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quinta-feira, 2 de julho de 2009

JURID - Falso testemunho. Autoria e aspectos materiais comprovados. [02/07/09] - Jurisprudência


Falso testemunho. Autoria e aspectos materiais comprovados. Apelação desprovida.
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Tribunal Regional Federal - TRF3ªR.

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL

MINUTA DE JULGAMENTO FLS.

*** QUINTA TURMA ***

2004.60.00.006457-2 35136 ACR-MS

PAUTA: 01/06/2009

JULGADO: 15/06/2009

NUM. PAUTA: 00097

RELATOR: DES.FED. ANDRÉ NEKATSCHALOW

REVISOR: DES.FED. BAPTISTA PEREIRA

PRESIDENTE DO ÓRGÃO JULGADOR: DES.FED. RAMZA TARTUCE

PRESIDENTE DA SESSÃO: DES.FED. RAMZA TARTUCE

PROCURADOR(A) DA REPÚBLICA: Dr(a). JOVENILHA GOMES DO NASCIMENTO

AUTUAÇÃO

APTE: ANA CRISTINA MOREIRA RODRIGUES

APDO: Justiça Publica

ADVOGADO(S)
ADV: ANNE ELISABETH NUNES DE OLIVEIRA
ADV: JAIR SOARES JUNIOR (Int.Pessoal)

CERTIDÃO

Certifico que a Egrégia QUINTA TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A Turma, à unanimidade, negou provimento à apelação, nos termos do voto do(a) relator(a).

Votaram os(as) DES.FED. BAPTISTA PEREIRA e DES.FED. RAMZA TARTUCE.

VALDIR CAGNO
Secretário(a)

Tribunal Regional Federal da 3ª Região

PROC.: 2004.60.00.006457-2 ACR 35136

ORIG.: 5 Vr CAMPO GRANDE/MS

APTE: ANA CRISTINA MOREIRA RODRIGUES

ADV: ANNE ELISABETH NUNES DE OLIVEIRA

ADV: JAIR SOARES JUNIOR (Int.Pessoal)

APDO: Justiça Publica

RELATOR: DES.FED. ANDRÉ NEKATSCHALOW / QUINTA TURMA

R E L A T Ó R I O

Trata-se de apelação criminal interposta contra a respeitável sentença que julgou procedente o pedido para condenar Ana Cristina Moreira Rodrigues à pena de 1 (um) ano de reclusão, regime inicial aberto, e ao pagamento de 10 (dez) dias-multa, cada um no valor de 1/2 (metade) do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos, a ser atualizado por ocasião da execução, pela prática do delito do art. 342, caput, do Código Penal. Substituída a pena privativa de liberdade por uma pena restritiva de direito, consistente em prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas, pela duração da pena privativa de liberdade (fls. 212/218).

Apela a acusada com os seguintes argumentos:

a) não há provas contundentes acerca da autoria e materialidades delitivas, tendo em vista que as divergências entre os depoimentos da acusada e os depoimentos não são aptas a ensejar um decreto condenatório;

b) os depoimentos da acusada e das demais testemunhas ouvidas nos autos são pessoais e dizem respeito, portanto, aos seus horários de trabalho, razão pela qual não há como se imputar de falso o depoimento da acusada;

c) as testemunhas de acusação são funcionárias da loja reclamada na Ação Trabalhista em que a acusada prestou depoimento, de modo que seus depoimentos devem ser considerados com ressalvas;

d) a ré é suspeita e não poderia ter prestado compromisso tendo em vista que era intimamente interessada no deslinde da causa, pois afirmava trabalhar no mesmo horário que a reclamante e, caso fosse reconhecido o direito desta, teria a mesma chance de êxito em demanda idêntica;

e) deve ser excluída a condenação ao pagamento das custas processuais, uma vez que a ré está desempregada e foi assistida pela Defensoria Pública da União

f) prequestiona a inobservância aos arts. 2º e 3º da Lei 1.060/50, ante a não imposição da gratuidade da Justiça e os descumprimento do artigo 405, § 3º, IV e § 4º, do Código de Processo Civil (fls. 223/230).

O Ministério Público Federal apresenta contra-razões, pleiteando o desprovimento do recurso (fls. 234/239).

Os autos foram distribuídos neste Tribunal em 11.12.08 (fl. 244v.).

A Ilustre Procuradora Regional da República, Dra. Silvana Fazzi Soares, manifesta-se pelo desprovimento do recurso (fls. 245/246).

Os autos foram encaminhados à revisão, nos termos regimentais.

É o relatório.

André Nekatschalow
Desembargador Federal
Relator

V O T O

Imputação. A acusada foi denunciada pela prática do delito do art. 342, caput, do Código Penal, pelos seguintes fatos:

"Consta do incluso inquérito policial que, no dia 17 de junho de 2003, Ana Cristina Moreira Rodrigues prestou depoimento como testemunha da reclamante Vanessa Gomes Pereira, na instrução da Reclamação Trabalhista n.º 0643-2003-003-24-00-2, perante o juízo da 3ª Vara do Trabalho de Campo Grande/MS.

No depoimento prestado em juízo (f. 14), Ana Cristina afirmou, sob compromisso legal, o seguinte, '...que a reclamante e a depoente começavam a trabalhar às 07:30h, indo até 18h/18:30h, com intervalo de 1h diária, de segunda a sexta. Aos sábados, cumpriam praticamente a mesma jornada, com exceção do intervalo que era, no máximo, 30 minutos. A empresa não permitia a anotação das jornadas reais nos cartões de ponto ...'.

Tal depoimento divergiu das declarações prestadas pela testemunha da reclamada da ação trabalhista (f. 15), Cleonice Rodrigues de Oliveira, a qual afirmou que as jornadas de trabalho cumpridas por dois grupos distintos de vendedores, estendiam-se das 08h às 18h/18:10h e das 9:30h às 19h durante a semana, e aos sábados das 08h às 17h e das 09h às 18h; segundo essa testemunha, as duas equipes gozavam intervalo de almoço com duração de duas horas, a saber, das 11h às 13h, a primeira, e das 13h às 15h, a segunda, inclusive aos sábados. Cleonice infirmou, ainda, a alegação de Ana Cristina sobre a anotação dos cartões de ponto, aduzindo que neles eram registradas as jornadas efetivamente laboradas.

A ação trabalhista proposta por Vanessa Gomes Pereira foi julgada improcedente no dia 29 de julho de 2003, oportunidade em que o MM Juiz Trabalhista aventou a ocorrência de falso testemunho, conforme consta da r. sentença encartada, por cópia, às f. 32-39.

Josué Castro Cabreira (f. 55/56), declarou que, assim como Vanessa, cumpria jornada das 8h às 17:30h, e das 08 às 16:30 aos sábados, com intervalo de duas horas para almoço, sendo que tais horários eram consignados com fidelidade nos cartões de ponto.

Lucilene Márcia Mendes (f. 57), no mesmo sentido, confirmou que seu expediente era das 08h às 17:30 de segunda a sexta, e das 08h às 16:30h aos sábados, gozando de duas horas para almoço nesses períodos. Disse ainda que não havia orientação para que fossem anotados nos cartões de ponto horários diversos daqueles correspondentes à entrada e à saída dos funcionários.

Por derradeiro, cumpre salientar que foram juntadas aos autos (f. 45/46) cópias dos cartões de ponto da denunciada, cujos conteúdos dão suporte às versões divergentes apresentadas por Ana Paula, no que se refere à jornada de trabalho na referida empresa. Ademais, tais cartões revelam anotações detalhadas dos horários de entrada e saída da funcionária, bem como, dos dias não trabalhados - inclusive aqueles justificados com atestado médico - o que infirma suas declarações no sentido de que essas anotações eram feitas de forma predominante e uniforme.

Nesse contexto, forçoso concluir que Ana Cristina Moreira Rodrigues fez, voluntária e dolosamente, afirmações falsas perante a Justiça do Trabalho, de conteúdo juridicamente relevante para o deslinde da lide trabalhista, uma vez que ficou evidenciado pelos depoimentos colhidos no juízo trabalhista e na instrução do apuratório, que mentiu ao declarar que ela e a reclamada não usufruíam de duas horas diárias de intervalo para almoço e que a empresa reclamada determinava que fossem assinalados nos cartões de ponto horários diversos daqueles realmente cumpridos pelos funcionários." (fls. 2/4)

Foi determinada a suspensão condicional do processo e do prazo prescricional pelo prazo de 2 (dois) anos em 04.07.05 (fl. 100), tendo o benefício sido revogado em 11.01.07 (fl. 113).

Prescrição. A acusada foi condenada à pena de 1 (um) ano de reclusão, pela prática do delito do art. 342, caput, do Código Penal.

Sem recurso da acusação, essa é a pena a ser considerada para fins de prescrição, cujo prazo é de 4 (quatro) anos, a teor do inciso V do art. 109 do Código Penal.

Entre a data dos fatos (17.06.03, fls. 2/3) e a do recebimento da denúncia (03.02.05, fl. 81), passaram-se 1 (um) anos, 7 (sete) meses e 16 (dezesseis) dias.

Em 04.07.05, houve transação penal, na qual a ré se comprometeu a apresentar-se mensalmente em Juízo para comprovar suas atividades pelo período de 2 (dois) anos, bem como não mudar de residência ou se ausentar da cidade na qual reside por mais de 8 (oito) dias sem autorização judicial, (fl. 100). Em decorrência da transação penal, o prazo prescricional não correu no período em que o processo esteve suspenso, nos termos do art. 89, § 6º, da Lei n. 9.099/95.

Em 11.01.07, o benefício foi revogado, tendo o processo voltado a tramitar normalmente (fl. 113).

Entre o recebimento da denúncia (03.02.05, fl. 81) e a decretação da suspensão condicional do processo (04.07.05, fl. 100) transcorreram 5 (cinco) meses e 1 (um) dia e entre a revogação do benefício (11.01.07, fl. 113) e a sentença condenatória (16.05.08, fl. 225) transcorreu 1 (um) ano, 4 (quatro) meses e 5 (cinco) dias.

A soma dos dois períodos em que o feito não esteve suspenso (03.02.05 a 04.07.05 e 11.01.07 a 16.05.08) totaliza 1 (um) anos e 9 (nove) meses e 6 (seis) dias. Portanto, não está prescrita a pretensão punitiva do Estado.

Materialidade. Aspectos materiais. Falso testemunho (CP, art. 342, caput). O delito de falso testemunho é de natureza formal, não exigindo, para sua consumação, resultado naturalístico. A consumação dá-se com o encerramento do depoimento no qual o agente faz afirmação falsa, nega ou cala a verdade sobre fato juridicamente relevante. Apesar desse crime inexigir a comprovação da materialidade, impende destacar que o objeto material do delito consiste, no caso, no depoimento prestado pela ré, como testemunha, em processo judicial trabalhista ajuizado por Vanessa Gomes Pereira em face da empresa Tecelagem Avenida Ltda., no qual o réu fez afirmação falsa sobre a jornada de trabalho e os horários de almoço concernentes a si e à ré (fls. 20/21).

Autoria. Está comprovada a autoria do delito.

Ao ser interrogada, em sede policial, a acusada ratificou as declarações prestadas na Justiça do Trabalho (fls. 66 e 70/71).

Em Juízo, a acusada também confirmou o teor do depoimento prestado perante a Justiça Trabalhista (fls. 20/21), aduzindo que chegava à empresa às 7h30, fazia a limpeza, iniciava o trabalho às 8h, quando a loja abria, e saía às 18h10 ou às 18h30. Informou que no cartão de ponto eram registradas duas horas de almoço, mas "de fato ficávamos no almoço entre 30 (minutos) a 1 (uma) hora", sendo que aos sábados os horários eram idênticos ao da jornada semanal. Argumentou que talvez a razão das contradições entre os depoimentos das testemunhas na ação trabalhista seja justificada pelo fato de os demais funcionários, que eram testemunhas da empregadora, ainda trabalharem na empresa. Acrescentou que seu depoimento correspondia exatamente às suas atividades na loja, não havendo como comprovar suas alegações em razão dos cartões de ponto serem preenchidos de acordo com as determinações dadas pela empresa e tendo em vista que os demais funcionários ainda estavam vinculados à empresa (fls. 120/121).

A testemunha de acusação Josué Castro Cabreira foi ouvido na fase policial e em Juízo, tendo afirmado que trabalha na "Tecelagem Avenida" desde 22.04.02 como vendedor. Declarou que nessa empresa a jornada de trabalho é organizada em dois turnos, sendo que o primeiro turno vai das 8h00 às 11h00 e das 13h00 às 17h30, portanto, com duas horas de intervalo para almoço, e o segundo turno vai das 9h30 às 13h00 e das 15h00 às 19h00, também com duas horas de intervalo para almoço, sendo que essas jornadas são cumpridas de segunda a sexta-feira. Informou que, no sábado, o primeiro turno inicia-se às 8h00 e termina às 16h30, com duas horas para o almoço, e o segundo turno inicia-se às 9h30 e termina às 18h00, com duas horas de intervalo para almoço. Salientou que a jornada de trabalho é controlada pelo cartão de ponto, o qual é assinado pelos funcionários no horário real de entrada e saída, e que, em função do tempo decorrido desde então, não sabe informar com certeza o horário feito pela acusada, sendo que, ao que se recorda, ela trabalhava no primeiro turno, assinalando que a funcionária Vanessa cumpria essa primeira jornada. Narrou que a loja inicia o atendimento ao público às 8h00, que o gerente chega antes desse horário para abrir a loja e que a limpeza é feita por pessoa responsável apenas por esse serviço, a qual também inicia seu trabalho às 8h00 e desempenha sua função no primeiro turno de trabalho da empresa (fls. 61/62 e 170/171).

Em sede policial e judicial, a testemunha de acusação Lucilene Maria Mendes afirmou que trabalha na "Tecelagem Avenida" há seis anos e que na empresa existem duas turmas de funcionários, sendo que a primeira inicia sua jornada de trabalho às 8h00 e termina às 17h30, com duas horas de intervalo para o almoço, das 11h00 às 13h00, e a segunda inicia às 9h30 e termina às 19h00, também com duas horas de almoço, das 13h00 às 15h00. Enfatizou que sempre anota em seu cartão de ponto o horário real de sua chegada e de sua saída do trabalho e que não tem conhecimento de que seus colegas tenham recebido qualquer orientação da empresa para anotar nesse cartão horário diverso do horário real. Consignou que não exerce função de chefia ou supervisão. Reportou que a loja é aberta pelo gerente, que chega ao local sozinho por volta de 7h30 ou 7h40, e que quando chega à loja o encontra sozinho, sendo que a pessoa responsável pela limpeza da loja faz o primeiro horário de trabalho. Declarou não se recordar do horário de trabalho da ré e do horário feito por Vanessa Gomes Pereira (fls. 63/64 e 173/174).

O Ministério Público Federal desistiu da oitiva da testemunha Cleonice Rodrigues de Oliveira (fl. 177), desistência que foi homologada à fl. 178. Cleonice foi ouvida em sede policial e afirmou que (fls. 49/51) é empregada da empresa "Tecelagem Avenida" desde 06.08.00, exercendo a função de vendedora, e que nunca desempenhara cargo de chefia ou direção. Declarou que mantém integralmente o depoimento que prestara nos autos da Ação Trabalhista proposta por Vanessa Gomes Pereira em face da Tecelagem Avenida Ltda., em especial no tocante à jornada de trabalho de Vanessa, que era das 8h00 às 18h00 ou 18h10, com intervalo de duas horas de almoço, usufruído entre 11h00 e 13h00, de segunda a sexta-feira, e aos sábados das 8h00 às 17h00, com idêntico intervalo para almoço. Esclareceu que mantinha controle sobre a jornada de trabalho de Vanessa, tendo em vista que apenas podia usufruir de seu horário de almoço a partir do retorno efetivo de Vanessa de seu intervalo, sendo que sua jornada de trabalho é das 09h30 às 19h00, com horário de almoço das 13h00 às 15h00. Indagada sobre o fato do primeiro turno de trabalho durar 30 minutos a mais que o segundo, informou que de fato havia tal diferença e que, posteriormente, a jornada do primeiro turno foi alterada, terminando às 17h30. Asseverou que todos os funcionários da empresa sempre usufruíram integralmente do intervalo diário de duas horas e que nos cartões de ponto eram anotadas as jornadas reais de trabalho e, inclusive, as eventuais horas extras realizadas (fls. 49/50).

Consta da denúncia, que no dia 13.06.03, perante a o Juízo da 3ª Vara do Trabalho de Campo Grande (MS), a apelante Ana Cristina Moreira Rodrigues prestou declarações falsas na qualidade de testemunha de defesa nos autos da Ação Trabalhista de n. 00643-2003-003-24-00-2, não se retratando ou declarando a verdade antes da prolação da respeitável sentença.

A acusada afirmou, na audiência de instrução e julgamento realizada naquele Juízo, que cumpria sua jornada de trabalho na empresa reclamada, Tecelagem Avenida Ltda., no horário das 7h30 às 18h00 ou 18h30, com intervalo de 1 hora para almoço, sendo que, aos sábados, a jornada de trabalho era a mesma, mas o intervalo para almoço atingia no máximo 30 minutos. Asseverou ainda a ré que a empresa não permitia que os empregados anotassem os horários reais de trabalho nos cartões de ponto e, caso isso ocorresse, eram obrigados a "refazerem os cartões". Aduziu que a reclamada mantinha duas turmas de vendedores, cada uma trabalhando em um horário, e que ela e a reclamante, Vanessa, cumpriam o primeiro turno de trabalho (fls. 20/21).

Em suas razões recursais, sustenta a ré que não há provas suficientes a demonstrar a prática do delito do art. 342 do Código Penal, visto que os depoimentos prestados na Ação Trabalhista são pessoais, referindo-se cada um deles à sua própria jornada de trabalho, de maneira que não podem comprovar que a ré proferiu afirmação falsa. Alega ainda que os depoimentos das testemunhas da reclamada não podem ser considerados, uma vez que continuam a trabalhar na empresa e que não poderia a ré ter prestado compromisso, devendo seu depoimento ter sido considerado suspeito, uma vez que possui interesse reflexo no deslinde da causa. Por fim, pleiteia a exclusão da condenação ao pagamento das custas processuais, pelo fato de ser a acusada hipossuficiente, amparada pela Lei n. 1.060/50.

Não assiste razão à acusada.

Os elementos de prova colhidos nos autos demonstram a falsidade das declarações da ré acerca de fatos relevantes ao deslinde de causa trabalhista, cujo objeto versava, entre outras questões, sobre o pagamento de horas extras e de seus reflexos sobre a remuneração auferida pela reclamante (fls. 13/18). Como bem aduziu o MM. Juízo a quo à fl. 215, apenas devem ser analisadas as declarações da ré que concernem ao horário de almoço de sábado e à autenticidade dos cartões de ponto, haja vista que, conforme narra a sentença proferida pelo Juízo Trabalhista, não houve controvérsia quanto aos demais horários atinentes à jornada de trabalho da reclamante (cfr. fl. 43).

Ao contrário do que aduz a defesa, os depoimentos das testemunhas de acusação não apresentam divergências e deles não se infere que cada empregado da loja cumpria jornada de trabalho distinta, daí não se poder falar que se reportem a jornadas pessoais. As declarações são harmônicas, coesas e indicam que todos os funcionários que trabalhavam na empresa Tecelagem Avenida Ltda. enquadravam-se em um dos dois turnos que compunham a jornada de trabalho da loja, sendo que durante todos os dias da semana, e inclusive aos sábados, usufruíam do intervalo de duas horas para o almoço. Também são uniformes no sentido de que nenhuma orientação havia por parte da empresa quanto aos horários aportados no cartão de ponto, os quais eram elaborados conforme os horários reais de entrada e saída. Tais declarações são amparadas pelas cópias dos cartões de ponto que constam das fls. 50/51, as quais não apresentam anotações uniformes, o que poderia sugerir orientação por parte da empresa, havendo apontamentos concernentes a folgas, a faltas justificadas mediante a apresentação de atestado médico e a horários diversos.

Não procedem as alegações da defesa de que não deveriam ser considerados os depoimentos prestados pelos demais empregados da empresa reclamada e pela ré, por serem suspeitos, os primeiros pelo fato de ainda estarem trabalhando na empresa no momento de sua oitiva, e a segunda, em razão de apresentar interesse reflexo no deslinde da causa a favor da reclamante, dada a possibilidade de também sair-se vencedora em ação trabalhista que eventualmente movesse contra essa empresa. Se assim fosse, a produção de prova restaria seriamente prejudicada em sede trabalhista, já que pouquíssimos depoimentos seriam considerados aptos a comprovar a verdade do fatos tratados, de maneira que tais condições devem ser apreciadas pelo Juiz no momento da valoração da prova. Ademais, no que tange às declarações prestadas nestes autos, não poderiam elas exercer qualquer influência sobre a demanda trabalhista, na qual a empresa reclamada já havia se saído vencedora (fls. 38/45), e ainda assim tanto a ré quanto as testemunhas de acusação mantiveram suas declarações na íntegra.

Assim, resta demonstrada a falsidade das afirmações da ré, ao declarar perante o Juízo trabalhista que ela e a reclamante perfaziam, aos sábados, o intervalo de no máximo 30 (trinta) minutos destinados ao almoço e que a empresa reclamada não permitia a anotação dos horários reais no cartão de ponto, sendo tais fatos relevantes, conforme já exposto, ao deslinde da causa, razão pela qual deve ser mantida a condenação da ré.

Dosimetria da pena. Considerados os critérios estabelecidos pelo art. 59 do Código Penal, a pena-base foi fixada pelo MM. Juízo a quo em 1 (um) ano reclusão, tendo em vista que as circunstâncias judiciais são favoráveis à acusada (fls. 84, 87, 91, 188, 191 e 195).

Ausentes circunstâncias agravantes ou atenuantes e causas de aumento ou diminuição da pena.

A pena de multa foi fixada pelo Juízo em 10 (dez) dias-multa, no valor unitário equivalente à 1/2 (metade) do salário mínimo mensal vigente ao tempo dos fatos, a ser atualizado por ocasião da execução, tendo em vista a situação econômica da acusada, que aduziu à fl. 120 exercer a função de vendedora (fl. 218).

Foi fixado o regime aberto para o cumprimento da pena privativa de liberdade (CP, art. 33, § 2º, c).

A pena privativa de liberdade foi substituída por 1 (uma) restritiva de direitos, nos termos do ao § 2º do art. 44 do Código Penal, consistente em prestação de serviços à comunidade ou à entidades públicas, pelo tempo de duração da pena substituída.

Em suas razões recursais, a defesa não se insurge contra a dosimetria da pena, que não merece reparo.

Custas. Réu pobre. Isenção. Ainda que beneficiário da assistência judiciária gratuita, o réu deve ser condenado ao pagamento das custas processuais (CPP, art. 804), ficando, no entanto, sobrestado o pagamento, enquanto perdurar o estado de pobreza, pelo prazo de 5 (cinco) anos, ocorrendo, após, a prescrição da obrigação (Lei n. 1.060/50, art. 12). A isenção deverá apreciada na fase de execução da sentença, mais adequada para aferir a real situação financeira do condenado:

"PENAL. RECURSO ESPECIAL. (...). ISENÇÃO DO PAGAMENTO DA MULTA COMINADA. IMPOSSIBILIDADE. RECURSO PROVIDO.

(...).

2. O Superior Tribunal já firmou jurisprudência no sentido de que o réu, ainda que beneficiário da assistência judiciária gratuita, deve ser condenado ao pagamento das custas processuais nos termos do art. 804 do Código de Processo Penal, ficando, contudo, seu pagamento sobrestado, enquanto perdurar seu estado de pobreza, pelo prazo de cinco anos, quando então a obrigação estará prescrita, conforme determina o art. 12 da Lei n.º 1.060/50.

3. Outrossim, a isenção somente poderá ser concedida ao réu na fase de execução do julgado, porquanto esta é a fase adequada para se aferir a real situação financeira do condenado, já que existe a possibilidade de sua alteração após a data da condenação. 4. Recurso especial conhecido e provido para, anulando o acórdão recorrido, restabelecer a sentença de 1º grau." (STJ, REsp n. 842.393-RS, Rel. Min. Arnaldo Esteves de Lima, j. 20.03.07)

"PROCESSUAL PENAL. RÉU. SUCUMBÊNCIA. CUSTAS. ISENÇÃO. MATÉRIA DO JUÍZO DA EXECUÇÃO.

1 - A isenção de custas, no processo penal, deve ser aferida pelo juízo da execução, porquanto a expressão não significa ausência de condenação, mas, pura e simplesmente, diferimento do pagamento por um determinado lapso temporal, dentro do qual serão verificadas as condições econômicas do réu (art. 12 da Lei nº 1.060/50).

2 - Recurso especial conhecido em parte (letra 'c'), mas improvido." (STJ, REsp n. 263.381-MG, Rel. Min. Fernando Gonçalves, j. 06.02.03)

"PENAL. PROCESSUAL PENAL. DESCAMINHO. (...). CONDENAÇÃO EM CUSTAS PROCESSUAIS. RÉU POBRE. ISENÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. APELAÇÃO DESPROVIDA.

1. Materialidade e autoria comprovadas.

(...)

3. Ainda que beneficiário da assistência judiciária gratuita, o réu deve ser condenado ao pagamento das custas processuais (CPP, art. 804), ficando, no entanto, sobrestado o pagamento, enquanto perdurar o estado de pobreza, pelo prazo de 5 (cinco) anos, ocorrendo, após, a prescrição da obrigação (Lei n. 1.060/50, art. 12). A isenção deverá apreciada na fase de execução da sentença, mais adequada para aferir a real situação financeira do condenado. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça.

4. Apelação desprovida." (TRF da 3ª Região, ACR n. 26.953-SP, Rel. Des. Fed. André Nekatschalow, unânime, j. 09/02/09)

Do caso dos autos. A defesa pleiteia a exclusão da condenação ao pagamento das custas processuais, sob a alegação de que a ré está desempregada e foi assistida pela Defensoria Pública da União.

Não prospera o pedido de exclusão da condenação em custas em face de se tratar de ré pobre. O alegado estado de pobreza não afasta a condenação nas custas processuais. Ademais, conquanto tenha a ré sido assistida pela Defensoria Pública da União, não se constatou nos autos seu estado de pobreza, uma vez que não está desempregada, mas afastada de suas funções, conforme declarações de fls. 120/121, dado o gozo de auxílio-doença (cfr. fls. 127/146).

Eventual miserabilidade da acusada deverá ser analisada pelo Juízo das Execuções Penais para o fim de isenção, fase mais adequada à apuração de sua real situação financeira para efeito de concessão da isenção.

Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação.

É o voto.

André Nekatschalow
Desembargador Federal
Relator

Tribunal Regional Federal da 3ª Região

PROC.: 2004.60.00.006457-2 ACR 35136

ORIG.: 5 Vr CAMPO GRANDE/MS

APTE: ANA CRISTINA MOREIRA RODRIGUES

ADV: ANNE ELISABETH NUNES DE OLIVEIRA

ADV: JAIR SOARES JUNIOR (Int.Pessoal)

APDO: Justiça Publica

RELATOR: DES.FED. ANDRÉ NEKATSCHALOW / QUINTA TURMA

E M E N T A

PENAL. FALSO TESTEMUNHO. AUTORIA E ASPECTOS MATERIAIS COMPROVADOS. APELAÇÃO DESPROVIDA.

1. O delito de falso testemunho é de natureza formal, não exigindo, para sua consumação, resultado naturalístico. A consumação dá-se com o encerramento do depoimento no qual o agente faz afirmação falsa, nega ou cala a verdade sobre fato juridicamente relevante.

2. A acusada, em seu interrogatório, manteve na íntegra o depoimento prestado perante o Juízo Trabalhista, sendo que suas declarações, que tratam sobre fatos juridicamente relevantes ao deslinde da causa, são frontalmente contrariadas pelas provas produzidas nos autos, restando comprovada a falsidade de suas afirmações. 3. Aspectos materiais e autoria comprovados.

3. Ainda que beneficiário da assistência judiciária gratuita, o réu deve ser condenado ao pagamento das custas processuais (CPP, art. 804), ficando, no entanto, sobrestado o pagamento, enquanto perdurar o estado de pobreza, pelo prazo de 5 (cinco) anos, ocorrendo, após, a prescrição da obrigação (Lei n. 1.060/50, art. 12). A isenção deverá apreciada na fase de execução da sentença, mais adequada para aferir a real situação financeira do condenado. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça e do TRF da 3ª Região.

4. Apelação desprovida.

A C Ó R D Ã O

Vistos e relatados os autos em que são partes as acima indicadas, DECIDE a Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da Terceira Região, à unanimidade, negar provimento ao recurso da ré, nos termos do relatório e voto do Desembargador Federal André Nekatschalow.

São Paulo, 15 de junho de 2009. (data do julgamento).

André Nekatschalow
Desembargador Federal
Relator




JURID - Falso testemunho. Autoria e aspectos materiais comprovados. [02/07/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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