grau pelo preenchimento dos requisitos de admissibilidade, subiram os autos a esta Eg. Corte, vindo-me conclusos, após distribuição por vinculação.

É o relatório.

FUNDAMENTAÇÃO

DA PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE ATIVA

Está configurada a legitimidade ativa do demandante. Ele é contribuinte de fato, efetivamente suporta o ônus econômico da incidência do ICMS, sendo a concessionária mera repassadora do valor que é obrigada a cobrar do consumidor final. Apenas arrecada o imposto para o Estado, consoante determina o art. 34, §9º, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.

Nessa linha, precedente do Eg. Superior Tribunal de Justiça:

PROCESSO CIVIL E TRIBUTÁRIO. ICMS. SERVIÇO DE COMUNICAÇÃO. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. LEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM. FAZENDA PÚBLICA ESTADUAL.

1. O sujeito passivo da obrigação tributária relativa ao ICMS sobre serviços de comunicação é o consumidor, que assume a condição de contribuinte de fato, sendo sujeito ativo desta relação o Estado - ou o Distrito Federal - onde se tenha iniciado a prestação do serviço.

2. A concessionária de serviço público figura como mera responsável pela retenção e recolhimento do tributo - ato material de "fazer", imposto pelo Estado -, carecendo, portanto, de legitimidade para integrar o pólo passivo da ação de repetição de indébito, porquanto não faz parte da relação de incidência tributária.

3. Deveras, a natureza jurídica de concessionária de serviço público, que ostenta a ora recorrida, empresta à causa a mesma exegese exteriorizada no Agrg no Resp 797826/MT, decidido por unanimidade pela Turma, por força do princípio de hermenêutica ubi eaden ratio, ibi eaden dispositio, na medida em que foi enfrentada questão preliminar análoga, qual seja, a ilegitimidade de concessionária de distribuição de energia elétrica para figurar no pólo passivo de demanda que objetivava extirpar a incidência de ICMS, nos termos da seguinte ementa: "PROCESSO CIVIL E TRIBUTÁRIO. ICMS. ENERGIA ELÉTRICA. LEGITIMIDADE ATIVA. CONSUMIDOR FINAL. DEMANDA RESERVADA DE POTÊNCIA. FATO GERADOR.

1. O sujeito passivo da obrigação tributária é o consumidor final da energia elétrica, que assume a condição de contribuinte de fato e de direito, figurando a concessionária como mera responsável pelo recolhimento do tributo. (Precedentes: REsp 838542 / MT, 2ª Turma, Rel. Min. Castro Meira, DJ 25/08/2006; EREsp 279491 / SP, 1ª Seção, Rel. para acórdão Min. Francisco Peçanha Martins, DJ 08/05/2006).

2. É cediço em sede doutrinária que, verbis: "Embora as operações de consumo de energia elétrica tenham sido equiparadas a operações mercantis, elas se revestem de algumas especificidades, que não podem ser ignoradas.

O consumo de energia elétrica pressupõe, logicamente, sua produção (pelas usinas e hidrelétricas) e sua distribuição (por empresas concessionárias ou permissionárias). De fato, só se pode consumir uma energia elétrica anteriormente produzida e distribuída.

A distribuidora de energia elétrica, no entanto, não se equipara a um comerciante atacadista, que revende ao varejista ou ao consumidor final, mercadorias de seu estoque.

É que a energia elétrica não configura bem suscetível de ser "estocado", para ulterior revenda aos interessados.

Em boa verdade científica, só há falar em operação jurídica relativa ao fornecimento de energia elétrica, passível de tributação por meio de ICMS, no preciso instante em que o interessado, consumindo-a, vem a transformá-la em outra espécie de bem da vida (luz, calor, frio, força, movimento ou qualquer outro tipo de utilidade).

Logo, o ICMS-Energia Elétrica levará em conta todas as fases anteriores que tornaram possível o consumo de energia elétrica.

Estas fases anteriores, entretanto, não são dotadas de autonomia apta a ensejar incidências isoladas, mas apenas uma, tendo por único sujeito passivo o consumidor final.

A distribuidora, conquanto importante neste contexto, não é - e nem pode vir a ser - contribuinte do imposto, justamente porque, a rigor, não pratica qualquer operação mercantil, mas apenas a viabiliza, nos termos acima expostos. Obviamente, a distribuidora de energia elétrica é passível de tributação por via de ICMS quando consome, para uso próprio, esta mercadoria. Não, porém, quando se limita a interligar a fonte produtora ao consumidor final. Este é que é o sujeito passivo da obrigação tributária, na condição de contribuinte de direito e, ao mesmo tempo, de contribuinte de fato.

(...) A distribuidora, ao colocar a energia elétrica à disposição do consumidor final, assume a condição de "responsável" pelo recolhimento do ICMS. Melhor explicando, ela, no caso, paga tributo a título alheio, isto é, por conta do consumidor final. Este, na verdade, o contribuinte do ICMS, nas duas acepções possíveis: contribuinte de direito (porque integra o pólo passivo da obrigação tributária correspondente) e contribuinte de fato (porque suporta a carga econômica do tributo)." (Roque Antonio Carrazza in ICMS, 10ª ed., Ed. Malheiros, p. 213/215) 3. A regra matriz constitucional estabeleceu como critério material da hipótese de incidência do ICMS sobre energia elétrica o ato de realizar operações envolvendo energia elétrica, salvo o disposto no art. no art. 155, § 2º, X, "b". Embora equiparadas às operações mercantis, as operações de consumo de energia elétrica têm suas peculiaridades, razão pela qual o fato gerador do ICMS ocorre apenas no momento em que a energia elétrica sai do estabelecimento do fornecedor, sendo efetivamente consumida. Não se cogita acerca de tributação das operações anteriores, quais sejam, as de produção e distribuição da energia, porquanto estas representam meios necessários à prestação desse serviço público.

4. Destarte, a base de cálculo do imposto é o valor da operação da qual decorra a entrega do produto ao consumidor, vale dizer, o preço realmente praticado na operação final, consoante estabelecido no art. 34, § 9º, do ADCT. Nesse diapasão, não há falar em incidência da exação sobre demanda reservada ou contratada junto à concessionária, porquanto faz-se mister a efetiva utilização da energia elétrica, não sendo suficiente a sua mera disponibilização pela distribuidora. (Precedentes: REsp 840285 / MT, 1ª Turma, Rel. Min. José Delgado, DJ 16/10/2006; AgRg no REsp 855929 / SC, 1ª Turma, Rel. Min. Francisco Falcão, DJ 16/10/2006; REsp 343952 / MG, 2ª Turma, Rel. Min. Eliana Calmon, DJ 17/06/2002).

5. Agravo regimental desprovido." (AgRg no REsp 797826/MT, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 03.05.2007, DJ 21.06.2007 p. 283) 4. Recurso especial desprovido.

(REsp 871.386/RJ, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 09/09/2008, DJe 01/10/2008) [destacado aqui].

Com esse entendimento, julgados deste Tribunal(1).

Por tal motivo, afasto a prefacial suscitada pelo ente público.

DA INCIDÊNCIA DO ICMS SOBRE DEMANDA RESERVADA DE POTÊNCIA

O Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços leva esse nome porque tem como fato gerador justamente a circulação. A energia reservada não circula, a não ser quando efetivamente consumida.

Segundo dicção de Roque Carrazza(2),

A base de cálculo possível do ICMS incidente sobre energia elétrica é o valor da operação da qual decorra a entrega desta mercadoria (a energia elétrica) ao consumidor. Noutro giro, é o preço da energia elétrica efetivamente consumida, vale dizer, o valor da operação da qual decorra a entrega desta mercadoria ao consumidor final. Isto correspondente, na dicção do art. 34, § 9º do ADCT, ao "preço então praticado na operação final".

De fato, segundo Roque Carrazza(3), "só há falar em operação jurídica relativa à circulação de energia elétrica no preciso instante em que o interessado, consumindo-a, vem a transformá-la em outra espécie de bem da vida (calor, frio, força, movimento ou qualquer outro tipo de utilidade)". Adiante o autor enfatiza: "tal tributação, em face das peculiaridades que cercam a circulação de energia elétrica, só é juridicamente possível no momento em que a energia elétrica é consumida."

Dessa forma, apenas o valor consumido deve ser cobrado, o que deflui do art. 155, inc. II, da Constituição Federal. Por isto, as disposições da Lei Complementar nº 87/96, da Res. nº 456/00 da ANEEL e do Regulamento do ICMS não infirmam que somente o valor consumido deve ser cobrado, apenas definindo realidades de demanda e consumo, somente sobre este se admitindo a exação. Porque se trata de um imposto sobre a circulação de mercadorias (a energia, aqui, foi assim encarada, como já era no Direito Penal).

Não serve ao ente público o art. 155, §2º, inc. IX, letra b, da Constituição Federal, porquanto ali a referência é a de que sobre operações relativas à energia elétrica somente podem incidir os impostos de que tratam o inciso II do caput desse artigo e o do art. 153, incs. I e II, tendo a energia sido tratada como mercadoria.

Se o contrato abrange um serviço à parte, ou mesmo um adicional que não envolve fornecimento de energia, isto não pode servir de base de cálculo do ICMS. A independência da natureza jurídica da operação que constitui o fato gerador não significa poder de ampliá-lo (art. 2º, §2º, da LC 87/96).

Os fatos sobre os quais aqui se discute não equivalem a seguros, juros, importâncias pagas, recebidas ou debitadas, bem como descontos sob condição, consoante a Lei Complementar nº 87/96, art. 13, inc. II, letra a. Com efeito, o art. 13 dispõe que a base de cálculo do imposto, na saída de mercadoria prevista nos incisos I, III e IV do art. 12, é o valor da operação, integrando-a aqueles consectários. Mas veja-se que o art. 12 não diz com a energia, nos incisos apontados:

Art. 12 - Considera-se ocorrido o fato gerador do imposto no momento:

I - da saída de mercadoria de estabelecimento de contribuinte, ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular;

III - da transmissão a terceiro de mercadoria depositada em armazém geral ou em depósito fechado, no Estado do transmitente;

IV - da transmissão de propriedade de mercadoria, ou de título que a represente, quando a mercadoria não tiver transitado pelo estabelecimento transmitente;

O inc. III menciona armazém geral ou depósito fechado, o inc. IV, o caso em que a mercadoria não tiver transitado pelo estabelecimento transmitente, e o inc. I reforça a necessidade de saída de mercadoria.

O Egrégio Superior Tribunal de Justiça tem manifestado, reiteradamente, esse entendimento(4).

Não é outro o entendimento dominante deste Tribunal. Como exemplos, colaciono arestos(5).

Dessarte, sem razão o Estado neste ponto.

DA REPETIÇÃO DE INDÉBITO

Com razão o ente público quanto à impossibilidade de deferimento do pleito de repetição de valores.

A repetição do indébito em comento fica inviabilizada em face do disposto no art. 166 do Código Tributário Nacional, sendo necessária, para a obtenção da devolução das quantias recolhidas a título de ICMS sobre demanda de potência, a comprovação da não transferência do respectivo encargo financeiro, assumido, num primeiro momento, pelo demandante, ou a autorização do contribuinte de fato, aquele que, ao fim e ao cabo, efetivamente arcou com a carga tributária.

É que os documentos acostados com a exordial não comprovam que o valor do imposto não foi cobrado dos clientes da empresa autora, cujo objeto social é "[...] a exploração do ramo de BAR E CHURRASCARIA." [destacado no original] (fl. 26). Tal prova era imprescindível para a obtenção do reconhecimento do direito à repetição, pois o ônus financeiro, invariavelmente, é repassado àquele que adquire o produto da empresa demandante, estando o valor do tributo embutido no montante cobrado por ele.

Incidem, assim, o art. 166 do Código Tributário Nacional e o verbete nº 546 da Súmula do STF.

Como salientado pelo em. Des. Roque Joaquim Volkweiss, no julgamento dos Embargos Infringentes nº 70012853032(6), não está dito, naquele dispositivo, que a comprovação nele exigida apenas tenha de se dar nos casos em que há destaque do tributo na nota fiscal. Apenas põe como requisito para a restituição, nos casos dos tributos que "comportem, por sua natureza, transferência do respectivo encargo financeiro", a comprovação da assunção do encargo ou a autorização do terceiro a quem foi transferido.

É evidente que o imposto em análise é incluído no custo da autora, havendo, portanto, o repasse do ônus.

Nesse sentido, leciona Sacha Calmon Navarro Coêlho, reproduzindo parte da palestra ministrada por Misabel Derzi, no Primeiro Congresso da Associação Brasileira de Direito Tributário (1997), que(7):

É importante notar que tanto o ICMS quanto o IPI não são impostos que devam ser suportados, economicamente, pelo contribuinte de direito (o comerciante ou industrial). São, a rigor, impostos sobre o consumo, não devendo onerar a produção ou o comércio, como alerta Klaus Tipke. Disso resulta que, numa operação entre empresas, cada uma delas pode se livrar, basicamente, através da dedução do imposto anterior, do imposto devido ao adquirente, e assim sucessivamente, até o consumidor final.

Consigno, ainda, precedentes do Eg. Superior Tribunal de Justiça:

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO COM EFEITOS INFRINGENTES. ICMS. ARTIGO 166 DO CTN. MAJORAÇÃO DA ALÍQUOTA DE 18% PARA 17%. INCONSTITUCIONALIDADE. COMPENSAÇÃO. TRIBUTO INDIRETO. PROVA DA NÃO-REPERCUSSÃO. NECESSIDADE.

1. A compensação via creditamento de valores pagos indevidamente por tributos indiretos, a exemplo o ICMS, pela manifesta pretensão de ressarcimento, exige a prova negativa da repercussão, não obstante a inconstitucionalidade da majoração da alíquota do ICMS de 17% para 18%.

2. É cediço nesta Corte que, verbis: "Em se tratando de ação declaratória, onde se busca o reembolso pela via indireta do creditamento (auto-lançamento) e não pela via direta do pagamento mediante ação de repetição de indébito, incide a norma do artigo 166, Código Tributário Nacional, segundo a qual, a restituição de tributos que comportem, por sua natureza, transferência do respectivo encargo financeiro, somente será feita a quem prove haver assumido referido encargo, ou no caso de tê-lo transferido a terceiro, estar por este expressamente autorizado a recebê-lo." (AGA 437657/SP, Rel. Min. Francisco Peçanha Martins, DJ de 22/09/2003).

3. Embargos de declaração da Fazenda Estadual acolhidos com efeitos infringentes, para negar provimento ao próprio recurso especial.

Embargos da empresa prejudicados.

(EDcl no AgRg no Ag 853.712/SP, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, Rel. p/ Acórdão Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 05.06.2008, DJe 25.06.2008) [destacado aqui].

TRIBUTÁRIO. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. ISS. LOCAÇÃO DE BENS MÓVEIS. AUSÊNCIA DE PROVA DA NÃO TRANSFERÊNCIA DO ENCARGO FINANCEIRO. APLICAÇÃO DO ART. 166, CTN. ARGUMENTAÇÃO DISSOCIADA DOS PRESSUPOSTOS FÁTICOS EMBASADORES DO ACÓRDÃO RECORRIDO. VEDADO REEXAME DE PROVA. RECURSO NÃO CONHECIDO.

I - A restituição de tributos que comportem, por sua natureza, transferência do respectivo encargo financeiro somente será feita a quem prove haver assumido referido encargo, ou, no caso de tê-lo transferido a terceiro, estar por este expressamente autorizado a recebê-la. (art. 166, CTN)

II - A alegação de ofensa à lei não se viabiliza se dependente de constatação fática diversa pelo acórdão recorrido, pois o exame do acervo probatório não se contém nos limites da jurisdição desta Corte em recurso especial.

III - Recurso não conhecido. (REsp n. 783, STJ, Primeira Turma, Rel. Min. César Asfor Rocha, DJ 05.09.1994, p. 23.027).

No Col. Primeiro Grupo Cível, essa posição foi assumida nos Embargos Infringentes nº 70012853032, Relator o em. Des. Luiz Felipe Silveira Difini, em 4/11/05.

No mesmo sentido, precedente desta Col. Câmara, in verbis:

APELAÇÃO CÍVEL. TRIBUTÁRIO. ICMS. TRANSPORTE AÉREO. INCONSTITUCIONALIDADE. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. LEGITIMIDADE ATIVA. TRIBUTO INDIRETO. TRANSFERÊNCIA DO ENCARGO FINANCEIRO. PROVA. 1. Não é de ser conhecido o agravo retido se não há pedido expresso para seu julgamento nas razões do recurso de apelação. 2. Na ação de repetição do indébito de ICMS, é necessária (I) a comprovação de que não houve repercussão do tributo ou (II) a autorização do contribuinte de fato para pleitear a repetição dos valores indevidamente pagos. Art. 166 do Código Tributário Nacional. 3. A sociedade empresária que presta serviços de transporte aéreo a beneficiários de plano de saúde não é contribuinte de fato do ICMS por não ser a consumidora final, já que o encargo financeiro pelo referido serviço integra a contraprestação do seguro saúde. 4. A Súmula 306 do STJ aplica-se aos processos em que a Fazenda Pública restou vencida. Agravo retido não conhecido. Apelações desprovidas. (Apelação Cível Nº 70015013949, Vigésima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Maria Isabel de Azevedo Souza, Julgado em 22/06/2006) [destacado aqui].

No caso dos autos, a demandante não atendeu às exigências do art. 166 do CTN, inexistindo comprovação de que não foi repassado o encargo financeiro decorrente da exação, tampouco autorização para o requerimento de repetição daquele que eventualmente o assumiu, sendo seu o ônus da demonstração do fato constitutivo do seu alegado direito, conforme art. 333, inc. I, do Código de Processo Civil. Segundo Humberto Theodoro Jr.(8), a prova "consiste na conduta processual exigida da parte para que a verdade dos fatos por ela arrolados seja admitida pelo juiz". O não-atendimento de tal requisito coloca a parte em desvantagem para a obtenção da tutela pleiteada(9).

Seguindo o mesmo posicionamento, colaciono as seguintes ementas:

TRIBUTÁRIO. TERMO DE INFRAÇÃO NO TRÂNSITO. TRANSPORTE DE MERCADORIA DIVERSA DA DESCRITA NAS NOTAS FISCAIS. PROVA. ÔNUS. AUTOR. Segundo as regras de distribuição do ônus da prova incumbe ao autor demonstrar o fato constitutivo de seu direito. Inteligência do art. 333 do CPC. APELAÇÃO DESPROVIDA. (Apelação Cível Nº 70008728131, Vigésima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Rel.ª: Des.ª Mara Larsen Chechi, julgada em 26/10/2006).

APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. ICMS. LANÇAMENTO TRIBUTÁRIO. ÔNUS DA PROVA. MÁ-FÉ PROCESSUAL. Tendo sido anulado o feito para que fosse oportunizada ao embargante a produção de provas, sem que diligenciasse na realização destas; torna legítimo o julgamento antecipado da lide. Ao embargante cabe o ônus da prova do fato constitutivo de seu direito (art. 333, I, do CPC). No caso, não demonstrou ter realizado vendas, com a emissão de notas fiscais, como levantado pela fiscalização em procedimento administrativo de constituição do crédito tributário, com a apreensão de borradores registrando saídas de mercadorias, sem a emissão de documentos. Conduta processual reprimida no art. 17, incisos IV e VI do CPC, na medida em que provocou incidente manifestamente infundado e resistência injustificada ao andamento do processo. Averbação de má-fé. Apelação desprovida, voto vencido. (Apelação Cível Nº 70009619156, Vigésima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Des. Genaro José Baroni Borges, julgada em 07/12/2005).

Nesse diapasão, é caso de dar parcial provimento à apelação do Estado.

DOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS

Tendo o julgamento do recurso do Estado importado em reforma da sentença, impõe-se a redistribuição da sucumbência.

Tangente à verba honorária, cumpre recordar que, quando sua alteração decorrer de modificação da sentença que repercuta na sucumbência, o valor a ser fixado é devolvido ao Tribunal (RSTJ 79/208)(10).

Considerando que o autor pretendia, com a demanda ordinária, a declaração da não incidência do ICMS sobre os valores correspondentes à demanda contratada e a repetição da exação indevidamente adimplida nos anos de 2006 a 2008, e que obteve apenas a declaração, tenho que a sucumbência foi recíproca, razão por que os ônus sucumbenciais devem ser arcados pela metade por cada uma das partes.

Levando em conta as circunstâncias do feito, o valor atribuído à causa (R$19.313,93), a matéria envolvida e o trabalho realizado, os princípios da equidade, da moderação e da proporcionalidade, e procurando não aviltar o trabalho dos causídicos que patrocinaram os interesses de ambas as partes, considerando, ainda, ter restado sucumbente a Fazenda Pública, fixo a verba honorária em R$ 900,00 (novecentos reais), com arrimo no art. 20, §§ 3º e 4º, do Código de Processo Civil, a ser arcada em favor dos procuradores de cada um dos litigantes, admitida a compensação.

Para fins de prequestionamento, observo que a solução da lide não passa necessariamente pela restante legislação e princípios invocados e não declinados, seja especificamente, seja pelo exame do respectivo conteúdo. Equivale a dizer que se entende estar dando a adequada interpretação à legislação invocada pelas partes. Não se faz necessária a menção explícita de dispositivos, consoante entendimento consagrado no Eg. Superior Tribunal de Justiça, nem o Tribunal é órgão de consulta, que deva elaborar parecer sobre a implicação de cada dispositivo legal que a parte pretende mencionar na solução da lide, uma vez encontrada a fundamentação necessária.

DISPOSITIVO

PELO EXPOSTO, com fulcro no art. 557 do Código de Processo Civil, dou parcial provimento à apelação do Estado.

Intimem-se. Transitando em julgado, dê-se baixa e remetam-se os autos à origem.

Porto Alegre, 31 de julho de 2009.

DES.ª REJANE MARIA DIAS DE CASTRO BINS,
Relatora.

Publicado em 07/08/09



Notas:

1 - Apelação e Reexame Necessário nº 70010573129, Vigésima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Rel. Des. Genaro José Baroni Borges, Julgado em 13/04/2005; Apelação Cível nº 599384286, Vigésima Primeira Câmara Cível, TJRS, Rel. Des. Marco Aurélio Heinz, j. em 13/12/00; Apelação Cível nº 70003341807, Primeira Câmara Cível, TJRS, Rel. Des. Henrique Osvaldo Poeta Roenick, j. em 27/03/2002; Apelação Cível nº 70008808438, Vigésima Segunda Câmara Cível, TJRS, Rel. Des. Carlos Eduardo Zietlow Duro, j. em 02/12/2004; e AC/RN nº 70007948763, Segunda Câmara Cível, TJRS, Rel. Des. Arno Werlang, j. em 29/09/2004. [Voltar]

2 - CARRAZZA, Roque. ICMS. 9.ed. rev. ampl., São Paulo: Malheiros, 2002, p. 201. [Voltar]

3 - CARRAZZA, Roque Antonio. ICMS. 9.ed. rev. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2002, p.198-9. [Voltar]

4 - REsp 840.285/MT, Rel. Ministro José Delgado, Primeira Turma, julgado em 19.09.2006, DJ 16.10.2006, p. 319; REsp 343952/MG; DJ DATA:17/06/2002, p. 0024; Rel.ª Min.ª Eliana Calmon, Segunda Turma, Data da Decisão 05/02/2002; EDREsp 222810/MG; DJ 01/08/2000, p. 00197; Rel. Min. Milton Luiz Pereira, Primeira Turma, Data da Decisão 15/06/2000; e REsp 222810/MG; DJ 15/05/2000, p. 00135, Rel. Min. Milton Luiz Pereira, Primeira Turma, Data da Decisão 14/03/2000. [Voltar]

5 - Apelação e Reexame Necessário nº 70021537964, Vigésima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Rel.ª Maria Isabel de Azevedo Souza, j. em 28/09/2007; Apelação Cível nº 70021335237, Vigésima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Rel.ª Rejane Maria Dias de Castro Bins, j. em 21/09/2007; e Apelação Cível nº 70020949897, Vigésima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Rel. Des. Carlos Eduardo Zietlow Duro, j. em 01/10/2007. [Voltar]

6 - Embargos Infringentes nº 70012853032, Primeiro Grupo de Câmaras Cíveis, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Des. Luiz Felipe Silveira Difini, julgado em 04/11/2005. [Voltar]

7 - DERZI, Misabel apud COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributário Brasileiro. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2003, p. 489. [Voltar]

8 - THEODORO Jr, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Vol. 1, 22. ed., 1997, p. 423. [Voltar]

9 - Conforme: NERY Jr, Nelson. Código de Processo Civil Comentado. 3. ed., 1997, p. 614. [Voltar]

10 - NEGRÃO, Theotonio. Código de Processo Civil e legislação processual e vigor. 37 ed. São Paulo: Saraiva, 2005, nota 7 ao art. 512, p. 586. [Voltar]




JURID - Direito tributário. ICMS. Demanda contratada de energia. [18/08/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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