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terça-feira, 4 de agosto de 2009

JURID - Desapropriação. Lei 8.629/1993 (art. 2º, § 6º). [04/08/09] - Jurisprudência


Desapropriação. Lei 8.629/1993 (art. 2º, § 6º). Interpretação do STF. Verificação da extensão e dos efeitos da invasão no cálculo do índice de produtividade.
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Superior Tribunal de Justiça - STJ.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.100.046 - AL (2008/0234909-0)

RELATORA: MINISTRA ELIANA CALMON

RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRÁRIA - INCRA

PROCURADOR: VALDEZ ADRIANI FARIAS E OUTRO(S)

RECORRIDO: CIA.ACUCAREIRA CONCEICAO DO PEIXE

ADVOGADO: RICARDO ANTÔNIO DE BARROS WANDERLEY E OUTRO(S)

EMENTA

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO - DESAPROPRIAÇÃO - LEI 8.629/1993 (art.2º, § 6º) - INTERPRETAÇÃO DO STF - VERIFICAÇÃO DA EXTENSÃO E DOS EFEITOS DA INVASÃO NO CÁLCULO DO ÍNDICE DE PRODUTIVIDADE - NECESSIDADE - OMISSÃO - VIOLAÇÃO DO ART. 535, II, DO CPC.

1. A jurisprudência do STF é firme no sentido de que a vedação de vistoria em imóvel esbulhado, conforme preceitua o art. 2º, § 6º, da Lei 8.629/1993, não é absoluta e deve ser analisada em cada caso, a fim de se perquirir o alcance da invasão e seu impacto na aferição da produtividade do imóvel submetido à inspeção do Poder Público.

2. Esbulho temporário, com vistoria realizada dez dias depois da invasão, sem manifestação do Tribunal sobre os seus efeitos, mesmo após a oposição de embargos de declaração.

3. Violação do art. 535, II, do CPC.

4. Recurso especial provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça "A Turma, por unanimidade, deu provimento ao recurso, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a)-Relator(a)." Os Srs. Ministros Castro Meira, Humberto Martins, Herman Benjamin e Mauro Campbell Marques votaram com a Sra. Ministra Relatora.

Brasília-DF, 16 de junho de 2009(Data do Julgamento)

MINISTRA ELIANA CALMON
Relatora

RELATÓRIO

A EXMA. SRA. MINISTRA ELIANA CALMON: Trata-se de recurso especial interposto, com base na alínea "a" do permissivo constitucional, contra acórdão do assim ementado (fl. 373):

ADMINISTRATIVO. DESAPROPRIAÇÃO. VISTORIA. IMÓVEL ESBULHADO. DECRETO 2.250/97. LEI 8.629/93. NULIDADE.

1. À época da realização da vistoria pela Autarquia Agrária, o imóvel a ser expropriado era objeto de esbulho, o que afronta o disposto no art. 4º, do Decreto 2.250/97. Vistoria nula. Invalidação de todo o processo de desapropriação.

2. Impossibilidade de se dar andamento à desapropriação, quando houver ocorrido o esbulho possessório ou invasão motivada por conflito agrário ou fundiário de caráter coletivo, do imóvel a ser expropriado, pois, mesmo que ele já tenha sido vistoriado, não se pode proceder a sua avaliação, ou se já avaliado, não poderá ser desapropriado antes do transcurso de dois anos a contar da sua ocupação, nos termos do § 6º, do art. 2º, da Lei nº 8.629/93, com a redação dada pela Medida Provisória 2.183/01. Precedentes.

Apelação provida.

Rejeitados os embargos de declaração opostos pelo INCRA (fl. 418), foi interposto pela autarquia recurso especial, sob alegação de violação do art. 535, II, do CPC e do art. 2º, § 2º, da Lei 8.629/1993.

Contra-razões às fls. 449-454, subindo os autos após a admissão do especial (fl. 456).

Nesta instância pronunciou-se o Ministério Público pelo não conhecimento do recurso e, no mérito, pelo não provimento (fls. 469-477).

É o relatório.

VOTO

A EXMA. SRA. MINISTRA ELIANA CALMON (Relatora): Tem-se, originariamente, ação anulatória de processo expropriatório instaurado pelo INCRA, julgada procedente em razão de nulidade da vistoria realizada pela Autarquia no imóvel esbulhado.

O INCRA afirma haver no acórdão negativa de vigência do art. 535, II, do CPC e do art. 2º, § 6º, da Lei 8.629/1993, assim redigido:

Art. 2º A propriedade rural que não cumprir a função social prevista no art. 9º é passível de desapropriação, nos termos desta lei, respeitados os dispositivos constitucionais.

(...)

§ 6o O imóvel rural de domínio público ou particular objeto de esbulho possessório ou invasão motivada por conflito agrário ou fundiário de caráter coletivo não será vistoriado, avaliado ou desapropriado nos dois anos seguintes à sua desocupação, ou no dobro desse prazo, em caso de reincidência; e deverá ser apurada a responsabilidade civil e administrativa de quem concorra com qualquer ato omissivo ou comissivo que propicie o descumprimento dessas vedações. (Incluído pela Medida Provisória nº 2.183-56, de 2001)

O recorrente afirma que o Supremo Tribunal Federal firmou entendimento no sentido de considerar incidente a norma restritiva a depender da extensão e da duração da suposta ocupação. Se de caráter transitório, sem afetar a utilização do fundo agrícola pertencente ao proprietário, não haveria de ser suspensa a desapropriação (fl. 428).

A jurisprudência do Pretório Excelso ostenta diversos precedentes, no mesmo sentido preconizado pelo INCRA, pois o dispositivo legal indicado como violado não tem eficácia absoluta, devendo ser analisado, em cada caso, para saber-se do alcance da invasão e do seu impacto na aferição da produtividade do imóvel submetido à inspeção do Poder Público. Vejamos:

CONSTITUCIONAL. AGRÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. DESAPROPRIAÇÃO. REFORMA AGRÁRIA. RECURSO ADMINISTRATIVO. CONTAGEM DO PRAZO PARA INTERPOSIÇÃO A PARTIR DA DATA DE RECEBIMENTO DO LAUDO AGRONÔMICO DE FISCALIZAÇÃO POR MEIO DE AVISO DE RECEBIMENTO SIMPLES. ART. 241 DO CPC. INAPLICABILIDADE. OCUPAÇÃO DO IMÓVEL POR MOVIMENTO SOCIAL DE TRABALHADORES RURAIS APÓS A VISTORIA. ART. 2º, § 6º, DA LEI N. 8.629/93. INAPLICABILIDADE. DECRETO DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA. OPORTUNIDADE E ALCANCE. ART. 61 DA LEI N. 9.784/99. ART. 184, § 2º, DA CB/88. PRODUTIVIDADE DO IMÓVEL. DILAÇÃO PROBATÓRIA. APRECIAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA. IMPOSSIBILIDADE.

(...)

4. O esbulho possessório que impede a desapropriação [art. 2º, § 6º, da Lei n. 8.629/93, na redação dada pela Medida Provisória n. 2.183/01], deve ser significativo e anterior à vistoria do imóvel, a ponto de alterar os graus de utilização da terra e de eficiência em sua exploração, comprometendo os índices fixados em lei. Precedente [MS n. 23.759, Relator o Ministro CELSO DE MELLO, DJ 22.08.2003 e MS n. 25.360, Relator o Ministro EROS GRAU, DJ 25.11.2005].

5. A impossibilidade de dilação probatória em mandado de segurança torna insuscetível de apreciação a questão relativa à produtividade do imóvel rural. Precedente [MS n. 24.518, Relator o Ministro CARLOS VELLOSO, DJ 30.04.2004 e MS n. 25.351, Relator o Ministro EROS GRAU, DJ 16.09.2005].

6. Segurança denegada.

(MS 24484, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Relator(a) p/ Acórdão: Min. EROS GRAU, Tribunal Pleno, julgado em 09/02/2006, DJ 02-06-2006 PP-00005 EMENT VOL-02235-01 PP-00114 LEXSTF v. 28, n. 331, 2006, p. 173-186, grifei)

MANDADO DE SEGURANÇA - REFORMA AGRÁRIA - IMÓVEL RURAL - PRODUTIVIDADE COMPROVADA POR REGISTRO CONSTANTE DO SISTEMA NACIONAL DE CADASTRO RURAL - INVASÃO DO IMÓVEL POR TRABALHADORES RURAIS - ESBULHO POSSESSÓRIO PRATICADO MEDIANTE AÇÃO COLETIVA - CONSEQÜENTE DEGRADAÇÃO DO COEFICIENTE DE PRODUTIVIDADE FUNDIÁRIA - SITUAÇÃO CONFIGURADORA DE FORÇA MAIOR - DESCABIMENTO DA DESAPROPRIAÇÃO-SANÇÃO (CF, ART. 184, CAPUT) - INVALIDAÇÃO DA DECLARAÇÃO EXPROPRIATÓRIA - MANDADO DE SEGURANÇA CONCEDIDO.

- A prática ilícita do esbulho possessório, quando afetar os graus de utilização da terra e de eficiência em sua exploração, comprometendo os índices fixados por órgão federal competente, qualifica-se, em face do caráter extraordinário que decorre dessa anômala situação, como hipótese configuradora de força maior, constituindo, por efeito da incidência dessa circunstância excepcional, causa inibitória da válida edição do decreto presidencial consubstanciador da declaração expropriatória, por interesse social, para fins de reforma agrária, notadamente naqueles casos em que o coeficiente de produtividade fundiária - revelador do caráter produtivo da propriedade imobiliária rural e assim comprovado por registro constante do Sistema Nacional de Cadastro Rural - vem a ser descaracterizado como decorrência direta e imediata da ação predatória desenvolvida pelos invasores, cujo comportamento, frontalmente desautorizado pelo ordenamento jurídico, culmina por frustrar a própria realização da função social inerente à propriedade. Precedentes.

(MS 23759, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Tribunal Pleno, julgado em 17/04/2002, DJ 22-08-2003 PP-00021 EMENT VOL-02120-35 PP-07156, grifei).

O acórdão recorrido anulou o procedimento expropriatório adotando dois fundamentos: 1) vistoria realizada quando o imóvel estava esbulhado; e 2) a invasão possessória precisa ter identificada a data da sua ocorrência para se saber se antes ou depois da vistoria. Se ocorrido após a vistoria, o imóvel não poderia ser desapropriado antes do transcurso de dois anos a contar da sua ocupação.

Para que fique claro, colaciono o seguinte trecho do acórdão (fl. 367-368):

Depreende-se, então, que, se a vistoria realizada pelo INCRA no imóvel objeto da presente ação ocorreu no momento em que ele se encontrava invadido (como restou comprovado nos autos), não há dúvida de que contrariou o disposto no preceito legal supra transcrito, o que a torna nula e invalida todo o processo de desapropriação.

Destaque-se, ainda, que mesmo que o esbulho possessório tivesse ocorrido após a realização da vistoria pelo Órgão autuante, não se poderia dar seguimento ao processo de desapropriação, em face do que dispõe o § 6º, do art. 2º, da Lei nº 8.629/93, com a redação dada pela Medida Provisória 2.183/01, in verbis:

"Art.2º..................................................................................

§ 6º O imóvel rural de domínio público ou particular objeto de esbulho possessório ou invasão motivada por conflito agrário ou fundiário de caráter coletivo não será vistoriado, avaliado ou desapropriado nos dois anos seguintes à sua desocupação, ou no dobro desse prazo, em caso de reincidência; e deverá ser apurada a responsabilidade civil e administrativa de quem concorra com qualquer ato omissivo ou comissivo que propicie o descumprimento dessas vedações." (grifei)

Infere-se, portanto, não ser possível dar andamento ao procedimento administrativo de desapropriação, quando houver ocorrido o esbulho possessório ou invasão motivada por conflito agrário ou fundiário de caráter coletivo, do imóvel a ser expropriado, pois, mesmo que ele já tenha sido vistoriado, não se pode proceder a sua avaliação, ou ainda, se já houver sido avaliado, não poderá ser desapropriado antes do transcurso de dois anos a contar da sua ocupação. (grifos no original).

Pelo trecho transcrito verifica-se que o Tribunal não se deteve na análise dos efeitos provocados pela invasão sobre o imóvel, nem como foi efetuada a vistoria pelo INCRA.

Conforme consta do voto-condutor do aresto recorrido, o esbulho aconteceu em 17.10.1999 e a vistoria foi realizada alguns dias depois, 26.10.1999. Também noticia o julgado que a reintegração do imóvel ocorreu em 21.12.1999. Ou seja, o esbulho possessório durou cerca de 2 meses, iniciou-se 10 dias antes da vistoria do Poder Público.

Assim, considerando a situação peculiar dos autos, entendo ser indispensável a verificação da extensão da invasão na propriedade e o respectivo impacto no cálculo do índice de produtividade do imóvel.

O INCRA, com propriedade, diante da nulidade do procedimento expropriatório decretada pelo acórdão, opôs embargos de declaração, pedindo que o Tribunal se manifestasse sobre os critérios estabelecidos pelo Supremo Tribunal Federal quanto a influência da invasão sobre a classificação do imóvel.

Entretanto o Tribunal omitiu-se inteiramente sobre tal aspecto, rejeitando os embargos de declaração. Daí a interposição do recurso especial por violação ao artigo art. 535, II, do CPC.

Pergunta-se então: é imprescindível o retorno dos autos à instância de origem, ao se reconhecer a omissão da Corte? Não poderia o STJ examinar os efeitos do impacto da invasão sobre o imóvel? A resposta é negativa na medida em que, para tal avaliação, se faz necessária a análise do conjunto fático-probatório dos autos (Súmula 7/STJ).

Resta para exame o segundo fundamento constante das razões do recurso, vejamos. A instância ordinária decretar a nulidade do procedimento expropriatório diante da vedação contida no art. 2º, § 6º, da Lei 8.629/1993, considerando a impossibilidade de realizar-se a vistoria nos dois anos seguintes à invasão. Ocorre que a vedação só passou a vigorar ao advento da Medida Provisória 2.183-56, publicada em 27 de agosto de 2001, enquanto é o esbulho e a vistoria ocorreram em data anterior, 1999.

Com essas considerações, dou provimento ao recurso especial do INCRA, por violação ao art. 535, II, do CPC, para anular o acórdão, determinando o retorno dos autos para que sejam examinados os embargos de declaração opostos pelo INCRA, nos quais é pedida seja analisada a extensão da invasão na propriedade e o respectivo impacto no cálculo do índice de produtividade do imóvel.

Em conclusão, DOU PROVIMENTO AO RECURSO.

É o voto.

CERTIDÃO DE JULGAMENTO

SEGUNDA TURMA

Número Registro: 2008/0234909-0 REsp 1100046 / AL

Número Origem: 200180000063238

PAUTA: 16/06/2009 JULGADO: 16/06/2009

Relatora
Exma. Sra. Ministra ELIANA CALMON

Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro CASTRO MEIRA

Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. CARLOS EDUARDO DE OLIVEIRA VASCONCELOS

Secretária
Bela. VALÉRIA ALVIM DUSI

AUTUAÇÃO

RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRÁRIA - INCRA

PROCURADOR: VALDEZ ADRIANI FARIAS E OUTRO(S)

RECORRIDO: CIA.ACUCAREIRA CONCEICAO DO PEIXE

ADVOGADO: RICARDO ANTÔNIO DE BARROS WANDERLEY E OUTRO(S)

ASSUNTO: Administrativo - Intervenção do Estado na Propriedade - Desapropriação - Fins de Reforma Agrária

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia SEGUNDA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

"A Turma, por unanimidade, deu provimento ao recurso, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a)-Relator(a)."

Os Srs. Ministros Castro Meira, Humberto Martins, Herman Benjamin e Mauro Campbell Marques votaram com a Sra. Ministra Relatora.

Brasília, 16 de junho de 2009

VALÉRIA ALVIM DUSI
Secretária

Documento: 893286

Inteiro Teor do Acórdão - DJ: 04/08/2009




JURID - Desapropriação. Lei 8.629/1993 (art. 2º, § 6º). [04/08/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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