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quarta-feira, 12 de agosto de 2009

JURID - Agravo de instrumento. Fornecimento de medicamentos. [12/08/09] - Jurisprudência


Agravo de instrumento. Ação ordinária com pedido de antecipação de tutela. Fornecimento de medicamentos. Paciente portadora de neoplasia de pulmão (câncer).


Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte - TJRN

Agravo de Instrumento Com Suspensividade n° 2009.003700-4

Origem: 5ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Natal/RN.

Agravante: Estado do Rio Grande do Norte.

Procuradora: Adriana Torquato da Silva Ringeisen.

Agravada: Cleonice Cardoso Silvério.

Advogado: Rensembrink A. P. Marinheiro de Souza.

Relator: Dr. Ibanez Monteiro da Silva (Juiz convocado).

EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO ORDINÁRIA COM PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. PACIENTE PORTADORA DE NEOPLASIA DE PULMÃO (CÂNCER). DECISÃO QUE DEFERIU O PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA REQUERIDO PELA AUTORA, ORA AGRAVADA, FIXANDO MULTA DIÁRIA, EM CASO DE DESCUMPRIMENTO, A SER SUPORTADA PELO SECRETÁRIO ESTADUAL DE SAÚDE. POSSIBILIDADE. MANUTENÇÃO DA DECISÃO. CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO DO RECURSO.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima identificadas:

ACORDAM os Desembargadores que integram a 3ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, em Turma, à unanimidade de votos, em dissonância com o parecer da lavra do Dr. Paulo Roberto Dantas de Souza Leão, 13º Procurador de Justiça, em conhecer e negar provimento ao presente Agravo de Instrumento, mantendo a decisão atacada, nos termos do voto do Relator, que passa a fazer parte integrante deste.

RELATÓRIO

Trata-se de Agravo de Instrumento interposto pelo ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE, contra decisão proferida pelo Juízo de Direito da 5ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Natal, que deferiu pedido de tutela antecipatória, determinando que o Réu, ora Agravante, conceda imediatamente à Agravada o fornecimento do medicamento Hepato Diet, sob pena de multa diária no valor de R$ 1.000,00 (hum mil reais), a ser aplicada à autoridade omissa, notificando-se o senhor Secretário Estadual de Saúde para que cumpra a decisão no prazo de 05 (cinco) dias.
Inconformado, alega que o Secretário de Saúde do Rio Grande do Norte não é litisconsorte passivo no processo iniciado pela Autora, e sim o Estado do Rio Grande do Norte.

Informa que o atual gestor da pasta da saúde estadual oscila entre dois dramas: o de ser responder por crime de improbidade administrativa por ter descumprido a Lei nº 8.666/93, ou o de ser condenado pessoalmente em multas por descumprimento de decisões em sede de antecipação de tutela.

Esclarece, por sua vez, que a autorização do Poder Judiciário para comprar medicamentos por meio de dispensa de licitação não é o melhor caminho, pois o próprio Estado estará chancelando uma ilegalidade, quando se sabe que esta outorga é disposta na Lei de Licitações e Contratos como uma exceção e não como regra; e o Estado não tem como estocar todos os medicamentos e artefatos concedidos em tutelas de urgência.

Sustenta que a decisão atacada, na medida que ultrapassa a Fazenda do Estado, alcançando a pessoa do administrador, toma contornos de pena administrativa, ou até penal, culminando em afronta expressa ao Princípio Constitucional do Devido Processo Legal.

Diz ainda que a punição pecuniária prevista em desfavor do gestor da Secretaria de Saúde não deu qualquer oportunidade ao mesmo de defesa, tampouco lhe foi dada ciência dos atos processuais que originaram possível diminuição de sua fazenda, a fim de que este pudesse produzir qualquer tipo de argumentação fática ou jurídica em seu favor, motivo pelo qual ocorreu a inobservância do Princípio do Devido Processo Legal, uma vez que os Princípios da Ampla Defesa e do Contraditório são seus princípios corolários.

Da mesma forma, defende que o responsável pela Secretaria em tela permanece na dependência de previsão orçamentária advinda da Administração Estadual, após aprovação de orçamento por parte do Poder Legislativo respectivo, motivo pelo qual não pode o Juiz entender que houve omissão por parte do Secretário, nem este ser responsabilizado pelo descumprimento de tal decisão judicial.

Por fim, pugnou pelo efeito suspensivo ao Agravo. No mérito, requer que seja decretada a nulidade da decisão que arbitrou multa diária de R$ 1.000,00 (mil reais) em desfavor do Secretário Estadual de Saúde Pública, e que seja reconhecida a inconstitucionalidade da previsão de multa a ser suportada pessoalmente pelo agente público.

Juntou documentos de fls. 10/36.

Em Decisão de fls. 40/43, foi indeferida a suspensividade postulada.
Devidamente intimada, a parte Agravada não apresentou contrarrazões, conforme se depreende da Certidão de fls. 45.

Com vista dos autos, a 13ª Procuradoria de Justiça, com parecer da lavra do Dr. Paulo Roberto Dantas de Souza Leão, opinou pelo conhecimento e provimento parcial do recurso.

É o relatório.

VOTO

Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço do presente Agravo de Instrumento.

O cerne da presente questão está na possibilidade ou não de aplicação de multa diária no valor de R$ 1.000,00 (hum mil Reais) a ser suportada pelo Secretário Estadual de Saúde, em caso de descumprimento da decisão que deferiu o pedido de tutela antecipada feito pela Autora, ora Apelada.

Argumenta o Estado Agravante, em síntese, que o Secretário de Saúde do Rio Grande do Norte não é litisconsorte passivo no processo iniciado pela Autora, e sim o Estado do Rio Grande do Norte; que a decisão atacada, na medida que ultrapassa a Fazenda do Estado, alcançando a pessoa do administrador, toma contornos de pena administrativa, ou até penal, culminando em afronta expressa ao Princípio Constitucional do Devido Processo Legal; que a punição pecuniária prevista em desfavor do gestor da Secretaria de Saúde não deu qualquer oportunidade ao mesmo de defesa, tampouco lhe foi dada ciência dos atos processuais que originaram possível diminuição de sua fazenda, a fim de que este pudesse produzir qualquer tipo de argumentação fática ou jurídica em seu favor, motivo pelo qual ocorreu a inobservância do Princípio do Devido Processo Legal, uma vez que os Princípios da Ampla Defesa e do Contraditório são seus princípios corolários.

Pois bem. Entendo que tais argumentos não merecem prosperar.

Acerca das astreintes, ensinam Luiz Guilherme Marinoni e Daniel Mitidiero1:

"13. Multa coercitiva. Astreintes. Para que a sentença mandamental tenha força persuasiva suficiente para coagir alguém a fazer ou não-fazer, realizando assim a tutela prometida pelo direito material, permite-se ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, a imposição de multa coercitiva - astreintes (art. 461, §§ 4º e 6º, CPC). A finalidade da multa é coagir o demandado ao cumprimento do fazer ou do não-fazer, não tendo caráter punitivo. Constitui forma de pressão sobre a vontade do Réu, destinada a convencê-lo a cumprir a ordem jurisdicional. Para que a multa coercitiva possa constituir autêntica forma de pressão sobre a vontade do demandado, é fundamental que seja fixada com base em critérios que lhe permitam alcançar o seu fim. Assim, é que o valor da multa coercitiva não tem qualquer relação com o valor da prestação que se quer observada mediante a imposição do fazer ou não-fazer. As astreintes, para convencer o Réu a adimplir, devem ser fixadas em montante suficiente para fazer ver ao réu que é melhor cumprir do que desconsiderar a ordem do juiz. Para o adequado dimensionamento do valor da multa, afigura-se imprescindível que o juiz considere a capacidade econômica do demandado. Se a multa não surte os efeitos que dela se esperam, converte-se automaticamente em desvantagem patrimonial que recai sobre o demandado desobediente. A decisão que a fixa, atendidos os pressupostos legais, pode ser executada para obtenção de quantia certa contra o demandado".

Já no que se refere à imposição de multa diária diretamente à pessoa do agente público, diz a melhor doutrina que:

"(...) não deve ficar descartado que, em casos graves, a multa venha a ser cominada diretamente contra a pessoa da autoridade coatora (assim como, em processos de outra natureza, contra o agente público incumbido do cumprimento da decisão). Em vista das peculiaridades (e deficiências) da estrutura interna administrativa, muitas vezes apenas a multa contra a própria autoridade atinge concretamente a meta de pressionar ao cumprimento. Para tanto, há de se interpretar o § 5º do art. 461 como permitindo não apenas a adoção de medidas atípicas, mas também o direcionamento dessas medidas contra terceiros cuja cooperação seja imprescindível para a consecução da tutela2 ".

No mesmo sentido, leciona Luiz Guilherme Marinoni3 :

"(...)
Entretanto, não há cabimento da multa recair sobre o patrimônio da pessoa jurídica, se a vontade responsável pelo não-cumprimento da decisão é exteriorizada por determinado agente público. Se a pessoa jurídica exterioriza a sua vontade por meio da autoridade pública, é lógico que a multa somente pode lograr o seu objetivo se for imposta diretamente ao agente capaz de dar atendimento à decisão jurisdicional. Não há procedência no argumento de que a autoridade pública não pode ser obrigada a pagar a multa derivada de ação em que foi parte apenas a pessoa jurídica".

Dessa forma, por ser o agente público o responsável pelo cumprimento da decisão judicial e, considerando que a multa arbitrada tem caráter de motivar o rápido cumprimento de decisão pelo Estado, entendo que as astreintes devem ser suportadas pelo gestor da Secretaria de Saúde, como uma forma de garantir a efetividade da medida.
Este também tem sido o entendimento desta Egrégia Corte, conforme se vê nos arestos colacionados a seguir:

"EMENTA: CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO DE INTRUMENTO. DECISÃO QUE DEFERIU PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DA TUTELA PARA DETERMINAR AO ESTADO AGRAVANTE QUE PROCEDESSE IMEDIATAMENTE COM A INTERVENÇÃO CIRÚRGICA, E CONSEQUENTE FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO, PARA TRATAMENTO INDISPENSÁVEL À SAÚDE DA AGRAVADA. PRELIMINAR DE NECESSIDADE DE FORMAÇÃO DE LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO. DESNECESSIDADE DE INCLUSÃO DA UNIÃO E DO MUNICÍPIO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DO PODER PÚBLICO. REJEIÇÃO. MÉRITO. COMPROVAÇÃO DA NECESSIDADE DO PROCEDIMENTO CIRÚRGICO. DIREITO À SAÚDE. GARANTIA FUNDAMENTAL ASSEGURADA NAS CONSTITUIÇÕES FEDERAL E ESTADUAL. PRIORIDADE ABSOLUTA AO PACIENTE IDOSO. LEI Nº 10.741/2003. CONSTATAÇÃO DO PERIGO DE DANO IRREPARÁVEL À SAÚDE DA AGRAVADA. PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS. COMINAÇÃO DE ASTREINTE AO GESTOR PÚBLICO. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES DA CORTE. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO".

(Agravo de Instrumento n° 2007.004898-4; 2ª Câmara Cível; Relator Desembargador Cláudio Santos; Julgamento:30/10/2007) (destaques acrescidos).

"EMENTA: CONSTITUCIONAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. NECESSIDADE DE EXAME MÉDICO PARA TRATAMENTO DE SAÚDE. DIREITO FUNDAMENTAL. OBRIGAÇÃO SOLIDÁRIA DO ESTADO E MUNICÍPIO. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA LEGALIDADE ORÇAMENTÁRIA E DA SEPARAÇÃO DOS PODERES. ASTREINTE IMPOSTA AOS AGENTES PÚBLICOS INCUMBIDOS DO CUMPRIMENTO DA DECISÃO. POSSIBILIDADE ANTE O RISCO DE NÃO CONSECUÇÃO DA TUTELA. PRECEDENTES DO STJ E DO TJRN. CONHECIMENTO E IMPROVIMENTO DO RECURSO".

(Agravo de Instrumento n° 2007.000736-6; 1ª Câmara Cível; Relatora: Desembargadora Célia Smith; Julgamento: 03/09/2007) (destaques acrescidos).

"EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSUAL CIVIL. DECISÃO AGRAVADA QUE ARBITROU MULTA POR DESCUMPRIMENTO A SER SUPORTADA POR AGENTES DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. MULTA POSSÍVEL EM RELAÇÃO AO AGENTE RESPONSÁVEL PELO DESCUMPRIMENTO DA DECISÃO. PROVIMENTO PARCIAL. REFORMA PARCIAL DA DECISÃO.

1- A desobediência de ordem judicial enseja arbitramento e pagamento de multa em desfavor do agente público que, representando o Estado, tem o dever de dar cumprimento à ordem judicial, porém se negando a tanto;

(Agravo de Instrumento nº 2004.005103-4; 1ª Câmara Cível; Relator: Desembargador Manoel Dos Santos; Julgamento: 01/06/2006) (destaques acrescidos).

Ante o exposto, em dissonância com o parecer da 13ª Procuradoria de Justiça, voto pelo conhecimento e desprovimento do presente Agravo de Instrumento, para manter a decisão atacada em todos os seus termos.

É como voto.

Natal, 21 de julho de 2009.

Desembargador SARAIVA SOBRINHO
Presidente

Doutor IBANEZ MONTEIRO
Relator (Juiz Convocado)

Doutora DARCI DE OLIVEIRA
2ª Procuradora de Justiça



Notas:

1 - In Código de Processo Civil comentado artigo por artigo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008 [Voltar]

2 - TALAMINI, Eduardo. Tutela relativa aos deveres de fazer e de não fazer e sua extensão aos deveres de entrega de coisa (CPC, Arts. 461 e 461-A, CDC, Art. 84). São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p.449-450. [Voltar]

3 - In Técnica Processual e Tutela dos Direitos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, p. 662. [Voltar]




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