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terça-feira, 4 de agosto de 2009

JURID - Acidente fatal causado no estabelecimento da empresa. [04/08/09] - Jurisprudência


Acidente fatal causado no estabelecimento da empresa por culpa de colega de trabalho. Responsabilidade objetiva empregador.
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Tribunal Regional do Trabalho - TRT3ªR.

Processo: 00642-2008-091-03-00-0 RO

Órgão Julgador: Segunda Turma

Juiz Relator: Des. Sebastiao Geraldo de Oliveira

Juiz Revisor: Des. Luiz Ronan Neves Koury

RECORRENTE: (1) ANTÔNIO PIRES DA SILVA (ESPÓLIO DE) E OUTROS

(2) EXTRATIVA MINERAL LTDA.

RECORRIDOS: (1) OS MESMOS

EMENTA - Acidente fatal causado no estabelecimento da empresa por culpa de colega de trabalho. Responsabilidade objetiva empregador. No início do século XX o empregador só respondia pelos danos causados por seus empregados se ficasse também comprovada a sua culpa ou descumprimento do seu dever de vigilância. A partir de 1963, o STF adotou o entendimento de que é presumida a culpa do patrão pelo ato culposo do seu empregado (Súmula 341). O Código Civil de 2002 deu mais um passo em benefício da vítima ao estabelecer a responsabilidade do empregador, independentemente de qualquer culpa de sua parte, pelos danos causados por culpa de seus empregados ou prepostos, conforme previsto nos arts. 932, III e 933. Assim, restando comprovado que o acidente fatal foi causado por empregado da reclamada que numa atitude inconsequente, a título de simples brincadeira, desloca a carregadeira que se encontra sob sua direção sobre colegas de trabalho, causando a morte imediata de um deles por decapitação, é imperioso deferir a responsabilidade civil da empresa pela indenização postulada pelos dependentes da vítima.

Vistos, relatados e discutidos os presentes autos de recurso ordinário, oriundos da Vara do Trabalho de Nova Lima, proferiu-se o seguinte acórdão:

RELATÓRIO

Inconformados com a sentença de f. 616/622, da lavra do Exmo. Juiz Lucas Vanucci Lins, integrada pela decisão dos embargos declaratórios de f. 633/634, os reclamantes interpuseram recurso ordinário (f. 637/643), versando sobre majoração da indenização por danos morais deriva do acidente do trabalho, hipoteca judiciária e horas extras.

Recurso ordinário da reclamada às f. 644/669, tratando de indenização por danos morais, pensão mensal e adicional de insalubridade.

Depósito recursal e custas processuais às f. 670/671.

Contrarrazões do reclamante às f. 674/680 - fax e 686/692 - originais.

Contrarrazões da reclamada às f. 703/718.

Mandatos às f. 17, 18, 19, 20, 21, 46, 47, 48, 341, 342, 614, 624 e 636.

O Ministério Público do Trabalho lavrou parecer à folha 722.

É o relatório.

2. JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE

Presentes e regulares todos os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade dos recursos, deles conheço.

JUÍZO DE MÉRITO

Analisarei primeiramente o recurso da reclamada, por conter questão cujo desfecho pode vir a prejudicar a apreciação do recurso dos reclamantes.

RECURSO DA RECLAMADA

3.1.1. Ilegitimidade

Trata-se de pretensão de recebimento de indenização por danos morais e de pensão mensal, derivadas de acidente do trabalho, que vitimou fatalmente o ex-empregado Antônio Pires da Silva.

A presente reclamatória tem como reclamantes: a) o espólio de Antônio Pires da Silva representado pela inventariante Nelcy Pereira Pires; b) a viúva Nelcy Pereira Pires; e c) os seguintes filhos do casal: Kátia Pereira Silva, Flávia Pereira Silva, Sara Pereira da Silva, Juçara Aparecida da Silva, Willian Pereira da Silva, Vinicio Antônio Pereira da Silva e Fabrício Pereira da Silva.

O espólio, herança ou monte-mor, figura do Direito das Sucessões, é o conjunto de bens constitutivos do patrimônio material e moral do "de cujus" e que, pelo fato da morte, transmitir-se-á aos seus herdeiros. O direito à sucessão aberta representa uma universalidade indivisível e desprovida de personalidade legal (art. 1.791, parágrafo único, do Código Civil). O espólio não é uma pessoa física nem jurídica, mas apenas massa patrimonial autônoma, unitária e essencialmente transitória.

Nasce o espólio no momento em que se abre a sucessão e perdura tão somente até o trânsito em julgado da sentença de partilha, quando os bens que compõem aquela universalidade são repartidos entre os herdeiros. Indo os bens do falecido para outras pessoas, extingue-se a comunhão hereditária e o espólio desaparece.

Assim é que, quanto à pretensão do espólio no presente feito (indenização por danos morais e pensão mensal), esses direitos não têm natureza hereditária. Hão de ser reclamados "jure próprio", ou seja, cada pessoa lesada, em seu próprio nome, buscará a reparação junto ao causador da morte do acidentado. A transferência do patrimônio, que origina a figura do espólio, opera-se unicamente no que diz respeito a direitos de natureza transmissível, tais como: direitos reais, obrigacionais e intelectuais. São intransmissíveis, todavia, a integridade moral, a sanidade psíquica, a honra, valores esses de natureza espiritual e personalíssima.

No caso presente, o direito de pleitear indenização por danos morais e pensão mensal não se transmitiu como herança, porque a vítima não sobreviveu ao acidente de modo a experimentar pessoalmente todas as agruras oriundas do infortúnio. Admitir-se-ia a transmissão da titularidade de uma ação dessa natureza somente se já tivesse sido ajuizada pelo "de cujus", antes do falecimento; se não houve o ajuizamento, não integra o espólio. Os familiares, dependentes ou os que se sintam de algum modo lesados têm a faculdade de intentar ação "jure proprio", com o propósito de obter a indenização dos danos morais e o pensionamento, o que foi feito pela viúva e pelos filhos do falecido. Não agirão, porém, na condição de herdeiros da vítima, mas como autores, em nome próprio. O espólio, em tal circunstância, não tem legitimidade para postular a indenização dos danos morais e a pensão porque o eventual direito é dos indiretamente lesados (dano em ricochete) e não necessariamente dos herdeiros.

Assim também pondera Arnaldo Rizzardo: "As indenizações a que fazia jus o falecido, e mesmo por atos ilícitos contra ele praticados, passam aos herdeiros, eis que de caráter patrimonial, integrando o acervo hereditário. Os direitos emergentes se já em trâmites judiciais, transferem-se e partilham-se. Há, aí, uma expectativa de direito, com repercussão econômica. Mas se a vítima não promoveu a ação, tendo ela suportado prejuízos, os herdeiros têm legitimidade para buscar a reparação? A resposta é negativa, pois a integridade física ou o patrimônio lesado refere-se ao de cujus. A menos que os herdeiros suportem prejuízos com o ato ilícito, o qual atingiu diretamente o morto quando em vida ou dependessem economicamente da vítima, como os filhos dependentes e o então cônjuge" (Direito das sucessões: Lei n. 10.406, de 10.01.2002. 2a. ed., Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 31).

Deflui, daí, que a legitimidade "ad causam" do espólio não alcança as ações relativas a direitos personalíssimos, tais como os danos morais e a pensão. Nesse caso, legitimado para a ação é o próprio lesado, titular do direito, que o exercerá em nome próprio (e não o espólio, por ele).

Ademais, como representante do espólio, a inventariante (no caso, a viúva) apenas o organiza e administra, representando-o ativa e passivamente em juízo (art. 991, inciso I, do CPC). Não age, porém, como mandatária, com amplitude de poderes quanto aos interesses dos herdeiros.

"Conquanto administre a herança em benefício dos demais consortes, ou dos credores da mesma", leciona Ulderico Pires dos Santos "eles não lhe outorgam poder algum. A autoridade ou poder de que dispõe para administrar os bens do monte emanam da lei e do dever que lhe impõe o encargo que assumiu sponte sua. Se é herdeiro, administra bens próprios e alheios; se não é, gerencia apenas bens de outrem" (Sucessão hereditária: doutrina, jurisprudência e prática. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 25).

Esse entendimento não constitui expressão de exagerado formalismo, se não que visa a resguardar a exequibilidade da sentença.

De fato, ainda que se considerasse que, a rigor, o inventariante representasse os interesses de cada herdeiro, o caráter transitório do espólio impediria a execução de eventual sentença que lhe deferisse direitos ou impusesse obrigações. Isso, porque, efetuada a partilha e registrado o formal, o espólio desaparece. O inventariante não mais interferirá, pois terá cessado a sua representação; os atos por ele praticados em nome do espólio serão nulos. O titular contemplado será o único com legitimidade para as ações judiciais que forem promovidas.

Sendo patente a ilegitimidade ativa do espólio e tendo em conta o disposto no inciso VI do art. 267 do CPC, de ofício extingo o processo, quanto a ele, sem julgamento do mérito, no que tange à indenização por danos morais e à pensão mensal.

3.1.2. Questão de ordem

Mesmo em face do decidido no item anterior, permanece a legitimidade do espólio para postular os direitos devidos ao "de cujus" até a data do óbito, tais como adicional de insalubridade e horas extras.

Desse modo, fazem parte do pólo ativo da lide o espólio, a viúva e os filhos do Sr. Antônio Pires da Silva, razão por que determino ao setor competente para retificar os registros cadastrais do processo para fazer constar, como primeiros recorrentes, Antônio Pires da Silva (Espólio de) e outros.

3.1.3. Acidente do trabalho. Danos morais e pensão mensal

Irresigna-se a ré com a condenação ao pagamento de indenização por danos morais e de pensão mensal em decorrência do acidente sofrido pelo ex-empregado Antônio Pires da Silva.

As Comunicações de Acidente do Trabalho - CAT´s de f. 91 e 97, emitidas pela reclamada, registram que, em 13.06.2006, às 15:30 horas, ocorreu o acidente com o trabalhador Antônio Pires da Silva, que atingiu seu pescoço e causou a sua morte por "amputação ou enucleação".

A certidão de óbito de f. 31 consigna que o falecimento aconteceu em conseqüência de decapitação.

O laudo de f. 428/431, elaborado pelo Instituto de Criminalística da Polícia Civil do Estado de Minas Gerais, apontou que:

. O local vistoriado foi o pátio da reclamada Extrativa Mineral Ltda., na Mina Morro do Gama, na zona rural de Nova Lima.

. Na chegada dos peritos ao lugar, observou-se "a presença do cadáver de um homem negro, decapitado, com o corpo em decúbito ventral fletido, na varanda de um imóvel destinado a dormitório, com a cabeça sobre uma floreira que fazia a limitação desta varanda com o terreno nu. Próximo ao cadáver havia grande quantidade de sangue.

... tinha ainda parte dos dedos indicador, médio e anular da mão esquerda decepados. Foi identificado como Antônio Pires da Silva, de 48 anos, Operador de Carregadeira, e funcionário da empresa mencionada.

... Segundo noticiado pelas testemunhas Júnior César Santos, Ricardo Augusto de Lima e Claudinei da Silva Anastácio, os três, juntamente com a vítima, se encontravam de pé na varanda mencionada, quando a carregadeira, que era operada por Antônio Bonifácio Martins, chegou e foi direto ao encontro dos quatro, com a caçamba levantada. As três testemunhas teriam se afastado da direção em que vinha o equipamento, ali permanecendo a vítima, que foi atingida pela lâmina da caçamba em seu pescoço, decapitando-a.

Ainda segundo as testemunhas a ação do operador com a carregadeira (partir em direção dos mesmos), já ocorrera em outras ocasiões, como uma 'brincadeira' habitual" (Destaques do Relator).

Às f. 432/441, acham-se as fotografias tiradas pelos expertos criminais, que retratam a vista geral da situação encontrada no local quanto à máquina carregadeira, o espaço físico e o estado em que se encontrava o corpo do trabalhador Antônio Pires da Silva.

Os documentos de f. 98/100 e 379 e seguintes referem-se à ação penal movida pelo Ministério Público do Estado de Minas Gerais em confronto com o Sr. Antônio Bonifácio Martins, causador do acidente que vitimou o Sr. Antônio Pires da Silva.

Perante o Delegado de Polícia Civil de Nova Lima, o 1º. Sargento PM Cláudio Matias Gomes, na qualidade de condutor do acusado Antônio Bonifácio, declarou "QUE segundo as testemunhas o conduzido estava usando a pá carregadeira como brinquedo e arremeteu referida pá em direção à vítima" (f. 383).

A testemunha Ricardo Augusto de Lima asseriu que: "por volta das 15:20h, estavam o depoente, JÚNIOR CÉSAR, CLAUDINEI e ANTÔNIO PIRES na área externa do alojamento da empresa quando surgiu no local ANTÔNIO BONIFÁCIO operando uma máquina pá carregadeira; QUE este veio com a máquina para cima do depoente e para as pessoas acima citadas, sendo que todos saíram correndo; QUE logo em seguida ANTÔNO BONIFÁCIO voltou com a máquina e novamente o depoente, JÚNIOR CÉSAR e CLAUDINEI saíram correndo, entretanto, ANTÔNIO PIRES permaneceu no local próximo à parede externa do alojamento, sendo que ANTÔNIO BONIFÁCIO foi se aproximando com a máquina até que esta encostou a vítíma na parede e decapitou a cabeça da mesma e alguns dedos; ... ANTÔNIO PIRES e ANTÔNIO BONIFÁCIO eram muito amigos; PERGUNTANDO ao depoente se o mesmo já presenciou o autor proceder desta forma anteriormente, RESPONDEU que não; QUE o depoente afirma que o mesmo e as pessoas acima nominadas tinham o costume de brincar entre si, mas apenas colocando apelidos uns nos outros" (f. 384) - (original sem grifos).

A testemunha Júnior César Santos informou: "QUE por volta das 15:20h surgiu ANTÔNIO BONIFÁCIO operando uma pá carregadeira, sendo que este jogou a máquina em cima do depoente e de seus companheiros, tendo todos corrido; QUE logo em seguida o autor veio novamente com a referida máquina em direção do depoente e dos outros, ocasião em que todos correram novamente com exceção do ANTÔNIO PIRES que permaneceu parado próximo da parede do alojamento; QUE então o autor foi se aproximando da vítima, com a máquina bem devagar, entretanto esta não parou e acabou por decapitar a cabeça e alguns dedos de ANTÔNIO PIRES junto à parede acima descrita; ... QUE o depoente afirma que não viu o ANTÔNIO BONIFÁCIO jogando a máquina em cima da vítima anteriormente e que as brincadeiras que costumavam fazer entre os funcionários eram de colocar apelidos uns nos outros; QUE o depoente afirma também que o autor e vítima eram amigos" (f. 385) - (grifos adicionados).

O conduzido Antônio Bonifácio Martins, também interrogado pela autoridade policial, sentiu-se mal no momento da inquirição, tendo sido encaminhado para atendimento médico, sob escolta policial, com ratificação de sua prisão em flagrante, "por ter o mesmo confessado, em interrogatório preliminar, que estava brincando com a vítima e que como o freio da máquina falhou" o mesmo "teve sua cabeça decepada, vindo a falecer, tendo as testemunhas acompanhado a ratificação do flagrante" (f. 386) - (original sem grifos).

Perante o Juízo Criminal da Comarca de Nova Lima, o acusado Antônio Bonifácio Martins asseriu: "QUE o interrogando confessa autoria do ato delituoso que lhe é imputado, mas nega que tenha jogado a máquina em cima da vítima; QUE o interrogando recebeu ordens para retirar o lixo que estava próximo ao alojamento; QUE o interrogando aproximou-se do local, onde estavam a vítima e as testemunhas Ricardo, Júnior e Claudinei; que todos começaram a brincar; QUE o interrogando estava manobrando a máquina e todos saíram correndo; QUE logo após, o interrogando novamente colocou a máquina em movimento e ao tentar pará-la, não conseguiu o seu intento, atingindo a vítima ...; QUE o interrogando não tinha a intenção de atingir a vítima; QUE o interrogando brincava com essas pessoas, mas através de voz e gestos, e não com a máquina; QUE o acidente só aconteceu porque a máquina perdeu o freio" (f. 462) - (destaques do Relator).

Novamente ouvida, a testemunha Ricardo Augusto de Lima, no Juízo Criminal da Comarca de Nova Lima (f. 475), confirmou as informações prestadas à autoridade policial, mencionadas alhures, e acrescentou "QUE os fatos se deram antes do início de uma partida de futebol a ser disputada entre o Brasil e uma outra equipe".

A testemunha Júnior César Santos, inquirida também pela Justiça Estadual (f. 485), confirmou, em parte, as informações fornecidas à autoridade policial, tendo acrescentado: "QUE retifica seu depoimento ... no que tange à expressão 'jogou a máquina em cima do depoente e de seus companheiros', pois o acusado na verdade 'virou a máquina na direção do depoente e de seus companheiros'; QUE o depoente sabe que o encarregado Sebastião fora quem ordenou ao acusado que recolhesse o lixo nas proximidades do alojamento".

Na audiência espelhada pela ata de f. 614/615, perante a Vara do Trabalho de Nova Lima, o preposto da reclamada afirmou que: "conhece Júnior César Santos, Ricardo Augusto de Lima e Claudinei da Silva Anastácio, que estavam presentes no dia do acidente; eles prestaram informações para a perícia técnica; no dia do acidente, Antônio estava com uma máquina e em uma brincadeira de mau gosto decapitou o outro empregado; havia jogo do Brasil neste dia, estando os empregados dispensados a partir das 15 h; o acidente ocorreu às 15:30 h; não era habitual esse tipo de brincadeira na recda, o que nunca ocorreu antes; não houve determinação para ele pegar a máquina; Antonio Bonifácio continua na empresa; ele sofreu punição moral, ficando preso no hospital por 30 dias".

A testemunha Sebastião Góis Pereira, inquirida a pedido da reclamada, asseverou que: "trabalha na recda, desde 06/2005, como auxiliar administrativo; não estava presente na hora do acidente; todos os empregados foram liberados às 15 h, em virtude do jogo do Brasil; nesse dia encontrou com Antonio Bonifácio na hora do almoço, que lhe disse que iria recolher o lixo com a carregadeira no horário do jogo, tendo o depoente falado que era para deixar para outro dia porque não era prioridade; ... a recda dá treinamento de uso de EPI e fiscaliza o uso deles; nunca ocorreu este tipo de brincadeira antes na recda, alguém jogar a máquina em cima dos outros; segundo as testemunhas, o acidente ocorreu devido a uma brincadeira do operador da máquina; o operador é o responsável pela máquina; o operador é subordinado ao depoente."

Traçado esse panorama, ficaram evidentes a existência do dano e o nexo de causalidade com o trabalho. O acidente ocorreu no local do trabalho com ciência do superior hierárquico do operador e no interesse da reclamada.

O passo seguinte consiste em verificar se a reclamada teve responsabilidade no acontecimento da desdita.

Não há qualquer dúvida que o empregado da reclamada Sr. Antônio Bonifácio, operador da carregadeira, numa atitude inconseqüente e desastrada, atingiu a vítima provocando sua morte imediata. Aliás, o preposto assim confessou expressamente: "no dia do acidente, Antônio estava com uma máquina e em uma brincadeira de mau gosto decapitou o outro empregado"- (conforme lavrado na ata da audiência de f. 614). Também a testemunha Sebastião Gois Pereira, arrolada pela reclamada e superior hierárquico do causados do acidente, informou que o Sr. Antônio Bonifácio lhe disse na hora do almoço que iria recolher o lixo com a carregadeira na hora do jogo do Brasil.

Como se vê, a culpa grave do empregado da reclamada de nome Antônio Bonifácio, o operador da Carregadeira, é indiscutível. Resta verificar se a reclamada responde pela indenização dos danos causados a outrem por um de seus empregados.

No Código Civil de 1916 a responsabilidade do empregador, inicialmente, dependia de prova de que este tivesse concorrido com culpa ou negligência para viabilizar a ocorrência do dano, conforme previa o art. 1.523. No entanto, essa exigência foi superada quando o Excelso Supremo Tribunal Federal adotou a Súmula 341, em 1963, com o seguinte teor: "É presumida a culpa do patrão ou comitente pelo ato culposo do empregado ou preposto".

O Código Civil de 2002, em vigor desde 2003, superou a hesitação do Código anterior e estabeleceu, sem qualquer margem a dúvidas, que o empregador responde pelos atos dos seus empregados desde que estejam no exercício do trabalho que lhes competir ou em razão dele (Art. 932, III). Para não pairar questionamentos, o art. 933 estabelece que o empregador responde pelos atos dos seus empregados ainda que não haja culpa de sua parte. Com efeito, não prevalece mais a presunção de culpa da Súmula 341 do STF, mas a responsabilidade automática do empregador.

No caso dos autos, a responsabilidade da empresa mostra-se evidente porque o operador da carregadeira estava ainda em serviço e no local de trabalho, não havendo margem para alegar que o empregado estivesse fora do exercício do trabalho que lhe competia. Aliás, doutrina e jurisprudência já assentaram entendimento de que a interpretação do "exercício do trabalho que lhes competir" prevista no art. 932, III, do Código Civil deve ser ampla e sem restrições. Vejam alguns julgados a respeito:

"A expressão no exercício do trabalho ou por ocasião dele, constante do artigo 1521, III, do Código Civil [de 1916, correspondente ao art. 932, III, do novo], deve ser entendida de modo amplo e não restritivo. Para a caracterização dessa responsabilidade pouco importa que o ato lesivo não esteja dentro das funções do preposto. Basta que essas funções facilitem sua prática. Assim, a responsabilidade do patrão, pelos atos do preposto, só pode ser elidida quando o fato danoso por este praticado não guardar relação alguma com sua condição de empregado (TJSP, Ap.107.191-4/5-00-SP, 10ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Ruy Camilo, julgado em 24 out. 2000)".

Responsabilidade Civil - Ato ilícito de preposto - Obrigação de indenizar do patrão fundada no mecanismo da substituição - Elisão somente possível se inexistente relação entre o fato danoso e a condição de preposto - Aplicação dos arts. 159 e 1.521, III, do CC. Aquele que se faz substituir no exercício das múltiplas funções da empresa responde pelos atos dos que exercem a substituição precisamente porque seu pessoal se considera extensão da pessoa ou órgão principal. Assim, a responsabilidade do patrão, pelos atos do preposto, só pode ser elidida quando o fato danoso por este praticado não guardar relação alguma com sua condição de empregado. (Ap. n. 411.155-5, São Paulo, SP, 1o TACSP, 09/05/90, Rei. Juiz Barreto de Moura, vu., RT 667/107).".

Responsabilidade civil. Furto praticado em decorrência de informações obtidas pelo preposto por ocasião do seu trabalho. Responsabilidade solidária do empregador. - O empregador responde civilmente pelos atos ilícitos praticados por seus prepostos (Art.1.521 do CCB/1916 e Súmula 341/STF). - Responde o preponente, se o preposto, ao executar serviços de dedetização, penetra residência aproveitando-se para conhecer os locais de acesso e fuga, para - no dia seguinte - furtar vários bens. - A expressão "por ocasião dele" (Art. 1.521, III, do Código Beviláqua) pode alcançar situações em que a prática do ilícito pelo empregado ocorre fora do local de serviço ou da jornada de trabalho. - Se o ilícito foi facilitado pelo acesso do preposto à residência, em função de serviços executados, há relação causal entre a função exercida e os danos. Deve o empregador, portanto, responder pelos atos do empregado. (REsp 623.040/MG, Rel. Ministro Humberto Gomes de Barros, Terceira Turma, julgado em 16/11/2006, DJ 04/12/2006 p. 296)

Responsabilidade civil. Acidente de trabalho. Funcionário de empresa atingido por disparo de colega de trabalho. Vigilante prestador de serviço terceirizado. Vinculo de preposição. Reconhecimento. Culpa presumida da preponente. Inexistência de prova em contrário pela ré. Culpa in eligendo e culpa in vigilando. Recurso provido. Aplicação do direito à espécie. Fixação da condenação. I - Na linha da jurisprudência deste Tribunal, "para o reconhecimento do vínculo de preposição não é preciso que exista um contrato típico de trabalho; é suficiente a relação de dependência ou que alguém preste serviço sob o interesse e o comando de outrem". II - Nos termos do enunciado nº 341 da súmula/STF, "é presumida a culpa do patrão ou do comitente pelo ato culposo do empregado ou preposto". III - Além de não ter a ré cuidado de afastar referida presunção, os fatos registrados no acórdão revelam a ocorrência de culpa in eligendo e in vigilando. (REsp 284.586/RJ, Rel. Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, Quarta Turma, julgado em 25/03/2003, DJ 28/04/2003 p. 203)

Posto isso, presentes os pressupostos exigidos pelo art. 186 do Código Civil de 2002, passa-se à análise das indenizações.

O reconhecimento dos danos morais e sua reparação pecuniária representam progresso extraordinário da ciência jurídica, para propiciar a convivência respeitosa e valorizar a dignidade humana, bem como para acarretar o efeito pedagógico decorrente da condenação.

O legislador sabiamente não adotou parâmetros ou limites para a indenização por dano moral, deixando ao prudente arbítrio do juiz a sua fixação, diante das múltiplas especificidades do caso concreto. Todavia, alguns pressupostos já assentados na doutrina e jurisprudência devem nortear a dosimetria dessa indenização: a) a fixação do valor obedece a duas finalidades básicas que devem ser consideradas: compensar a dor, o constrangimento ou sofrimento da vítima e punir o infrator; b) é imprescindível aferir o grau de culpa do empregador e a gravidade dos efeitos da infração; c) o valor não deve servir para enriquecimento da vítima nem de ruína para o empregador; d) o valor deve ser arbitrado com prudência temperada com a necessária coragem, fugindo dos extremos dos valores irrisórios ou dos montantes exagerados, que podem colocar em descrédito tanto o Poder Judiciário quanto esse avançado instituto da ciência jurídica; e) a situação econômica das partes deve ser considerada, especialmente para que a penalidade tenha efeito prático e repercussão na política administrativa patronal; f) ainda que os prejudicados possam ter superado bem a ofensa, permanece a necessidade da condenação, pois a indenização pelo dano moral tem por objetivo também uma finalidade pedagógica de punir o infrator, já que demonstra para este e a sociedade a punição exemplar para aquele que desrespeitou as regras básicas da convivência humana.

Sopesado tudo isso, considero que a decisão recorrida, que fixou a indenização por danos morais em R$30.000,00 não merece provimento para reduzir o valor arbitrado.

Sobre a pensão mensal, a sentença atacada deu a seguinte resolução ao conflito:

"Como os autores requereram pensionamento, cujo fim maior é a restauração de sua situação financeira antes da morte do esposo e pai, entendo razoável arbitrar tal quantia, ao salário que teria direito o ex-empregado se continuasse a trabalhar na ré.

Para o cálculo de tal valor, deverá ser aplicado ao último salário do autor os reajustes devidos à categoria. As parcelas vencidas e vincendas deverão ser acrescidas de juros e correção monetária, como se apurar em execução.

A pensão, arbitrada em um salário do falecido, e devida até o ano em que o falecido atingiria a idade de 70 anos, quando deixaria de trabalhar. Os filhos do falecido terão direito à pensão até completarem 25 anos, data que se presume que deixam de ter dependência econômica dos pais.

A parte da pensão dos filhos que completarem 25 anos passará para a primeira autora.

A reclamada deverá constituir um capital para garantia do pagamento da pensão".

Quanto ao marco final da pensão mensal, meu entendimento é de que deveria ser deferida até quando o falecido completaria 76 anos, consoante a tabela de expectativa de sobrevida divulgada pelo IBGE. Considerando que o pedido, na inicial, foi de pagamento até a projeção de 71 anos do "de cujus"; tendo em vista que os reclamantes não recorreram quanto a isso; e como o recurso é da reclamada, impõe-se manter a sentença nesse particular, em face do princípio do non reformatio in pejus.

Diante dos elementos dos autos e dos limites do recurso, quanto à pensão mensal, há que se modificar a sentença apenas no que tange à correção monetária e juros de mora sobre as parcelas vincendas, ou seja, só caberá a incidência de tais encargos se tais parcelas não forem quitadas no prazo.

Provejo parcialmente nos termos sobreditos.

3.1.4. Aplicação do art. 1º., § 1º., da Lei n. 6.858/80

Pugna a reclamada pela aplicação do art. 1º., § 1º., da Lei n. 6.858/80.

O referido dispositivo legal assim preconiza:

"Art. 1º - Os valores devidos pelos empregadores aos empregados e os montantes das contas individuais do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço e do Fundo de Participação PIS-PASEP, não recebidos em vida pelos respectivos titulares, serão pagos, em quotas iguais, aos dependentes habilitados perante a Previdência Social ou na forma da legislação específica dos servidores civis e militares, e, na sua falta, aos sucessores previstos na lei civil, indicados em alvará judicial, independentemente de inventário ou arrolamento.

§ 1º - As quotas atribuídas a menores ficarão depositadas em caderneta de poupança, rendendo juros e correção monetária, e só serão disponíveis após o menor completar 18 (dezoito) anos, salvo autorização do juiz para aquisição de imóvel destinado à residência do menor e de sua família ou para dispêndio necessário à subsistência e educação do menor."

Com exceção dos valores atinentes à pensão mensal, dos quais os filhos menores necessitam para sobrevivência e os quais serão recebidos pela responsável, no caso, a viúva e mãe deles, os demais importes provenientes desta reclamatória deverão ser depositados em caderneta de poupança até que eles completem 18 anos, na forma da regra legal sobredita.

Provimento parcial concedido.

3.1.5. Adicional de insalubridade

Insurge-se a ré contra a condenação ao pagamento do adicional de insalubridade.

Sem razão.

O laudo pericial de f. 491 e seguintes, produzido pela perita oficial Márcia Regina Fiorini Andrade Perillo, apurou que, o "de cujus", no labor de operar a pá carregadeira, trabalhava exposto a ruído acima do limite de tolerância, cuja insalubridade não restou neutralizada pela ré, tanto por não ter conservado o ambiente de trabalho dentro do referido limite, quanto por ter reposto os equipamentos de proteção individual por períodos superiores aos estipulados, assim como por não ter orientado o falecido a utilizar corretamente os EPI´s.

Não infirmadas as conclusões da experta por qualquer elemento, tem-se por correto o deferimento do adicional de insalubridade de grau médio, com fulcro nas Normas Regulamentadoras n. 6 e 15 do Ministério do Trabalho e no art. 192 da CLT.

Desprovejo.

3.2. RECURSO DOS RECLAMANTES

3.2.1. Danos morais

Aspiram os autores ao aumento do valor da indenização por danos morais. Entendo que o recurso deve ser provido neste tópico.

A morte de um pai de família, que saiu de casa para ganhar a vida, representa o desmonte traumático de todos os projetos de vida da esposa e filhos e deixa um vazio no lar que jamais será preenchido. A indenização pelos danos materiais pode até alcançar a recomposição do prejuízo e a "equivalência matemática" norteia os critérios de cálculo. No entanto, a solidão do abandono na intimidade do lar, a orfandade e a viuvez inesperada não têm retorno nem dinheiro que repare suficientemente. Na verdade a dor moral deixa na alma feridas abertas e latentes que só o tempo, com vagar, cuida de cicatrizar, mesmo assim, sem nunca apagar o registro.

Por outro lado, se a reparação no seu sentido rigoroso não é atingível, cabe pelo menos uma compensação monetária, um lenitivo, que possa oferecer aos dependentes da vítima um outro bem da vida para acalmar sua revolta e facilitar sua resignação diante do fato consumado. Não se trata, porém, de estabelecer um preço para a dor (pretium doloris), mas de criar possibilidades para que a viúva e os filhos da vítima desenvolvam novas atividades ou entretenimentos, para vencer as recordações dolorosas e superar o sofrimento ( ("A indenização, em caso de danos morais, não visa reparar, no sentido literal, a dor, a alegria, a honra, a tristeza ou a humilhação; são valores inestimáveis, mas isso não impede que seja precisado um valor compensatório, que amenize o respectivo dano, com base em alguns elementos como a gravidade objetiva do dano, a personalidade da vítima, sua situação familiar e social, a gravidade da falta, ou mesmo a condição econômica das partes". STJ. 5ª Turma. REsp. n. 239.973/RN, Rel.: Ministro Edson Vidigal, julgado em 16 maio de 2000, DJ 12 jun. 2000, p. 129.)). Na expressão lapidar de Cunha Gonçalves, a indenização pelo dano moral "não é remédio, que produza a cura do mal, mas sim um calmante. Não se trata de suprimir o passado, mas sim de melhorar o futuro" ( (CUNHA GONÇALVES, Luiz da. Tratado de direito civil, 1957, v. 12, t. II, p. 543.)).

Assim, com apoio nos parâmetros mencionados na apreciação do recurso da reclamada, entendo que o valor dos danos morais deve ser elevado, especialmente diante da intensa gravidade do fato. Com efeito, provejo o recurso para elevar o valor da indenização por danos morais para R$100.000,00, sendo R$30.000,00 para a viúva e R$70.000,00 que deverá ser dividido igualmente entre os filhos.

3.2.2. Hipoteca judiciária

A determinação, pelo Juízo a quo, de a reclamada constituir capital para garantir o pagamento da renda mensal, encontra amparo no artigo 475-Q do CPC e supre os efeitos a hipoteca judiciária.

Desprovejo.

3.2.3. Horas extras

Perseveram os autores no intento de que seja deferido o pagamento de horas extras.

Sem razão.

No recurso (f. 642), os reclamantes afirmam que os registros de frequência são corretos.

Examinados tais documentos e os recibos salariais (f. 237 e seguintes), constata-se a quitação de diversas horas extras.

Analisados os demonstrativos apresentados pelos reclamantes às f. 369/370, verifica-se, tomando-se como exemplo, o dia 25.11. 2004, que os autores apuraram horas extras a maior. Ou seja, no referido dia, considerando-se, inclusive, a redução das horas noturnas, o "de cujus" excedeu sua jornada normal em 60 minutos, mas os autores computaram 1 hora e 36 minutos.

Logo, não demonstradas habilmente diferenças entre as horas extras pagas e as reputadas devidas, realmente improcede a pretensão.

Nego provimento.

FUNDAMENTOS PELOS QUAIS,

O Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região, pela sua Segunda Turma, unanimemente, determinou a retificação dos registros cadastrais, para fazer constar, como primeiros recorrentes, Antônio Pires da Silva (Espólio de) e outros; sem divergência, conheceu de ambos os recursos e, por maioria de votos, vencido, parcialmente, o Exmo. Desembargador Revisor, declarou, de ofício, a ilegitimidade ativa do espólio para postular a indenização por danos morais e a pensão mensal, extinguindo, com fulcro no inciso VI do artigo 267 do CPC, o processo, quanto a ele e acerca de tais matérias, sem resolução de mérito; unanimemente, deu provimento parcial ao apelo da reclamada para estabelecer: I) quanto aos reclamantes menores de idade, com exceção dos valores atinentes à pensão mensal, que os demais importes provenientes desta reclamatória deverão ser depositados em caderneta de poupança até que eles completem 18 anos; II) que só caberá a incidência da correção monetária e juros de mora sobre as parcelas vincendas se elas não forem quitadas no prazo; sem divergência, ao recurso dos reclamantes, deu-lhe provimento parcial para elevar o valor da indenização por danos morais para R$100.000,00, a ser dividido entre os autores, conforme especificado na fundamentação do voto do Exmo. Desembargador Relator. Acrescido à condenação o valor de R$70.000,00, com custas adicionais de R$1.400,00, pela reclamada.

Belo Horizonte, 22 de junho de 2009.

SEBASTIÃO GERALDO DE OLIVEIRA
Desembargador Relator

Data de Publicação: 03/07/2009




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