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segunda-feira, 8 de junho de 2009

JURID - Lesões corporais causadas pelo preposto da ré. [08/06/09] - Jurisprudência


Consumidor e processual civil. Ação indenizatória. Lesões corporais causadas pelo preposto da ré. Reclamação por danos morais.


Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro - TJRJ.

3ª Câmara Cível

Apelação Cível n.º 69014/07

Relator: Des. LUIZ FERNANDO RIBEIRO DE CARVALHO

ACÓRDÃO

CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. AUTORAS QUE ADENTRAM ÔNIBUS, VINDO O MOTORISTA A PROIBIR A PASSAGEM DE UMA DELAS, QUE ALEGAVA TER PASSE LIVRE, DEPOIS AGREDINDO-AS VERBALMENTE, E TERMINANDO POR AGREDI-LAS TAMBÉM FISICAMENTE. LESÕES CORPORAIS CAUSADAS PELO PREPOSTO DA RÉ. RECLAMAÇÃO POR DANOS MORAIS. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. APELAÇÃO. CONTRATO DE TRANSPORTE INCONTROVERSO, AO MENOS COM A 2ª AUTORA, FILHA DA 1ª. ABRANGÊNCIA DA 1ª AUTORA COMO CONSUMIDORA POR EQUIPARAÇÃO. CAUSA DE PEDIR QUE É PROVADA POR DOCUMENTOS E POR TESTEMUNHO, NÃO MOSTRANDO ESTE DIVERGÊNCIA, EM SEUS PONTOS ESSENCIAIS, COM OS DEMAIS TESTEMUNHOS PRODUZIDOS. DEMANDA CONSUMERISTA. PLENA INDENIZABILIDADE DOS DANOS (ART. 6º, VI, CDC). RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO FORNECEDOR (ART. 14, CDC). CONSUMIDOR POR EQUIPARAÇÃO (ART. 17, CDC). CONDUTA ILÍCITA, NEXO CAUSAL E DANOS COMPROVADOS. DANO MORAL QUE DISPENSA PROVA. REPARAÇÃO DE R$10.000,00 PARA CADA AUTORA QUE É RAZOÁVEL, MAL APRESENTANDO VALOR DE DESESTÍMULO PARA A DESÍDIA E A TOLERÂNCIA DA RÉ COM ILÍCITOS DA ORDEM DO EXAMINADO NOS AUTOS. APELAÇÃO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos da Apelação Cível nº 69014/07, em que figuram como Apelante LINAVE TRANSPORTE LTDA. e como Apeladas ROSINETE AVELINA DA SILVA e outra, ACORDAM os Desembargadores que compõem a 3.ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, por unanimidade, em sessão realizada em 28 de abril de 2009, em conhecer do Recurso e negar-lhe provimento, na conformidade do voto em separado.

Rio de Janeiro, 14 de maio de 2009.

Desembargador LUIZ FERNANDO RIBEIRO DE CARVALHO
Relator

V O T O

Ação indenizatória, proposta por ROSINETE AVELINA DA SILVA e DAMARIS SILVA DOS SANTOS, buscando a compensação de danos morais correspondentes a 100 salários mínimos para cada uma, sustentando que em 30/09/02 a 2ª Autora, após adentrar e pagar sua passagem em um dos ônibus da Ré, fez reclamações com o motorista tendo em vista a recusa deste à entrada da 1ª Autora, sua mãe. Afirmam que o preposto da Ré, após discussão, agrediu-as fisicamente e destacam que a 2ª Autora bateu com a cabeça no solo e ficou desacordada, vindo a ser socorrida por ambulância do Corpo de Bombeiros.

Pedem, por conseguinte, seja condenada a Ré ao pagamento de reparação por danos morais em quantia equivalente a 100 salários mínimos para cada uma, bem como a imputação dos ônus da sucumbência, com honorária fixada em 20%.

Sentença às fls. 143/146, julgando procedente o pedido, condenando a Ré ao pagamento da quantia de R$ 10.000,00, para cada Autora, a título de danos morais, corrigidos monetariamente a partir da publicação da sentença e juros legais de 1% ao mês, a contar da citação.

Apelação da Ré às fls. 147/159, na qual se pleiteia a reforma da sentença, com a improcedência do pedido, ou a redução do valor arbitrado a título de danos morais.

Contra-razões às fls. 164/166, prestigiando a sentença e pugnando por sua manutenção.

É o Relatório, passando-se ao voto.

Recurso tempestivo e preparado, pelo que, presentes seus demais requisitos de admissibilidade, dele se conhece.

No mérito, a r. sentença deu solução adequada à demanda, e não merecem acolhida os argumentos recursais, corroborando-se, no presente, os fundamentos adotados em 1ª instância.

Com efeito, a demanda é consumerista, porque a causa de pedir envolve uma relação de consumo, entre a Ré e a 2ª Autora (DAMARIS), e seus efeitos sobre a 2ª Autora. É incontroversa a existência de contrato de transporte entre a Ré e DAMARIS, e patente que a única razão para que a 1ª Autora estivesse presente - e em última análise fosse agredida - era a existência daquela relação.

Importa isso em que se aplicam ao caso as disposições do CDC, em especial as relativas à plena indenizabilidade dos danos (art. 6º, VI), à responsabilidade objetiva do fornecedor (art. 14) e aos acidentes de consumo (art. 17).

Destaque-se, também, doutrina de SERGIO CAVALIERI FILHO, quanto à imputação do risco do empreendimento ao fornecedor:

"Pela teoria do risco do empreendimento, todo aquele que se disponha a exercer alguma atividade no campo do fornecimento de bens e serviços tem o dever de responder pelos fatos e vícios resultantes do empreendimento, independentemente de culpa. Este dever é imanente ao dever de obediência às normas técnicas de segurança, bem como aos critérios de lealdade, quer perante os bens e serviços ofertados, quer perante os destinatários dessas ofertas. A responsabilidade decorre do simples fato de dispor-se alguém a realizar atividade de produzir, estocar e comercializar produtos ou executar determinados serviços" (4.ª edição, Malheiros Editores, 05/2003, pág. 473).

Muito embora a Ré impugne a narrativa autoral, buscando nuances na prova testemunhal para afirmar a ausência de nexo causal, e apontando a ausência de prova dos danos morais, não se pode concluir em sentido diverso do que foi consignado na sentença.

Está provado pelos documentos de fl. 12/13 o atendimento da 1ª Autora (ROSINETE), após o incidente, no Hospital Geral de Nova Iguaçu, conduzida pelo GSE do Corpo de Bombeiros, e, de forma mais eloquente, estão provadas as lesões sofridas pela 2ª Autora (DAMARIS) pelo que foi lançado no Auto de Exame de Corpo de Delito de fl. 15. Está provado, ademais, pelo depoimento de fl. 68, de minuciosa narrativa, que o motorista do ônibus, preposto da Ré, proibiu a entrada da 1ª Autora, e, após ofendê-la reiteradamente, agrediu-a fisicamente, socando-lhe o rosto, o que, evidentemente terá resultado nas lesões descritas no aludido documento de fl. 13, tendo agredido reiteradamente também sua filha, 2ª Autora.

É induvidoso, portanto, que os fatos transcorreram tal como narrados na inicial, e por isso inquestionáveis, também, a conduta ilícita do preposto da Ré e a existência de nexo causal entre esta e os danos sofridos pelas Autoras. A prova citada é suficiente à constatação da veracidade da narrativa autoral, não se podendo acolher as irrogações de contradição do testemunho, em relação a outros, como referido nas razões do apelo.

Em consequência, foi adequada a condenação da Apelante, fundada em fato do serviço, que ocasionou verdadeiro acidente de consumo, sendo necessária a indenização dos danos morais causados, na forma da jurisprudência:

Processo Civil. Ação indenizatória por danos morais, materiais, estéticos, pensão vitalícia e fixação de capital garantidor. Relação de consumo. Fato do Serviço. Agressão ao apelado por parte dos seguranças da casa noturna. Prova testemunhal e pericial da ocorrência do fato e o nexo causal. Sentença parcialmente procedente para condenar o réu ao pagamento de indenização por danos morais de R$20. 000,00 (vinte e mil reais), danos materiais e lucros cessantes, pensionamento mensal vitalício de 15% sobre os vencimentos do apelado e constituição de capital garantidor. Recurso desprovido, sentença que se mantém na íntegra. (Apelação 2008.001.34117 - 9ª Câmara Cível - Relator JDS.DES. RENATO RICARDO BARBOSA - Julgamento: 21/10/2008)

Responsabilidade civil. Consumidores agredidos por integrantes do corpo de segurança particular de shopping center. Sentença que condena o centro comercial ao pagamento de indenização por dano moral e lucros cessantes; julga improcedente a denunciação da lide à empresa de segurança privada contratada, e procedente o pedido secundário em face da companhia de seguros, reconhecendo seu direito de regresso contra o IRB. Apelações do réu e do IRB. 1. Descabida e injustificada a tese de culpa exclusiva das vítimas. Mesmo em se admitindo, em mero exercício de especulação, a alegação de que os consumidores-autores tenham mantido conduta imprópria nas dependências do centro comercial, tal não justifica a violência e truculência dos prepostos do réu. De uma pessoa comum, compreende-se que possa exceder-se na resposta a uma provocação, partindo até para as vias da força bruta; mas de alguém que se supõe profissional de segurança, isto é inconcebível. 2. A agressão dolosa é ato capaz de gerar dano moral, não só pela invulgar dor física, que por si só já reclama compensação, como ainda pelo verdadeiro achincalhe que daí decorre à honra de qualquer pessoa, máxime se o ilícito é praticado de sorte a impossibilitar a defesa do agredido, tornando tão mais cruel o ato. 3. Valor indenizatório que não encerra qualquer exagero, arbitrado até com comedimento excessivo, já que compatível ao que em regra se concede em casos de simples negativação do nome do consumidor. 4. A norma contida no art. 101, II, do CDC, visa a garantir maior celeridade à ação fundada na responsabilidade civil do fornecedor de produtos e serviços, evitando, ao lado do art. 88 da mesma lei, a intervenção de terceiros na lide (exceto na hipótese de contrato de seguro de responsabilidade), inclusive a integração do pólo passivo pelo IRB, que torna mais moroso o processo e longínquo o julgamento. Contudo, se os requerimentos nesse sentido já foram deferidos ao longo do processo, sem recurso da parte autora, embora em ofensa flagrante à sistemática processual do CDC, é de se concluir que os prejuízos que o consumidor poderá suportar em razão da demora processual já terão sido causados, de toda forma. 5. Nessas circunstâncias, melhor do que aplicar ao pé-da-letra o dispositivo legal e extinguir as lides secundárias quando já formada de fato a relação processual, aconselha-se a decisão que atende mais completamente à economia processual (visada nos próprios artigos citados do CDC), evitando que se instaurem novas ações autônomas, assoberbando inutilmente o Judiciário, com a desnecessária renovação de atos já praticados. 6. Com as ressalvas anteriores, é possível a denunciação da lide pela seguradora ao IRB, com ou sem fundamento no revogado art. 68 do Decreto-lei nº 73/66, conforme precedentes do Superior Tribunal de Justiça. 7. Com as mesmas ressalvas, procede o pedido secundário formulado, em sede de denunciação da lide, contra a empresa de vigilância privada, empregadora dos autores da agressão física que deu ensejo à presente ação. Desprovimento do primeiro recurso. Provimento parcial do segundo recurso. (Apelação 2008.001.07757 - 16ª Câmara Cível - Relator DES. MARCOS ALCINO A TORRES - Julgamento: 20/05/2008)

Não se verifica excesso, de outro turno, na quantia fixada para a reparação, como ademais se pode inferir do primeiro precedente acima transcrito, cabendo ponderar que, acerca da prova do dano moral e da valoração da respectiva reparação, na lição mais uma vez adotada de SERGIO CAVALIERI FILHO:

"...por se tratar de algo imaterial ou ideal a prova do dano moral não pode ser feita através dos mesmos utilizados para comprovação do dano material. Seria uma demasia, algo até impossível, exigir que a vítima comprove a dor, a tristeza ou a humilhação através de depoimentos, documentos ou perícia; não teria ela como demonstrar o descrédito, o repúdio ou desprestígio através dos meios probatórios tradicionais, o que acabaria por ensejar o retorno à fase da irreparabilidade do dano moral em razões de fatores instrumentais.

Neste ponto a razão se coloca ao lado daqueles que entendem que o dano moral está ínsito na própria ofensa, decorre da gravidade do ilícito em si..."

(...)

"Importa dizer que o juiz, ao valorar o dano moral, deve arbitrar uma quantia que, de acordo como o seu prudente arbítrio, seja compatível com a reprovabilidade da conduta ilícita, a intensidade e duração do sofrimento experimentado pela vítima, a capacidade econômica do causador do dano, as condições sociais do ofendido, e outras circunstâncias mais que se fizerem presentes." (Programa de Responsabilidade Civil, Malheiros Editores, 5ª edição, 2003, p. 101/102 e 108)

O aspecto punitivo da reparação por dano moral está bem caracterizado em precioso comentário de ANDRÉ GUSTAVO CORRÊA DE ANDRADE:

"A função punitiva

A consolidação da idéia de que a responsabilidade civil desempenha um papel profilático, de prevenção ou evitação do dano, tem aberto espaço, principalmente no campo da proteção dos direitos da personalidade, para o estabelecimento de sanção pecuniária não relacionada diretamente com a extensão do dano, com a finalidade de prevenir a prática de novos comportamentos ilícitos, violadores daqueles direitos especialmente caros ao homem.

(...)

Independentemente de qualquer previsão legal, a indenização punitiva do dano moral é aplicável em nosso ordenamento jurídico, porque retira seu fundamento diretamente de princípio constitucional. É no princípio da dignidade humana, estabelecido no art. 1º, inciso III, da Constituição Federal, que ela encontra sua base lógico-jurídica. A aplicação dessa forma especial de sanção constitui, também, consectário lógico do reconhecimento constitucional dos direitos da personalidade e do direito à indenização do dano moral, encartados no art. 5º, incisos V e X, da Constituição brasileira. Tais princípios constitucionais, como mandados de otimização que são, ou seja 'normas que ordenam que algo seja realizado na maior medida possível', ao mesmo tempo que consagram direitos de natureza fundamental, determinam ao operador jurídico que empregue todos os meios possíveis para a proteção desses direitos.

(...)

A indenização punitiva surge, no sistema jurídico vigente, não apenas como reação legítima e eficaz contra a lesão e a ameaça de lesão a princípios constitucionais da mais alta linhagem, mas como medida necessária para a efetiva proteção desses princípios. Com efeito, não é possível, em certos casos, conferir efetiva proteção à dignidade humana e aos direitos da personalidade senão através da imposição de uma sanção que constitua fator de desestímulo ou dissuasão de condutas semelhantes do ofensor, ou de terceiros que pudessem se comportar de forma igualmente reprovável."

(Dano Moral e Indenização Punitiva, Forense, 1ª edição, 2006, págs. 241, 251/252 e 253)

Ao contrário, a reparação de R$10.000,00 em favor de cada uma das Autoras chega a ser modesta, mal alcançando o chamado valor de desestímulo à desídia da Ré com o treinamento de seus motoristas, e a tolerância com aqueles que, em seu nome e para seu prejuízo, deixam de prestar os serviços públicos concedidos com a necessária urbanidade, para não dizer com um mínimo de civilidade.

Por tais fundamentos, conheço do presente Apelo, negando-lhe provimento.

Rio de Janeiro, 14 de maio de 2009.

LUIZ FERNANDO RIBEIRO DE CARVALHO
RELATOR




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