Anúncios


sexta-feira, 31 de julho de 2009

JURID - Crimes contra a ordem tributária. Prova da materialidade. [31/07/09] - Jurisprudência


Crimes contra a ordem tributária. Artigo 1º, incisos I e II da Lei nº 8.137/90. Prova da materialidade e autoria.

Tribunal de Justiça do Paraná - TJPR.

APELAÇÃO CRIMINAL Nº 466.154-3 - 1ª VARA CRIMINAL DE MARINGÁ

APELANTE: LEVI ALVES GUIMARÃES

APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ

RELATOR: DES. JOATAN MARCOS DE CARVALHO

Apelação criminal. Crimes contra a ordem tributária. Artigo 1º, incisos I e II da Lei nº 8.137/90. Prova da materialidade e autoria. Conjunto probatório suficiente para um decreto condenatório. Dolo específico configurado. Condenação mantida. Inconstitucionalidade da prisão civil por dívida não se confunde com prisão penal em razão do crime de fraude ao sistema tributário. Recurso desprovido.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de apelação criminal nº 466.154-3, 1ª Vara Criminal de Maringá, onde é apelante Levi Alves Guimarães e apelado o Ministério Público do Estado do Paraná.

1. RELATÓRIO

Levi Alves Guimarães foi processado e denunciado pela prática dos crimes descritos nos artigos 1º, incisos I e II da Lei nº 8.137/90 c/c artigo 71, caput, do Código Penal, pela prática dos fatos assim narrados na denúncia:

"No período compreendido entre 05 de abril de 1997 e dezembro de 1998, o denunciado Levi Moreira Alves, na condição de sócio-gerente da empresa exercendo, a administração financeira, contábil e fiscal da empresa Nippomag do Brasil Indústria e comércio de Colchões Magnéticos Ltda., sediada na Avenida Manoel Prudêncio de Brito, 360, Parque Industrial bandeirante, em Maringá/Pr, com liberdade de escolha, consciência e vontade atuação, por sucessivas vezes, sempre de forma continuada, reduziu o pagamento do ICMS devido nas diversas operações comerciais que realizou, e , para tanto, consignou nas notas fiscais respectivas valores de venda sub-faturados, conforme tabela abaixo.Assim, agindo, o denunciado Levi Moreira Alves prestou declaração falsa à autoridade fazendária estadual, após consignar elementos inexatos nas notas fiscais, nos livros de saída de mercadorias e de apuração de ICMS, bem como nas GIAs/ICMS correspondentes a casa exercício fiscal, causando um prejuízo ao Estado do Paraná no valor atualizado de R$1.448.756,18 (Um milhão, quatrocentos e quarenta e oito mil, setecentos e cinqüenta e seis reais e dezoito centavos).

No período compreendido entre julho de 1997 e maio de 2000, o denunciado Levi Moreira Alves, na condição de sócio-gerente, exercendo, portanto, a administração financeira, contábil e fiscal da empresa Nippomag do Brasil Indústria e Comércio de Colchões Magnéticos LTda., com liberdade de escolha, consciência e vontade de atuação, por sucessivas vezes, de forma continuada, suprimiu o pagamento de ICMS devido ao promover a saída de mercadorias sem registrá-las nos documentos e livros fiscais exigidos, conforme tabela abaixo. Assim, agindo, o denunciado fraudou a fiscalização tributária ao omitir o registro das operações comerciais realizadas nos livros de saída de mercadorias e de apuração de ICMS, bem como nas GIAs correspondentes a casa exercício fiscal, causando um prejuízo ao Estado do Paraná no valor de R$4.853.799,85 (quatro milhões, oitocentos e cinqüenta e três mil, setecentos e noventa e nove reais e oitenta e cinco centavos).

Verifica-se, pois, que o denunciado, sempre sob o mesmo propósito ilícito- suprimir/reduzir o pagamento do ICMS devido pela empresa Nippomag do Brasil Indústria e Comércio de Colchões Magnéticos Ltda., valendo-se das mesmas condições de tempo, lugar, meio e modo de execução agiu de forma continuada na série de fraudes fisco-contábeis praticadas, causando à sociedade paranaense o prejuízo já mencionado."

A denúncia foi recebida em 15 de abril de 2004(fls. 197).

Sobreveio sentença (fls. 513/519) julgando procedente a denúncia para o fim de condenar o réu Levi Alves Guimarães como incurso nas sanções do artigo 1º, incisos I e II da Lei nº 8.137/90 c/c artigo 71 do Código Penal, a uma pena de 03 (três) anos e 06 (seis) meses de reclusão e 18 (dezoito) dias-multa, no valor de 14 BTN, sendo substituída a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direito, a serem ajustadas em audiência admonitória.

Inconformado com a r. decisão Levi Alves Guimarães interpôs recurso de apelação (fls.525). Nas razões recursais (523/533) pugnou pela reforma da sentença para que seja absolvido, sob a alegação de que não há prova inequívoca da fraude, vez que as autuações fiscais não prestaram a provar a prática delituosa que lhe é imputada.

Sustentou que os agentes fiscais, de forma equivocada, tomaram por base a tabela de venda ao consumidor, quando na verdade os produtos são vendidos por um valor aos revendedores e estes, por sua vez, revendem os produtos ao consumidor final por um valor superior.

Asseverou que não houve dolo específico, exigível para a consumação dos crimes descritos na inicial.

Concluiu, por fim, que é inconstitucional a privação de liberdade da pessoa humana em razão de dívida, tendo em vista o "Pacto de São José da Costa Rica".

O Ministério Público do Estado do Paraná apresentou contra - razões (fls. 535/537), manifestando-se pelo desprovimento do presente recurso.

A Procuradoria Geral de Justiça se manifestou (fls. 581/589) pelo desprovimento do recurso.

É o relatório, em rápida síntese.

2.Fundamentação

Presentes os pressupostos recursais de admissibilidade intrínsecos e extrínsecos, conheço do presente recurso.

O apelante Levi Alves Guimarães foi condenado nas sanções dos crimes contra a ordem tributária, nas modalidades dos incisos I e II do art. 1° da Lei 8137/90.

O delito previsto no artigo 1º, inciso I da Lei nº 8.137/90, configura-se quando o agente omite ou presta informação falsa às autoridades fazendárias. Já o delito tipificado no artigo 1º, inciso II, da mesma lei, configura-se quando resta evidenciado ter o agente fraudado a fiscalização tributária, inserindo elementos inexatos, ou omitindo operação de qualquer natureza, em documento ou livro exigido pela lei fiscal.

A conduta imputada ao apelante, na condição de sócio-gerente da empresa Nippomag do Brasil Indústria e Comércio de Colchões Magnéticos Ltda., foi de inserir elementos inexatos em notas fiscais e omitir o registro de saída de diversas mercadorias nos livros fiscais exigidos, assegurando assim, a não incidência ou a redução do valor do ICMS - Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços, e causando um prejuízo aos cofres públicos.

Ao contrário do que afirma o apelante, as provas colhidas durante toda a instrução processual são suficientes para o decreto condenatório.

Embora não haja questionamento quanto à materialidade, importante ressaltar que restou absolutamente caracterizada através do relatório e cópia dos processos administrativos fiscais nº 6.174311-1, 6.139.856-2, 6.174308-1, 6.174277-8, 6.1742859, 6.174940-8, 6.173935-5, 6.174244-1, 6.174257-3; cópia da decisão da decisão do Conselho de Contribuintes e Recursos Fiscais; cópia do extrato de crédito tributário pendente; cópia do extrato cadastral do CAD; cópia dos documentos pessoais dos sócios e contrato social primitivo e notas fiscais de fls. 53/136.

Da mesma forma, a autoria é certa e recai sobre a pessoa do apelante Levi Alves Guimarães, diante do conteúdo da prova documental acima mencionada e corroborada pela prova testemunhal colhida na instrução.

Sustentou o apelante que a empresa possui um sistema de revenda, chamado "marketing de rede", em que vende o produto para revendedores e estes revendem para o consumidor final, por um preço pré - estabelecido, de acordo com uma tabela.

Alegou que os agentes fiscais, de forma equivocada, tomaram por base a tabela de venda ao consumidor final, de valor superior.

Todavia, restou demonstrado de maneira clara e inquestionável, que o denunciado, sujeito ativo do delito, face à responsabilidade que detinha na administração da empresa, empreendeu ação ilícita, decorrente sua vontade, livre e consciente de lesar o fisco, nada existindo nos autos a eximir a sua responsabilidade criminal.

Na instrução probatória, os auditores fiscais, de forma harmônica, declararam que não tomaram por base "tabelas", mas que chegaram a conclusão do subfaturamento através do relatório de vendas (fls. 32/43) apreendido na empresa e as notas fiscais de fls. 53/136.

Transcrevo parte dos depoimentos:

Auditor Mitsuro Tsudo(fls. 568, degravação):

"O trabalho desenvolvido por nós não foi considerado tabelas. Foi feito considerando nota fiscal emitida para o destinatário e os documentos de pagamento relativos a pedidos que comprovavam que eram as mesmas mercadorias faturadas e do pedido e cópias de cheques anexadas ao pedido."

Auditor Antônio Marques da Silva (fls. 558, degravação):

"(...) Ocorreu em situação de uma solicitação, através de ordem de serviço fiscal expedida pela Inspetora Regional de Fiscalização da 9ª Delegacia Regional da Receita de Maringá, com uma denúncia de um ex- funcionário ou uma ex-funcionária.

Num primeiro momento, nós colhemos os dados através da ordem de serviço e fiscalização, e de acordo com a denúncia do local onde estaria as provas desses ilícitos fiscais, nós fizemos uma coleta dos documentos, com a devida retenção dos documentos fiscais, né, e posteriormente, na inspetoria, foi feita a análise desses documentos e posterior lançamento do auto de infração.

Havia pedidos fiscais em que a gente constatou que havia diferença do preço que ele praticava, e comprovado através de pedidos fiscais, com a emissão de notas fiscais, os valores eram divergentes. A mesma mercadoria, as mesmas especificações do produto."

Observa-se que, as alegações do apelado apresentam-se isoladas e dissociadas do caderno processual, sendo que, não há prova da ausência de dolo.

Incumbia ao acusado desconstituir a conclusão da autoridade fiscal de que houve a sonegação, o que não logrou fazer.

No presente caso, o elemento subjetivo do tipo, o dolo específico consistente no especial fim de agir do agente de eximir-se ou exonerar-se do valor tributado, restou demonstrado.

Por ser o apelante a pessoa que gerencia e tem o dever legal de zelar pela regularidade da empresa, é pouco crível que desconheça as normas tributárias e as irregularidades cometidas dentro da empresa.

Logo, era sabedor que a venda de mercadorias deveria ser registrada através de emissão de nota fiscal e nos documentos exigidos e, mais do que isso, que a conseqüência decorrente do seu ato infracional seria a supressão de tributo.

Caso estivéssemos diante de uma situação excepcional, de uma situação isolada em que restasse demonstrado que o apelante mantinha a regularidade em toda a movimentação fiscal de sua empresa, poderia se dar algum crédito à tese defensiva.

Contudo, a sonegação fiscal levada a efeito, alcançou os períodos de 05 de abril de 1997 a dezembro de 1998 e julho de 1997 a maio de 2000 e a quantia de R$6.302.256,03 (seis milhões, trezentos e dois mil, duzentos e cinqüenta e seis reais e três centavos), em prejuízo do erário público.

Quanto a inconstitucionalidade da privação da liberdade em razão da dívida, algumas considerações devem ser feitas.

Efetivamente a Constituição Federal estabelece que "não haverá prisão civil por dívida, salvo a do responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e a do depositário infiel".

Todavia, a prisão por dívida, vedada pela Constituição, é a prisão civil, meio utilizado para compelir o devedor a pagar sua dívida, que não se confunde com a prisão penal, sanção pelo cometimento de um crime.

O direto penal não incrimina a inadimplência de dívida, mas sim as práticas fraudulentas ao Fisco, como bem esclarece Dra. Lilian Romero na Apelação Criminal nº 332.509-1: "Alegaram os apelantes, ainda, ser vedada pela Constituição Federal a prisão por dívida, salvo prestações alimentares e depósito infiel.

Ocorre que a disposição acima se restringe ao âmbito civil, não alcançando o âmbito penal. Além do mais, no caso, a conduta típica e punida na órbita penal é a supressão ou redução do tributo mediante o emprego de fraude (vale dizer, mediante o emprego de engodo ou ardil) ou omitindo dados (violando o dever de informar a operação) visando a induzir o Fisco em erro e causando prejuízo ao erário público."

Nesse sentido:

"Omissão do recolhimento de contribuições previdenciárias descontadas dos empregados. Figura de caráter criminal inconfundível com a da prisão por dívida. Alegação de indisponibilidade de recursos, cuja comprovação está a depender do regular processamento da ação penal, sendo insusceptível de exame em habeas corpus impetrado contra o recebimento da denúncia." (STF-1ª Turma, HC 78.234/PA, REl. Min. Octavio Gallotti, julg. 02/02/99, DJU 21.05.99, p. 281)

Do exposto, voto no sentido de negar provimento ao recurso de apelação.

3. DISPOSITIVO

ACORDAM os integrantes da Segunda Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em negar provimento ao presente recurso de apelação.

Presidiu a sessão de julgamento o Senhor Desembargador LIDIO JOSÉ ROTOLI DE MACEDO (sem voto), dele participando os Senhores Juízes de Direito Substitutos em Segundo Grau JOSÉ LAURINDO DE SOUZA NETTO e LILIAN ROMERO.

Curitiba, 16 de julho de 2009.c

JOATAN MARCOS DE CARVALHO
Relator




JURID - Crimes contra a ordem tributária. Prova da materialidade. [31/07/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário