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terça-feira, 2 de junho de 2009

JURID - Homem preso ilegalmente será indenizado. [02/06/09] - Jurisprudência


Distrito Federal terá de pagar indenização a homem preso ilegalmente.
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Circunscrição: 1 - BRASÍLIA
Processo: 2006.01.1.133802-3
Vara: 112 - SEGUNDA VARA DA FAZENDA PUBLICA DO DF

Processo: 2006.01.1.133802-3
Ação: INDENIZAÇÃO
Requerente: RAIMUNDO FERREIRA DA SILVA
Requerido: DISTRITO FEDERAL

Sentença

Vistos etc.

RAIMUNDO FERREIRA DA SILVA ajuíza ação em desfavor do DISTRITO FEDERAL. Alega que em 12 de abril de 2006, foi preso em decorrência de um mandado de prisão, expedido em 1998, proveniente do processo nº. 1027/96, cuja sentença extinguiu a punibilidade e já tinha transitado em julgado.

Informa que mesmo alegando que o mandado de prisão não se mantinha por causa da referida sentença, os agentes públicos não fizeram nenhuma averiguação se o que autor estava aduzindo era verossímil, ao mesmo tempo em que era recolhido para o Centro de Detenção Provisória (Papuda), dividindo a cela com outros presos durante 06(seis) dias.

Aduz que trabalha como auxiliar de serviços gerais e, que em virtude de sua prisão, acordou com uma pessoa para exercer suas atividades, por meio de pagamento em dinheiro, enquanto estava preso.

Pondera que sofreu constrangimento ao ser preso ilegalmente, posto que, o mandado emanasse de um processo fundamentado em crime de tentativa de homicídio e que, ao seu final do mesmo, foi desclassificado para crime de lesão corporal de natureza leve e, por conseguinte, teria tido extinguido a punibilidade por prescrição. Acrescenta que sua prisão foi concluída depois de oito anos da expedição do mandado e depois de dois anos do trânsito em julgado da sentença.

Diz que sofreu um abalo em sua honra e em sua reputação e foi privado de seu bem jurídico, qual seja o direito à liberdade de locomoção em face dos atos ilegais praticados pelos agentes públicos, com fundamento em um mandado com mais de oito anos de expedição. Pede que o réu seja condenado a pagar indenização pelo dano moral que causou na quantia que estima em R$ 50.000,00.

Junta os documentos de fls. 17/25.

Contesta o Distrito Federal às fls. 31/45. Levanta preliminar de ilegitimidade passiva ad causam, visto que o ato causador do dano foi provocado por erro do Poder Judiciário da União, haja vista que aduz a correta ação dos agentes públicos, pois constava a existência de um mandado de prisão em desfavor do autor.

Informa que a negligência não pode ser imputada ao réu, pois a ordem de recolhimento do mandado deveria ter sido ordenada pelo Poder Judiciário da União no momento que prolatou a sentença e que, quando da solicitação de devolução do mandado, a informação é lançada imediatamente no sistema da PCDF. Conclui que a prisão ilegal do autor foi decorrente de ato omissivo do Poder Judiciário da União que não efetivou as medidas administrativas possíveis para a devolução do mandado.

No mérito aduz que não causou dano moral indenizável ao autor, pois o que ocorreu foram meros aborrecimentos e contratempos ao mesmo. Alega que o autor não teve uma prisão real, e sim, uma detenção para esclarecimentos e que essa detenção não acarretou destrato ou violência física ou moral por parte dos agentes públicos.

Argumenta que é exorbitante o valor pretendido pelo autor a título de dano moral. Que o valor ultrapassa o patamar decidido pela jurisprudência do Egrégio TJDFT. Requer que seja reconhecida a preliminar de ilegitimidade passiva ad causam e que no mérito sejam julgados improcedentes os pedidos do autor.

Junta documentos às fls. 41/45.

Em réplica, fls. 49/54, o autor esclarece que apesar de ter havido um descompasso de informações entre o Poder Judiciário da União e a Delegacia de Polícia do Distrito Federal, esse descompasso não exonera a responsabilização do Distrito Federal. Em relação aos documentos juntados pelo réu, aduz que não comprovam a inexistência de ofício solicitando a devolução do mandado de prisão. Esclarece que na mesma certidão juntada pelo réu (fl. 45), a mesma informa o trânsito em julgado da sentença, que foram expedidas as comunicações necessárias e que o processo foi arquivado, comprovando assim, o erro no âmbito da Policia Judiciária. No que tange ao mérito, reitera os argumentos da inicial e a procedência da ação.

Aberta a fase de provas, tanto autor como réu requereram produção de prova testemunhal (fls. 55/61). Os autos foram encaminhados para o Ministério Público que se manifestou no sentido da não participação do MP, pois a demanda não está no rol do artigo 82, do Código de Processo Civil e por não se tratar de direito indisponível de que trata o artigo 127 da Constituição Federal.

Encerrada a instrução, vieram os autos conclusos para sentença.

É a exposição do que é necessário para a solução da lide. Decido.

Os fatos da causa foram satisfatoriamente demonstrados pelos documentos juntados nos autos. A natureza dos direitos em conflito inviabiliza a conciliação. Dispensável audiência para esse fim (CPC, artigo 331, § 3º). Passa-se ao julgamento antecipado da lide como determina o artigo 330, inciso I, do Código de Processo Civil.

A preliminar de ilegitimidade confunde-se com o mérito. Será analisada oportunamente.

Passa-se ao exame de mérito.

O dever de indenizar o prejuízo moral derivado da prática de ato ilícito exige, nos termos em que preceituam os artigos 186 e 927 do Código Civil, a prática de ato ilícito capaz de causar prejuízo, a ocorrência de dano e que a conduta atribuída à parte seja a causa do dano experimentado.

Tratando-se de indenização por ato ilegal de agente público, como a hipótese em questão, a responsabilidade independe da demonstração de culpa, a teor do que dispõe o artigo 37, § 6º, da Constituição Federal.

Na hipótese em exame, o ato tido como ofensivo consiste na prisão ilegal do autor, pois apresentada informações de que haveria uma sentença transitada em julgado extintiva da punibilidade do autor. Não há controvérsia quanto à prisão.

O agente público agiu com negligência, apesar de ter agido dentro de seu ofício, pois ao verificar informações de que existia um mandado de prisão em desfavor do autor, imediatamente informou-o e o deteve. Porém, na qualidade de agente público e na circunstância em que estava atuando foi imprudente em não averiguar, imediatamente, as informações dadas pelo autor, ante a constatação do mandado de prisão ser de 08(oito) anos atrás. Por isso, praticando um ato como agente público já é suficiente para a responsabilização objetiva do Estado, pois a Administração assume os riscos causados por seus agentes e é obrigada a ressarcir os danos causados por ação dos mesmos.

Há nexo de causalidade entre o ato ilícito e o dano causado, demonstrado pela ação do agente público, em sua função, em recolher o autor na Papuda, sem averiguação prévia de que a informação do autor poderia estar correta, pois estava no poder de um mandado de prisão datado de mais oito anos atrás. Ademais, o que se colocou em jogo foi um dos bens maiores do Direito, o direito à liberdade de locomoção, princípio basilar protegido como cláusula pétrea em nossa Constituição Federal.

Maria Silvia Di Pietro ressalta que o fundamento da responsabilidade civil do Estado é o nexo de causalidade existente na teoria do risco administrativo (Direito Administrativo, Atlas, 17ª edição, São Paulo, 2004, pg.551):

"Nessa teoria, a idéia de culpa é substituída pela de nexo causalidade entre o funcionamento do serviço público e o prejuízo sofrido pelo administrado. É indiferente que o serviço público tenha funcionado bem ou mal, de forma regular ou irregular."

A justificativa apresentada pelo réu não afasta a sua responsabilidade pelos prejuízos morais experimentados pelo autor. A uma, porque "uma mera restrição de liberdade" para apurar fatos, não significa passar 06(seis) dias detido na Papuda dentro de uma cela com outros detentos, restringindo o direito de locomoção, ao trabalho e o respeito à dignidade da pessoa humana.. A duas, porque o réu poderia e deveria ter averiguado o mandado, não fazendo com que o autor passasse pelo constrangimento de ser preso.

Nesse sentido, confira-se o seguinte julgado:

APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. DANO MORAL. REBELIÃO EM PRESÍDIO. MORTE DE INTERNO - GARANTIA CONSTITUCIONAL DE INCOLUMIDADE FÍSICA E MORAL DO PRESO. RISCO ADMINISTRATIVO. NEXO DE CAUSALIDADE. QUANTUM INDENIZATÓRIO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CRITÉRIOS DE FIXAÇÃO.

O Estado, nos termos da norma constitucional, tem o dever de assegurar a incolumidade dos cidadãos quando lhes restringe a liberdade em razão da cominação de pena através do jus puniendi.

A Administração Pública, à luz da teoria objetiva, tem responsabilidade pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, em face do que dispõe o art. 37, § 6º, da Constituição Federal.

Restando comprovado que o ente estatal não cumpriu o dever de garantir a segurança do estabelecimento prisional, inclusive com a falta de manutenção dos equipamentos de combate a incêndio e com a escala de número de agentes prisionais incapaz de solucionar qualquer tipo de incidente, patente o nexo de causalidade e o dever de indenizar.O STJ tem consagrado a doutrina da dupla função na indenização do dano moral: compensatória e penalizante, devendo ser arbitrada verba indenizatória que amenize o sofrimento causado aos autores, sem dar ensejo ao enriquecimento sem causa. Quando a Fazenda Pública for vencida, os honorários serão fixados consoante apreciação eqüitativa do juiz, atendidas as normas das alíneas a, b e c do §3º, quais sejam, o grau de zelo do profissional, o lugar da prestação do serviço, a natureza e importância da causa, o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o serviço. (20010111195015APC, Relator CARMELITA BRASIL, 2ª Turma Cível, julgado em 24/09/2008, DJ 01/10/2008 p. 39).

No que toca ao prejuízo, a responsabilidade pelo dano moral dispensa a sua demonstração, dado que este presumivelmente decorre do ato lesivo. Nesse sentido, confira-se:

"CIVIL. DANO MORAL. REGISTRO NO CADASTRO DE DEVEDORES DO SERASA. IRRELEVÂNCIA DA EXISTÊNCIA DE PREJUÍZO.

A jurisprudência desta Corte está consolidada no sentido de que na concepção moderna da reparação do dano moral prevalece a orientação de que a responsabilização do agente se opera por força do simples fato da violação, de modo a tornar-se desnecessária a prova do prejuízo em concreto.

(Omissis)" (STJ - RESP 196.024/MG - Rel. (Min. César Asfor Rocha - DJ 02/08/1999).

Não se faz necessário perquirir, por se tratar de responsabilidade objetiva do Estado, se a ré agiu com culpa, pois a responsabilidade pela reparação do dano causado independe da demonstração desse elemento.

Presentes todos os elementos que configuram o dever de indenizar, passa-se à análise do quantum devido.

A fixação da indenização devida a título de dano moral é matéria que exige especial atenção do julgador, principalmente porque a extensão da dor sofrida não pode ser objetivamente quantificada em pecúnia. Vindo em auxílio ao magistrado, a doutrina erige alguns critérios hábeis a balizar a atividade judicial, tais como: a) o nível econômico-financeiro das partes, de sorte a não fazer da indenização arbitrada fonte de enriquecimento indevido do autor ou de miserabilidade do réu; b) o caráter punitivo de que deve ser revestir a indenização, posto ser esta meio de sanção pelo ilícito praticado; c) a função educativa, eis que a indenização também tem como escopo evitar a reiteração do ato lesivo; e d) o grau de culpa do responsável.

Nesse sentido, ressalta Carlos Bittar, citado por Yussef Said Cahali (Dano Moral, Ed. RT, 2ª Edição, pág. 177):

"Demarca-se, como dados propiciadores da configuração do dano moral, a necessidade de a ação judicial acarretar a exigível intimidação para que fatos análogos não se repitam, além de se constituir, sob certo aspecto, em forma punitiva civil dirigida ao ilícito, sem desconsiderar que propicia a pecúnia um conforto maior para quem suportou tão grande trauma como a morte violenta do chefe de família". E segue Cahali "o montante do dano moral deve ser estipulado em conformidade com a teoria do valor de desestímulo, que doutrina e jurisprudência vêm propugnando, para elisão de comportamentos lesivos à sociedade. Cuida-se de técnica que, a um só tempo, sanciona o lesante e oferece exemplo à sociedade para que não floresçam condutas que possam ferir valores que o direito protege; a indenização por dano moral não tem caráter unicamente indenizatório, mas também possui caráter pedagógico, ao servir de freio para que atos culpáveis voltem a se repetir".

Atendendo a tais elementos, principalmente ao caráter educativo e punitivo de que deve se revestir a indenização, ao grau de culpa do réu que, em razão da prisão ilícita provocado por agente público, tendo o réu submetido o autor a constrangimento ilegal, fixo a indenização pelo dano moral causado em R$ 10.000,00 (dez mil reais), considerado o valor indenizatório devido na data desta sentença.

Ante o exposto, julgo PROCEDENTE o pedido deduzido pelo autor para condenar o Distrito Federal a pagar-lhe a quantia de R$ 10.000,00 (dez mil reais), acrescida de correção monetária e de juros de mora de 1% ao mês a partir desta data. Condeno em custas e honorários advocatícios. Declaro resolvido o mérito com fundamento no artigo 269, inciso I, do Código de Processo Civil.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Dispensado o reexame necessário, com fundamento no § 2º do artigo 475 do CPC.

Brasília - DF, quinta-feira 21/05/2009 às 19h57.

Luciana Pessoa Ramos
Juíza de Direito Substituta



JURID - Homem preso ilegalmente será indenizado. [02/06/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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