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quarta-feira, 22 de julho de 2009

JURID - Estupros. Materialidade e autoria comprovadas. Violência. [21/07/09] - Jurisprudência


Estupros. Materialidade e autoria comprovadas. Violência presumida pela idade das vítimas. Materialidade e autoria presentes.

Tribunal de Justiça de São Paulo - TJSP.

ESTUPROS - Materialidade e autoria comprovadas - Violência presumida pela idade das vítimas - Materialidade e autoria presentes - Negativa de autoria isolada - Absolvição insustentável - Condenação de rigor - Reconhecimento da continuidade delitiva - Regime prisional inicialmente fechado.

Agravamento pelo artigo 9º, da Lei 8072/90 - Violência presumida - Aplicabilidade, a juízo do Relator - Bis in idem inexistente - artigo 224, "a", do Código Penal, que dispensa a prova da violência, a qual, esta sim, tipifica o crime de atentado violento ao pudor, presumindo-a - artigo 9º, da Lei 8072/90, que, por sua vez, considera a menoridade, a debilidade mental da vítima ou qualquer outra circunstância que dificulte sua reação para exacerbar a resposta penal - Entendimento majoritário da Turma, contudo, que nega a aplicação, ao qual se rende, por motivo de ordem prática, este Relator.

Recurso parcialmente provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Criminal Com Revisão nº 990.08.098175-7, da Comarca de São José dos Campos, em que é apelante MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO sendo apelado ANDERSON DUARTE.

ACORDAM, em 6ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO APELO, A FIM DE CONDENAR ANDERSON DUARTE A 12 ANOS DE RECLUSÃO, EM REGIME FECHADO, COMO INCURSO NO ARTIGO 213, C.C. OS ARTIGOS 224, "A", 225, PARÁGRAFO PRIMEIRO, I, NA FORMA DO ARTIGO 71, PARÁGRAFO ÚNICO, TODOS DO CÓDIGO PENAL, E DETERMINARAM SE EXPEÇA MANDADO DE PRISÃO, ESGOTADAS AS VIAS IMPUGNATIVAS ORDINÁRIAS. V.U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores RICARDO TUCUNDUVA (Presidente sem voto), MACHADO DE ANDRADE E JOSÉ RAUL GAVIÃO DE ALMEIDA.

São Paulo, 04 de dezembro de 2008.

Ericson Maranho
Relator

VOTO Nº 15.085

APELAÇÃO Nº 990.08.098175-7 - São José dos Campos.

APELANTE:- Ministério Público.

APELADO:- Anderson Duarte.

I - Denunciado como incurso nos artigo 213, c.c. os artigos 224, "a", 225, parágrafo primeiro, I, na forma do artigo 71, parágrafo único, todos do Código Penal, c.c. o artigo 9º, da Lei nº 8.072/90, ANDERSON DUARTE viu-se absolvido, nos termos do artigo 386, III, do Código de Processo Penal, pela r. sentença de fls. 215/22, de que aproveito o relatório.

Inconformado, apela, tempestivamente, o Promotor de Justiça, visando à integral procedência da ação.

Recurso respondido, não mereceu o apoio da douta Procuradoria Geral de Justiça, que opinou pelo desprovimento (fls. 165/169).

É o relatório.

2. - Consta da denúncia que o réu, no dia 1º de janeiro de 2006, no interior de sua residência, constrangeu Isadora de Moraes Pereira, à época com treze anos de idade, mediante violência presumida, à conjunção carnal. Consta, ainda, que no mesmo local, poucas horas depois, o réu constrangeu Bárbara Amanda Nunes Marques Benedito, à época com onze anos de idade, mediante violência real e presumida, à conjunção carnal.

Os laudos de fls. 18 e 19 concluíram ter havido conjunção carnal, o que comprova a materialidade, em que pese, por serem as lesões de data não recente, não ter sido possível estabelecer nexo com os episódios sob apuração.

O vínculo, porém, vem de outras fontes.

O apelante negou a autoria (fls. 22 e 72/76), mas a prova lhe foi adversa.

As vítimas foram firmes em suas afirmações, narrando que eram virgens antes dos fatos e confirmando a conjunção carnal com o apelado (fls. 11, 12, 96/101 e 139/143).

As testemunhas Marcos Roberto Miranda de Oliveira e Marcelly Miranda Porto, embora não afirmando as conjunções carnais, confirmaram que elas "ficaram,, com o apelante na residência deste (fls. 23, 58, 1 15 e 144/149)

Rosângela Morinigo, prima do acusado, afirmou ter sido informada por Isadora de que ambas as relações foram consentidas (fls. 50 e 102/105).

A genitora de Bárbara (fls. 135/138) afirmou que, após os fatos, sua filha se tornou agressiva, não lhe obedecia mais e, dizendo que queria ir embora para Maceió, falou "vocês não entendem, eu estou revoltada". Diante de seu comportamento, passou a pressioná-la, dizendo que a levaria a um médico, ocasião em que ela lhe acabou contando o ocorrido, afirmando ter sido forçada à relação sexual pelo réu.

O certo é que restou provado que o apelado manteve conjunção carnal com as duas vítimas, que eram menores de 14 anos na data dos fatos, o que foi reconhecido na r. sentença de fls. 215/222.

3. - A sentença afastou a presunção legal de violência, entendendo-a relativa, concluindo não ter havido crime.

Sem razão, contudo.

As vítimas não possuíam condições psicológicas para darem seu consentimento.

"Embora seja certo que alguns menores, com essa idade, já tenham maturidade sexual, na verdade não ocorre o mesmo com o desenvolvimento psicológico. Assim, o fundamento do dispositivo é a circunstância de que o menor de 14 anos não pode validamente consentir pelo desconhecimento desses atos sexuais e de suas consequências (innocentia consilli). O consentimento em casos que tais é absolutamente nulo (RT 494/386)" - cit. pág. 442, "Manual de Direito Penal" Júlio Fabbrini Mirabete, 2º vol., Atlas, 14ª ed.

Por outro lado, a presunção de violência quando a vítima do abuso sexual é menor de catorze anos tem a mesma força daquela que faz do menor de dezoito anos inimputável. Assim como não vale alegar que o menor de dezoito anos já alcançou a plenitude de suas faculdades mentais, para fazer dele um imputável, também não colhe alegar-se que a vítima menor de catorze anos já não era ingênua, para excluí-la da proteção legal. A lei, pura e simplesmente, presume a ingenuidade, dispensando qualquer prova a esse respeito. Em razão da ingenuidade presumida, presume também a violência, na medida mesma em que a menor não tem condição de consentir. Não se pode creditar importância à vontade de um menor de 14 anos, porque incapaz de compreender, em toda a sua extensão, as consequências de seus atos. É esta a razão da proteção que a lei lhes confere.

A presunção de violência, nas hipóteses em exame, tem plena aplicação, de nada valendo assacar-se contra as vítimas.

Nesse sentido:

"Crimes sexuais mediante violência ou grave ameaça (C.Pen., artigos 213 e 214): presunção de violência, se a vítima não é maior de 14 anos (C. Pen., artigo 224, a): caráter absoluto da presunção, que não é inconstitucional, visto não se tratar de presunção de culpabilidade do agente, mas de afirmação da incapacidade absoluta de menor de até 14 anos para consentir na prática sexual: análise da jurisprudência do STF - após a decisão isolada do HC 73.662, em sentido contrário - conforme julgados posteriores de ambas as Turmas (C 74.286, 1ª Turma 22.10.1996, Sanches, RTJ 163/291; HC 75.0608,, 10.2.1998, Jobim, DJ 27.3.1998): orientação jurisprudencial, entretanto, que não elide a exigência, nos crimes referidos, do dolo do sujeito ativo, erro justificado quanto à idade da vítima pode excluir" (1ª Turma, HC 81.268-DF, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. 16.10.2001, DJ, 16.11.2002, p. 8).

No mesmo sentido, do STJ, precedente assinado pela Ministra Laurita Vaz (REsp 250.305-SC, j. 1º.4.2003, DJ, 5.5.2003, p. 316). No mesmo sentido, do Ministro Gilson Dipp, REsp. 213.291-SP, j. 9.4.2002, DJ, 13.5.2002, p. 218).

4. - Vou às penas.

Nos termos do artigo 59, do Código Penal, doso a pena-base, para os dois delitos, no mínimo legal, a míngua de circunstâncias judiciais desfavoráveis.

Penas no mínimo, não há falar em redução por conta da atenuante da menoridade relativa, a teor da súmula nº 231, do Superior Tribunal de Justiça.

5. - Este Relator acolheria o recurso ministerial na íntegra, aplicando o artigo 9º, da Lei 8.072/90.

O agravamento da pena pelo artigo 9º, da Lei que definiu os crimes hediondos, tenho que também restou configurado. Reformulo, aqui, entendimento anterior.

Declara o dispositivo que "As penas fixadas no artigo 6º para os crimes capitulados nos artigos ... 214 e sua combinação com o artigo 223, caput c parágrafo único, todos do Código Penal, são acrescidas de metade, respeitado o limite superior de 30 (trinta) anos de reclusão, estando a vítima em qualquer das hipóteses referidas no artigo 224 também do Código Penal". Neste artigo, na alínea "a", está o caso da violência presumida em razão da idade.

Não há bis in idem. A menoridade, referida no artigo 224, "a", institui a presunção de violência sempre que o menor tenha 14 anos ou menos. Esta regra destina-se apenas a dispensar a prova da violência. No artigo 9º, da Lei 8072/90, prevê-se agravante especial pela idade da vítima. São finalidades absolutamente diferentes. Não é a presunção de violência que tipifica o fato, mas a própria violência. Aquela apenas dispensa que esta deva ser comprovada.

Nesse sentido:

"O fato de a vítima ser menor de quatorze anos pode ser utilizado tanto para presumir a violência como circunstância elementar do tipo (CP, artigo 214 c/c 224, a) quanto para aumentar devido à causa de aumento prevista no artigo 9º da Lei dos Crimes Hediondos Precedentes citados: HC n. 76.004-RJ (DJU, 21-8-98; HC n. 74.780-RJ (DJU, 06-02-98)" (STF, 2ª Turma, HC 77.254-SP, Rel. Ministro limar Galvão, Informativo n. 129, 4-11- 1998).

"Ambas as Turmas do Supremo Tribunal Federal consideram a não ocorrência de bis in idem no reconhecimento da causa de aumento do artigo 9º, da Lei n. 8.072/90, em face de ser a vítima menor de quatorze anos, nos crimes de estupro e atentado violento ao pudor tipificado pela violência presumida (artigo 224, alínea a, do Código Penal)" (STF, HC 77.254-7/SP, DJU, 12.3.1999).

São precedentes citados por Fernando Capez, in Curso de Direito Penal, volume 3, 5ª edição, 2007, Saraiva, São Paulo, pág. 67).

Não sendo este, todavia, o entendimento predominante na Câmara, deixo de aplicá-lo, curvando-me ao entendimento da douta maioria.

6. - Aqui, convém esclarecer que este Relator não se convenceu da existência de violência real contra Bárbara. Segundo ela narrou, dirigiu-se até a casa do réu no intuito de "ficar" com ele, tendo, no entanto, sido levada para o quarto e, mesmo diante de sua recusa, obrigada à conjunção carnal, uma vez que teria sido segurada pelo pescoço, restando imobilizada.

Conforme se depreende do apurado nos autos, ela procurou pelo réu, restando claro que consentiu no ocorrido. Foi, possivelmente, para justificar-se perante sua genitora, minimizando a culpa que sentia, que preferiu afirmar que foi forçada.

Com efeito, um só homem não consegue, salvo em circunstâncias especiais, pela violência física, obrigar outra pessoa à prática de ato libidinoso, sobretudo o estupro, em que o ato da conjunção carnal reclama a concentração das energias psíquicas e fisiológicas do agressor no fenômeno da ereção. Para a configuração da violência, necessário se faz comprovar, existindo na vítima a capacidade de resistência, que esta foi empregada; ou, em outros termos, que houve ataque e reação séria, que houve luta. Nesse sentido o magistério de A. Almeida Júnior e J. B. de O. e Costa Júnior, em Lições de Medicina Legal. 8ª edição, Companhia Editora Nacional. Disso não encontrei indícios convincentes nos autos.

7. - Aplica-se a regra do crime continuado. Os delitos foram cometidos em circunstâncias de tempo, lugar e maneira de execução tais, que permitem considerá-los unidade jurídica.

Tendo sido praticados dois delitos dolosos, contra vítimas diferentes, aplica-se a pena em dobro, nos termos do parágrafo único, do artigo 71, do Código Penal, perfazendo a punição total 12 anos de reclusão.

8. - O regime carcerário será inicialmente fechado, diante da hediondez dos delitos e da quantidade de pena aplicada.

9. - Pelo exposto, dou parcial provimento ao apelo, a fim de condenar ANDERSON DUARTE a 12 anos de reclusão, em regime fechado, como incurso no artigo 213, c.c. os artigos 224, "a" 225, parágrafo primeiro, I, na forma do artigo 71, parágrafo único, todos do Código Penal, e determino se expeça mandado de prisão, esgotadas as vias impugnativas ordinárias.

ERICSON MARANHO
Relator




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