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terça-feira, 28 de julho de 2009

JURID - Recurso em sentido estrito. Rejeição da queixa-crime. [28/07/09] - Jurisprudência


Recurso em sentido estrito. Rejeição da queixa-crime. Depoimento de testemunha prestada na esfera cível. Calúnia.

Tribunal de Justiça de Goiás - TJGO.

RECURSO EM SENTIDO ESTRITO Nº 10133-9/220 (200803349119)

Comarca: GOIÂNIA

Recorrente: RAUL FERREIRA DE ASSIS

Recorrido: POLIANA RESPLANDES PEREIRA

RELATÓRIO e VOTO

RAUL FERREIRA DE ASSIS, por intermédio de seu procurador ingressou com queixa-crime perante a 11ª Vara Criminal da Comarca de Goiânia, em desfavor de POLIANA RESPLANDES PEREIRA, qualificada nos autos, atribuindo-lhe as condutas tipificadas nos artigos 138 (calúnia), 139 (difamação), 140 (injúria) e 342 (falso testemunho), todos do Código Penal, narrando fatos ocorridos em Ação Cominatória perante o Juízo da 3ª Vara Cível da Comarca de Goiânia.

Em decisão às fls. 115/118, o Dr. Everton Pereira Santos rejeitou a queixa-crime, com fulcro no artigo 43, incisos I e III, do Código de Processo Penal.

Irresignado, o defensor interpôs recurso Apelatório (fls. 139/150), onde alega que a decisão foi em total desobediência as provas dos autos, ao devido processo legal e aos preceitos constitucionais.

Noticia que a recorrida, ao ser arrolada para testemunhar no juízo cível a respeito de fatos na Ação Cominatória, prestou depoimento falso em detrimento do recorrente, além de ofender-lhe a reputação, o decoro e sua dignidade ao atribuir-lhe fatos criminosos.

Ao final requer que o recurso seja conhecido e provido, para os fins de reformar a decisão de primeiro grau e condenar a recorrida nos tipos penais inicialmente apontados, nos efeitos da sucumbência processual e honorários advocatícios.

Em despacho à fl. 152, o Magistrado recebeu a Apelação como Recurso em Sentido Estrito.

Nas contra-razões, tanto a defesa da recorrida (fls. 169/192), quanto o Ministério Público (fls. 252/254) rebateram os argumentos do recurso e pugnaram pela confirmação da sentença.

No juízo de retratação a decisão foi mantida (fls. 262/263).

A Procuradoria-Geral de Justiça entende que o recurso deve ser conhecido, mas negado provimento ao pedido, ao fundamento de que as declarações prestadas pela querelada no Juízo Cível não se apresentam com a finalidade de praticar atos criminosos (fls. 269/277).

Relatório.

Voto.

Satisfeitos os pressupostos de admissibilidade do recurso, dele conheço.

Conforme relatado, insurge o recorrente contra a decisão de primeiro grau, que rejeitou queixa-crime onde postulava a condenação de Poliana Resplandes Pereira, pelas condutas tipificadas nos artigos 138, 139, 140 e 342, todos do Código Penal.

O dirigente procedimental ao rejeitar a queixa-crime, assim o fez com a seguinte fundamentação (fls. 115/118), in verbis:

"...Pela análise do depoimento da Querelada percebo que a queixa não tem como prosperar. Na nota de rodapé, onde transcrevi as disposições dos artigos, grifei os pontos que a queixa padece de sustentação.

Vejamos todo o depoimento da Querelada, prestado sobre compromisso ao Juiz da 3ª Vara Cível desta comarca, MM Dr. Marcus Vinícius de Oliveira:

"que pode dizer que a autora teve dificuldades em adentrar no apartamento após a concessão desse direito judicialmente, tendo os representantes do condomínio obstado a sua entrada, sendo necessária chamar a polícia; que a autora informou a depoente que chamaram-na de "caloteira e pilantra"; que a autora informou a depoente que quando recebia visitas tinha que esperar na portaria pois não avisavam da chegada destas; que informou também que não entregavam as taxas de condomínio, fazendo com que a autora tivesse que depositar na conta do condomínio; que no dia do leilão a autora estava realizando uma venda de equipamentos de proteção em materiais elétricos para um cliente, razão pela qual pediu a depoente que comparecesse ao leilão; que a depoente foi até o leilão e ligou para a autora informando que o mesmo teria atrasado e que a autora poderia chegar a tempo, tendo a autora dito que se saísse perderia a venda, o que ocorreu, tendo o comprador fechado negócio com outro concorrente".

"que a autora mostrou a depoente quem seria o representante do condomínio que estaria obstando a sua entrada no imóvel, tendo a depoente identificado na sala de Audiências o Sr. De camisa azul que o procurador da requerida nominou de Raul Ferreira de Assis como sendo a pessoa que constrangeu a entrada da autora no imóvel, bem como no elevador; que nunca sofreu restrição a subida na casa da autora, mas afirma que essas restrições ocorreram próximo à mudança e acredita que foram realizadas pela porteira; que presenciou todos os atos do leilão e após a entrega do cheque pela autora foi-lhe entregue um recibo, não se recordando se o auto de leilão e arrematação foram entregues na ocasião; que no início do leilão um Sr. De nome César se apresentou como representante do condomínio e posteriormente ofertou lances dizendo que atuava como particular; que no apartamento existe móveis na sala e no quarto, mas não armários fixos".

Da analise do depoimento da Querelada não vislumbro, nem de longe, a prática dos crimes de calúnia, difamação e injúria. Quanto ao crime de falso testemunho, parece inoportuno, eis que ainda não há sentença reconhecendo o falso.

Observo que os trechos do depoimento da Querelada, pinçados pelo querelante, para justificar a prática dos crimes, se referem a informações prestadas pela autora à depoente.

No presente caso, se a testemunha depôs sobre o que ouviu da autora, esta também deveria integrar o pólo passivo da queixa, sob pena de ferir o princípio da indivisibilidade da queixa-crime.

Ressalto que o Juiz que ouviu o depoimento da Querelada fez constar todos esses detalhes, tratando-se de depoimento indireto, ou seja, quando a testemunha depõe sobre o que ouviu dizer. Indispensável dizer que nesses casos o julgador dará o devido valor às informações prestadas em consonância com o acervo probatório.

Por outro lado, não percebo a intenção (dolo direto ou eventual) de caluniar, difamar ou injuriar. Cabe frisar que o Juiz deve garantir às testemunhas formas de prestar depoimento livre, ou seja, imunes a todo tipo de pressão, sob pena de não prestarem o depoimento de forma integral e capaz de contribuir para elucidação de fatos.

Assim, o fato narrado evidentemente não constitui crime.

Acrescento ainda que, a ação penal gera gravame ao denunciado ou querelado (strepitus judicii), devendo por isso ter suporte probatório mínimo que ampare a imputação.

Trata-se da Justa Causa que Afrânio da Silva Jardim coloca esta como uma quarta condição da ação. É o "fumus boni juris" (art. 648, I, CPP; art. 44, parágrafo 1º, Lei 5.250/67 e artigo 39 da Lei nº 10.409/02).

Dessa forma, seja pela atipicidade do fato narrado, ou pela falta de condição da ação, a queixa-crime deve ser rejeitada..."

Percebe-se, portanto, que os fatos considerados pelo recorrente como ofensivos à honra foram narrados no Juízo Cível pela ora recorrida, na condição de testemunha, em uma ação Cominatória de Obrigação de Fazer com Pedido de Tutela Específica, e o que relatou foi o que teria ouvido da parte autora Rosângela Aparecida Espíndola Martins Soares.

Em que pese os fundamentos do recurso, tenho que não merece prosperar a pretensão condenatória ou mesmo o recebimento da queixa-crime, pois não se vislumbra a presença do dolo específico, ou seja, a vontade livre e consciente de atingir a dignidade ou decoro de outrem, fator preponderante para configuração dos crimes previstos nos artigos 138, 139 e 140 do Código Penal.

A propósito do tema, leciona Guilherme de Souza Nucci:

"Narrativa de testemunha: não configura o crime de difamação se a testemunha se limita a expor, na sua ótica, sob o animus narrandi, o que lhe foi indagado pelo juiz, ainda que implique em considerações desairosas sobre alguém..."(Código Penal Comentado, 6ª edição, Editora Revista dos Tribunais, pág. 601/602).

Nesse sentido já decidiu o Superior Tribunal de Justiça, vejamos:

"EMENTA: Processual Penal. Habeas-corpus. Trancamento de ação penal. Crimes contra a honra. Fatos narrados por testemunha. Ausência de justa causa (...). - É desprovida de justa causa a ação penal proposta contra testemunha que, sob o compromisso legal de dizer a verdade, limita-se a narrar, objetivamente, os fatos tidos como ofensivos a honra dos quais tomou conhecimento, no intuito de responder às perguntas que lhe foram propostas..." (STJ, HC 10602/GO, DJ 04/09/2000 p. 198, Rel. Min. Vicente Leal).

Por outro lado, quanto à assertiva de falso testemunho, carece os autos de iniciativa por parte do dirigente procedimental da esfera cível para a apuração desse hipotético crime, nem se infere prova cabal de que tenha feito afirmação falsa ou negado a verdade dos fatos. Segundo a doutrina de Júlio Fabrinne Mirabete: " O dolo do crime previsto no art. 342 é a vontade de prestar depoimento ou realizar perícia em desacordo com o que o agente tem ciência ou verificou em seu exame. Exige, pois, a consciência de estar cometendo uma falsidade. Não é suficiente que o testemunho ou perícia seja contrário à verdade; é necessário que o agente tenha consciência disso, o que caracteriza um elemento subjetivo do tipo. Não importa, porém, o fim do agente. O erro exclui o dolo". (Código Penal Interpretado, 2º edição, pág. 2109).

Nesse passo, considerando que o crime de falso testemunho é de ação penal pública e, levando-se em conta que até mesmo os representantes do Ministério Público de primeiro e segundo grau não detectaram elementos para instauração de inquérito policial ou oferecimento de denúncia, torna-se incomportável o reconhecimento da prática dessa conduta.

Diante dessas considerações, tenho que agiu com acerto o Juiz da Instância Singela ao rejeitar o pedido de queixa-crime, seja pela atipicidade da conduta ou ausência de justa causa, não merece prosperar a pretensão recursal.

Pelo teor do exposto, acolho o parecer da Procuradoria-Geral de Justiça e, já conhecido do recurso, nego-lhe provimento, nos termos acima expostos.

É o voto.

Goiânia, 16 de julho de 2009.

Des. PRADO
RELATOR

RECURSO EM SENTIDO ESTRITO Nº 10133-9/220 (200803349119)

Comarca: GOIÂNIA

Recorrente: RAUL FERREIRA DE ASSIS

Recorrido: POLIANA RESPLANDES PEREIRA

EMENTA

RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. REJEIÇÃO DA QUEIXA-CRIME. DEPOIMENTO DE TESTEMUNHA PRESTADA NA ESFERA CÍVEL. CALÚNIA. DIFAMAÇÃO. INJÚRIA. FALSO TESTEMUNHO. IMPROCEDÊNCIA. I. O fato narrado pela recorrida, na condição de testemunha, foi do que ouviu falar, não se vislumbrando a vontade livre e consciente de atingir a honra de outrem. II. Carece os autos de qualquer iniciativa na esfera cível para apuração de falso testemunho, enquanto o próprio Ministério Público, titular da ação penal, não vislumbrou a existência do referido crime. III. A decisão de primeiro grau que rejeitou pedido de queixa-crime deve ser mantida, seja pela atipicidade da conduta ou ausência de justa causa.

Recurso conhecido e não provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os componentes do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, pela Terceira Turma Julgadora da Segunda Câmara Criminal, à unanimidade, acolhendo o parecer da Procuradoria-Geral de Justiça, em conhecer do recurso e o improver, nos termos do voto do Relator.

Custas de Lei.

Votaram, além do Relator, que presidiu a sessão, o Doutor Carlos Alberto França, em substituição ao Desembargador José Lenar de Melo Bandeira, e o Desembargador Ney Teles de Paula.

Completou a Turma Julgadora o Juiz Carlos Alberto França, dada a ausência justificada da Desembargadora Nelma Branco Ferreira Perilo, e também o Desembargador Ney Teles de Paula, dada a ausência justificada do Desembargador Luiz Cláudio Veiga Braga.

Presente ao julgamento o Doutor Edison Miguel da Silva Júnior, digno Procurador de Justiça.

Goiânia, 16 de julho de 2009.

Des. PRADO
PRESIDENTE/RELATOR

DJ de 27/07/2009




JURID - Recurso em sentido estrito. Rejeição da queixa-crime. [28/07/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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