Anúncios


quinta-feira, 4 de junho de 2009

JURID - Inépcia da inicial. Prescrição. Fundaf. Ressarcimento. [04/06/09] - Jurisprudência

Jurisprudência Tributária
Inépcia da inicial. Prescrição. Fundaf. Ressarcimento dos custos das atividades extraordinárias de fiscalização em entrepostos de uso público.

Tribunal Regional Federal - TRF1ªR.

APELAÇÃO CÍVEL N. 2005.34.00.010654-4/DF

RELATOR(A): DESEMBARGADORA FEDERAL MARIA DO CARMO CARDOSO

APELANTE: EMPRESA DE REVITALIZACAO DO PORTO DE MANAUS - SPE

ADVOGADO: VERA CARLA NELSON CRUZ SILVEIRA E OUTROS(AS)

APELANTE: FAZENDA NACIONAL

PROCURADOR: LUIZ FERNANDO JUCA FILHO

APELADO: OS MESMOS

REMETENTE: JUIZO FEDERAL DA 14A VARA - DF

EMENTA

PROCESSUAL. TRIBUTÁRIO. INÉPCIA DA INICIAL. PRESCRIÇÃO. FUNDAF. RESSARCIMENTO DOS CUSTOS DAS ATIVIDADES EXTRAORDINÁRIAS DE FISCALIZAÇÃO EM ENTREPOSTOS DE USO PÚBLICO. NATUREZA JURÍDICA DE TAXA. ATIVIDADE TÍPICA ESTATAL, COMPULSORIEDADE, PODER DE POLÍCIA ALFANDEGÁRIA. DECRETO-LEI 1.455/1976. REVOGAÇÃO. ART. 25 DO ADCT.

1. Desnecessária a apresentação de documentos originais de recolhimento do tributo, não só porque a Fazenda Nacional dispõe do controle desses pagamentos, mas também pelo fato de que a prova do recolhimento deverá ocorrer na fase de liquidação do julgado.

2. Constituem documentos hábeis a comprovação do pagamento da exação as cópias autenticadas dos recolhimentos efetuados.

3. A Corte Especial deste Tribunal, em julgamento realizado em 02/10/2008, declarou a inconstitucionalidade da segunda parte do art. 4º da LC 118/2005, ou seja, afastado o pretenso caráter meramente interpretativo da norma, nos termos do voto da lavra do Desembargador Federal Leomar Amorim (AI na AC 2006.35.02.001515-0/GO). Assentado, também, que a aplicabilidade da LC 118/2005 se refere apenas a fatos geradores posteriores à sua vigência.

4. À luz do art. 145, II e § 2º, da CF/1988 e dos arts. 77 a 79 do CTN, entende-se por taxa a espécie tributária que tem por fato gerador a atuação estatal decorrente do exercício do poder de polícia ou da utilização efetiva ou potencial de serviços públicos específicos e divisíveis prestados ao contribuinte ou postos à sua disposição.

5. A fiscalização exercida nas áreas alfandegárias junto aos portos constitui atividade estatal típica, compulsória e decorrente do exercício do poder de polícia alfandegário, e sua remuneração não se caracteriza como preço público, mas como taxa.

6. Tratando-se de taxa, e, por ser considerada tributo, está sujeita às limitações do poder de tributar previstas constitucionalmente, ou seja, sua hipótese de incidência deveria ter base de cálculo, alíquota e contribuintes fundamentados em lei (art. 150, I, da CF c/c o art. 97 do CTN), em face do princípio da legalidade.

7. A obrigação tributária não foi devidamente delineada, quanto aos seus aspectos indispensáveis, pelos Decretos que instituíram o FUNDAF (Decreto-Lei 1.437/1975) ou que delegaram a competência ao Secretário da Receita Federal (Decreto-Lei 1.455/1976 e Decreto 91.030/1985).

8. Os elementos constitutivos da taxa foram previstos por atos regulamentares da Receita Federal. Os instrumentos normativos, frutos da delegação de competência previstas no Decreto-Lei 1.455/1976 e no Decreto 91.030/1985, não mais subsistem ante o disposto no art. 25 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.

9. Se o fundamento para a regulamentação foi revogado, inviável a cobrança da referida taxa também após os 180 dias da vigência da CF/1988, nos termos do art. 25 do ADCT, pois os instrumentos normativos que fixaram seus elementos constitutivos, em observância à delegação de competência prevista no Decreto-Lei 1.455/1976 e no Decreto 91.030/1985, não mais subsistem.

10. A cobrança realizada esteve embasada em preceito legal em branco, pois o Decreto-Lei 1.455/1976 não definiu suficientemente todos os elementos constitutivos da referida taxa, nos moldes do art. 97 e incisos do CTN.

11. Apelação da autora a que se dá provimento.

12. Apelação da Fazenda Nacional e remessa oficial a que se nega provimento.

ACÓRDÃO

Decide a Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação da autora e negar provimento à apelação da Fazenda Nacional e à remessa oficial, nos termos do voto da Relatora.

Brasília/DF, 10 de março de 2009.

Desembargadora Federal Maria do Carmo Cardoso
Relatora

RELATÓRIO

A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL MARIA DO CARMO CARDOSO (RELATORA):

Estas apelações foram interpostas pela União e pela EMPRESA DE REVITALIZAÇÃO DO PORTO DE MANAUS - SPE da sentença proferida pelo Juízo Federal da 14ª Vara da Seção Judiciária do Distrito Federal, que, nos autos da ação proposta pelo rito ordinário, declarou a inexigibilidade da taxa de ressarcimento de despesas administrativas decorrentes da atividade extraordinária de fiscalização em entrepostos aduaneiros, instituída pelo Decreto-Lei 1.455/1976, nos termos vigentes até 180 depois do advento da promulgação da atual Constituição, assim como da ilicitude da sanção de cancelamento do alfandegamento por falta de pagamento da referida taxa. Condenou a União à repetição dos valores recolhidos indevidamente, ao ressarcimento das custas processuais adiantadas e verba honorária no importe de 5% sobre o valor da condenação.

O MM. Magistrado sentenciante rejeitou a preliminar de inépcia da inicial. No mérito, entendeu que a natureza do ressarcimento em questão é de tributo da espécie taxa, e, portanto, todos os seus elementos constitutivos devem estar previstos em lei.

Assentou que a regulamentação da taxa por ato do Secretário da Receita Federal que importe em alterar a legislação, como vigia até 180 dias depois da promulgação da CF/1988, relativamente a um dos elementos essenciais, viola o art. 150, I, da CF.

Quanto ao Decreto 1.912/1996, afirmou não ter trazido novidades no que se refere aos contribuintes, atuando suplementarmente ao Decreto 1.455/1976, que já definia com suficiência o fato gerador e os contribuintes da taxa, relegando ao regulamento legitimamente a definição do quantum respectivo. Rejeitou, pois, a inconstitucionalidade do art. 22 do Decreto 1.455/1976.

Afastou a tese de que apenas por serviços extraordinários de fiscalização, a exação poderia ser cobrada, pois tais serviços devem estar aparelhados para exercer suas atribuições, ordinariamente em qualquer dia e hora, a fim de desembaraçar, a tempo e modo, as mercadorias que chegam aos portos e deles saem, sendo que o custo desse aparelhamento deve ser suportado pelos permissionários, beneficiários, concessionários e usuários dos serviços portuários.

No que se refere à sanção de cancelamento do alfandegamento, entendeu pela sua inaplicabilidade, pois em se tratando de taxa de polícia, o Fisco deve constituir o respectivo crédito e cobrá-lo pelas vias próprias.

Os embargos de declaração opostos pela empresa autora foram rejeitados.

A autora apela, sustentando que a sentença incorreu em duas contradições. A primeira entre a premissa de que as normas vigentes nos 180 dias seguintes à promulgação da Carta de 1988 tratavam, unicamente, do elemento pessoal da norma de tributação e a conclusão de que o tributo pode ser exigido com base nessas normas, sem os demais elementos - quantitativo, temporal e espacial.

A segunda, no fato de o magistrado ter declarado o direito de o Fisco constituir créditos com base nas normas vigentes dentro do prazo da norma transitória, e, ao mesmo tempo, reconheceu que essas regras eram insuficientes para sustentar a exigência do tributo.

Requer, assim, o provimento da presente apelação, para fins de procedência integral das pretensões deduzidas na inicial.

Nas razões recursais, a União suscita a ocorrência da prescrição, nos termos do art. 3º da Lei Complementar 118/2005.

No mérito, afirma que a receita cobrada da autora tem natureza jurídica de preço público. Defende que não há violação ao art. 150, I, da CF, ou art. 97 do CTN, pois o pressuposto de validade da cobrança da contribuição ao FUNDAF por fiscalização aduaneira consiste no Decreto-Lei 1.455/1976 (art. 22).

Ressalta que tal decreto-lei continua em vigor com as alterações trazidas pela Medida Provisória 2.158-35/2001. Conclui que não se pode cogitar em delegação de competência tributária ou ofensa ao princípio da legalidade tributária, pois a exigência em causa não é tributo.

Pleiteia, dessa forma, o provimento do apelo e a reforma da sentença, para julgar improcedentes os pedidos.

Contrarrazões apresentadas às fls. 394/403.

É o relatório.

VOTO

A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL MARIA DO CARMO CARDOSO (RELATORA):

DA INÉPCIA DA INICIAL:

Correto o entendimento adotado pelo douto Magistrado a quo quanto à desnecessidade de apresentação de documentos originais de recolhimento do tributo, não só porque a Fazenda Nacional dispõe do controle desses pagamentos, mas pelo fato de que a prova do recolhimento deverá ocorrer na fase de liquidação do julgado.

Ainda que assim não fosse, as cópias autenticadas acostadas às fls. 297/320 constituem documentos hábeis a comprovação do pagamento da exação.

DA PRESCRIÇÃO - LC 118/2005:

A União, em suas razões recursais, suscita a ocorrência da prescrição, nos moldes da LC 118/2005, e superação da tese dos cinco mais cinco.

No entanto, a Corte Especial deste Tribunal, em julgamento realizado em 02/10/2008, declarou a inconstitucionalidade da segunda parte do art. 4º da LC 118/2005, ou seja, afastado o pretenso caráter meramente interpretativo da norma, nos termos do voto da lavra do Desembargador Federal Leomar Amorim (AI na AC 2006.35.02.001515-0/GO). Assentado, também, que a aplicabilidade da LC 118/2005 se refere apenas a fatos geradores posteriores à sua vigência.

Além da inaplicabilidade do prazo prescricional previsto na LC 118/2005 ao caso em tela, conforme fls. 297/320, os recolhimentos ora impugnados foram realizados nos cinco anos anteriores ao ajuizamento desta ação - 15/04/2005.

DA NATUREZA JURÍDICA:

A discussão posta nestes autos refere-se à contribuição para o FUNDAF - Fundo Especial de Desenvolvimento e Aperfeiçoamento das Atividades de Fiscalização, a título de ressarcimento dos custos das atividades extraordinárias de fiscalização em entrepostos aduaneiros de uso público, instituída pelo Decreto-Lei 1.455/1976, art. 22, e regulamentada por atos do Poder Executivo - Decreto 1.912/1996 e Instruções Normativas/SRF 37 e 48/1996.

O Decreto-Lei 1.437/1975 criou o FUNDAF, nos termos do art. 6º, in verbis:

Fica instituído, no Ministério da Fazenda, o Fundo Especial de Desenvolvimento e Aperfeiçoamento das Atividades de Fiscalização - FUNDAF, destinado a fornecer recursos para financiar o reaparelhamento e reequipamento da Secretaria da Receita Federal, a atender aos demais encargos específicos inerentes ao desenvolvimento e aperfeiçoamento das atividades de fiscalização dos tributos federais e, especialmente, a intensificar a repressão às infrações relativas a mercadorias estrangeiras e outras modalidades de fraude fiscal ou cambial, inclusive mediante a instituição de sistemas especiais de controle do valor externo de mercadorias e de exames laboratoriais.

As fontes de recursos do referido Fundo são as dotações específicas consignadas em lei de orçamento ou em créditos adicionais; receitas diversas, decorrentes de atividades próprias da SRF; outras receitas que lhe foram atribuídas por lei (art. 8º); assim como o produto do recolhimento dos encargos de que trata o art. 1º do Decreto-Lei 1.025/1969.

Diversamente das alegações trazidas pela Fazenda Nacional, o pagamento, a título de ressarcimento das despesas das atividades de fiscalização exercidas nas áreas alfandegárias junto aos portos destinados ao FUNDAF (art. 22 do Decreto-Lei 1.455/1976), tem natureza jurídica de taxa.

Na busca em estabelecer a diferença entre taxa e preço público, o STF, na edição da Súmula 545 do Supremo Tribunal Federal, assentou que:

Preços de serviços públicos e taxas não se confundem, porque estas, diferentemente daquelas, são compulsórias, e têm sua cobrança condicionada à prévia autorização orçamentária, em relação à lei que as institui.

Constitui taxa a espécie tributária que tem por fato gerador a atuação estatal decorrente do exercício do poder de polícia ou da utilização efetiva ou potencial de serviços públicos específicos e divisíveis prestados ao contribuinte ou postos à sua disposição, à luz do art. 145, II e § 2º, da CF/1988 e dos arts. 77 a 79 do CTN.

Para análise do caso em tela, convém, ainda, refletir a respeito dos atributos que ensejam a exação tributária taxa. O Código Tributário Nacional, pautando-se no texto constitucional (art. 145, II), nos arts. 77 a 79, dispõe que:

Art. 77. As taxas cobradas pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal ou pelos Municípios, no âmbito de suas respectivas atribuições, têm como fato gerador o exercício regular do poder de polícia, ou a utilização, efetiva ou potencial, de serviço público específico e divisível, prestado ao contribuinte ou posto à sua disposição.

Parágrafo único. A taxa não pode ter base de cálculo ou fato gerador idênticos aos que correspondam a imposto nem ser calculada em função do capital das empresas.

Art. 78. Considera-se poder de polícia atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranqüilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos.

Parágrafo único. Considera-se regular o exercício do poder de polícia quando desempenhado pelo órgão competente nos limites da lei aplicável, com observância do processo legal e, tratando-se de atividade que a lei tenha como discricionária, sem abuso ou desvio de poder.

Art. 79. Os serviços públicos a que se refere o artigo 77 consideram-se:

I - utilizados pelo contribuinte:

a) efetivamente, quando por ele usufruídos a qualquer título;

b) potencialmente, quando, sendo de utilização compulsória, sejam postos à sua disposição mediante atividade administrativa em efetivo funcionamento;

II - específicos, quando possam ser destacados em unidades autônomas de intervenção, de unidade, ou de necessidades públicas;

III - divisíveis, quando suscetíveis de utilização, separadamente, por parte de cada um dos seus usuários.

Há necessidade de que o serviço público prestado ao contribuinte, como fato gerador da taxa, (i) seja específico, quando possam ser destacados em unidades autônomas de intervenção, de unidade, ou de necessidades públicas; (ii) seja divisível, quando suscetível de utilização, separadamente, por parte de cada um dos seus usuários, sendo essa a intenção do constituinte originário; (iii) tenha como fator a atuação estatal decorrente da utilização efetiva ou potencial de serviços públicos específicos.

Na hipótese dos autos, a fiscalização exercida nas áreas alfandegárias junto aos portos constitui atividade estatal típica, compulsória, e sua remuneração não se caracteriza como preço público, mas como taxa.

A 3ª Turma deste Tribunal, na AC 2000.01.00.059523-7/DF, sob a relatoria do Desembargador Federal Olindo Menezes, considerando a natureza jurídica da referida remuneração, ponderou que:

A cobrança ocorre em caráter coativo, em função das atividades extraordinárias de fiscalização, nos termos do Decreto-lei nº 1.455, de 07/04/1976, pois nos locais não existem unidades instaladas da Secretaria da Receita Federal, atividade típica do fisco que, não podendo ser objeto de delegação a particulares, não tem natureza contratual, como pretendido.

O preço público não tem caráter obrigatório e corresponde a serviços de natureza exclusivamente privada, industriais ou comerciais, prestados pelo Estado, tendo a parte a liberdade de usá-los ou não, o que não ocorre no caso, onde os recolhimentos eram obrigatórios por parte da apelada e remuneravam atividades exclusivamente públicas.

Definida a natureza jurídica, passo ao exame da legalidade da referida taxa.

Embora a instituição do FUNDAF tenha se dado pelo Decreto-Lei 1.437/1975, não há menção à cobrança dos valores destinados ao Fundo.

Com a edição do Decreto-Lei 1.455/1976, no art. 22, ficou estabelecido que:

Art 22. O regulamento fixará a forma de ressarcimento pelos permissionários beneficiários, concessionários ou usuários, das despesas administrativas decorrentes de atividades extraordinárias de fiscalização, nos casos de que tratam os artigos 9º a 21 deste Decreto-lei, que constituirá receita do Fundo Especial de Desenvolvimento e Aperfeiçoamento das Atividades de Fiscalização - FUNDAF, criado pelo Decreto-lei número 1.437, de 17 de dezembro de 1975.

O Decreto 91.030/1985 atribuiu ao Secretário da Receita Federal a competência para fixar a forma de ressarcimento pelos permissionários beneficiários, concessionários ou usuários, das despesas administrativas decorrentes das atividades de fiscalização.

Somente em 1993 e 1996, sob a vigência da Constituição de 1988, com as Instruções Normativas 14 e 48, foram fixados os valores e as diretrizes para cobrança do referido ressarcimento.

Tratando-se de taxa, e, por ser considerada tributo, está sujeita às limitações do poder de tributar previstas constitucionalmente, ou seja, sua hipótese de incidência deveria ter base de cálculo, alíquota e contribuintes fundamentados em lei (art. 150, I, da CF c/c o art. 97 do CTN), em face do princípio da legalidade.

In casu, a obrigação tributária não foi devidamente delineada, quanto aos seus aspectos indispensáveis, pelos Decretos que instituíram o FUNDAF ou que delegaram a competência ao Secretário da Receita Federal.

Os elementos constitutivos da taxa foram previstos por atos regulamentares da Receita Federal. Referidos instrumentos normativos, frutos da delegação de competência prevista no Decreto-Lei 1.455/1978 e no Decreto 91.030/1985, não mais subsistem ante o disposto no art. 25 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, que assim dispõe:

Ficam revogados, a partir de cento e oitenta dias da promulgação da Constituição, sujeito este prazo a prorrogação por lei, todos os dispositivos legais que atribuam ou deleguem a órgão do Poder Executivo competência assinalada pela Constituição ao Congresso Nacional, especialmente no que tange: I - ação normativa; II - alocação ou transferência de recursos de qualquer espécie.

Ora, uma vez definida a natureza jurídica de taxa do ressarcimento pelos permissionários beneficiários, concessionários ou usuários, das despesas administrativas decorrentes de atividades extraordinárias de fiscalização (DL 1.455/1976, não há dúvidas de que se trata de competência assinalada pela Constituição Federal ao Congresso Nacional, nos termos do art. 145, II, da CF/1988.

Nessa linha, cito alguns precedentes jurisprudenciais, in verbis:

TRIBUTÁRIO. FUNDO ESPECIAL DE DESENVOLVIMENTO E APERFEIÇOAMENTO DAS ATIVIDADES DE FISCALIZAÇÃO - FUNDAF. TAXA. PREÇO PÚBLICO. PRINCÍPIO DA LEGALIDADE.

1. A contribuição ao Fundaf não tem previsão contratual nem constitui remuneração pela exploração das instalações portuárias, não havendo previsão tampouco na Lei nº 8.630/93, que traz o regime jurídico da exploração dos portos organizados e das instalações portuárias nacionais.

2. O Decreto-lei nº 1.437/75, que instituiu o FUNDAF, não criou a taxa, assim como não o fez o Decreto-lei nº 1.455/76. O Decreto nº 91.030/85 atribuiu competência ao Secretário da Receita Federal, o qual, por meio de instrução normativa, veio dispor sobre sujeição passiva e valores devidos, inobservando o princípio da legalidade em matéria tributária.

3. Ausente a base legal para a imposição tributária, torna-se esta indevida. Os valores recolhidos pela autora a título de taxa ao Fundaf, a serem apurados oportunamente, devem ser-lhe restituídos, com incidência da taxa Selic, que incide como correção monetária e juros de mora. (TRF4, AC 2002.72.08.000127-3, Primeira Turma, Relatora Vivian Josete Pantaleão Caminha, D.E. de 31/07/2007)

TRIBUTÁRIO. FUNDO ESPECIAL DE DESENVOLVIMENTO E APERFEIÇOAMENTO DAS ATIVIDADES DE FISCALIZAÇÃO - FUNDAF. TAXA. PRINCÍPIO DA LEGALIDADE.

A contribuição ao FUNDAF constitui taxa, porquanto compulsória e destinada a custear atividades estatais típicas de polícia. A referida taxa não foi criada pelo Decreto-lei nº 1.437/75, que instituiu o FUNDAF, tampouco pelo Decreto-lei nº 1.455/76. O Decreto nº 91.030/85 atribuiu competência ao Secretário da Receita Federal, o qual, através de instrução normativa, veio dispor sobre sujeição passiva e valores devidos, inobservando o princípio da legalidade em matéria tributária. Indevida a imposição tributária, pois ausente a base legal. (AC 200572050036833/SC, Desembargador Federal Eloy Bernst Justo, DJ de 30/01/2008).

A sentença recorrida assentou que o ressarcimento de despesas de fiscalização, estabelecido no art. 22 do Decreto-Lei 1.455/1976, somente poderia ser cobrado nos termos da regulamentação vigente até 180 dias depois da vigência da Constituição de 1988.

Considerou, na apreciação dos embargos declaratórios, que se até o prazo fixado no ADCT não se complementaram os requisitos do tributo, daí afirmar-se nos embargos, haver "impossibilidade material e jurídica de exigência do tributo por falta de vários dos seus componentes estruturais', essa questão não foi declinada como causa de pedir na petição de ingresso.

Nesse ponto, razão assiste à autora, ora apelante, uma vez que não se trata de inovação da causa de pedir, mas de evidente contradição entre os fundamentos de matéria implícita ao pedido expostos na sentença e sua conclusão.

Expressamente consignado na sentença que o disposto no art. 22 do Decreto-Lei n. 1.455, de 1976, não é inconstitucional, pois foi revogado pelo art. 25 do ADCT, configurando-se, em verdade, inconstitucional a regulamentação (instruções normativas) editada ao seu fundamento.

Se o fundamento para a regulamentação foi revogado, inviável a cobrança da referida taxa também após os 180 dias da vigência da CF/1988, nos termos do art. 25 do ADCT, pois os instrumentos normativos que fixaram seus elementos constitutivos, em observância à delegação de competência previstas no Decreto-Lei 1.455/1976 e no Decreto 91.030/1985, não mais subsistem.

A cobrança realizada esteve embasada, assim, em preceito legal em branco. Diversamente do quanto assentado na sentença, o Decreto-Lei 1.455/1976 não definiu suficientemente todos os elementos constitutivos da referida taxa, nos moldes do art. 97 e incisos do CTN.

Tal premissa reforça a ilegalidade e, via de consequência, a impossibilidade da sua exigência, assim como o direito de a autora ver restituídos os valores indevidamente pagos.

Outrossim, incabível a sanção de cancelamento do alfandegamento, não só pelos fundamentos expostos neste voto, mas pelo fato de que essa sanção não pode ser utilizada como meio coercitivo para pagamento de tributo, conforme Enunciado 323 da Súmula do STF.

DISPOSITIVO:

Ante o exposto, dou provimento à apelação da autora e nego provimento à apelação da Fazenda Nacional e à remessa oficial.

É como voto.

VOTO VOGAL

O DESEMBARGADOR FEDERAL LEOMAR AMORIM: Senhora Presidente, na Turma, por diversas vezes, enfrentamos questão referente à constitucionalidade de taxas, sobretudo taxa de lixo. Quanto à doutrina deste tipo tributário, nós já temos mais ou menos o domínio. A Constituição e o Código Tributário estabeleceram como tipos de taxa as duas modalidades conhecidas: a taxa cobrada em razão do poder de polícia e a taxa de serviço. O pressuposto da cobrança de taxa é o de que o Estado preste um serviço público, divisível, específico, referente ao contribuinte, ao utente desse serviço.

O Supremo Tribunal, em relação à taxa, e a própria doutrina têm grandes vacilações sob o aspecto doutrinário, sobretudo no tocante a um campo um pouco cinzento, nebuloso, de se saber em que momento alguns tipos de taxa podem ser cobrados por preço público ou por taxa. No caso, não vou me alongar, porque o voto de Vossa Excelência é detalhado, fundamentado, e examinou todos os aspectos da questão, mas eu me limitaria a verificar logo - fugindo a essa questão epistemológica de saber se isso é uma taxa de serviço ou se é uma taxa de polícia - e me comprometeria com a tese de que se trata de uma taxa de polícia, porque o art. 22 deste Decreto 1.455, expressamente, diz que essa imposição fiscal é cobrada em razão de despesas decorrentes de atividades extraordinárias de fiscalização.

O Código Tributário, no art. 78, define o que é poder de polícia, e entre a longa definição descritiva dos acontecimentos materiais que caracterizam o fato gerador dessa exação fiscal está, por exemplo: disciplina da produção do mercado, exercício de atividades econômicas etc. Então, não há dúvida, a meu ver, que, neste caso, independentemente do nomem juris, se trata de taxa de polícia.

O STF, no julgamento do RE n. 89.876, o Relator, Ministro Moreira Alves, faz algumas afirmações sobre a questão de saber quando se pode cobrar preço público e quando se pode cobrar taxa em razão do serviço público. O Ministro, nesse julgado, referendado pelo Plenário do STF, diz: "1. O legislador não pode optar livremente entre taxa e preço público; 2. O regime jurídico deve ser o de taxa, sempre que se pretenda cobrar a exação pelo mero uso potencial; 3. A circunstância de uma taxa só se cobrar pelo uso efetivo do serviço não a desnatura; 4. Os serviços propriamente públicos, os quais o Estado tem o dever de prestar, por isso mesmo obrigatórios, só se compadece com a noção de taxa". Portanto, neste caso, como se trata de serviço de polícia, o Estado não tem outra opção senão a de exigir na contraprestação desses serviços o pagamento de taxa e não preço público.

Fixada essa premissa de que se trata de taxa, vamos para a Constituição e para o Código Tributário Nacional. A Constituição exige desse tipo de tributário, cujo fato material não é nem do contribuinte, é do Estado, porque este é que tem que prestar o serviço, o mesmo regime jurídico dos tributos. A taxa é uma espécie tributária, portanto, está sujeita ao princípio da legalidade, anterioridade, etc. Essa parte Vossa Excelência bem desenvolveu, estou de acordo.

Ainda que se pudesse admitir delegação legislativa na vigência da Constituição anterior, que acho que não seria possível, em face do princípio da tipicidade cerrada, porque a norma que cria o tributo é fechada, ela não permite que outros atos infra legais preencham o campo dos aspectos que definem o tipo. Então, quando a lei nasceu, ela não preenchia essa exigência de ser uma norma que estabelecia, em homenagem ao princípio da legalidade, um tipo cerrado. O Professor Luis Barroso lembra, em trabalho doutrinário, que no Direito norte-americano a Suprema Corte admitiu delegação legislativa ao Executivo em duas hipóteses: Delegation with standards e fill up details. Na Delegation with standards a lei delegaria ao Executivo a atuação em determinados espaços não preenchidos pelo legislador, mas com standards, com parâmetros determinados. A outra forma, a do fill up details, o Executivo apenas preencheria detalhes e não propriamente criaria a norma. Mas é evidente que as constituições brasileiras, pelo menos de 1946 para cá, sem fazer uma rememoração histórica, sempre criaram o tipo tributário como tipo fechado. A regra é essa. E mesmo o decreto-lei, que tem força de lei, quando tinha o poder de criar o tributo, ele próprio já devia veicular todos esses elementos que foram definidos aqui: material, objetivo, espacial, territorial, quantitativo, etc., do tributo, e este decreto não atende este requisito, seja no regime anterior, seja no regime atual.

E, ad argumentandum que ele tivesse valor jurídico, à luz do regime constitucional anterior, ele estaria revogado pelo art. 25 da Constituição, e aqui se usa o critério cronológico ou o hierárquico para solucionar o conflito de normas no tempo. A Constituição é uma lei posterior que revogou esse decreto, seja pelo critério cronológico, seja pelo hierárquico. Como havia uma série de delegações legislativas veiculadas em normas esparsas, que o constituinte não tinha controle, ele próprio escreveu no ADCT, no art. 25, essa norma de que no prazo de cento e oitenta dias ficariam revogadas todas as delegações normativas que tivesse o Executivo recebido, se não fossem revalidadas neste período.

Em conclusão: Trata-se de taxa cobrada em razão do poder de polícia. Por se tratar de taxa, está sujeito ao regime jurídico do art. 142 da Constituição e do art. 77 e seguintes do Código Tributário Nacional. Portanto, não satisfazendo esse ato normativo os pressupostos do tipo tributário taxa, não pode prevalecer.

Assim, pelos fundamentos já bem desenvolvidos por Vossa Excelência, eu acompanho o seu douto voto, para, na conclusão, dar provimento à apelação da autora e negar provimento à apelação da Fazenda Nacional e à remessa oficial.




JURID - Inépcia da inicial. Prescrição. Fundaf. Ressarcimento. [04/06/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário