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quinta-feira, 23 de julho de 2009

JURID - Reforma. Descabimento. Militar temporário. Incapacidade. [23/07/09] - Jurisprudência


Reforma. Descabimento. Militar temporário. Incapacidade temporária.

Tribunal Regional Federal - TRF2ªR.

RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL CASTRO AGUIAR

APELANTE: UNIÃO FEDERAL

APELADO: WERLEY PAZ FELISBINO

ADVOGADO: APARECIDO SOARES COSTA (RJ107775)

REMETENTE: JUÍZO FEDERAL DA 2A VARA DE SÃO GONÇALO-RJ

ORIGEM: 2A. VARA FEDERAL DE SÃO GONÇALO/RJ (200651170017497)

R E L A T Ó R I O

Trata-se de apelação e remessa necessária de sentença, proferida em sede de ação ordinária, que julgou parcialmente procedente o pedido, para anular o ato de licenciamento do autor, reintegrando-o ao Serviço Ativo do Exército, bem como condenar a União ao pagamento de R$ 6.000,00 (seis mil reais), a título de reparação pelos danos morais sofridos.

A União requer a reforma da sentença, para que o pedido seja julgado improcedente. Alega que o autor não possui estabilidade e não é considerado inapto para outros atos da vida civil, não preenchendo os requisitos para reforma, nem para a reintegração ao serviço ativo. Afirma que a sentença proferida desconsiderou o laudo pericial e que a questão referente ao dano moral não foi comprovada (fls. 157/159).

O autor apresenta contra-razões, requerendo o improvimento do recurso. Alega que o Exército não poderia licenciá-lo, porque é portador de enfermidade com relação de causa e efeito com o serviço ativo (fls. 162/166).

O Ministério Público Federal opina pelo improvimento do recurso e da remessa necessária, com a confirmação da sentença (fls. 174/178).

É o relatório.

V O T O

Trata-se de apelação e remessa necessária de sentença, proferida em sede de ação ordinária, que julgou parcialmente procedente o pedido, para anular o ato de licenciamento do autor, reintegrando-o ao Serviço Ativo do Exército, bem como condenar a União ao pagamento de R$ 6.000,00 (seis mil reais), a título de reparação pelos danos morais sofridos.

Conforme os documentos acostados aos autos, o autor, então militar temporário, sofreu um atropelamento em 09.07.2002, quando ia de sua residência para o 3º Batalhão de Infantaria, tendo ficado internado no Hospital Central do Exército.

Após o ocorrido, por várias vezes, foi julgado temporariamente incapaz para o Exército, em decorrência das seqüelas adquiridas no acidente, tendo sido apontada a necessidade de tratamento cirúrgico (fls. 36/41), até que, em 14.06.2005, foi considerado "apto", e, finalmente, licenciado da Força Armada (fl. 59).

Contudo, o laudo pericial de fls. 127/132, realizado em outubro de 2007, constatou incapacidade laborativa do autor, em decorrência das lesões no joelho esquerdo causadas pelo acidente em serviço, o que leva a crer que houve uma avaliação equivocada das condições do militar na inspeção de saúde de 14.06.2005, que viabilizou o licenciamento.

Ora, o autor não poderia ter sido licenciado, porque se encontrava incapaz, em decorrência de acidente em serviço. O Exército deveria ter-lhe dispensado adequada assistência médica, inclusive de natureza cirúrgica, conforme indicado pelos médicos da Força Singular. Em vez disso, simplesmente o desligou, lançando-o à própria sorte.

Importa registrar o disposto no art. 149 do Decreto 57.654/66 (Regulamento da Lei do Serviço Militar):

"Art. 149. As praças que se encontrarem baixadas a enfermaria ou hospital, ao término do tempo de serviço, serão inspecionadas de saúde, e mesmo depois de licenciadas, desincorporadas, desligadas ou reformadas, continuarão em tratamento, até a efetivação da alta, por restabelecimento ou a pedido. Podem ser encaminhadas a organização hospitalar civil, mediante entendimentos prévios por parte da autoridade militar."

Trago à colação julgado sobre a matéria, já citado na sentença:

"ADMINISTRATIVO - PROCESSUAL CIVIL - MILITAR - ATO DE LICENCIAMENTO - ANULAÇÃO - REINCORPORAÇÃO ÀS FILEIRAS DO EXÉRCITO - ATENDIMENTO MÉDICO E FISIOTERÁPICO - INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - COMPENSAÇÃO PECUNIÁRIA - LEI 7.963/89 - REDUÇÃO DA VERBA HONORÁRIA PARA 5% SOBRE O VALOR DA CONDENAÇÃO - ART. 20, § 4º, CPC - APELAÇÃO E REMESSA NECESSÁRIA PARCIALMENTE PROVIDAS.

(...)

- Ademais, não se pode olvidar que o laudo pericial acostado às fls. 308/309 foi conclusivo ao atestar a existência de lesões no joelho esquerdo do apelado, resultantes de acidente em serviço, limitando-o para locomover-se por meios próprios e levando o mesmo a "necessitar de suporte com muletas". Outrossim, o expert do Juízo a quo ressaltou que, no momento da perícia, o apelado encontrava-se impossibilitado de auferir qualquer rendimento na vida civil destinado a sua subsistência, apresentando "incapacidade temporária para a função de militar", bem como necessitando de tratamento cirúrgico.

- Neste sentido, cumpre transcrever o seguinte trecho do parecer de fls. 454/457, emitido pelo parquet Federal: "Observa-se que não diagnosticada irreversibilidade definitiva do seu estado clínico, e sido recomendada intervenção cirúrgica reparadora da lesão nos meniscos do joelho esquerdo do autor, este não poderia fazer jus à reforma por invalidez. No entanto, se mostrou correto a reintegração do autor ao serviço do Exército para prosseguimento do seu tratamento médico-fisioterápico e, caso necessário, seja este submetido a intervenção cirúrgica. Isto porque, o ora apelado, foi licenciado por conclusão do tempo de serviço, porém, sem ter recebido alta médica, o que configura a nulidade do ato de seu licenciamento."

- Destarte, há que se concluir que o apelado faz jus à anulação do ato de seu licenciamento e, conseqüentemente, à sua reincorporação às fileiras do Exército Brasileiro, bem como aos medicamentos e ao atendimento médico e/ou fisioterápico de que necessitar, conforme determinado na sentença, a qual, ao contrário do que alega a apelante, observou corretamente o devido processo legal.

(...)

(TRF-2ª REGIÃO, AC 390899, Processo: 200451010102234, QUINTA TURMA ESPECIALIZADA, DJU 12/09/2007, p. 42, Relatora Desembargadora Federal VERA LÚCIA LIMA)"

Por isso, entendo que o Exército deve reintegrá-lo e, então, submetê-lo a tratamento médico-cirúrgico. Caso fique curado, aí sim, será avaliada a questão pertinente ao licenciamento; caso contrário, analisar-se-á a hipótese de reforma.

Assim, correta a sentença que declarou nulo o ato de licenciamento, determinou a reintegração do autor ao Exército e condenou a União a prestar o atendimento médico necessário.

Ressalte-se que, de fato, não há direito à reforma.

O art. 106, II, da Lei 6.880/80 autoriza a reforma do militar julgado incapaz definitivamente para o serviço ativo das Forças Armadas, não necessitando ser considerado inválido para todo e qualquer trabalho:

"Art. 106. A reforma ex officio será aplicada ao militar que:

(...)

II - for julgado incapaz, definitivamente, para o serviço ativo das Forças Armadas;

(...)"

No entanto, os militares temporários somente têm direito à reforma por acidente em serviço se a incapacidade for definitiva, conforme o disposto nos artigos 108 e 109 da Lei 6.880/80, o que inocorreu. Vejamos:

"Art. 109. O militar da ativa julgado incapaz definitivamente por um dos motivos constantes dos itens I, II, III, IV e V do artigo anterior será reformado com qualquer tempo de serviço."

"Art. 108. A incapacidade definitiva pode sobrevir em conseqüência de:

I - ferimento recebido em campanha ou na manutenção da ordem pública;

II - enfermidade contraída em campanha ou na manutenção da ordem pública, ou enfermidade cuja causa eficiente decorra de uma dessas situações;

III - acidente em serviço;

IV - doença, moléstia ou enfermidade adquirida em tempo de paz, com relação de causa e efeito a condições inerentes ao serviço;

V - tuberculose ativa, alienação mental, neoplasia maligna, cegueira, lepra, paralisia irreversível e incapacitante, cardiopatia grave, mal de Parkinson, pênfigo, espondiloartrose anquilosante, nefropatia grave e outras moléstias que a lei indicar com base nas conclusões da medicina especializada; e

VI - acidente ou doença, moléstia ou enfermidade, sem relação de causa e efeito com o serviço.

§ 1º Os casos de que tratam os itens I, II, III e IV serão provados por atestado de origem, inquérito sanitário de origem ou ficha de evacuação, sendo os termos do acidente, baixa ao hospital, papeleta de tratamento nas enfermarias e hospitais, e os registros de baixa utilizados como meios subsidiários para esclarecer a situação.

(...)"

Assim sendo, tendo em vista que o perito afirma que poderá haver reversão total ou parcial do quadro clínico, se o autor for submetido à operação, não restou demonstrada a incapacidade definitiva para o serviço militar, não havendo, portanto, direito à reforma.

No que tange à condenação por danos morais, a sentença deve ser mantida.

Cabe lembrar que, por se tratar a União de pessoa jurídica de direito público, o critério utilizado para determinação do quantum indenizatório não tem caráter punitivo, mas meramente retributivo.

Assim, considero que o valor de R$ 6.000,00 (seis mil reais), fixado pela juíza, a título de danos morais, não se revela exagerado ou desproporcional, de modo a ensejar a reforma da sentença, tendo em vista que o Exército não providenciou ao autor o necessário tratamento cirúrgico, diversas vezes indicado por seus próprios médicos e o desligou abruptamente, desamparando-o.

É óbvio que a falta de assistência médica adequada, por tanto tempo, somada às dificuldades financeiras oriundas da interrupção do recebimento do soldo, acarretaram grande sofrimento ao autor, justificando a reparação por danos morais.

Quanto à correção monetária das parcelas atrasadas, a jurisprudência deste Tribunal tem reconhecido a inclusão dos expurgos inflacionários nos cálculos de correção monetária, visto que esta se configura mera recomposição do valor da moeda, devendo ser observado, contudo, o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal.

Segue julgado ilustrativo:

"ADMINISTRATIVO. CONTRATO ADMINISTRATIVO. SERVIÇO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. PAGAMENTOS MENSAIS COM ATRASO. REAJUSTE DEVIDO.

(...)

VI - A jurisprudência pacífica é no sentido de que a correção monetária é simples recomposição do valor real da moeda, devendo ser reconhecidos os índices expurgados da inflação, mesmo quando não tenham sido expressamente requeridos. Todavia, devem ser adequados os percentuais acolhidos na sentença àqueles previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal (o que, aliás, foi expressamente pleiteado pela autora na inicial).

(...)

(TRF -2ª REGIÃO, AC - APELAÇÃO CIVEL - 239171, Processo: 200002010373672, QUINTA TURMA ESPECIALIZADA, DJU:19/12/2008, p. 140, Relator Desembargador Federal ANTÔNIO CRUZ NETTO)"

Com relação aos juros moratórios das prestações vencidas, dispõe o art. 1º-F da Lei n.º 9.494/97, cuja redação foi dada pela MP 2.180-35/01:

"Art. 1º-F Os juros de mora, nas condenações impostas à Fazenda Pública para pagamento de verbas remuneratórias devidas a servidores e empregados públicos, não poderão ultrapassar o percentual de seis por cento ao ano. (NR) (Artigo incluído pela Medida provisória nº 2.180-35, de 24.8.2001)"

Por se tratar de norma restritiva de direitos, será aplicada apenas ao pagamento de verbas remuneratórias devidas aos servidores e empregados públicos, que é a hipótese dos autos, e iniciados a partir da citação.

De outro giro, na linha de precedentes desta Quinta Turma Especializada, os honorários advocatícios foram corretamente fixados em 5% sobre o valor da condenação, porque vencida a Fazenda Pública.

Assim, há que ser mantida a sentença, in totum.

Isto posto, nego provimento à apelação e à remessa necessária.

É como voto.

CASTRO AGUIAR
Desembargador Federal

E M E N T A

ADMINISTRATIVO - REFORMA - DESCABIMENTO - MILITAR TEMPORÁRIO - INCAPACIDADE TEMPORÁRIA - ARTS. 108 E 109 DA LEI 6.880/80 - LICENCIAMENTO - DESCABIMENTO - DIREITO A TRATAMENTO MÉDICO - ART. 149 DO DECRETO 57.645/66 - DANOS MORAIS.

I - O autor não poderia ter sido licenciado, porque se encontrava incapaz, em decorrência de acidente em serviço. O Exército deveria ter-lhe dispensado adequada assistência médica, inclusive de natureza cirúrgica, conforme indicado pelos médicos da Força Singular. Em vez disso, simplesmente o desligou, lançando-o à própria sorte.

II - O art. 149 do Decreto 57.654/66 (Regulamento da Lei do Serviço Militar) garante o tratamento de praça não-estável temporariamente incapaz.

III - Os militares temporários somente têm direito à reforma por acidente em serviço se a incapacidade for definitiva, conforme o disposto nos artigos 108 e 109 da Lei 6.880/80, o que inocorreu.

IV - A falta de assistência médica adequada, que não lhe foi prestada pelo Exército, somada às dificuldades financeiras oriundas da interrupção do recebimento do soldo, acarretaram grande sofrimento ao autor, ensejando a reparação por danos morais.

V - Apelação da União e remessa necessária improvidas.

A C Ó R D Ã O

Vistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima indicadas.

Decide a Quinta Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da Segunda Região, por unanimidade, negar provimento à apelação e à remessa necessária, nos termos do relatório e voto constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Rio de Janeiro, 15 de julho de 2009 (data do julgamento).

DESEMBARGADOR FEDERAL CASTRO AGUIAR
Relator




JURID - Reforma. Descabimento. Militar temporário. Incapacidade. [23/07/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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