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quinta-feira, 4 de junho de 2009

JURID - HC. Condenada com residência e trabalho fora do Brasil. [04/06/09] - Jurisprudência


Habeas Corpus. Deferimento do direito de recorrer em liberdade sob condição de não se ausentar do país. Condenada com residência e trabalho fora do Brasil. Ilegalidade não configurada. Ordem denegada.


Tribunal de Justiça de Goiás - TJGO.

Habeas Corpus nº 34769-0/217 (200901391691)

Comarca de Goiânia

Impetrante : Marcos Henrique Sul Santana

Paciente : Elsa Soares da Silva

Relator : Desembargador Prado

Redator : Juiz Carlos Alberto França

EMENTA: HABEAS CORPUS. DEFERIMENTO DO DIREITO DE RECORRER EM LIBERDADE SOB CONDIÇÃO DE NÃO SE AUSENTAR DO PAÍS. CONDENADA COM RESIDÊNCIA E TRABALHO FORA DO BRASIL. ILEGALIDADE NÃO CONFIGURADA. ORDEM DENEGADA. I - Não há falar em constrangimento ilegal ao direito de ir e vir, se o juiz, ao proferir sentença condenatória, após a devida fundamentação e usando do seu poder de cautela, concede ao sentenciado o direito de recorrer em liberdade, impondo-lhe a restrição de não se ausentar do país.

A C Ó R D Ã O

Vistos, relatados e discutidos estes autos de HABEAS CORPUS nº 34.769-0/217 (200901391691), da comarca de Goiânia, em que figura como impetrante MARCOS HENRIQUE SUL SANTANA e paciente ELSA SOARES DA SILVA.

ACORDA o Tribunal de Justiça de Goiás, por sua Segunda Câmara Criminal, em votação por maioria, desacolhendo o parecer da Procuradoria Geral de Justiça, em conhecer do pedido, mas denegar a ordem impetrada, nos termos do voto do Juiz Carlos Alberto França, designado redator do acórdão.

Sem custas.

Vencido o relator, que acolhendo o parecer Ministerial, concedeu a ordem, para afastar da sentença a proibição da paciente de ausentar-se do país.

Votaram, além do redator, os Desembargadores Prado, que presidiu a sessão, Nelma Branco Ferreira Perilo e Luiz Cláudio Veiga Braga.

Presente, representando o órgão de cúpula do Ministério Público, o Procurador de Justiça, Dr. Paulo Sérgio Prata Rezende.

Goiânia, 12 de maio de 2009.

Juiz Carlos Alberto França
Relator em substituição

VOTO PREVALECENTE

Elsa Soares da Silva, por seu advogado, impetra habeas corpus, com pedido de liminar, ao argumento de que padece de constrangimento ilegal, por ato da MMª. Juíza-Presidente do 1º Tribunal do Júri desta Capital que - após condená-la à pena de 18 anos de reclusão, pela prática do crime tipificado no art. 121, § 2º I, III e IV, c/c o art. 29 do CP, contra a menor Michael Mendes, de apenas 5 anos de idade, em ritual de magia negra - permitiu-lhe recorrer em liberdade, porém, determinou que ela se abstivesse de deixar o país.

Sustenta, em síntese, que a sentença condenatória proferida em desfavor da paciente, no tocante à proibição de ausentar-se do país, encontra-se desprovida de fundamentação, como exigido pelo texto constitucional e legal. Ademais houve violação ao princípio constitucional da não-culpabilidade.

O ilustre Relator dos presentes autos, acolhendo o parecer ministerial de cúpula, conheceu do pedido e concedeu a ordem para afastar da sentença a proibição imposta à paciente (ausentar-se do país), ao argumento de que inexiste previsão legal para tal vedação, houve ofensa aos preceitos constitucionais que primam pela liberdade, pela presunção de inocência e, sobretudo, ao contido no art. 5º, II, da CF.

Data vênia, ouso discordar do seu posicionamento, pois lendo com mais acuidade a petição inicial e os documentos constantes dos autos, deles constato que, a paciente ataca a sentença condenatória de fls. 50/54 que, em obediência aos arts. 93, IX, da CF e 387, parágrafo único, do CPP, deferiu-lhe o direito de recorrer em liberdade, sob a condição de que se abstivesse de deixar o país.

No caso em exame, portanto, não há falar em falta de fundamentação da sentença condenatória que agraciou a condenada com a liberdade provisória, impondo-lhe a restrição de não se ausentar do país pois, segundo a doutrina dominante, a liberdade provisória pode ser vinculada ou não, tendo em vista que, em determinadas hipóteses, o legislador admitiu a concessão desse instituto, porém sujeitou o acusado ao cumprimento de certas condições, sob pena de se revogar a liberdade e recolher-se o acusado à prisão.

As condições às quais o réu estará sujeito encontram-se previstas nos arts. 327 e 328 do Código de Processo Penal:

a) obrigação de comparecer a todos os atos do processo (art. 327 do CPP);

b) proibição de o réu mudar de residência, sem prévia permissão da autoridade processante (art. 328, 1ª parte, do CPP);

c) proibição de o réu ausentar-se por mais de 8 (oito) dias de sua residência, sem comunicar à autoridade processante o lugar onde será encontrado (art. 328, 2ª parte, do CPP).

Como se vê, o legislador permite a concessão de liberdade provisória, no entanto, sujeita o acusado a certas condições. Nas palavras do professor Paulo Rangel: "(...) Portanto, o réu fica livre, mas preso ao processo" (RANGEL, Paulo. Op. Cit., p. 661).

A vedação a que se refere o art. 328, 2ª parte, do CPP, também se aplica, com muito mais razão, à proibição de ausentar-se do país, principalmente quando a condenada comprova possuir residência e trabalho fora do Brasil.

Ressalte-se que, embora as citadas proibições se refiram aos crimes afiançáveis, seria um contra-senso não admiti-las nos casos de condenação por crime mais grave, com pena de reclusão a ser cumprida em regime inicial fechado.

O saudoso Julio Fabbrine Mirabete, em sua obra Código de Processo Penal Interpretado, ao comentar o art. 310 que trata da liberdade provisória assim dispõe: "...a liberdade provisória, que substitui a prisão provisória, com ou sem fiança, nas hipóteses de flagrante (arts. 301 a 310), pronúncia (atual art. 413, § 3º) e sentença condenatória recorrível (atual art. 387 parágrafo único). Com ela, o acusado não é recolhido à prisão ou é posto em liberdade se estiver preso, vinculando ou não a certas obrigações que o prendem ao processo e ao juízo, com o fim de assegurar sua presença aos atos do processo sem o sacrifício da prisão provisória". (grifei) (Ed. Atlas 7ª Ed. 2005, p.403).

Se não isso, atualmente, com a edição da Lei nº 11.719/08, os Tribunais veem entendendo que o juiz pode impor qualquer medida acautelatória para garantir a aplicação da lei, na forma do art. 387, parágrafo único do CPP, in verbis: "... Após a reforma pontual do Código de Processo Penal, especialmente através da Lei nº 11.719/2008, tornou-se possível juízo discricionário do magistrado para o fim de, conforme a singularidade dos casos, deixar de decretar prisão cautelar (preventiva, na sentença condenatória e na decisão pronúncia) e impor providência acautelatória substitutiva, que na compreensão do juiz seja suficiente para assegurar a ordem pública e econômica, a aplicação da lei penal e a regularidade da instrução; trata-se de inteligência do parágrafo único do art. 387 do Código de Processo Penal cujo discurso (...) se estende às demais modalidades de prisão cautelar posto que, no fundo, todas elas (à exceção da prisão temporária) devem obedecer uma ordenação comum (artigo 312)...Ordem denegada" (HC28333/SP, TFR 3ª Região, Rel. Juiz Johonson Di Salvo, DJF3 16/1/09 p. 119).

Segundo o entendimento do STF e STJ, não viola o direito de ir vir, a decisão que assegura ao condenado o direito de recorrer em liberdade, impondo-lhe a restrição de não deixar o país, com o propósito de assegurar o cumprimento da pena privativa de liberdade, caso esta venha a ser confirmada em grau de recurso.

O Ministro Marco Aurélio ao apreciar o HC 96066 / RJ, em decisão monocrática datada de 15/9/08, foi além, ao assim decidir: "... 4. Defiro a medida acauteladora para afastar a prisão preventiva determinada. O cumprimento deste ato subordina-se ao compromisso formal de o beneficiário não deixar o País, de não se ausentar do distrito da culpa sem autorização judicial expressa, atendendo aos chamamentos judiciais. Os passaportes referidos na decisão, caso ainda não entregues à autoridade competente, ao Juízo sentenciante, deverão sê-lo, oficiando-se, mais, à direção da Polícia Federal para que os setores de fiscalização de saída do País fiquem alertados da impossibilidade de o paciente empreender viagem ao exterior. 4. Este ato, precário e efêmero, não impede o curso do Habeas Corpus nº 113.898-RJ no Superior Tribunal de Justiça. Comuniquem à ministra Laurita Vaz, relatora da citada impetração, o inteiro teor desta decisão. 5. Estando no processo as peças indispensáveis à compreensão da matéria, colham o parecer da Procuradoria Geral da República. 6. Publiquem. Brasília, 15 de setembro de 2008. Ministro MARCO AURÉLIO Relator" (grifei).

Nesse mesmo sentido é o entendimento do STJ: "...1. Hipótese em que a paciente, embora brasileira, reside no exterior e responde a processo criminal no Brasil, tendo obtido da autoridade judicial a devolução de seu passaporte e o direito de ausentar-se do país. Com a superveniência da sentença condenatória, foi conduzida ao cárcere sob a alegação de que obstaculizaria a aplicação da lei penal, tão-somente porque não possui vínculo com o distrito da culpa. 2. Havendo a paciente permanecido solta durante todo o processo, sem alteração fática que recomende a prisão cautelar, assim deve permanecer durante o eventual processamento de recursos. Precedentes do STF e do STJ. (...) 4. Ordem concedida à paciente, com a condição de assinatura de termo, em que fica obrigada a comparecer em juízo todas as vezes em que for intimada a fazê-lo, sem a possibilidade de se ausentar do país. Expedido alvará de soltura ao clausulado (HC 102859/PE 2008/0064825-5 Rel. Min. Jane Silva - Desembargadora convocada).

No mesmo sentido: "... Atipicidade da conduta. Ausência de justa causa não-evidenciada de plano. Necessidade do procedimento inquisitorial para a apuração dos fatos. Autorização para ausentar do distrito da culpa. Impossibilidade. Constrangimento ilegal não configurado. Recurso Desprovido". (RHC 18212 / RJ, Rel. Min. Gilson Dipp, DJ 27/03/2006 p. 302). No acórdão, assim justificou o Ministro Gilson Dipp: "Da mesma forma, não se mostra oportuna a revogação da proibição de se ausentar do distrito da culpa, pois, como afirmado no acórdão recorrido, "seria como dar um cheque em branco para uma eventual impunidade" (fl. 282).

Embora existam decisões em contrário no próprio STJ, observo que elas não são aplicáveis ao caso em exame, porque proferidas em situações peculiares, ou seja, mero indiciamento ou quando ainda não concluída a ação penal, e não em processo com sentença condenatória (18 anos de reclusão em regime inicial fechado), em que o condenado possui residência e trabalho no exterior, o que justifica a restrição para garantir o cumprimento da lei penal, caso a condenação venha a ser mantida.

Dessa forma, inaceitável a tese de falta de fundamentação ou ilegalidade da condição imposta à condenada, ou seja, de não se ausentar do país, quando da permissão para recorrer em liberdade.

De igual modo, inexiste violação ao princípio constitucional da não-culpabilidade, pois segundo o STF: "A presunção de inocência (CF, art. 5º, LVII) é relativa ao Direito Penal, ou seja, a respectiva sanção somente pode ser aplicada após o trânsito em julgado da sentença condenatória. Não alcança os institutos de Direito Processual, como a prisão preventiva..." (RT686/388), bem como as condições impostas ao beneficiário da liberdade provisória.

Com essas considerações, deixo de acompanhar o voto proferido pela Eminente Relator para, desacolhendo a manifestação da douta Procuradoria Geral de Justiça, denegar a ordem impetrada, mantendo incólume a decisão atacada.

É como voto.

Goiânia, 12 de maio de 2009.

Juiz Carlos Alberto França
Relator em Substituíção

Publicado em 03/06/09




JURID - HC. Condenada com residência e trabalho fora do Brasil. [04/06/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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