Anúncios


quinta-feira, 30 de julho de 2009

JURID - Ação anulatória e execução fiscal. Conexão. Contribuição. [30/07/09] - Jurisprudência

Jurisprudência Tributária
Ação anulatória e execução fiscal. Conexão. Contribuição social sobre o lucro. Base de cálculo.
Obras jurídicas digitalizadas, por um preço menor que as obras impressas. Acesse e conheça as vantagens de ter uma Biblioteca Digital!

Tribunal Regional Federal - TRF4ªR.

APELAÇÃO CÍVEL Nº 97.04.54757-9/RS

RELATOR: Des. Federal Joel Ilan Paciornik

APELANTE: VARIG S/A VIACAO AEREA RIO GRANDENSE

ADVOGADO: Waldir Luiz Braga
: Plinio Jose Marafon
: Renato Bing Reis e outros

APELADO: UNIÃO FEDERAL (FAZENDA NACIONAL)

ADVOGADO: José Diogo Cyrillo da Silva

EMENTA

PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. AÇÃO ANULATÓRIA E EXECUÇÃO FISCAL. CONEXÃO. CONTRIBUIÇÃO SOCIAL SOBRE O LUCRO. BASE DE CÁLCULO. LUCROS OBTIDOS NO EXTERIOR. APLICAÇÃO DO ART. 268 DO RIR/1980. LEI Nº 9.249/1995. MP Nº 1.858-6/1999.

1. A jurisprudência do STJ e desta Corte reconhece a conexão entre a ação anulatória do débito e a execução fiscal, uma vez que se vislumbra a mesma natureza de ação de embargos do devedor na anulatória, bem como admite a competência do juízo da Vara de Execuções Fiscais, por se tratar de competência funcional e, portanto, absoluta.

2. Quando os processos que justificariam o processamento no mesmo juízo das execuções fiscais já foram sentenciados, não há mais razão para a reunião dos processos, nos termos da Súmula nº 235 do STJ: "A conexão não determina reunião dos processos, se um deles já foi julgado".

3. Há evidente paralelismo entre a contribuição social sobre o lucro e o imposto de renda calculado com base no lucro real, porque ambos os tributos originam-se do lucro contábil do exercício, resultante do cômputo do lucro operacional, dos resultados não operacionais e das participações nos lucros, apurados conforme as demonstrações financeiras. O lucro líquido, após as adições, exclusões e compensações autorizadas pela legislação da CSLL e do IRPJ, formará a base de cálculo da contribuição e do imposto. O lucro líquido, portanto, é o elemento básico para compor a base de cálculo tanto da CSLL quanto do IRPJ; o que diferencia esses tributos são as adições, exclusões e compensações determinadas pela lei tributária. Por isso, a base de cálculo da CSLL é o resultado ajustado do exercício, antes da provisão para o imposto de renda, ao passo que a do IRPJ é o lucro real.

4. O art. 63 da Lei nº 4.506/1964, regulamentado pelo art. 268 do Decreto nº 85.450/1980, não trata de hipótese de isenção, mas de não incidência. A isenção exclui o crédito tributário, ou seja, o fato previsto na norma legal constitui obrigação tributária, porém a lei dispensa o seu cumprimento. Não incidência significa que o fato não se amolda à hipótese abstratamente prevista na obrigação tributária. No caso presente, a legislação não prevê o surgimento de obrigação tributária sobre o lucro operacional resultante de atividades exercidas no exterior; é caso clássico de não subsunção fática, pois o fato não está abrangido pela norma de tributação.

5. A omissão na legislação da CSLL, no que concerne aos lucros auferidos no exterior, não decorre propriamente da má redação do texto legal. O legislador considerou ser desnecessário referir todas as hipóteses que poderiam influir no lucro líquido, já reguladas pela legislação do imposto de renda. A incidência do art. 268 do RIR/1980 somente se revelaria impossível caso houvesse nítido conflito com as adições, exclusões e compensações ao resultado do exercício, expressamente mencionadas na Lei nº 7.689/1988. A questão resolve-se, portanto, pela pesquisa do verdadeiro alcance da lei, em consonância com o princípio da legalidade, posto no art. 150, inciso I, da Constituição.

6. Embora os elementos que compõem o resultado do exercício sejam estabelecidos pela lei comercial (art. 187 da Lei nº 6.404/1976), a inexistência de definição no regramento da CSLL não torna incompatível a aplicação das normas específicas do imposto de renda. Ora, se a lei tributária determina que o lucro proveniente de atividades exercidas no exterior não integra o resultado do exercício, não é possível erigir o art. 187 da Lei das Sociedades Anônimas para afastar a aplicação dessa norma em relação à CSLL, mas considerá-la válida quanto ao IRPJ. Por conseguinte, a mesma regra de apuração do IRPJ, no tocante ao lucro proveniente de atividades exercidas fora do País, incide para efeito de apuração da base de cálculo da CSLL.

7. Não obstante o inciso I do § 2º do art. 153 da CF/1988 estabeleça a universalidade como critério informativo do imposto de renda, o IRPJ, até a edição da Lei nº 9.249/1995, adotava o princípio da territorialidade, ou seja, somente era passível de tributação a renda originada de situações jurídicas ocorridas dentro do território nacional. No que concerne à CSLL, a tributação em bases universais foi normatizada somente pela Medida Provisória nº 1.858-6, de 29/06/1999.

8. O art. 15 da Instrução Normativa SRF nº 38/1996, concernente à Lei nº 9.249/1995, exclui os lucros, rendimentos e ganhos de capital, auferidos no exterior, da base de cálculo da CSLL. Somente a contar de 01/10/1999 há base legal para a tributação dos lucros provindos do exterior, conforme o Ato Declaratório SRF nº 75/1999, relativo à MP nº 1.858-6/1999.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 1ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, rejeitar a preliminar e, no mérito, dar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 15 de julho de 2009.

Des. Federal Joel Ilan Paciornik
Relator

APELAÇÃO CÍVEL Nº 97.04.54757-9/RS

RELATOR: Des. Federal Joel Ilan Paciornik

APELANTE: VARIG S/A VIACAO AEREA RIO GRANDENSE

ADVOGADO: Waldir Luiz Braga
: Plinio Jose Marafon
: Renato Bing Reis e outros

APELADO: UNIÃO FEDERAL (FAZENDA NACIONAL)

ADVOGADO: José Diogo Cyrillo da Silva

RELATÓRIO

Varig S/A ajuizou ação objetivando a anulação do débito exigido no processo administrativo nº 11080.004887/93-51, oriundo de auto de infração e relativo à apuração de valor da contribuição social sobre o lucro líquido - CSLL - no ano base 1989, decorrente da parcela de lucro obtida no exterior e não adicionada à base de cálculo do tributo no exercício financeiro de 1990.

Regularmente processada a demanda, sobreveio sentença de improcedência da ação (fls. 119/130).

A autora opôs recurso de apelação, arguindo, preliminarmente, a nulidade da sentença, em razão da necessidade de reunião da ação anulatória com a execução fiscal, diante da conexão entre elas. No mérito, sustenta que as contribuições sociais podem se revestir da natureza jurídica de imposto, taxa ou contribuição de melhoria (art. 145 da CF), conforme as hipóteses de incidência, a base de cálculo e a destinação que tiverem, uma vez que o art. 149 da Constituição Federal apenas apontou as finalidades das contribuições. Alega que a CSLL consiste em um imposto, pois possui base de cálculo referente a uma particularidade do sujeito passivo (lucro) e não está vinculada a qualquer atuação estatal. Propugna a reforma da sentença, ainda, em virtude da recusa de aplicação analógica do art. 268 do Decreto nº 85.450/1980 (Regulamento do Imposto de Renda de 1980), pois isenção ou exclusão não se confunde com não incidência, hipótese da qual trata esse dispositivo. Traçando o paralelo entre a hipótese de incidência e a base de cálculo do imposto de renda e da CSLL, entende que há autorização legal de interpretação integrativa mediante analogia, nos termos do art. 108, I, do CTN, mormente porque a Lei nº 7.689/1988 não prevê a incidência do tributo sobre o resultado apurado no exterior ou no território nacional. Frisa que o pressuposto da analogia é justamente a inexistência da lei. Defende que os mesmos motivos que nortearam o legislador e o aplicador da norma do imposto de renda são aplicáveis como justificativa para a não incidência da CSLL sobre o lucro apurado no exterior. Aponta violação ao princípio da estrita legalidade tributária (art. 150, I, da CF/88), porquanto não existe lei dispondo expressamente acerca da exigência de CSLL sobre o lucro obtido no exterior. Preconiza a aplicação do princípio da territorialidade, com fulcro em interpretação a contrario sensu dos arts. 101 e 102 do CTN, no sentido de que a legislação não poderá incidir fora dos limites do território, ante a inexistência de lei ou tratados dispondo sobre o assunto (fls. 145/161).

O recurso foi improvido (fls. 190/198), publicando-se a ementa nestes termos:

TRIBUTÁRIO. CSSL. LUCROS OBTIDOS NO EXTERIOR. TERRITORIALIDADE E LEGALIDADE. ASPECTOS MATERIAL E ESPACIAL DA HIPÓTESE DE INCIDÊNCIA.

1. É de se ter que os lucros obtidos no exterior, compondo o resultado do exercício, não podem deixar de incluir-se na base de cálculo da contribuição social sobre o lucro, nos termos do esquema jurídico-contábil consagrado pelos arts. 2º, da Lei nº 7.689/88, e 187, da Lei nº 6.404/76. Desse modo, não cabe falar que a exigência fiscal ora impugnada fere o princípio da legalidade.

2. Inaplicável à espécie o art. 268 do RIR/80, já, somente após obtido o lucro líquido do exercício, iniciam-se as adições, exclusões e compensações prescritas ou autorizadas, como os lucros auferidos no exterior, que determinam o lucro real tributável.

3. Diferindo o aspecto espacial das normas tributárias do campo de validade da lei, não se vislumbram óbices, no que concerne ao ponto, à incidência da contribuição instituída pela Lei nº 7.689/88 sobre o lucro obtido no exterior. (TRF4, AC 97.04.54757-9, Primeira Turma, Relatora Vânia Hack de Almeida, DJ 24/01/2001)

Então, a autora opôs embargos de declaração, esgrimindo que o acórdão não se manifestou expressamente sobre a ofensa aos arts. 103, 105 e 106 do CPC e do Provimento nº 11, de 26/08/1993, deste Tribunal; aos arts. 145 e 150, I, da CF/88; e ao art. 108 do CTN. Obtempera que o princípio da territorialidade foi adotado por nosso ordenamento jurídico até o advento da Lei nº 9.249/1995, quando o Brasil passou a adotar o princípio da universalidade, para o fim de tributação da renda internacional das pessoas jurídicas. Argumenta que a Instrução Normativa SRF nº 38/1996 determina expressamente que os lucros auferidos no exterior não integram a base de cálculo da CSLL, explicando que a tributação dos lucros provindos do exterior ocorreu somente a partir da edição da Medida Provisória nº 1.858/1999, regulamentada pelo Ato Declaratório nº 75/1999. Alega que as questões atinentes ao princípio da territorialidade, ao teor da IN SRF nº 38/1996 e da MP nº 1.858/99, embora analisados por ocasião do julgamento do recurso, não constaram no acórdão (fls. 200/206).

No julgamento dos embargos de declaração, a Turma afirmou que "não há omissão por não ter a decisão enfrentado todas as questões suscitadas ou analisado todos os dispositivos mencionados pelo recorrente. Deve o magistrado apenas apreciar todo o objeto do recurso, demonstrando os motivos de seu convencimento, concatenando os argumentos de forma lógica" (fls. 208/212).

A autora interpôs recurso especial, arguindo a ofensa ao art. 535 do CPC e de outros dispositivos da legislação federal - arts. 97, 101 e 108 do CTN, arts. 2º e 6º da Lei nº 7.689/1988, art. 63 da Lei nº 4.506/1964, art. 25 da Lei nº 9.249/1995 e art. 19 da MP nº 1.858/1999 (fls. 261/303).

O Ministro Francisco Falcão proveu o recurso especial, uma vez que "a matéria dos artigos apontados como violados não foi objeto de debate no v. acórdão hostilizado e, embora opostos embargos de declaração para suprir a omissão e ventilar a questão federal, restaram eles rejeitados". Determinou o retorno dos autos a esta Corte, para que se manifeste sobre a matéria articulada nos embargos de declaração (fls. 402/403).

A União opôs agravo regimental, asseverando que o Tribunal manifestou-se sobre todos os pontos feridos pela apelação da Varig S/A. Aduz que a recorrente trouxe questões nos embargos declaratórios e no recurso especial que não foram abordadas ao longo do processo, tal como a Lei nº 9.249/1995, a IN SRF nº 38/96, MP nº 1.858/99, Ato Declaratório nº 75/99, assim como questões constitucionais não invocadas anteriormente.

A Primeira Turma do STJ negou provimento ao agravo regimental nestes termos:

PROCESSUAL CIVIL. CSSL. LUCROS OBTIDOS NO EXTERIOR. RECURSO ESPECIAL. AGRAVO REGIMENTAL. VIOLAÇÃO AO ARTIGO 535 DO CPC. OMISSÃO VERIFICADA. RETORNO AO TRIBUNAL A QUO PARA EXAME DAS QUESTÕES NÃO ESCLARECIDAS.

I - O Tribunal a quo, no acórdão principal, não se desincumbiu de apreciar as questões alavancadas. Nos embargos de declaração que se seguiram, apesar do Sodalício ter observado que inexistiriam as pechas invocadas, relativas à não incidência da CSSL para o período anterior à MP nº 1.858/99, não realizou o necessário desate jurídico apto à formação do convencimento e obrigatório para viabilizar a interposição posterior de eventuais recursos.

II - O fato do Tribunal a quo haver lastreado o decisum, em grande parte, com esteio em regra constitucional não implica na vedação da análise de pretenso malferimento ao artigo 535 do CPC quando tal omissão busca o exame de regra infraconstitucional.

III - Agravo regimental improvido. (AgRg no REsp 379917/RS, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 16/06/2005, DJ 05/09/2005 p. 205)

Transitado em julgado o acórdão, vieram os autos a esta Corte.

É o relatório. Peço dia.

Des. Federal Joel Ilan Paciornik
Relator

APELAÇÃO CÍVEL Nº 97.04.54757-9/RS

RELATOR: Des. Federal Joel Ilan Paciornik

APELANTE: VARIG S/A VIACAO AEREA RIO GRANDENSE

ADVOGADO: Waldir Luiz Braga
: Plinio Jose Marafon
: Renato Bing Reis e outros

APELADO: UNIÃO FEDERAL (FAZENDA NACIONAL)

ADVOGADO: José Diogo Cyrillo da Silva

VOTO

De início, impende esclarecer a matéria submetida à apreciação desta Corte. O STJ reconheceu a relevância e a necessidade de debate das questões suscitadas nos embargos de declaração, na decisão singular proferida pelo Ministro Francisco Falcão. Reafirmou esse entendimento ao julgar o agravo regimental, salientando que "O Tribunal a quo, no acórdão principal, não se desincumbiu de apreciar as questões alavancadas. (...) não realizou o necessário desate jurídico apto à formação do convencimento e obrigatório para viabilizar a interposição posterior de eventuais recursos" (fl. 415).

Outrossim, o STJ não acolheu a alegação da Fazenda Nacional que apontava inovação da causa, em sede de embargos de declaração, quanto à ausência de manifestação sobre a Lei nº 9.249/1995, a IN SRF nº 38/1996, a MP nº 1.858/99 e o Ato Declaratório nº 75/99. Não obstante esses dispositivos legais, editados posteriormente à propositura da demanda, não integrassem a fundamentação expendida na inicial, esse Tribunal não pode desconhecê-los, porque isso implicaria desconsiderar a decisão da Corte Superior.

Para que as omissões apontadas pela embargante sejam supridas, ou seja, haja o esgotamento da prestação jurisdicional, segundo a determinação do STJ, é imperioso o reexame da causa posta nestes autos. As razões que formaram a convicção da relatora do acórdão que apreciou a recurso de apelação não são exatamente as mesmas deste julgador, de modo que seria paradoxal analisar as questões postas nos embargos, não apreciadas anteriormente, a partir da fundamentação utilizada no julgamento do apelo. Assim, embora o STJ não tenha anulado o acórdão principal, entendo que este Tribunal está autorizado a se valer de fundamentos diversos dos que embasaram o acórdão embargado. Esse procedimento equivale à atribuição de efeitos modificativos aos embargos declaratórios, admitida quando, para sanar a omissão, é preciso alterar o julgado.

Passo, então, a analisar a matéria controvertida.

A autora invoca a conexão entre esta ação anulatória, ajuizada em 26/01/1995, e a execução fiscal nº 95.0001712-1, ajuizada em 01/02/1995, com base no art. 3º do Provimento nº 11, de 26/08/1993, deste Tribunal, e nos arts. 103, 105 e 106 do CPC. Conquanto a jurisprudência do STJ e desta Corte reconheça a conexão entre a ação anulatória do débito e a execução fiscal, uma vez que se vislumbra a mesma natureza de ação de embargos do devedor na anulatória, bem como admita a competência do juízo da Vara de Execuções Fiscais, por se tratar de competência funcional e, portanto, absoluta, a anulação da sentença constitui medida desprovida de utilidade, de acordo com a presente configuração processual.

É certo que, em 19/04/1996, quando a autora alegou a conexão, ainda não fora sentenciada a ação anulatória, o que veio a ocorrer em 09/12/1996. A petição de fl. 131, informando que o Juízo onde tramitava a execução fiscal havia se declarado competente para processar e julgar a ação anulatória, foi protocolada em 26/11/1996, porém, equivocadamente, juntada após a sentença. Por sua vez, a 2ª Vara das Execuções Fiscais solicitou a redistribuição da ação anulatória apenas em 07/02/1997, momento em que a declaração de competência já havia se tornado inócua.

O fato é que a comunicação oficial do Juízo das Execuções Fiscais aconteceu após a prolação da sentença na ação anulatória. Quando os processos que justificariam o processamento no mesmo juízo das execuções fiscais já foram sentenciados, não há mais razão para a reunião dos processos, nos termos da Súmula nº 235 do STJ: "A conexão não determina reunião dos processos, se um deles já foi julgado". Impende salientar que não houve qualquer prejuízo concreto à autora, porque, embora as ações não tenham sido julgadas conjuntamente, receberam decisão idêntica; quanto aos recursos nelas interpostos, estão distribuídos a este relator, incluídos na mesma pauta, de molde que não há possibilidade de julgamentos conflitantes. Assim, verifica-se a inexistência de afronta aos arts. 103, 105 e 106 do CPC e ao art. 3º do Provimento nº 11, de 26/08/1993.

A questão de fundo diz respeito à base de cálculo da contribuição social sobre o lucro no ano de 1989.

O fisco autuou a empresa, alicerçado no entendimento de que a CSLL incide sobre o lucro auferido fora do território nacional por pessoas jurídicas domiciliadas no País que possuam filiais ou estabelecimentos situados no exterior. Asseverou que não incide a norma contida no art. 268 do RIR/80, pois a lei tributária veda a utilização da analogia para estender a um tributo ou contribuição a isenção concedida a determinado fato por outro tributo. Afirmou que se aplica a analogia somente quando a situação fática não é objeto de regulamentação legal.

As alegações da autora fundam-se em três linhas argumentativas básicas: a) possibilidade de aplicação analógica do art. 268 do Decreto nº 85.450/1980 (Regulamento do Imposto de Renda de 1980), com base no art. 108, inciso I, do CTN, uma vez que a CSLL, na tipologia prevista no art. 145 da Constituição Federal, enquadra-se na categoria de imposto; b) violação ao art. 150, inciso I, da CF/88, pois não existe lei tributária determinando de forma expressa a incidência de CSLL sobre o lucro auferido no exterior; c) aplicação do princípio da territorialidade, porquanto o princípio da universalidade, para fins de tributação da renda internacional das pessoas jurídicas, passou a vigorar após a edição da Lei nº 9.249/1995 e da Medida Provisória nº 1.858-6/1999 (atualmente tramitando sob nº 2.158-35/2001), consoante estabelecem a Instrução Normativa nº 38/1996 e o Ato Declaratório nº 75/1999, da Secretaria da Receita Federal.

De acordo com a evolução da doutrina e da jurisprudência sobre o sistema tributário instituído pela Constituição de 1988, não há dúvida no sentido de que a contribuição social sobre o lucro é tributo. Segundo o entendimento firmado pelo STF, no RE nº 146.733/SP (Relator Min. Moreira Alves, DJ 06/11/1992, p. 20110), há cinco espécies de tributos: impostos, taxas, contribuições de melhoria, empréstimos compulsórios e contribuições especiais. Em relação aos três primeiros, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios possuem competência legislativa; por isso, estão agrupados no art. 145. Em relação aos dois últimos, somente a União é competente para instituí-los, havendo normatização exclusiva nos arts. 148 (empréstimo compulsório) e 149 (contribuições especiais). As contribuições especiais, por sua vez, subdividem-se em sociais (gerais e de seguridade social), de intervenção no domínio econômico e de interesse nas categorias profissionais ou econômicas. A CSLL, portanto, não se enquadra na categoria de imposto; todavia, submete-se ao regime jurídico tributário, diante da determinação constitucional de observância das normas gerais de direito tributário e dos princípios da legalidade estrita, da irretroatividade e da anterioridade nonagesimal.

A Constituição Federal não veda a instituição de contribuições especiais com o mesmo fato gerador e a mesma base de cálculo de imposto, porque o requisito que as caracterizam é a finalidade constitucional que autoriza a sua criação. As contribuições de seguridade social, entre as quais se enquadra a CSLL, possuem fato gerador e base de cálculo expressamente previstos no art. 195, inciso I, da CF/88.

Há evidente paralelismo entre a contribuição social sobre o lucro e o imposto de renda calculado com base no lucro real, porque ambos os tributos originam-se do lucro contábil do exercício, resultante do cômputo do lucro operacional, dos resultados não operacionais e das participações nos lucros, apurados conforme as demonstrações financeiras. O lucro líquido, após as adições, exclusões e compensações autorizadas pela legislação da CSLL e do IRPJ, formará a base de cálculo da contribuição e do imposto. O lucro líquido, portanto, é o elemento básico para compor a base de cálculo tanto da CSLL quanto do IRPJ; o que diferencia esses tributos são as adições, exclusões e compensações determinadas pela lei tributária. Por isso, a base de cálculo da CSLL é o resultado ajustado do exercício, antes da provisão para o imposto de renda, ao passo que a do IRPJ é o lucro real.

Feita essa explanação, impõe-se a apreciação do disposto no art. 63 da Lei nº 4.506/1964, regulamentado pelo art. 268 do Decreto nº 85.450/1980, in verbis:

Art. 63. No caso de empresas cujos resultados provenham de atividades exercidas parte no País e parte no exterior, somente integrarão o lucro operacional os resultados produzidos no País.

§ 1º Consideram-se atividades exercidas parte no País e parte no exterior as que provierem:

a) das operações de comércio e outras atividades lucrativas iniciadas no Brasil e ultimadas no exterior, ou vice-versa;

b) da exploração da matéria-prima no território nacional para ser beneficiada, vendida ou utilizada no estrangeiro, ou vice-versa;

c) dos transportes e meios de comunicação com os países estrangeiros.

Art. 268. O lucro proveniente de atividades exercidas parte no País e parte no exterior somente será tributado na parte produzida no País (Lei nº 4.506/1964, art. 63).

Esses dispositivos, evidentemente, não tratam de hipótese de isenção, mas de não incidência. A isenção exclui o crédito tributário, ou seja, o fato previsto na norma legal constitui obrigação tributária, porém a lei dispensa o seu cumprimento. Não incidência significa que o fato não se amolda à hipótese abstratamente prevista na obrigação tributária. No caso presente, a legislação não prevê o surgimento de obrigação tributária sobre o lucro operacional resultante de atividades exercidas no exterior; é caso clássico de não subsunção fática, pois o fato não está abrangido pela norma de tributação. A propósito, colaciono precedente do STF esclarecedor da distinção entre não incidência e isenção:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI 268, DE 2 DE ABRIL DE 1990, DO ESTADO DE RONDÔNIA, QUE ACRESCENTOU INCISO AO ARTIGO 4º DA LEI 223/89. INICIATIVA PARLAMENTAR. NÃO-INCIDÊNCIA DO ICMS INSTITUÍDA COMO ISENÇÃO. VÍCIO FORMAL DE INICIATIVA: INEXISTÊNCIA. EXIGÊNCIA DE CONVÊNIO ENTRE OS ESTADOS E O DISTRITO FEDERAL.

(...)

2. A não-incidência do tributo equivale a todas as situações de fato não contempladas pela regra jurídica da tributação e decorre da abrangência ditada pela própria norma.

3. A isenção é a dispensa do pagamento de um tributo devido em face da ocorrência de seu fato gerador. Constitui exceção instituída por lei à regra jurídica da tributação.

4. A norma legal impugnada concede verdadeira isenção do ICMS, sob o disfarce de não-incidência.

(...) (ADI 286, Relator Min. MAURÍCIO CORRÊA, Tribunal Pleno, julgado em 22/05/2002, DJ 30-08-2002 PP-00060 EMENT VOL-02080-01 PP-00001)

Uma vez que o art. 268 do RIR/1980 trata de hipótese de não incidência, é impertinente invocar o art. 97, inciso VI, do CTN, que exige lei específica para excluir crédito tributário. Pelo mesmo motivo, o disposto no art. 111, inciso II, do CTN, que determina a interpretação literal da lei concessiva de isenção, não tem relevância.

É deveras tormentoso apontar se o caso rende ensejo à integração analógica ou à interpretação extensiva. A clássica distinção teórica, que enfatiza a analogia como forma de integração da legislação, mediante aplicação da lei à situação de fato nela não prevista, cuja semelhança com a hipótese legal é o elemento determinante de ambas, e a interpretação extensiva como modo de determinar com exatidão o verdadeiro sentido da lei, estendendo a sua aplicação de acordo com os limites da sua incidência, não fornece critério definitivo para o caso presente. Na prática, a distinção não é simples, como pondera Luciano Amaro:

Teoricamente, a integração analógica não se confunde com a interpretação extensiva, de que se avizinha. Na prática, distingui-las não é tarefa simples. Como se viu, a integração visa a preencher a lacuna legislativa; já a interpretação extensiva teria por objetivo identificar o 'verdadeiro' conteúdo e alcance da lei, insuficientemente expresso no texto normativo (dixit minus quam voluit). A diferença estaria em que, na analogia, a lei não teria levado em consideração a hipótese, mas, se o tivesse feito, supõe-se que lhe teria dado idêntica disciplina; já na interpretação extensiva, a lei teria querido abranger a hipótese, mas, em razão da má formulação do texto, deixou a situação fora do alcance expresso da norma, tornando com isso necessário que o aplicador da lei reconstitua o seu alcance. (Direito Tributário Brasileiro, São Paulo, Saraiva, 7ª ed., 2001, p. 206)

A omissão na legislação da CSLL, no que concerne aos lucros auferidos no exterior, não decorre propriamente da má redação do texto legal. Como já foi explicitado acima, o resultado do exercício (lucro contábil) forma a base de cálculo da CSLL e do IRPJ (apurado pelo lucro real). A meu ver, o legislador considerou ser desnecessário referir todas as hipóteses que poderiam influir no lucro líquido, já reguladas pela legislação do imposto de renda. Prova disso é a concisão da Lei nº 7.689/1988 (oito artigos relativos à CSLL, nos quais estabelece somente a base de cálculo, alíquota, contribuintes, forma de pagamento e órgão fiscalizador). Percebe-se que a lei cingiu-se ao essencial do tributo, mormente os ajustes a serem feitos ao resultado do exercício, cuja apuração deve observar a legislação comercial. Assim, a incidência do art. 268 do RIR/1980 somente se revelaria impossível caso houvesse nítido conflito com as adições, exclusões e compensações ao resultado do exercício, expressamente mencionadas na Lei nº 7.689/1988. A questão resolve-se, portanto, pela pesquisa do verdadeiro alcance da lei, em consonância com o princípio da legalidade, posto no art. 150, inciso I, da Constituição. A reserva de lei, em matéria tributária, não significa a adoção de tipos fechados, mas a determinabilidade do conteúdo da relação obrigacional a partir da lei, o que permite a utilização dos métodos de interpretação e de integração, a fim de concretizar a abstração do comando legal.

Outro ponto a ser elucidado diz respeito ao que consiste o resultado do exercício. Embora os elementos que compõem o resultado do exercício sejam estabelecidos pela lei comercial (art. 187 da Lei nº 6.404/1976), a inexistência de definição no regramento da CSLL não torna incompatível a aplicação das normas específicas do imposto de renda. Ora, se a lei tributária determina que o lucro proveniente de atividades exercidas no exterior não integra o resultado do exercício, não é possível erigir o art. 187 da Lei das Sociedades Anônimas para afastar a aplicação dessa norma em relação à CSLL, mas considerá-la válida quanto ao IRPJ. Por conseguinte, a mesma regra de apuração do IRPJ, no tocante ao lucro proveniente de atividades exercidas fora do País, incide para efeito de apuração da base de cálculo da CSLL.

Por fim, devem ser lançadas luzes sobre o aspecto espacial da base de cálculo do imposto de renda, por ser pertinente ao conteúdo da norma investigada. Não obstante o inciso I do § 2º do art. 153 da CF/1988 estabeleça a universalidade como critério informativo do imposto de renda, o IRPJ, até a edição da Lei nº 9.249/1995, adotava o princípio da territorialidade, ou seja, somente era passível de tributação a renda originada de situações jurídicas ocorridas dentro do território nacional. Neste sentido, dispõe o art. 337 do Decreto nº 1.041/1994 (Regulamento do Imposto de Renda), in verbis:

Art. 337. O lucro proveniente de atividades exercidas parte no País e parte no exterior somente será tributado na parte produzida no País (Lei nº 4.506/64, art. 63, e Decreto-lei nº 2.429/88, art. 11).

§ 1º Considera-se lucro de atividades exercidas parte no País e parte no exterior o proveniente (Lei nº 4.506/64, art. 63, § 1º):

a) das operações de comércio e outras atividades lucrativas iniciadas no Brasil e ultimadas no exterior, ou vice-versa;

b) da exploração de matéria-prima no território nacional para ser beneficiada, vendida ou utilizada no exterior, ou vice-versa;

c) dos transportes e meios de comunicação com os países estrangeiros.

§ 2º Para os efeitos da alínea "c" do parágrafo anterior, serão considerados:

a) resultados produzidos no País aqueles derivados de fontes nacionais, provenientes de fretes, passagens ou outros, recebidos ou a receber de fontes sediadas, domiciliadas ou estabelecidas no País, irrelevante o local em que tal pagamento se efetue;

b) resultados produzidos no exterior aqueles derivados de fontes estrangeiras, relativos a fretes, passagens ou outros, recebidos ou a receber de fontes domiciliadas, sediadas ou estabelecidas no exterior, irrelevante o local em que tal pagamento se efetue.

A base de cálculo do IRPJ passou a alcançar a renda auferida no País e no exterior por pessoas jurídicas aqui domiciliadas, concretizando o princípio da universalidade, por determinação dos arts. 25 e 26 da Lei nº 9.249/1995:

Art. 25. Os lucros, rendimentos e ganhos de capital auferidos no exterior serão computados na determinação do lucro real das pessoas jurídicas correspondente ao balanço levantado em 31 de dezembro de cada ano.

Art. 26. A pessoa jurídica poderá compensar o imposto de renda incidente, no exterior, sobre os lucros, rendimentos e ganhos de capital computados no lucro real, até o limite do imposto de renda incidente, no Brasil, sobre os referidos lucros, rendimentos ou ganhos de capital.

No que concerne à CSLL, contudo, a tributação em bases universais foi normatizada somente pela Medida Provisória nº 1.858-6, de 29/06/1999 (incorporada à MP nº 2.158-35/2001), nos termos do art. 19:

Art. 19. Os lucros, rendimentos e ganhos de capital auferidos no exterior sujeitam-se à incidência da CSLL, observadas as normas de tributação universal de que tratam os arts. 25 a 27 da Lei nº 9.249, de 26 de dezembro de 1995, os arts. 15 a 17 da Lei nº 9.430, de 27 de dezembro de 1996, e o art. 1º da Lei nº 9.532, de 1997.

Parágrafo único. O saldo do imposto de renda pago no exterior, que exceder o valor compensável com o imposto de renda devido no Brasil, poderá ser compensado com a CSLL devida em virtude da adição, à sua base de cálculo, dos lucros oriundos do exterior, até o limite acrescido em decorrência dessa adição.

A argumentação expendida neste voto é corroborada por atos normativos da Secretaria da Receita Federal, que reconhecem a legalidade da tributação dos lucros provindos do exterior, para apuração da base de cálculo da CSLL, somente a contar da MP nº 1.858-6/1999. Veja-se o teor do art. 15 da Instrução Normativa nº 38/1996, concernente à Lei nº 9.249/1995, e do artigo único do Ato Declaratório nº 75/1999, relativo à MP nº 1.858-6:

Art. 15. Os lucros, rendimentos e ganhos de capital, auferidos no exterior, não integram a base de cálculo da contribuição social sobre o lucro, instituída pela Lei nº 7.689, de 15 de dezembro de 1988.

Artigo único. A incidência da CSLL, segundo as normas de tributação em bases universais, dar-se-á em relação aos lucros, rendimentos e ganhos de capital, auferidos no exterior, disponibilizados, nos termos do art. 1° da Lei n° 9.532, de 1997, a partir de 1° de outubro de 1999, e serão computados na base de cálculo dessa contribuição em 31 de dezembro do ano-calendário da disponibilização, observadas as demais normas estabelecidas para o imposto de renda.

As razões expostas pela autora, tanto no recurso de apelação quanto nos embargos declaratórios, merecem acolhida, devendo ser desconstituído o lançamento tributário que originou o processo administrativo nº 11080.004887/93-51.

Considerando o elevado valor da causa (R$ 11.000.000,00, em janeiro de 1995), impõe-se considerar a equidade na fixação da verba honorária.

O art. 20, § 4º, do CPC, permite que se arbitre os honorários com base na equidade, valendo-se dos critérios elencados nas alíneas 'a', 'b' e 'c' do § 3º desse artigo. A equidade serve como valioso recurso destinado a suprir as lacunas legais e auxiliar a aclarar o sentido e o alcance das leis, atenuando o rigorismo dessas, de molde a compatibilizá-las às circunstâncias sociais, inspirada pelo espírito de justiça.

Assim, ao passo que se deve ter em conta o grau de zelo do profissional, o lugar de prestação do serviço e a natureza e importância da causa, o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para seu serviço, também deve-se remunerar dignamente o causídico, impedindo-se o aviltamento da profissão. A remissão ao parágrafo 3º não significa, todavia, que os honorários devam necessariamente ser fixados em percentual sobre o valor da causa, principalmente quando o montante da verba corresponderia à vultosa importância, que oneraria demasiadamente ambas as partes.

No caso presente, o percentual de 10% sobre o valor da causa representa ônus exacerbado à Fazenda Nacional. Por esse motivo, arbitro os honorários advocatícios em R$ 100.000,00, atualizado pelo IPCA-E, com fulcro no art. 20, §§ 3º e 4º, do CPC.

Ante o exposto, voto no sentido de rejeitar a preliminar e, no mérito, dar provimento à apelação.

Des. Federal Joel Ilan Paciornik
Relator

D.E. Publicado em 29/07/2009




JURID - Ação anulatória e execução fiscal. Conexão. Contribuição. [30/07/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário