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quinta-feira, 4 de junho de 2009

JURID - Dispensa discriminatória. Procedência. [04/06/09] - Jurisprudência


Indenização por danos materiais e morais. Dispensa discriminatória. Procedência.


Tribunal Regional do Trabalho - TRT3ªR.

Processo: 00470-2008-086-03-00-9 RO

Órgão Julgador: Quinta Turma

Juiz Relator: Des. Jose Murilo de Morais

Juiz Revisor: Juiza Convocada Maria Cecilia Alves Pinto

Juiz Redator: Juiza Convocada Maria Cecilia Alves Pinto

RECORRENTE: ELIAS JOSÉ MELCHIADES

RECORRIDO: JOSÉ NELSON MALLMANN

EMENTA: INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. PROCEDÊNCIA. O contexto fático-probatório dos autos demonstrou que a dispensa do recorrente foi discriminatória e objetivava desencorajar os empregados quanto à tentativa de organização em busca de melhores condições de trabalho, em especial a constituição de CIPA, o que enseja a imposição de indenização por danos materiais e morais.

Vistos os autos, relatado e discutido o presente Recurso Ordinário, DECIDE-SE:

RELATÓRIO

Este é o relatório da lavra do Desembargador Relator:

"O juiz Frederico Leopoldo Pereira, da Vara de Alfenas, julgou improcedente a ação de indenização por danos morais e materiais ajuizada pelo reclamante.

Ele interpôs recurso ordinário insurgindo-se contra o indeferimento da pretensão reparatória.

Contrarrazões às fls 296/316.

Dispensado o parecer da Procuradoria Regional do Trabalho."

ADMISSIBILIDADE

Satisfeitos os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso interposto.

FUNDAMENTOS

INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS

Pretende o recorrente a reforma da decisão de origem, que julgou improcedentes os pedidos de condenação do recorrido ao pagamento de indenização por danos materiais e morais.

Examina-se.

A pretensão indenizatória por danos morais e materiais pressupõe, necessariamente, um comportamento do agente que, "desrespeitando a ordem jurídica, cause prejuízo a outrem, pela ofensa a bem ou direito deste. Esse comportamento deve ser imputável à consciência do agente por dolo (intenção) ou por culpa (negligência, imprudência ou imperícia), contrariando seja um dever geral do ordenamento jurídico (delito civil), seja uma obrigação em concreto (inexecução da obrigação ou de contrato)" (Rui Stoco, Responsabilidade Civil, 2ª edição, ed. Revista dos Tribunais).

Assim, a conduta que desrespeita a ordem jurídica, causando prejuízo a outrem pela ofensa a bem ou direito deste -, gera a responsabilidade civil, traduzindo-se, na prática, pela reparação do dano ocasionado; é o ilícito figurando como fonte geradora de responsabilidade, devendo o agente recompor o patrimônio (moral ou econômico) do lesado, ressarcindo-lhe os prejuízos (danos) acarretados.

Assim, a obrigação de indenizar encontra-se condicionada à comprovação do dano sofrido, à culpa do empregador e ao nexo causal entre eles, sendo esses requisitos essenciais para se atribuir a responsabilidade civil por dolo ou culpa, conforme previsão do artigo 7º, inciso XXVIII, da Constituição da República e dos artigos 186 e 927 do Novo Código Civil.

Pois bem.

Ante ao contexto fático probatório dos autos, entendo que a dispensa do recorrente foi discriminatória e objetivava desencorajar os empregados quanto à tentativa de organização em busca de melhores condições de trabalho, em especial a constituição de CIPA.

A única testemunha ouvida em juízo, João Batista Valenciano, não deixa dúvidas quanto à conduta arbitrária da ré, tendo prestado as seguintes informações:

"que trabalhou para o reclamado de doze de abril de 2004 a vinte e um de dezembro de 2006; que chegou a trabalhar com os reclamantes, estando a trabalhar quando da ruptura do contrato dos autores; que ao que sabe o depoente, "pelo que o pessoal andou falando lá", os autores teriam sido dispensados por haverem solicitado a instalação de uma CIPAR no local de trabalho; que participou de uma das reuniões relativas à reivindicação de criação da CIPAR; que viu no início da reunião a presença do Sr. João, encarregado do reclamado, reconhecido pelo vulgo "Baú", porém não constatou ao final da reunião a presença daquela pessoa; que houve contratação de empregado após a dispensa dos autores e "se não se engana" foi contratada uma pessoa; que quando da dispensa dos autores não ocorreu o despedimento de outros trabalhadores; que foram os reclamantes os organizadores da reunião onde foi discutida a reivindicação de implementação da CIPAR; que os autores haviam manifestado interesse de integrar aquela comissão; que a notícia da motivação da dispensa dos reclamantes veio "dos trabalhadores mesmos, o pessoal comentava"; que não sabe se a dispensa dos reclamantes foi testemunhada por alguém; que a informação de que a dispensa decorrera da participação dos reclamantes na mencionada reunião não partiu dos autores, senão de outros trabalhadores do local; que teve notícia da motivação da dispensa dos autores logo após a realização da reunião, porque vários trabalhadores que estavam laborando na mesma gleba da testemunha começaram a fazer aquele comentário; que os reclamantes foram dispensados em dezesseis de agosto, no dia da mencionada reunião; que do Sindicato Rural de Campo do Meio participaram da reunião pessoas que a testemunha conhece por Paulo Evandro e Alex, não sabendo todavia que função exercem no órgão de classe, além de membros de sindicatos de outras bases territoriais que não eram conhecidos da testemunha; que foram os reclamantes aqueles que, oralmente, informaram o depoente e outros trabalhadores da ocorrência da reunião; que foi redigida uma ata da reunião, firmada pela testemunha; que havia na citada reunião de vinte e cinco a trinta pessoas; que não havia empregados do reclamado dentre os membros de sindicatos participantes da reunião; que não sabe se houve comunicação por escrito ao reclamado da realização da reunião; que não sabe como os membros do sindicato adentraram a propriedade, lá não existindo cerca; que se não se engana o depoente, no período declinado o depoente trabalhou por umas três vezes para o réu; que não pode informar quando houve a instalação da CIPAR porque lá não trabalhava mais na época; que o depoente trabalhava na mesma turma dos reclamantes; que não se lembra de conhecer a pessoa de Dona Sueli Aparecida de Castro, tendo porém trabalhado com a pessoa conhecida por "Sueli do Nó", por um curto período; que não trabalhou com a pessoa de D. Maria Aparecida de Silva França, não podendo asseverar se trabalhou com D. Maria Aparecida de Paula, porque, pelo sobrenome não conhece a trabalhadora; que não se lembra de haver trabalhado com a Sra. Elaine Vicente; que não tem certeza se apenas os reclamantes foram pelo réu dispensados no mês de agosto de 2006; que não sabe informar onde ocorreu a comunicação da dispensa dos autores." (Grifo nosso. Fls. 278/279)

Em idêntico sentido, as informações constantes do documento de fls. 44/46, termo de depoimento prestado por Josué Gomes Ferreira, em procedimento investigatório instaurado pelo Ministério Público do trabalho. Noticiou o depoente que "que os trabalhadores da Fazenda Santa Terezinha, arrendada pelo Sr. José Nelson Mallmann, vinham se submetendo a condições de trabalho que colocava em risco sua saúde, vez que não recebiam treinamento, todos os EPI's necessários no trabalho com agrotóxicos e não existia CIPATR no estabelecimento; que os trabalhadores solicitaram, assim a intervenção do sindicato, já que o empregador não se dispunha a negociar com os mesmos, (...); que o depoente e o Sr. Elias José Melchiades tiveram a iniciativa de solicitar a intervenção do sindicato porque haviam sido escolhidos previamente, em acerto como os demais trabalhadores, para se candidatarem às vagas dos representantes dos empregados na CIPATR que pretendiam constituir (...) tendo o depoente e o Sr. Elias reunido os trabalhadores para que a reunião ocorresse; que a reunião foi assistida pelo Sr. João, conhecido como Baú, que dirige o ônibus que transporta os trabalhadores e controla os registros das jornadas de trabalho nos cartões de porto; que o Sr. Baú não se manifestou durante a reunião; que o Sr. Baú se retirou antes do fim da reunião; que os dirigentes sindicais, ante à ausência de representante do empregador decidiram elaborar uma pauta de reivindicações (...) que após o encerramento da reunião os trabalhadores retornaram às suas atividades e por volta das 15 horas o depoente recebeu do Sr. Elias José Melchiades a notícia de que ambos haviam sido dispensados; que tendo procurado o Sr. Baú, para confirmar a notícia, recebeu a informação de que a dispensa dos dói trabalhadores havia sido determinada por telefone (...) que o sindicato solicitou reunião na SDT Varginha com a presença do empregador (...) numa segunda reunião, na SDT, presente o Sr. José Nelson Mallmann, este informou que não tinha poderes para decidir sobre as reintegrações, porque esta questão estava afeta à competência do Sr. Paulo Henrique Zuk e que a submeteria a este, tendo solicitado o prazo de dois a cinco dias para apresentar resposta ao sindicato, o que não ocorreu até a presente data (...)".(Sem grifo no original)

Ressalte-se que, há algum tempo, o desrespeito a direitos básicos dos trabalhadores e a normas elementares de segurança e saúde no ambiente de trabalho por parte da empregadora eram noticiados, tanto que firmou um termo de conduta como o Ministério do Trabalho, em 2003, do qual constam obrigações como não utilizar de mão-de-obra de menores de 16 anos, efetuar pagamento de adicional de insalubridade, fornecer água potável aos trabalhadores da lavoura, fornecer gratuitamente EPI etc (fls. 49/53)

Ademais, se a dispensa do reclamante foi promovida porque a "quadra em que o mesmo laborava foi acometida de uma praga que causou a redução acentuada da safra que, já estava em seu final", como alega o recorrido em sua defesa (fl. 69, segundo parágrafo), porque o empregador cogitou, em reunião com o sindicato, documentada à fl. 22, de analisar a possibilidade de reintegrar o reclamante. Não parece razoável, ainda, que o empregador não dispusesse de poderes para tanto, não sendo necessária, por óbvio, a concordância de qualquer preposto seu. Além do mais, não se entende porque apenas o reclamante e o Sr. Josué, que convocaram a reunião, foram dispensados logo após o término da mesma.

Da prova dos autos, portanto, se infere que o reclamante e o empregado Josué Gomes Ferreira, promoveram, com o auxílio do sindicato da categoria, uma reunião no ambiente de trabalho, objetivando organizar os demais trabalhadores no sentido de pressionar a empregadora a promover melhorias nas condições de trabalho, dentre as quais a criação de CIPA. Desta reunião, mesmo que não tenha sido formalmente comunicada por escrito, o reclamado, certamente, tomou ciência, eis que realizada em suas dependências e na presença de seu preposto - que, inclusive, deixou o local antes mesmo do encerramento da reunião e depois comunicou a rescisão contratual - e em razão de tal movimento efetuou, imediatamente, a dispensa do reclamante, procedimento abusivo e intentado para desencorajar condutas semelhantes.

Diante de tais fatos, verifica-se que em atenção ao disposto nos artigos 818 da CLT e 333, I do CPC, o autor se desincumbiu do ônus de provar a conduta antijurídica do reclamado, que extrapolando as prerrogativas de seu poder diretivo, agiu dolosamente de forma a dispensar o autor, penalizando sua atitude de tentar se unir aos demais empregados em busca de melhores condições de trabalho, em especial a constituição de CIPA. O autor foi dispensado de forma discriminatória, sofrendo dano moral e material, decorrentes dos dissabores da dispensa e do prejuízo patrimonial, restando caracterizado o dano e o nexo de causalidade entre tais fatos.

Assim, a hipótese tratada se enquadra na previsão instituída pelo antigo artigo 159 do CCB, cujas bases foram mantidas pela legislação vigente, condicionando a reparação à existência do ilícito. Ressalte-se que o caso concreto em análise não se enquadra nas exceções da obrigação de reparar o dano, previstas no atual artigo 188 do CCB, por não se tratar de hipótese de legítima defesa, bem como de exercício regular de um direito, diante da arbitrariedade aplicada. A imposição do dever de reparar decorre da conduta abusiva do reclamado de dispensar o autor, motivado pelo seu envolvimento com a união dos trabalhadores para pressionar a empregadora a promover melhorias nas condições de trabalho.

A conduta do reclamado é ilícita e causou prejuízo ao autor, o que deve ser objeto de reparação civil.

Dou provimento parcial ao apelo do reclamante para condenar a reclamada a pagar indenização por danos morais no importe de R$ 10.000,00 (dez mil reais), que reputo compatível com a gravidade do ato abusivo praticado e com o fim pedagógico a que se propõe, bem como indenização por danos materiais equivalente ao salário do reclamante devido pelo período de 12 meses, tal como postulado na inicial e com amparo na aplicação analógica da Lei 9.029/95, artigo 4º, inciso II.

CONCLUSÃO

Conheço do recurso interposto e, no mérito, dou-lhe provimento parcial para condenar a reclamada a pagar indenização por danos morais no importe de R$ 10.000,00 (dez mil reais), que reputo compatível com a gravidade do ato abusivo praticado e com o fim pedagógico a que se propõe, bem como indenização por danos materiais equivalente ao salário do reclamante devido pelo período de 12 meses, tal como postulado na inicial e com amparo na aplicação analógica da Lei 9.029/95, artigo 4º, inciso II.

Custas pela reclamada no importe de R$400,00, calculadas sobre R$20.000,00, valor arbitrado à condenação

FUNDAMENTOS PELOS QUAIS,

O Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região, por sua Quinta Turma, à unanimidade, conheceu do recurso; no mérito, por maioria de votos, deu provimento parcial ao apelo do reclamante para condenar a reclamada a pagar indenização por danos morais no importe de R$10.000,00 (dez mil reais), que reputou compatível com a gravidade do ato abusivo praticado e com o fim pedagógico a que se propõe, bem como indenização por danos materiais equivalente ao salário do reclamante devido pelo período de 12 meses, tal como postulado na inicial e com amparo na aplicação analógica da Lei 9.029/95, artigo 4o. Inciso II; custas pela reclamada no importe de R$400,00, calculadas sobre R$20.000,00, valor arbitrado à condenação, vencido do Exmo. Desembargador Relator que negava provimento ao recurso.

Belo Horizonte, 07 de abril de 2009.

MARIA CECÍLIA ALVES PINTO
Juíza Convocada Redatora e Revisora

Data de Publicação: 27/04/2009




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