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terça-feira, 23 de junho de 2009

JURID - Iate Clube é condenado a indenizar criança. [23/06/09] - Jurisprudência


Iate Clube é condenado a indenizar criança acidentada em suas dependências.


Circunscrição: 1 - BRASÍLIA
Processo: 2002.01.1.115241-0
Vara: 207 - SÉTIMA VARA CÍVEL

Processo: 2002.01.1.115241- 0
Ação: Indenização de danos materiais c/c reparação por danos estéticos.

Lide Principal:
Autora: PEDRO HENRIQUE DE ALMEIDA NLOFRANO, representado por sua genitora NEILÂNDIA MARIS OTAVIANO ALMEIDA ALVES.
Réu: IATE CLUBE DE BRASÍLIA

Lides Secundárias:
1ª Denunciação:
Ré/Litisdenunciante: IATE CLUBE DE BRASÍLIA

Litisdenunciada: VERA CRUZ SEGURADORA S/A

2ª Denunciação:
Segunda Litisdenunciante: VERA CRUZ SEGURADORA S/A
Segunda Litisdenunciada: INSTITUTO DE RESSEGUROS DO BRASIL

SENTENÇA

RELATÓRIO

Cuida-se de AÇÃO DE INDENIZAÇÃO DE DANOS MATERIAIS C/C REPARAÇÃO de DANOS ESTÉTICOS ajuizada por PEDRO HENRIQUE DE ALMEIDA NLOFRANO, representado por sua genitora NEILÂNDIA MARIS OTAVIANO ALMEIDA ALVES, em desfavor de IATE CLUBE DE BRASÍLIA, partes qualificadas nos autos.

Alega o autor, em síntese (fls. 02/08), que é frequentador dos estabelecimentos da parte ré desde 1988, que faz parte da estrutura predial da ré uma sauna que, segundo o autor, é circundada por uma calçada e passível de acesso por crianças, que utilizam o local para brincar.

Aduz que as janelas da sauna são tipo basculantes, e que sempre permaneceram fechadas, isso porque se tais janelas fossem conservadas abertas não seria possível o acesso ao calçamento que circunda a mencionada sauna.

Alega, ainda, que no dia 17.02.2002 uma das janelas encontrava-se aberta para fora sem qualquer advertência, fato que nunca havia ocorrido, demonstrando, segundo o autor, negligência por parte da ré. Aduz que em virtude disso, ao brincar como de costume na calçada da sauna, o autor colidiu com a janela aberta, fato que ocasionou um corte de 5 cm em sua testa.

Aduz, também, que os primeiros socorros ao autor foram prestados pelo serviço médico do clube, ora réu, havendo sido transferido, posteriormente, ao Hospital Santa Lúcia.

Alega que, em virtude do ferimento, a despeito de terem sido efetuados diversos procedimentos médicos, ficou uma cicatriz na região da testa do autor que informa, também, as datas dos procedimentos realizados, bem como as datas e números das notas fiscais referentes a tais atendimentos.

Traz ao conhecimento deste juízo que não houve contato, por parte da administração do réu, com os genitores do autor para que fossem ressarcidas as despesas médicas arcadas por eles, em virtude do acidente. Aduz, ainda, que o réu modificou o local do acidente, havendo transformado a calçada que envolvia a sauna em canteiros e jardim. Requer a condenação da parte ré ao pagamento dos danos materiais suportados pelo autor pertinentes ao tratamento médico e medicamentos, equivalentes a R$2.019,57, conforme notas fiscais e recibos acostados aos autos; bem como ao valor de R$8.000,00 a título de danos estéticos. A inicial foi instruída com os documentos de fls. 09/39.

Determinada emenda à inicial, fl. 41, foi apresentada a emenda de fl. 44, especificando o valor dos pedidos e adequando o valor da causa.

A emenda ofertada foi recebida à fl. 46, oportunidade em que foi ordenada a citação.

O réu foi devidamente citado, conforme AR de fl. 49, tendo apresentado contestação às fls. 54/67, refutando as alegações do autor, afirmando que não era costume haver crianças brincando no local do acidente, que o prédio da sauna foi construído "dentro das normas da ABNT- ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS". Alega que o ambiente é frequentado exclusivamente por adultos; que a sauna foi construída em local isolado, distante dos locais destinados a atividades infantis.

Aduz que o local do acidente é impróprio para o passeio de crianças, atribuindo o acidente a "culpa exclusiva da vítima" e "absoluta falta de cuidado de seus genitores". Aduz, ainda, que não foi feita uma reforma no local do acidente, como alega o autor, mas sim uma "alteração paisagística", fl. 59, sem ligação com o acidente.

Afirma, ainda, à fl. 60 da contestação, que "o local escolhido pelo autor para patinar representava sérios perigos", nunca tendo sido admitida a prática de patinação, ciclismo ou corridas infantis ao redor do prédio. Requer sejam julgados improcedentes os pedidos deduzidos na inicial, condenando-se o autor nas verbas de sucumbência. A contestação veio acompanhada de documentos de fls. 68/91.

Às fls. 93/96, apesar de não concomitantemente à contestação, mas ainda no prazo para resposta, foi apresentada denunciação da lide em desfavor de VERA CRUZ SEGURADORA, tendo sido admitido o pedido de denunciação da lide, conforme fl. 97. A litisdenunciada foi devidamente citada (fl. 103), tendo apresentado a contestação de fls. 120/124, no bojo da qual a litisdenunciada Vera Cruz Seguradora S/A procedeu, por sua vez, a uma segunda denunciação à lide, o fazendo em desfavor do Instituto de Resseguros do Brasil, admitida à fl. 173.

Alega a primeira litisdenunciada que o seguro firmado entre ela e o IATE CLUBE DE BRASÍLIA prevê a cobertura por RESPONSABILIDADE CIVIL-OPERAÇÕES, afirmando que o referido seguro a

barca apenas as condenações por danos materiais e corporais, não prevendo tal apólice a cobertura do seguro para danos morais, que por ventura venha a ser condenado o réu/denunciante. No mérito, aduz que o acidente ocorreu por culpa exclusiva da vítima, ressaltando ter o autor agido com negligência. Acompanharam a contestação da litisdenunciada os documentos de fls. 13/166.

O Instituto de Resseguros do Brasil, segundo litisdenunciado, foi devidamente citado, conforme fl.239, tendo apresentado a contestação de fls. 227/238, aduzindo, em preliminar, descabimento da denunciação da lide, pleiteando sua admissão na lide como assistente litisconsorcial, nos termos do art. 54 do CPC, não como denunciado. No mérito requer a improcedência dos pedidos formulados pelo autor por ausência de culpa da parte ré.

Manifestação do Órgão Ministerial à fl. 249.

À fl. 260 foi proferida decisão interlocutória suspendendo a audiência que havia sido designada e chamando o feito à ordem para tornar sem efeito as fls. 167 e 240, e determinar a intimação da ré para manifestação, em réplica, quanto à contestação apresentada pela litisdenunciada e desta sobre a contestação apresentada pelo segundo litisdenunciado. Na mesma oportunidade foi determinada a exibição pela parte ré das normas da ABNT para construção de saunas, conforme havia sido requerido à fl. 246.

Às fls. 267/271 consta réplica à contestação apresentada pela primeira litisdenunciada, aduzindo a parte ré que, havendo condenação para o pagamento de indenização, a seguradora deve arcar com todo o prejuízo sofrido pelo segurado (réu), deixando, todavia, de exibir a documentação que havia sido determinada através da decisão de fl. 260 (itens 8 e 9 de fls. 270 2 271).

Por sua vez, a primeira litisdenunciada, Vera Cruz Seguradora S/A, apresentou réplica à contestação do IRB, segundo litisdenunciado, às fls. 274/275, aduzindo não ter o instituto negado a existência de resseguro, tendo sido a denunciação efetivada na forma do art. 70, III, do CPC.

Proferido despacho à fl. 277, facultando a especificação de provas, as partes se manifestaram às fls. 280 e 281, e enquanto as litisdenunciadas se manifestaram às fls. 279 e 282.

O Ministério Público se manifestou requerendo a juntada dos róis de testemunhas e de certidão de nascimento do autor (fl.284), tendo o autor se manifestado às fls. 291/292, enquanto a parte ré permaneceu inerte, conforme fl. 297, sendo proferida a decisão de fl. 299, determinando designação de audiência de instrução e julgamento, bem como a oitiva do representante legal do réu e da representante do autor, deferindo o pedido de exibição de documentos requerido à fl. 280.

Através da petição de fls. 314/315 o réu Iate Clube de Brasília informou não existir "norma específica da ABNT para construção de saunas", mas apenas normas gerais de edificação, aduzindo "reconsideração ao alegado na defesa".

Audiência de instrução e julgamento realizada conforme fls. 324/331, na qual tendo restado infrutífera a tentativa de conciliação, foi proferida a decisão de fl. 325, tendo por ilegítima a pretensão da ré de substituir um fundamento de defesa por outro. Na mesma oportunidade, foi ouvida a genitora do autor, fls. 328/329. Considerando a ausência do representante legal do réu, que não havia sido intimado, pessoalmente, para prestar depoimento pessoal, não foi aplicada pena de confissão, sendo ouvido o preposto Sérgio Correa Gama como testemunha do juízo, fls. 330/331, na qualidade de informante (conforme fl. 325 parte final), tendo a parte autora e o Ministério Público desistido da oitiva do representante legal da ré. Na referida audiência foi mantida a decisão que deferiu a segunda denunciação à lide, fl. 326. Em razão disso, foi interposto pelo IRB agravo retido, oportunizando-se à litisdenunciante a apresentação de contrarrazões, na forma do art. 523, § 2º, do CPC, sendo mantida a decisão agravada, fl. 327.

Às fls. 338/347 foi apresentada pela litisdenunciada VERA CRUZ SEGURADORA, o documento pertinente ao resseguro.

Foram apresentadas as razões finais da primeira litisdenunciada às fls. 348/357, por meio de memoriais.

Alegações finais apresentadas pelo autor às fls. 374/375; pela parte ré às fls. 358/362; pela primeira litisdenunciada às fls. 348/357; e pelo segundo litisdenunciado às fls. 380/381.

Parecer do Órgão Ministerial às fls. 366/369 ratificada à fl. 387, posicionando-se pela procedência dos pedidos deduzidos na inicial.

É o relatório. Decido:

FUNDAMENTAÇÃO

Cuida-se de AÇÃO DE INDENIZAÇÃO DE DANOS MATERIAIS C/C REPARAÇÃO POR DANOS ESTÉTICOS ajuizada por PEDRO HENRIQUE DE ALMEIDA NLOFRANO, representado por sua genitora NEILÂNDIA MARIS OTAVIANO ALMEIDA ALVES, em desfavor de IATE CLUBE DE BRASÍLIA, que, por sua vez, denunciou a lide à empresa Vera Cruz Seguradora S/A, a qual promoveu segunda denunciação em desfavor do Instituto de Resseguros do Brasil.

Considerando que as questões processuais pendentes já foram re

solvidas no curso da lide e em sede de audiência de instrução, passo diretamente ao exame do mérito.

Cinge-se a controvérsia à verificação de responsabilidade da ré pelos danos morais (estéticos) e materiais causados ao autor em decorrência dos fatos narrados na inicial e, se o caso, fixação do quantum devido e disposição sobre as lides de regresso.

Argumenta a ré, em sua defesa que o acidente ocorreu por culpa exclusiva do autor e negligência de seus genitores, pois não era comum haver crianças brincando em torno da sauna, que segundo alegou em sede de contestação, mas não provou, teria sido construída de acordo com as normas técnicas pertinentes, o que, de qualquer sorte, já foi objeto de decisão proferida à fl. 325, primeira parte.

Ora, o autor da presente demanda, por ocasião dos fatos narrados na inicial era apenas uma criança, não podendo prevalecer o argumento da parte ré no sentido de que o acidente teria ocorrido por culpa exclusiva da vítima, alegando que conhecia as dependências do clube, devendo ter tomado cuidado ao brincar nas mediações da sauna, principalmente quando se trata de estabelecimento destinado à recreação onde, segundo consta dos autos, não havia qualquer restrição ao acesso de crianças ao local, não sendo cabível, portanto, a argumentação deduzida.

No tocante à alegada negligência por parte dos pais do autor, de fato, se verifica dos autos, uma vez que deveriam ter acompanhado o seu filho enquanto brincava, o que pelos depoimentos obtidos em audiência verifica-se não ter ocorrido.

Contudo, a existência de culpa concorrente dos genitores do autor, no caso, não exime a responsabilidade do réu, decorrente de prestação de serviços defeituosa, haja vista que, como se constata da análise dos documentos de fls. 85/90, não existia, à época do infortúnio, qualquer sinalização indicando ser aquela uma área de risco, nem muito menos, que não fosse permitido o acesso de crianças ao local.

Em um estabelecimento destinado à recreação não se pode deixar de prever o trânsito de crianças brincando em qualquer parte de suas dependências, a atitude que deveria ter sido tomada pela parte ré, compatível com prestação de serviços adequada, seria sinalizar as mediações do local do acidente alertando os que ali passavam sobre os riscos do local, bem como orientar os empregados responsáveis pela segurança do estabelecimento no sentido de afastarem as crianças que transitassem por áreas perigosas, o que não ocorreu.

Ademais, aplica-se, no caso, o Código de Defesa do Consumidor, uma vez que o autor figura na condição de consumidor, e o Iate Clube de Brasília como fornecedor de serviços, enquadrando-se perfeitamente aos conceitos dispostos nos arts. 2º e 3º da Lei nº. 8.078/90.

Dessa maneira, a comprovação do dolo ou da culpa da parte ré ou de seus prepostos é prescindível, de modo que a responsabilidade por danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos é objetiva, conforme dispõe o art. 14 da lei em comento.

Resta, assim, aferir se houve ou não nexo de causalidade entre o defeito do serviço e os danos experimentados pelo autor.

Como dito, o dever do réu era demonstrar, por meio de sinais de alerta, que as mediações da sauna representavam risco para quem ali passasse, haja vista que havia a possibilidade, como de fato ocorreu, de as janelas estarem abertas, podendo causar danos a pessoas que contra elas colidissem, no momento em que por aquele caminho transitasse, exatamente como ocorreu, sendo até mesmo previsível que alguém se machucasse seriamente, colidindo contra janela modelo basculante existente no local a que todos tinham acesso através de calçada existente no local que, posteriormente, foi jardinado pela parte ré.

Portanto, uma vez ocorrido o acidente em virtude de estar uma das janelas basculantes da sauna aberta, frise-se sem qualquer sinalização do risco que dali advinha, ocasionando ferimento na parte frontal superior da face do autor, resta verificado o nexo de causalidade entre o defeito do serviço e os danos suportados pela parte autora. Fazendo-se mister o reconhecimento do dever de indenizar, não afastado, no caso, por culpa concorrente dos genitores do autor que, de qualquer sorte, influenciará na fixação do valor devido, reduzindo-se a verba indenizatória.

No que tange à quantificação dos valores devidos a título de danos materiais, o réu alegou não estarem devidamente comprovadas, por meio de notas fiscais, todas as despesas elencadas pelo autor no documento de fl. 20, haja vista terem sido apresentadas, algumas daquelas despesas, apenas de forma genérica por meio de fatura do cartão de crédito, conforma observa-se nos documentos de fls. 36/37.

Em verdade não foram comprovadas as seguintes despesas constantes do anexo II (doc. fl. 20): MEDICAMENTOS - DROGARIA DISTRITAL no valor de R$ 38,44; MEDICAMENTOS - DROGARIA DISTRITAL no valor de R$ 37,00; MEDICAMENTOS - DROGARIA DISTRITAL no valor de R$ 61,16; MEDICAMENTOS - DROGARIA DISTRITAL no valor de R$ 77,49. Isso porque a simples apresentação da fatura do cartão de crédito, constando o estabelecimento empresarial para o qual foram creditados determinados valores, não tem o condão de comprovar que tais valores foram despendidos em virtude do dano material sofrido pelo autor, nem para aquisição deste ou daquele medicamento, motivos pelos quais tais verbas deverão ser abatidas do quantum indenizatório, arcando a parte ré apenas com os valores das despesas devidamente comprovadas nos autos.

Quanto aos reflexos da culpa concorrente genitores do autor:

Considerando que foi reconhecido que os genitores do autor, responsáveis pelo menor, negligenciaram seu dever de zelo, já que não poderiam simplesmente deixar o menor transitar sozinho pelo clube, especialmente usando patinete, diante do risco de que enseja, resta verificar os reflexos de tal culpa quanto à responsabilidade da parte ré.

Ou seja, a culpa dos genitores anteriormente reconhecida, correspondente à ausência do devido cuidado com o menor, não sendo o motivo determinante a ocorrência do acidente que vitimou o autor, somente minorará em parcela mínima, a responsabilidade da parte ré, não a eximindo, interferindo, todavia, no montante da indenização.

Indiscutível, portanto, que, ao contrário do que alega a ré, não há que se falar em culpa exclusiva da vítima ou de seus genitores, mas em culpa concorrente, que, se por um lado não tem o condão de eximir a responsabilidade da parte ré, por outro se presta a reduzi-la, ainda, que, repita-se, em mínima parte, por não ter sido a conduta dos genitores do autor o motivo determinante do evento danoso, mas sim a má prestação de serviços da parte ré, consubstanciada em instalação de janelas aberta para calçada estreita, sem qualquer sinalização, oferecendo risco para os transeuntes.

Assim em razão da concorrência de culpas reconhecida nos termos da fundamentação retro, tenho que a responsabilidade da parte ré, pelos danos materiais, deverá ser reduzida em 10% (dez por cento).

Quanto ao dano estético afirma a parte ré ser incabível a reparação pleiteada, sob o argumento de que o acidente não teria causado ao autor cicatriz permanente, uma vez que esta pode ser superada por meio de cirurgia plástica, não reconhecendo, portanto, o dever de reparação.

Superada a discussão acerca da responsabilidade do réu em face do acidente ocorrido com o autor, não merece ser acolhida a alegada ausência de dano estético suportado por ele até mesmo em face da prova documental acostada aos autos e que demonstra a extensão das lesões sofridas (fl. 14).

Ocorre dano estético quando há, em virtude de acontecimento externo, modificação da aparência, modificação esta que faz com que a pessoa que a suportou se torne esteticamente menos agradável comparada à sua aparência anterior ao agente externo, decorrente da pura transformação da aparência de maneira indesejada.

Nesse sentido, em sua obra Responsabilidade Civil. 3ª edição. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2004, Teresa Ancona Lopez leciona: "qualquer modificação duradoura ou permanente na aparência externa de uma pessoa, modificação esta que lhe acarreta um 'enfeamento' e lhe causa humilhações e desgostos, dando origem, portanto, a uma dor moral".

Ou seja, não merece ser acolhida a afirmação do réu no sentido de que "nada mudou na vida do autor após seu acidente e sua cicatriz não o transformou num menino infeliz, anti-social e arredio, porque esta não causa desagrado ou impressão vexatória a ninguém", nem merece ser acolhida a tese de que tal cicatriz poderia ser reparada por cirurgia plástica porque para o reconhecimento do dano estético não se faz necessário que a modificação da aparência seja "permanente", como pretende fazer crer, bastando que seja "duradoura" o que se verifica da tão só afirmação no sentido de que para repara-la seria necessária uma ou várias cirurgias plásticas, ou seja, para repara-las o autor ainda deverá submeter-se a novos procedimentos dolorosos, o que por si só, configura dano passível de reparação.

Se o autor, conforme pretende o réu, tivesse se transformado "num menino infeliz, anti-social e arredio" isso seria causa de agravamento do dano moral, não, necessário, entretanto, para configuração deste.

Argumentam ainda que não é possível a cumulação dos pedidos de danos morais com danos estéticos, que, segundo afirma, foi pleiteado pelo autor. Não lhe assiste razão.

Primeiramente, é importante ressaltar que, como se verifica às fls. 07/08, não compôs o pedido do autor a cumulação de indenizações por dano moral e estético, havendo pleiteado, tão somente, o ressarcimento por danos materiais e estéticos, pura e simplesmente.

Destarte, ainda que houvesse o referido pleito, a despeito do argumentado pelo réu e por ambos os litisdenunciados, a jurisprudência do Egrégio Superior Tribunal de Justiça é convergente ao sentido de ser admitida a referida cumulação, nesse sentido:

PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. ACIDENTE AUTOMOBILÍSTICO. VIOLAÇÃO DOS ARTS. 165, 458, II e 535, I e II, DO CPC. INEXISTÊNCIA. CUMULAÇÃO DE DANO MORAL E DANO ESTÉTICO. CABIMENTO. QUANTUM INDENIZATÓRIO. VALOR MODERADO. IMPOSSIBILIDADE DE REVISÃO. SÚMULA N. 7/STJ. CORREÇÃO MONETÁRIA. TERMO INICIAL. EXCLUSÃO DO 13° SALÁRIO E FÉRIAS.

1. Inexiste violação dos arts. 165, 458, II e 535, I e II, do CPC quando o aresto impugnado decide, de forma objetiva e fundamentada, as questões que delimitam a controvérsia.

2. Aplicam-se os óbices previstos nas Súmulas n. 282 e 356/STF quando as questões suscitadas no recurso especial não tenham sido debatidas no acórdão recorrido nem, a respeito, tenham sido opostos embargos declaratórios.

3. É cabível a cumulação de danos morais com danos estéticos quando, ainda que decorrentes do mesmo fato, são passíveis de identificação em separado.

4. A ausência de prova de que a vítima possuía, ao tempo do acidente, vínculo empregatício, constitui óbice à inclusão do décimo terceiro salário e da gratificação de férias no montante da indenização.

5. O termo inicial da correção monetária da indenização por danos materiais é a data da apuração do dano.

6. A revisão do valor da indenização por danos morais apresenta-se inviável em sede de recurso especial quando arbitrado com moderação na instância ordinária, a teor da Sumula n. 7/STJ.

7. Recurso especial conhecido em parte e provido.

Feitas tais considerações, cabe enfrentar questão pertinente à fixação do quantum devido a título de reparação por dano estético, uma vez que não existe parâmetro legal prefixado, nenhuma tabela ou tarifa a ser observada pelo juiz na tarefa de fixar o valor da reparação.

Em doutrina, predomina o entendimento de que a fixação da reparação do dano estético deve ficar ao prudente arbítrio do juiz, adequando aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade.

Galeno Lacerda, abordando o tema em artigo publicado na Revista dos Tribunais, vol. 728, págs. 94/101, diz que a dificuldade de medir pecuniariamente o dano decorre de sua própria natureza imaterial, não se constituindo em deficiência ou demérito do sistema brasileiro, mesmo porque não há preço para a dor, e a reparação tem caráter compensatório destinado a mitigar a lesão à personalidade.

O bom senso dita que o valor do dano deve ser fixado com equilíbrio e em parâmetros razoáveis, de molde a não ensejar uma fonte de enriquecimento sem causa da vítima, vedado pelo ordenamento pátrio, mas que igualmente não seja apenas simbólico, devendo servir como desestímulo à prática de atos da mesma natureza.

Nesse contexto e em observância aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, e considerando, ainda, a existência de culpa concorrente, nos termos da fundamentação retro, fixo o valor da reparação em R$ 3.500,00 (três mil e quinhentos reais), em função dos danos estéticos causados ao autor em razão do acidente ocorrido nas dependências da parte ré, que deverá ser por ela suportada, em virtude de seu caráter duradouro, ainda que, em tese, seja passível de reparação através de cirurgia, conforme antes considerado.

Quanto ao termo inicial de incidência de atualização monetária sobre o valor fixado a título de reparação de dano estético deverá operar-se a partir da fixação de seu valor, ou seja, a partir desta sentença, e o termo inicial de incidência dos juros deverá ser a data do evento danoso, ou seja, da data do acidente.

No que pertine aos índices de atualização a serem aplicados, deverão ser aqueles legalmente estabelecidos para os cálculos judiciais, podendo a parte interessada utilizar-se do programa existente no site do TJDFT para efetivação dos cálculos respectivos e os juros serão calculados no percentual de 1% ao mês, na forma do art. 406 do CCB c/c art. 161, §1º, do CTN.

Esclareça-se, por oportuno, que a quantia declinada na inicial é mera expectativa da parte autora, não afetando o juízo de procedência do pedido, nem implicando em sucumbência parcial ou recíproca, nos exatos termos da Súmula 326 do STJ.

Quanto à responsabilidade da 1ª litisdenunciada:

Do exame da contestação apresentada pela seguradora denunciada verifica-se que aceitou a denunciação no que pertine aos danos patrimoniais assumindo a posição de litisconsorte da empresa ré, na forma do art. 75, inciso I, do CPC, negando, todavia, a denunciação no que pertine aos danos morais não abrangidos pelo contrato celebrado.

No tocante à responsabilidade do réu apta a ensejar a responsabilidade da seguradora denunciada já restou apreciada, não elidindo a responsabilidade do réu a imputação de culpa concorrente aos pais do autor, muito menos por culpa exclusiva da vítima, conforme fundamentação retro.

De fato, como se verifica ao item 54.2, h, situado à fl. 156 (verso), o seguro firmado pelo réu com a litisdenunciada não abarca a condenação por danos morais (aqui considerados para fins de reparação, os danos estéticos objeto dos autos), razão pela qual esta não poderá ser responsabilizada por tal condenação em via de regresso.

Deverá arcar a denunciada com montante relativo à condenação pelos danos materiais, respeitado o limite do valor estipulado no contrato de seguro firmado com a parte ré, qual seja R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais).

Quanto à responsabilidade da 2ª litisdenunciada:

Conforme se observa da contestação de fls.227/237 o Instituto de Resseguros do Brasil - IRB reconheceu a existência de contrato de resseguro firmado com a primeira litisdenunciada, não aceitando a sua denunciação à lide em face de se considerar Assistente litisconsorcial, questão já superada por meio de decisão interlocutória proferida em sede de audiência de instrução e julgamento, conforme se observa às fls. 326/327.

Posto isto, deverá arcar a segunda litisdenunciada, em via de regresso, com o pagamento de 40,39% (quarenta vírgula trinta e nove por cento) do valor da condenação por danos materiais.

DISPOSITIVO

Diante do exposto: 1) julgo parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial, para condenar o réu a pagar ao autor a importância correspondente a 90% (noventa por cento) dos valores pleiteados na inicial a título de danos materiais, devidamente corrigidos desde o efetivo desembolso e acrescidos de juros de mora desde a citação até o efetivo pagamento, deduzidas, antes, as verbas não comprovadas nos autos, nos termos da fundamentação retro; bem como para condenar a ré ao pagamento em favor da parte autora, a título de danos estéticos, do valor de R$ 3.500,00 (três mil e quinhentos reais), já contemplada em ambas as condenações a redução pertinente ao reconhecimento de culpa concorrente dos genitores do autor.

2) julgo parcialmente procedente o pedido da parte ré/denunciante para condenar a 1ª litisdenunciada Vera Cruz Seguradora S.A. a arcar, em via de regresso, tão somente, com o valor referente à condenação por danos materiais, porque inferior ao limite da apólice (fl. 44), na forma do art. 70, inciso III, do CPC; afastada a responsabilidade da Seguradora quanto ao ressarcimento dos valores fixados a título de condenação da Segurada à reparação por danos morais (espécie na qual se insere, no caso, os danos estéticos objeto da condenação da parte ré), em face da inexistência de previsão contratual neste sentido. Considerando que a litisdenunciada aceitou a denunciação, assumindo, assim, a posição de litisconsorte da denunciante poderá pagar diretamente ao autor o valor pertinente à indenização por danos materiais até o limite da apólice;

3) julgo procedente o pedido formulado na segunda lide de regresso para condenar a 2ª litisdenunciada a ressarcir a 1ª litisdenunciada o valor de 40,39% (quarenta vírgula trinta e nove por cento) do valor fixados a título de indenização por danos materiais, em face do contrato de resseguro.

Por conseguinte, julgo o processo, com resolução do mérito, com fulcro no art. 269, inciso I, do CPC.

Em face da sucumbência mínima da parte autora, arcará a ré com a integralidade das custas processuais, bem como com os honorários devidos ao advogado do autor no importe de 10% sobre o valor total do débito, na forma do art. 20, § 3º e art. 21, parágrafo único, ambos do CPC.

Condeno, ainda, a 1ª litisdenunciada ao pagamento de 10% sobre o valor da condenação referente aos danos materiais a título de honorários devidos ao advogado da ré, também na forma do art. 20, § 3º, do CPC; bem como ao pagamento, em via de regresso, de 50% (cinquenta por cento) das custas processuais.

Por fim, condeno a 2ª denunciada ao pagamento de 10% sobre o valor da condenação referente a 40,39% dos danos materiais, a título de honorários devidos ao advogado da 1ª litisdenunciada; bem como ao pagamento, em via de regresso, de 25% (vinte e cinco por cento) das custas processuais.

Advirto a ré e as litisdenunciadas de que após o trânsito em julgado da presente sentença, ou caso não sujeita a recurso com efeito suspensivo, deverão promover a quitação do débito, no prazo de 15 (quinze) dias, sob pena de acréscimo de multa de 10% (dez por cento), na forma do art. 475-J do CPC, independentemente de nova intimação.

Oportunamente, transitada em julgado, não havendo outros requerimentos, intimando-se ao recolhimento das custas em aberto, dê-se baixa e arquivem-se, observando-se as normas do art. 150 do Provimento Geral da Corregedoria.

Sentença registrada nesta data. Publique-se e intimem-se, observando-se quanto ao Ministério Público intimação pessoal.

Brasília - DF, sexta-feira, 5 de junho de 2009 às 18:45:47.

Marilza Neves Gebrim
Juíza de Direito



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