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quinta-feira, 13 de agosto de 2009

JURID - Crime contra os costumes. Atentado violento ao pudor. [13/08/09] - Jurisprudência


Crime contra os costumes. Atentado violento ao pudor. Artigo 214, c/c artigo 224, alínea 'a' e artigo 226, inciso II, todos do Código Penal.


Tribunal de Justiça do Paraná - TJPR.

APELAÇÃO CRIMINAL Nº 415.825-8, DA COMARCA DE JACAREZINHO, VARA CRIMINAL

APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ

APELADO: ANTÔNIO RAMOS

RELATOR: DES. LAURO AUGUSTO FABRÍCIO DE MELO

PENAL - CRIME CONTRA OS COSTUMES - ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR - ARTIGO 214, C/C ARTIGO 224, ALÍNEA 'A' E ARTIGO 226, INCISO II, TODOS DO CÓDIGO PENAL - MATERIALIDADE E AUTORIA CABALMENTE DEMONSTRADAS - PALAVRA DA VÍTIMA EM HARMONIA COM OS DEMAIS ELEMENTOS PROBATÓRIOS CONSTANTES DOS AUTOS - RECURSO PROVIDO.

1. os crimes contra os costumes são dos que se procura cometer entre quatro paredes às ocultas, horas mortas, sem vigília de ninguém. Bem por isso as vítimas são suas grandes testemunhas. Descrer delas, só quando se arregimentam elementos seguros de que tem imaginação doentia ou agem por vingança irracional.

2. Cabalmente comprovado nos autos, não só através da prova testemunhal, mas também pelo relatório de avaliação psicológica, que o apelado submeteu sua própria filha, que à época dos fatos contava com apenas 11 anos de idade, à prática de atos libidinosos.

VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Apelação Criminal nº 415.825-8, da Comarca de Jacarezinho, Vara Criminal, em que é apelante o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ e apelado ANTÔNIO RAMOS.

1. Trata-se de recurso de apelação interposto pelo Ministério Público, em face da r. sentença de fls. 181/190, que julgando improcedente a denúncia, absolveu o acusado Antonio Ramos com fulcro no artigo 386, inciso VI, do Código de Processo Penal das sanções do artigo 214 do Código Penal.

Em suas razões recursais, afirma que existem provas suficientes para embasar o édito condenatório, pugnando, daí, pela condenação do acusado nas sanções do artigo 214 c/c artigo 224 'a' e 226, inciso II, todos do Código Penal.

Contra-arrazoado o recurso, foram os autos remetidos a esta Corte de Justiça.

Nesta instância, a douta Procuradoria Geral de Justiça pronunciou-se pelo provimento do recurso, tendo esta col. 5ª Câmara Criminal, através do acórdão nº 5848 (fls. 230/246), convertido o julgamento em diligência, nos termos do artigo 616 da lei de ritos, para determinar a submissão da vítima a acompanhamento psicológico.

Baixados os autos, realizou-se relatório de avaliação psicológica com a ofendida (fls. 258/255), colhendo-se novamente suas declarações (fls. 258/259).

A douta Procuradoria Geral de Justiça, com nova vista dos autos, reiterando o pronunciamento anteriormente exarado, manifestou-se pelo provimento do apelo.

É O R E L A T Ó R I O.

2. O réu, ora apelado, foi denunciado pela prática do crime descrito no artigo 213 c/c artigo 224, 'a' e artigo 226, inciso II, todos do Código Penal, verbis:

No dia 28 de fevereiro do ano de 2003, por volta das 23:40 horas, uma sexta-feira de carnaval, o denunciado Antônio Ramos foi pilhado por inúmeros pessoas quando, pretendendo satisfazer sua concupiscência, arrastou à força Aline Aparecida Ramos, criança com apenas 11 anos de idade, sua própria filha, para o interior de um terreno baldio situado na rua Minas Gerais, próximo ao nº 620, momento em que, usando de força física, despindo a pequena jovem, acabou por retirar as suas próprias calças e passou a esfregar o seu órgão no corpo de Aline. Como não bastasse a bestialidade acima descrita, o denunciado Antônio Ramos, com o mesmo impulso lascivo, passava as suas mãos nas nádegas da criança, tentando beijá-la na boca, oportunidade em que determinava, à força mesmo, que Aline segurasse em seu pênis, sugerindo também que a mencionada jovem praticasse 'felatio in ore'. Em meio às barbáries mencionadas, tentou introduzir o membro na vagina de Aline. Como a jovem de tudo relutasse e clamasse por socorro, viandantes presenciaram o denunciado Antônio Ramos no exato momento do aberrante ataque acima descrito. Na seqüência, com a chegada da Polícia Militar o denunciado Antônio Ramos foi conduzido preso em flagrante à DelPol.

É dos autos que, diante do que foi apurado na fase indicaria, o denunciado Antônio Ramos era useiro e vezeiro da prática de ataque sexual contra Aline desde há muito tempo, havendo relatos da mencionada criança de que em outras oportunidades o indigitado já havia tentado introduzir o pênis na vagina de Aline, tudo mediante violência física e moral, consistente em agarrar a jovem e ameaçá-la psicologicamente, oportunidades em que a criança historiou sangramento na região de sua genitália (fls. 02/03).

Recebida a denúncia, o réu foi interrogado e, prosseguindo o processo seus trâmites legais, sobreveio sentença, - tendo o magistrado, com fulcro no artigo 383 do Código de Processo Penal, apreciado o crime como o capitulado no artigo 214 c/c artigo 224, 'a' e artigo 226, inciso II, todos do Código Penal, - que JULGOU IMPROCEDENTE a acusação, absolvendo o ora apelado das sanções lhe imputadas, com fulcro no artigo 386, inciso VI, da lei de ritos.

Irresignado, apelou o órgão acusatório, alegando estar suficientemente comprovada a ocorrência do crime imputado ao apelado.

Encaminhados os autos à esta Corte de Justiça, a col. 5ª Câmara Criminal, pelo acórdão nº 5848, converteu o julgamento em diligência, a fim de que a vítima fosse submetida a exame psicológico (fls. 230/246), o qual foi realizado (fls. 252/255), colhendo-se, novamente, as declarações da ofendida (fls. 258/259).

Lançadas tais considerações, passo a análise do recurso interposto pelo Ministério Público.

3. Com efeito, do exame minucioso da prova oral colhida durante a instrução criminal, bem como, do relatório de avaliação psicológica, vislumbra-se indene de dúvidas que o apelado, de fato, praticou o delito de atentado violento ao pudor em face sua própria filha, que à época dos fatos contava com apenas 11 (onze) anos.

O réu, interrogado, negou a prática da violência sexual:

... que no dia do fato, o interrogando foi até o estabelecimento conhecido como 'Bar do Zezinho' para tomar uma cerveja antes de ir para casa; que lá chegou a vítima depois que o interrogado já havia ingerido aproximadamente 3 cervejas e estava um pouco embriagado; que o interrogando comprou doces para a vítima; que na segunda vez em que foi ao banheiro do estabelecimento, o fecho da calça do interrogando arrebentou, razão pela qual ele amarrou com uma cordinha; que o interrogando saiu com a vítima do estabelecimento e foi até a pracinha com ela; que lá pagou um sorvete para a vítima; que resolveu cevar a vítima para a casa da mãe dela; que a vítima começou a chorar, razão pela qual, no meio do caminho, o interrogando parou com ela e sentou no meio fio; que colocou a vítima no colo porque estava chorando; que neste instante chegou uma pessoa conhecida por Junior e disse que iria chamar a polícia; que o interrogando disse que poderia chamar porque não estava fazendo nada demais; que o interrogado não estava com a calça arriada, mas apenas segurando ela porque a mesma estava com o fecho arrebentado... (fls. 66).

Contudo, sua versão está isolada do conjunto probatório, notadamente das declarações prestadas pela vítima, que tanto na fase inquisitorial, quanto em juízo, narrou, com segurança e com riqueza de detalhes a prática de atos libidinosos:

... que estava indo de volta para casa, quando percebeu que seu pai a estava seguindo, tendo ele alcançado a declarante e convidando-a para dar uma volta para chuparem sorvete juntos no Bar do Candinho. Que a declarante recusou-a a acompanhá-lo porque sua mãe não sabia que havia saído de casa e poderia ficar preocupada. Que o pai da declarante ficou irritado com a recusa e pegou o braço da declarante, puxando-a em direção a um terreno vazio, cheio de mato, onde ficam alguns cavalos, ao lado da casa do Alex, onde estava muito escuro. Que a declarante ficou com medo e tentou escapar, mas ele segurou forte e apertou o braço da declarante. Que chegaram perto de uma cerca de arame de varal, quando ele pegou a declarante no colo e a colocou do lado de dentro do terreno. Que ele puxou a declarante para o meio do mato, sendo que a mesma tentava escapar, mas não conseguia. Que o pai da declarante abaixou a calça e a calcinha que a mesma vestia, até os pés e também abaixou a própria calça e a cueca até o joelho, ficando com o 'pinto' de fora...

... que o pai da declarante começou a passar a mão pelo corpo da mesma, sendo que beijava seu pescoço, sua barriga, coxas e peito, além de passar as mãos por sua bunda e 'periquita' (aponta a vagina). Que ele beijou a boca da declarante e também beijou sua 'periquita'. Que a declarante resistia e seu pai lhe disse que se deixasse ele transar com a mesma, lhe daria R$ 15,00 ou R$ 20,00...

... que em dado momento o pai da declarante a colocou deitada no chão e deitou-se sobre a mesma, tentando colocar seu 'pinto' na 'periquita' da declarante, mas não conseguiu porque a declarante se mexia muito e tentava levantar a calça que usava e que estava abaixada até os pés... (fls. 12/15).

... que a depoente entrou no bar e se encontrou com o denunciado; que o denunciado comprou um salgado e um halls para a declarante no bar; que o denunciado estava tomando cerveja e também estava bêbado; que em nenhuma oportunidade no bar o denunciado foi até o banheiro; que a declarante resolveu ir embora, momento em que o denunciado convidou ela para tomar um sorvete; que a declarante disse que não queria ir porque tinha saído de casa para ir a igreja e se demorasse a mãe iria bater nela; que o denunciado disse que iria levar a depoente tomar sorvete num bar conhecido por Cantinho; que puxou a declarante pelo braço; que o denunciado acabou levando a declarante para um mato nas proximidades da casa do Alex; que a casa do Alex fica próxima ao Mercado do Ivo; que no matagal, o denunciado tirou a calça e a calcinha da declarante; que abaixou também a calça e a cueca, colocando o pênis para fora; que o denunciado passou a acariciar o corpo da declarante; que passou a beijá-la também; que virou a declarante de costa e deitou em cima; que pegou a mão da declarante e passou no pênis dele, mas a declarante tirava a mão; que o denunciado pediu para a declarante colocar o pênis dele na boca, mas a declarante o empurrou... (fls. 110).

Outrossim, a ofendida foi submetida a avaliação psicológica, tendo a expert consignado em seu relatório que embora mais sintética e sugerindo alguns lapsos de memória atribuídos ao fato de não admitir tratar sobre a questão, por ocasião das abordagens acerca do exposto na inicial ALINE APARECIDA ratificou ter sido vítima das investidas libidinosas do pai, inclusive no período em que residiu somente na companhia do mesmo, para tanto observando, ao que parece, a cronologia das ocorrências (fls. 254).

Induvidoso que a vítima ao ser ouvida novamente, quando da conversão do julgamento em diligência, procurou eximir o apelado de responsabilidade. Porém, da leitura atenta de seu depoimento, sobressai a prática de atos libidinosos pelo seu pai:

... que no dia dos fatos a mãe da depoente tinha ido até a igreja e a depoente queria ir no ensaio do carnaval, que como seu padrasto não deixaria ela ir mentiu para ele que também iria a igreja mas foi ao bar onde estava tendo o ensaio, que lá encontrou seu pai; que lhe pediu bença ao seu pai e ele lhe deu um doce, que imediatamente seu pai lhe convidou para tomar um sorvete que foi aceito; que ao sair seu pai tomou rumo diverso da sorveteria; que indagado pela depoente este disse que teria que passar em casa para pegar dinheiro; que no caminho o acusado passou a depoente para o lado de dentro da cerca; que o acusado então deitou a depoente no chão e após deitou sobre ela; que o acusado abaixou um pouco a calça da depoente até a altura da coxa...

... que o acusado deitou a depoente no chão e tirou sua camiseta; que apenas passou a mão no pescoço e no ombro da depoente... (fls. 258).

E, como bem consignou o culto representante da douta Procuradoria Geral de Justiça, Procurador de Justiça, Dr. José Antonio Pereira da Costa, em seu proficiente parecer, da própria narrativa exsurge patente o intuito de satisfação da lascívia, pois não é crível ter o apelado conduzido sua filha com apenas 11 (onze) anos de idade até um pasto, realizando a conduta acima descrita, sem qualquer conotação sexual, mesmo porque pediu segredo absoluto. Aliás, ao que parece, atentando para o decurso de considerável lapso temporal e a colheita do último depoimento, assim como para a relação de parentesco entre ambos, a menor poderia ter sofrido influências para inocentar seu pai, sendo tal situação plenamente possível, por isso não se pode desprezar as demais provas colhidas para a correta elucidação da questão posta em deslinde (fls. 269/270).

De fato, inegável que o objetivo do apelado era satisfazer sua própria lascívia, abusando sexualmente de sua filha.

Ademais, corroborando as declarações prestadas pela ofendida, o testigo de Antonio de Carvalho Pereira:

... que no dia e na hora dos fatos descritos na inicial, na qualidade de policial militar, o depoente recebeu a notícia de que a vítima teria sido vítima de tentativa de estupro praticado pelo denunciado...

... que os populares que estavam no local confirmaram a denúncia; que o depoente constatou que o denunciado estava com a calça aberta...

... que a vítima aparentava estar em estado de choque e, no momento de ser conduzida para a delegacia chegou a sofrer um desmaio...

... que a vítima disse que teria ido até as proximidades do local do fato porque estava acontecendo um ensaio de carnaval; que na volta foi perseguida pelo denunciado; que teria sido levada para um matagal existente nos fundos da residência de uma pessoa conhecida por Alex; que lá o denunciado teria tirado a calça dela e tentado a prática da conjunção carnal; que o denunciado fez, ainda, com que a vítima pegasse no pênis dele; que chegou a colocar o pênis na boca da vítima... (fls. 107).

Zanibaldo Delsasso, inquirido, disse:

... que na noite dos fatos, o depoente estava saindo de casa quando foi informado pela sua irmã e pela sua prima de que teria visto o denunciado acariciando a vítima nas proximidades do local; que estava saindo de carro quando avistou o denunciado sentado no meio fio com a vítima ao lado; que o denunciado estava com a calça aberta e um pouco caída...

... que a menina chorava bastante e parecia estar desesperada... (fls. 113).

As testemunhas Débora de Souza Melo, Amália Cristina Tiburico e Camila Cristina Delsasso, asseveraram que a vítima estava bastante nervosa, chorando e, ainda, que o denunciado puxava-a para junto de si, ... que não se tratava de uma carícia de pai para filha... (fls. 115), sem olvidar que todos foram uníssonos em afirmar que a calça do réu estava aberta (fls. 114, 115 e 116).

Assim, remanescendo cabalmente comprovado que o apelado praticou atos libidinosos em face de sua própria filha, é de rigor sua condenação nas sanções do artigo 214 c/c artigo 224, 'a' e artigo 226, inciso II, todos do Código Penal, razão pela qual, passo à dosimetria da pena, com espeque no artigo 59 do mesmo diploma legal.

A culpabilidade do acusado é grave, agindo com dolo intenso, sendo-lhe exigida conduta diversa.

Não possui antecedentes criminais, bem como, sua conduta social não restou devidamente esclarecida nos autos.

Sua personalidade não é voltada para a criminalidade, tratando-se de ilícito isolado em sua vida pregressa.

Os motivos são inerentes ao tipo penal violado, ou seja, satisfação da própria lascívia.

As circunstâncias em que o crime foi cometido não são favoráveis. O apelado convidou sua filha para tomar um sorvete, quando, então, levou-a para um matagal, deitando-a no chão e submetendo-a a diversos atos libidinosos.

As conseqüências não foram graves, pois consoante consta do relatório de avaliação psicológica, mesmo que lacônica, sempre que se referiu ao pai jamais o fez mediante expressões de repulsa ou desqualificativos (fls. 254).

O comportamento da vítima em nada contribuiu para o evento criminoso.

Dessa maneira, fixo a pena base em seis anos de reclusão e, ausentes circunstâncias atenuantes, agravantes e causas de diminuição, mas presente a causa de aumento do artigo 226, inciso II, do Código Penal, aumento-a de quarta parte (o delito foi praticado em 2003, ou seja, antes da vigência da Lei nº 11.106/2005), quedando-se definitiva em sete anos e seis meses de reclusão.

O regime prisional é o inicial fechado, com fulcro no artigo 33, § 3º do Código Penal, considerando-se, ainda, a gravidade dos fatos aqui retratados.

Por tais razões, provejo o recurso.

EX POSITIS, ACORDAM os Desembargadores integrantes da Quinta Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em dar provimento ao recurso, consoante enunciado.

Participaram do julgamento os Senhores Juízes de Direito Substituto em Segundo Grau Convocados Raul Vaz da Silva Portugal e Rogério Etzel.

Curitiba, 30 de julho de 2009.

DES. LAURO AUGUSTO FABRÍCIO DE MELO
Presidente e Relator




JURID - Crime contra os costumes. Atentado violento ao pudor. [13/08/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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