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terça-feira, 18 de agosto de 2009

JURID - Demissão após 14 anos. Comportamento agressivo. [18/08/09] - Jurisprudência


Apelação cível. Ação de indenização por danos materiais e morais. Prestação de serviços em congregação religiosa. Demissão após 14 anos. Comportamento agressivo perante as demais colegas.
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Tribunal de Justiça de Santa Catarina - TJSC.

Apelação Cível n. 2007.048412-8, de Videira

Relator: Des. Mazoni Ferreira

APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS - PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS EM CONGREGAÇÃO RELIGIOSA - DEMISSÃO APÓS 14 ANOS - COMPORTAMENTO AGRESSIVO PERANTE AS DEMAIS COLEGAS - DESLIGAMENTO PRECEDIDO DE AVALIAÇÕES E COMUNICAÇÃO - JUSTO MOTIVO CONFIGURADO - AUTORA QUE TINHA CIÊNCIA PRÉVIA DE TODAS AS CONDIÇÕES QUE DEVERIA SE SUBMETER APÓS SER ADMITIDA À PROFISSÃO RELIGIOSA, INCLUSIVE DA OBRIGAÇÃO DE DOAR SEUS RENDIMENTOS À ENTIDADE A QUE SERVIA - RECEBIMENTO DE AJUDA FINANCEIRA E MATERIAL QUANDO DO RETORNO À VIDA LEIGA DEMONSTRADO - DANOS MATERIAIS NÃO COMPROVADOS - RECONHECIMENTO DE INAPTIDÃO PARA O INGRESSO NA PROFISSÃO RELIGIOSA - ABALO MORAL NÃO CONFIGURADO - AUSÊNCIA DE PROVA DOS FATOS CONSTITUTIVOS DO DIREITO DA AUTORA - EXEGESE DO ART. 333, INC. I, DO CPC - INDENIZAÇÃO INDEVIDA - SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO.

Não comprovando escorreitamente a autora os fatos constitutivos do seu direito e ficando assim indemonstrados os requisitos aptos a gerar o dever de indenizar, é de ser negado o pedido indenizatório postulado.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 2007.048412-8, da comarca de Videira (1ª Vara Cível), em que é apelante Teonila de Fátima da Silva, e apelada Congregação das Irmãs do Divino Salvador:

ACORDAM, em Segunda Câmara de Direito Civil, por unanimidade de votos, negar provimento ao recurso. Custas na forma da lei.

RELATÓRIO

Teonila de Fátima da Silva ajuizou ação ordinária de ressarcimento de danos materiais e morais contra a Congregação das Irmãs do Divino Salvador, alegando, em resumo que, em meados de fevereiro de 1985, a autora aceitou a proposta da demandada e passou a viver em função de sua vocação religiosa, participando de encontros vocacionais preparado-se para o ingresso definitivo na carreira.

Asseverou que após dois anos, foi submetida a uma avaliação e ingressou na instituição da ré na qualidade de aspirante, passando a residir no Colégio Imaculada Conceição na cidade de Videira, executando serviços domésticos na residência das irmãs salvatorianas, cumprindo a jornada de trabalho das 8 horas às 12 horas, reiniciando às 13h30min exercendo serviços de enfermagem no setor de pediatria.

Aduziu que, no ano de 1995 exerceu suas atividades na cidade de Lages, retornando a Videira em final de 1996, exercendo sempre atividades em locais em que as Irmãs Salvatorianas possuíam estabelecimentos e os apontamentos em sua CTPS eram efetuados pelas superioras, e seus vencimentos entregues, integralmente, sob a forma de "doação" compulsória.

Argumentou que, no ano de 2001, ou seja, após 14 anos de serviços prestados, recebeu um comunicado da ré de que seria desligada da Congregação sem receber qualquer amparo, vindo a sofrer dificuldades para obtenção de trabalho, pois não possui experiência profissional, bem como encontra-se em notório estado depressivo.

Ao final, pugnou pela procedência do pedido, com a condenação da ré ao pagamento de indenização por danos materiais no valor de R$ 7.773,70 (sete mil, setecentos e setenta e três reais e setenta centavos) e morais no importe de R$ 40.320,00 (quarenta mil, trezentos e vinte reais), além de custas processuais e honorários advocatícios.

Devidamente citada, a ré apresentou contestação, arguindo, em preliminar, a ocorrência da prescrição trienal. No mérito, sustentou em apertada síntese que: a autora prestou votos temporários de pobreza, castidade e obediência e como ingressou na Congregação, de forma livre e voluntária, renunciou aos bens materiais e remunerações; a ré auxiliou financeiramente pelo período de quatro meses pagando os alugueres da autora no valor de R$ 375,00; a demissão da autora foi legítima, pois aplica-se, no presente caso, o Código de Direito Canônico, não fazendo jus, portanto, a indenização por danos morais.

Ao final, pugnou pelo acolhimento da preliminar argüida e pela improcedência do pedido.

Houve réplica (fls. 140/151).

Na audiência de conciliação e saneamento (fl. 244) a proposta conciliatória restou inexitosa. Na oportunidade foi afastada a preliminar de prescrição e deferida a produção de provas (fl. 248).

A ré interpôs agravo retido requerendo seja preliminarmente conhecida a prescrição (fls. 250/253).

Em audiência de instrução e julgamento foi tomado o depoimento pessoa da autora e da representante da ré e inquiridas cinco testemunhas arroladas (fls. 266/278).

As partes apresentaram suas alegações finais (fls. 281-302 e 303-310).

Sentenciando, a MMa. Juíza de Direito julgou improcedente o pedido formulado pela autora, com base no art. 269, inciso I do CPC, e condenou-a ao pagamento das custas e honorários, estes fixados em 10% sobre o valor dado à causa, suspensos pela concessão do benefício de assistência judiciária gratuita.

Inconformada, a autora interpôs recurso de apelação, no qual, pugnou pela procedência do pedido exordial. Sustentou em suas razões recursais, que em razão de sua demissão sumária da entidade religiosa, a recorrente deparou-se com inúmeras dificuldades de ordem econômica e social, bem como enfrentou sérios problemas de adaptação ao mercado de trabalho, haja vista ter ingressado na instituição ainda muito jovem (22 anos de idade) e de lá ter saído já com a idade de 37 anos, sem nenhuma espécie de preparo além do conhecimento teleológico. Afirmou que tais circunstâncias resultaram em danos materiais e morais, os quais restaram devidamente comprovado nos autos. Ao final, postulou pelo provimento do apelo.

O recurso foi contra-arrazoado.

VOTO

O recurso é conhecido porque próprio e tempestivo.

Compulsando o caderno processual, verifica-se que a situação delineada nos autos foi perfeitamente equacionada pela nobre Magistrada sentenciante - Dra. Leila Mara da Silva - e, por consentir com os argumentos expostos, adoto seus fundamentos como razão de decidir, in verbis (fls. 313-316):

"Alega a autora que deixou de receber remuneração da Congregação pelos serviços prestados durante os quatorze anos que permaneceu na instituição ré, entretanto, aduz, a requerida, que quando a autora ingressou na Congregação prestou votos temporários de pobreza, castidade e obediência as suas superioras motivo pelo qual doava a remuneração percebida.

Primeiramente vale esclarecer acerca da legalidade da demissão.

A autora ingressou na vida religiosa ciente de que iniciaria sua promoção vocacional passando pelo postulantado, seguido do noviciado, para somente após ser admitida à profissão religiosa que se desdobra em temporária e perpétua, vejamos o seu depoimento:

"[...] QUE quando ingressou na Congregação, tinha consciência de que todo trabalho remunerado que viesse a ter, durante a vida religiosa, seria doado à Congregação; QUE também tinha ciência das etapas de "postulanda", "noviciado" e "profissão religiosa", esta última com o desdobramento na temporária e perpétua, que deveria percorrer, durante a vida religiosa, junto à Congregação Salvatoria, bem como tinha ciência de que, até a fase da profissão religiosa temporária, poderia ser excluída da Congregação.[...]" (fl.267)

Porém, afirma, a autora, ter sido dispensada quando do noviciado sem justo motivo, todavia, denota-se que sua dispensa foi antecedida de diversos pedidos de renovação de votos (fl.110), seguidos de avaliações (fl.113), inclusive, tendo sido recomendada a fazer tratamento psicológico. O depoimento de Lourdes Oro, coordenadora da Congregação, é esclarecedor:

"[...] QUE em relação ao processo de desligamento da autora, tem a esclarecer que esta sempre foi cientificada de suas avaliações e aconselhada pela formadora que lhe acompanhava, Irmã Iracema Polli; QUE inclusive, a autora também foi cientificada das razões pela qual estava sendo indeferida a renovação de seus votos, o que aconteceu quando da reunião na presença dos diretores do CIC[...]; (fl.269)

A própria autora afirma ter ciência dessas avaliações que, inclusive, foi recomendada a fazer tratamento psicológico. Admitiu, ainda, em seu depoimento em juízo que "tinha ciência de que, até a fase da profissão religiosa temporária, poderia ser excluída da Congregação". (fl.267)

Ora, tendo ciência das avaliações aliado ao fato de ter participado da reunião no CIC juntamente com as testemunhas ouvidas neste feito, bem como ter recebido a comunicação de fl.26, não há que se falar em dispensa sem justo motivo.

Pode-se notar, ainda, que a requerente ao contrário do que afirmou na inicial recebeu ajuda quando de seu retorno para a vida leiga conforme faz prova os recibos de fls.114 e a afirmação da testemunha Luiz Alberto Menegazzo (fl. 275):

"[...]QUE quando a autora foi desligada da Congregação, o depoente, juntamente com a Sra. Ilva, coordenadora pedagógica do CIC, na época, foram chamados até a residência das Irmãs, que fica ao lado do CIC, para testemunhar a entrega de uma certa quantia em dinheiro e de alguns objetos à autora, sendo que assinaram, juntamente com esta, o recibo, como testemunha[...]"

Quando do ingresso na vida religiosa, a autora teve ciência das etapas que teria que percorrer para após ser admitida à profissão religiosa. Nota-se, ainda, que a requerente admite, em seu depoimento, que estava ciente que "todo o trabalho remunerado que viesse a ter, durante a vida religiosa, seria doado à congregação".

Assim, não pode, a autora, agora, reclamar pelos rendimentos que deixou de auferir em razão de tê-los doado a requerida, pois o fez de livre e espontânea vontade, consciente da atitude tomada. Em relação aos serviços prestados a terceiros, na peça exordial, a autora, sequer reconhece que os tenha prestado, portanto, não havendo prova suficiente nos autos, também não podem ser reconhecidos.

Em conseqüência, não tem direito, a autora, à indenização por danos materiais vez que doou os valores a que fazia jus.

Pretende, a autora, ainda, receber indenização por danos morais em razão de ter, a ré, apropriado-se dos rendimentos daquela valendo-se do seu trabalho sem remunerá-la, bem como em virtude de tê-la dispensado de forma ofensiva e humilhante.

A autora não logrou demonstrar que a conduta da ré causou-lhe o dano moral que alega ter sofrido. Na realidade, não emerge dos autos a convicção de que a Congregação ofendeu moralmente a autora ao não considerá-la apta para ingresso na profissão religiosa.

Denota-se dos autos, que a autora fora dispensada inclusive em virtude de sua agressividade o que se nota relevante eis que foi autora de ameaças feitas as irmãs durante uma celebração religiosa, conforme se depreende dos boletins de ocorrência de fl.115.

De outra monta, a própria autora, quando de seu depoimento em juízo, afirma que sempre foi cientificada de suas avaliações, sendo inclusive recomendada a fazer atendimento psicológico (fl.267).

Em relação a certas atividades, não se nega que a avaliação psicológica seja prestante para detectar características de personalidade incapacitantes para a função, como o seria, neste caso, um teor exagerado de agressividade.

O dano moral, ensina o Professor Fernando Noronha, "é aquele que se traduz na violação de valores ou interesses puramente espirituais ou afetivos, ocasionando perturbações anímicas no ofendido", ou, ainda, "aquele que se traduz em lesões que a pessoa sofre no corpo (dor sensação) ou na alma (dor interior) resultantes de atos antijurídicos" (Apostila de direito das obrigações, obra inédita, p. 412).

A prova dos autos não demonstra que o constrangimento impingido à autora escapou à normalidade. Ausente pressuposto essencial para a imputação de responsabilidade civil à requerida, qual seja, o dano moral indenizável, deve ser afastada a pretendida condenação.

Ainda sobre a caracterização do dano moral, assinala com propriedade o autor Sílvio de Salvo Venosa no sentido de que meros infortúnios não estão a merecer a configuração de prejuízos ao patrimônio moral da parte:

"Dano moral é o prejuízo que afeta o ânimo psíquico, moral e intelectual da vítima. Nesse campo, o prejuízo transita pelo imponderável, daí por que aumentam as dificuldades de se estabelecer a justa recompensa pelo dano. Em muitas situações, cuida-se de indenizar o inefável. Não é também qualquer dissabor comezinho da vida que pode acarretar a indenização. Aqui, também é importante o critério objetivo do homem médio, o bônus pater famílias: não se levará em conta o psiquismo do homem excessivamente sensível, que se aborrece com fatos diuturnos da vida, nem o homem de pouca ou nenhuma sensibilidade, capaz de resistir sempre às rudezas do destino. Nesse campo, não há fórmulas seguras para auxiliar o juiz. Cabe ao magistrado sentir em cada caso o pulsar da sociedade que o cerca. O sofrimento como contraposição reflexa da alegria é uma constante do comportamento humano universal." (Direito civil: responsabilidade civil. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2003, p. 33).

Diante disso, o pedido de indenização por danos morais também não merece guarida".

Ante o exposto, nego provimento ao recurso.

DECISÃO

Nos termos do voto do Relator, a Segunda Câmara de Direito Civil decide, por unanimidade de votos, negar provimento ao recurso.

O julgamento, realizado no dia 18 de junho de 2009, foi presidido pelo Des. Mazoni Ferreira, com voto, e dele participaram os Exmos. Srs. Des. Luiz Carlos Freyesleben e Sérgio Izidoro Heil.

Florianópolis, 19 de junho de 2009.

Mazoni Ferreira
RELATOR

Publicado em 11/08/09




JURID - Demissão após 14 anos. Comportamento agressivo. [18/08/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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