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quarta-feira, 19 de agosto de 2009

JURID - Alegação de prova nova da inocência do condenado. [19/08/09] - Jurisprudência


Revisão criminal. Alegação de prova nova da inocência do condenado. Declaração de inocência firmado por uma das vítimas de tortura perante ofício de registro de documentos.


Tribunal de Justiça do Distrito Federal e seus Territórios - TJDFT.

Órgão Câmara Criminal

Processo N. Revisão Criminal 20080020040776RVC

Requerente(s) RONY BATISTA PALA

Requerido(s)

Relator Desembargador GEORGE LOPES LEITE

Revisora Desembargadora SANDRA DE SANTIS

Acórdão Nº 369.984

E M E N T A

PROCESSUAL PENAL. REVISÃO CRIMINAL. ALEGAÇÃO DE PROVA NOVA DA INOCÊNCIA DO CONDENADO. DECLARAÇÃO DE INOCÊNCIA FIRMADO POR UMA DAS VÍTIMAS DE TORTURA PERANTE OFÍCIO DE REGISTRO DE DOCUMENTOS. INCONSISTÊNCIA DO FATO NOVO ALEGADO. O autor é policial militar e foi condenado pela prática de tortura contra duas vítimas, agredidas por ele e por dois colegas de farda, que invadiram à noite o barraco onde elas dormiam, com o objetivo de obterem a indicação do paradeiro de outro indivíduo, irmão de uma delas, suspeito de lhe haver furtado um revólver. Sendo a finalidade da revisão corrigir erros de fato ou de direito acaso existentes na sentença ou no acórdão transitados em julgado, não merece acolhida o pedido baseado em suposto fato novo, provado por meio de declaração firmada por uma das vítimas perante o Cartório de Registro de Títulos e Documentos afirmando a inocência do réu condenado, Tal documento não tem o condão de desconstituir o sólido conjunto probatório produzido sob o pálio do contraditório e da ampla defesa, estando fundada em declaração de vítima com problemas mentais, fato já ressaltado na ação penal de que resultou a condenação, não podendo ser considerada como prova nova. Improcedência da ação revisional.

A C Ó R D Ã O

Acordam os Senhores Desembargadores da Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, GEORGE LOPES LEITE - Relator, SANDRA DE SANTIS - Revisora, SILVÂNIO BARBOSA DOS SANTOS - Vogal, SÉRGIO ROCHA - Vogal, ARNOLDO CAMANHO DE ASSIS - Vogal, MARIO MACHADO - Vogal, sob a Presidência do Senhor Desembargador ROBERVAL CASEMIRO BELINATI, em proferir a seguinte decisão: JULGAR IMPROCEDENTE A REVISÃO CRIMINAL. UNÂNIME, de acordo com a ata do julgamento e notas taquigráficas.Brasília (DF), 10 de agosto de 2009 Certificado nº: 61 52 29 C0 00 02 00 00 0A B810/08/2009 - 19:14Desembargador GEORGE LOPES LEITERelator

R E L A T Ó R I O

Rony Batista Pala ajuizou a presente ação de Revisão Criminal após ter sido condenado definitivamente por sentença oriunda da Vara Criminal e de Delitos de Trânsito de Sobradinho, nos autos do Processo 1999.06.1.003634-4, que lhe impôs três anos e seis meses de reclusão no regime fechado, posteriormente modificado para o aberto no segundo grau de jurisdição, tendo o acórdão transitado em julgado em 05/11/2007. Recebeu, ainda, a pena acessória de perda do cargo público de policial militar e a interdição para o seu exercício pelo dobro do prazo da pena aplicada, por infringir o artigo 1º, inciso I, alínea "a", combinado com o § 4º, inciso III, da Lei 9.455/1997. Fundamenta seu pedido no artigo 621, Inciso III, do Código de Processo Penal, afirmando que há prova nova a demonstrar sua inocência, consistente em declaração firmada pela vítima, Carlos Augusto Silvestre Santos, portador de distúrbios mentais.

O autor é policial militar e foi denunciado pela prática de tortura praticada contra Carlos Augusto Silvestre Santos e Francisco Alves Pereira, agredidos pelo acusado e dois colegas de farda, que invadiram o barraco onde moravam, situado na Quadra 03, CL 12, Sobradinho no dia 22/02/99, por volta das 11h00min, no momento em que dormiam. O primeiro foi levado até o Pólo de Cinema, em Sobradinho, com a finalidade de indicar o paradeiro de Edcarlos, ou Edgard, Silvestre dos Santos, vulgo "Gaguinho", irmão da vítima. Para obrigá-lo a tanto, lhe aplicaram chutes, pontapés, socos e cacetadas.

A sentença condenatória transitou em julgado, consoante a informação de folha 60, valendo salientar que o requerente é primário.

A Procuradora de Justiça, no parecer de folhas 67/81, opina pela procedência da revisão criminal, afirmando que a vítima Carlos Augusto Silvestre Santos tem problemas graves de saúde mental, sendo portadora de patologia que o impede de reconhecer com segurança o seu agressor, gerando dúvida incontornável quanto à prova da autoria, ainda mais depois que firmou a declaração inocentando o autor.

É o relatório. À revisão.

V O T O S

O Senhor Desembargador GEORGE LOPES LEITE - Relator

Aprecia-se ação rescisória em sede penal, visando à desconstituição de sentença condenatória transitada em julgado, exigindo análise percuciente dos seus fundamentos. O autor é policial militar e foi condenado pela prática de tortura contra Carlos Augusto Silvestre Santos e Francisco Alves Pereira, ambos agredidos por ele e dois colegas de farda, que invadiram à noite o barraco onde moravam e dormiam, com o objetivo de indicarem o paradeiro de Edcarlos, ou Edgard, Silvestre dos Santos, vulgo "Gaguinho", irmão de Carlos Augusto.

Conforme pontifica a doutrina, a revisão criminal não é uma segunda apelação, exigindo como pressuposto de admissibilidade a afronta à evidência dos autos, sendo necessário que a decisão não encontre base em qualquer elemento apurado e esteja em desacordo com todos os autos, justificadores de solução diferente". Sobre o conceito de evidência, Nilo Batista afirma:

A evidência dos autos só pode ser alguma coisa que resulte de uma apreciação conjunta e conjugada da prova... não basta que o decisório se firme em qualquer prova: é mister que a prova que o ampare seja oponível, formal e logicamente, às provas que militem em sentido contrário".

Neste caso, o autor pretende reexaminar a sentença à luz de novas evidências probatórias, na tentativa de desconstituir os seus efeitos. Na verdade, trata-se de mero recurso que procura justificar o pedido revisional.

A Ocorrência Policial nº 01017/99-000 (folhas 11/12), noticia as lesões sofridas pelas vítimas na data de 22/02/99, quando três homens vestidos à paisana, portando armas e se auto-intitulando policiais civis, levaram Carlos Augusto num Gol vermelho para um local ermo do cerrado onde o espancaram com socos, pontapés e cacetadas, visando obterem a indicação do paradeiro de seu irmão, Edgard Silvestre Santos, vulgo Gaguinho. Sem atingir esse intento, voltaram ao casebre e agrediram a segunda vítima, Francisco, com o mesmo objetivo infrutífero. A materialidade do crime ficou provada pelo Laudo de Exame de Corpo de Delito de folhas 19/24, que descreve as extensas lesões sofridas pelas vítimas.

Mais tarde, quando a primeira vítima conseguiu voltar para o casebre, contou o ocorrido a um amigo, informando que fora atendido no Hospital Regional de Sobradinho. Ela declarou haver reconhecido um dos torturadores porque, em dado momento, este falou: "eu te conheço rapaz, você já morou no Conjunto F, da quadra 05". Quem falou isto foi justamente o Policial Militar Roni, seu antigo vizinho. Posteriormente veio a saber por intermédio de José Hélio, vulgo "Gordo", que se tratava efetivamente do filho do policial Milton Bala, o mesmo que lhe indagara anteriormente sobre o paradeiro de seu irmão, dias antes do fato. O soldado Roni queria saber do paradeiro de Edcarlos ou Edgard, porque supunha que este lhe subtraíra os pertences que estavam dentro do seu carro, incluindo uma arma de fogo, conforme a ocorrência constante às folhas 08/10.

Ora, a revisão criminal objetiva corrigir erros de fato ou de direito, existentes na sentença ou no acórdão com trânsito em julgado, sem que haja nova apreciação da prova da inocência ou de outras circunstâncias capazes de alterar o quantum da pena. O conjunto probatório dos autos foi e continua sendo suficiente para justificar a condenação por ofensa ao artigo 1º, inciso I, alínea "a", da Lei 9.455/1997.

Oportuna lição da jurisprudência:

"Hipótese excepcional: o acolhimento de pretensão revisional, na esfera criminal, há de ser excepcional, pois o que se pretende é alterar a coisa julgada. Assim, eventual contradição ao texto da lei e à evidência dos autos deve exsurgir cristalina nos autos, sem a necessidade de interpretação duvidosa ou análise puramente subjetiva das provas. Nessa linha:" a retificação do julgado, em sede revisional, há de ser viável e tolerável, como meio excepcional de afastamento da coisa julgada, apenas na medida em que se apresente a sentença grotescamente contrária ao texto de lei ou à evidência dos autos, claramente aberrante do senso de justiça

A pretensão revisional, neste caso, se funda na alegação de que a carência de higidez psíquica da vítima Carlos Augusto a impede de concatenar as idéias de molde a fornecer testemunho seguro dos fatos, implicando uma incerteza incompatível com um juízo condenatório.

A vítima Carlos Augusto Silvestre Santos prestou depoimentos às folhas 15/16, 96, 111/112, 160/161 e 297 da Ação de Justificação Judicial ajuizada pelo autor, onde narra os acontecimentos sempre de maneira linear e bastante coerente, a despeito de ser portador de distúrbios psiquiátricos, consoante atestam vários documentos acostados nos autos (folhas 312/321 da Justificação). À época dos fatos, já se sabia que a vítima tinha problemas neurológicos, pois as informações trazidas aos autos sempre indicaram tais anomalias. Ocorre que as amargas lembranças daquela noite fatídica do dia 22/02/1999 foram tão intensa que nunca se apagaram da memória da vítima.

Além disso, acrescente-se que a segunda vítima, Francisco Alves Pereira, também foi ouvida na fase inquisitorial e reconheceu o policial militar Roni, consoante se vê dos depoimentos (folhas 17/18, 91/92), não se renovando a sua inquirição por ter falecido (folhas 95, 96, 99).

Nos autos da Justificação requerida pelo autor, há uma declaração atribuída a Carlos Augusto, datada de 21/08/2007, na qual constam os seguintes dizeres, em português bastante precário: "EL Carlos Augusto Silvestre Santos decraro ci Roni Pala PM é inoceti das acuzasos di tortura minha i do mel irmão"

É difícil crer que a vítima possa ter elaborado uma declaração em letra de forma, totalmente distinta da sua letra usual, com a data de 2007, corroborada pela Escritura Pública Declaratória de folha 23, atestando a veracidade dos seus termos. Ademais, o argumento da revisional é incongruente, pois, ao mesmo tempo em que afirma a incapacidade mental da vítima, quer apresentar a sua manifestação em favor da inocência do réu como prova nova, capaz de fundamentar o pedido revisional.

Há que se ressaltar que a sentença condenatória se baseou em outras provas, além da incriminação do réu pela vítima Carlos Augusto. Houve também as declarações da segunda vítima, os laudos periciais de exame de corpo de delito e outras provas testemunhais que corroboram os indícios e presunções surgidas desde o primeiro momento quanto à autoria do crime de tortura. Basta conferir a sólida fundamentação da sentença, quando transcreveu o seguinte depoimento:

[...]que não presenciou os fatos denunciados; que tomou conhecimento, por intermédio de RAIMUNDO, cujo nome verdadeiro é Francisco Alves Pereira, falecido, vítima de atropelamento, salvo engano; que RAIMUNDO disse que teria avistado o acusado ou pessoa muito parecida com ele, o qual o teria agredido, sendo que estava querendo saber o paradeiro de terceira pessoa que teria subtraído uma arma; que RAIMUNDO disse, ainda, que o acusado ou pessoa parecida com ele havia agredido também CARLOS AUGUSTO, vulgo "Neguinho"... (José Hélio de Souza, depoimento de folha 151).

Enfim, o conjunto probatório coletado nos autos da ação penal é coerente e harmônica. Apontando com bastante clareza a autoria do crime. Não podem ser desprezados os depoimentos da fase inquisitorial quando tenham sido corroborados por outros elementos de convicção produzidos sobre o crivo do contraditório e da ampla defesa. Sobre estas provas não pode prevalecer uma declaração da vítima, firmada em condições alheias àqueles mesmos princípios. Há que se ressaltar, ainda, o depoimento de Carlos Augusto na ação de Justificação, quando afirmou que o autor o procurou para pedir desculpas pelo ocorrido (folha 196 da Justificação), o que confere coerência às provas colhidas nos autos da ação penal condenatória cuja sentença se pretende desconstituir.

Não há, portanto, que se cogitar de condenação contrária à lei ou à evidência dos autos, inexistindo, tampouco, prova nova capaz de contrariar o conjunto probatório dos autos, aptas a inocentar o requerente pelo crime de tortura, praticado por quem tinha o dever de proteger o cidadão contra atos violência, especialmente quando se trata de um cidadão portador de necessidades especiais, em razão de distúrbios psíquicos.

Enfim, inexiste qualquer discrepância entre as provas colhidas na fase inquisitorial e a judicial, podendo-se inferir que a vítima, pessoa simples, carente e doente foi induzida a produzir uma declaração perante um ofício extrajudicial. Contudo, nada invalida o depoimento da segunda vítima Francisco Alves Pereira.

Acrescente-se que a perda da função pública e a interdição para o seu exercício pelo dobro do prazo da pena aplicada são efeitos naturais da condenação nos crimes de tortura, expressamente previstas no § 5º da Lei 9.455/1997, justificada pela gravidade da conduta.

Assim, a sentença revisanda se encontra em harmonia com a prova dos autos, tendo sido dada interpretação razoável às normas de regência. Com estas razões, julgo improcedente o pedido revisional.

É como voto.

A Senhora Desembargadora SANDRA DE SANTIS - Revisora

Presentes os pressupostos, conheço do pedido.

RONY BATISTA PALA ajuizou revisão criminal para desconstituir decisão condenatória transitada em julgado que o condenou a 3 (três) anos e 6 (seis) meses de reclusão, no regime inicial aberto, pela prática do crime do artigo 1º, inciso I, alínea "a", c/c §4º, inciso III, ambos da Lei 9.455/97.

A defesa alega existirem novas provas da inocência do acusado. Aduz que a vítima é portadora de sérios distúrbios mentais e não teria condições de identificar o réu como autor do delito. Sustenta que o ofendido firmou declaração, registrada em cartório, na qual isenta o acusado de culpa pelas lesões sofridas. Requer a absolvição.

Não há como acolher a pretensão.

A decisão que condenou o requerente, mantida pelo Tribunal, baseou-se nos elementos constantes do processo, aferidos com minúcia em ambas as instâncias. A interpretação, diante da prova produzida, foi suficientemente fundamentada e não deixou margem de dúvida acerca da materialidade e autoria do crime.

As investigações realizadas pela polícia judiciária revelaram que o policial militar RONI, em companhia de dois indivíduos não identificados, espancou com um cassetete CARLOS AUGUSTO SILVESTRE e FRANCISCO ALVES PEREIRA, causando-lhes intenso sofrimento físico e mental, com o objetivo de descobrir o paradeiro de EDCARLOS SILVESTRE SANTOS, irmão da primeira vítima.

Durante a instrução criminal restou constatado que o réu teve a carteira e uma arma de fogo furtadas no Setor de Indústrias de Sobradinho. Iniciou investigação por conta própria. E ao descobrir quem seria o suposto autor do furto foi até a casa de CARLOS AUGUSTO e FRANCISCO e os torturou a fim de obter informações a respeito da localização de EDCARLOS.

CARLOS AUGUSTO reconheceu o denunciado como um dos autores do delito tanto na fase inquisitorial (fls. 15/16, 91 e 111/112) quanto em juízo (fls. 160/161). Apesar de ser portador de distúrbios mentais, sempre narrou de forma coerente a dinâmica dos acontecimentos.

FRANCISCO confirmou à autoridade policial a versão apresentada por CARLOS AUGUSTO (fls. 17/18). O depoimento não foi reiterado em juízo em razão do falecimento do ofendido. Mas a testemunha JOSÉ HÉLIO confirmou que "Raimundo", apelido de Francisco, narrou ter sido agredido pelo autor, ou por pessoa muito parecida com ele.

A declaração apresentada (fl. 22 - autos da ação de justificação em apenso), na qual CARLOS AUGUSTO inocenta o réu, não é capaz de abalar o acervo probatório e desconstituir o juízo condenatório. Trata-se de documento de idoneidade duvidosa, produzido por pessoa que a própria defesa alega ser incapaz.

A dosimetria não merece reparos. A perda da função pública e a interdição para o exercício pelo dobro do prazo são efeitos que decorrem da própria legislação (art. 1º, §5º, Lei 9.455/97).

Ante o exposto, julgo improcedente o pedido revisional. É o voto.

O Senhor Desembargador SILVÂNIO BARBOSA DOS SANTOS - Vogal

Com o Relator.

O Senhor Desembargador SÉRGIO ROCHA - Vogal

Com o Relator.

O Senhor Desembargador ARNOLDO CAMANHO DE ASSIS - Vogal

Com o Relator.

O Senhor Desembargador MARIO MACHADO - Vogal

Com o Relator.

D E C I S Ã O

JULGAR IMPROCEDENTE A REVISÃO CRIMINAL. UNÂNIME.

Publicado em 18/08/09




JURID - Alegação de prova nova da inocência do condenado. [19/08/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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