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quarta-feira, 10 de junho de 2009

JURID - Contrato de financiamento. Aplicação do CDC. [10/06/09] - Jurisprudência


Contrato de financiamento. Aplicação do Código de Defesa do Consumidor. Capitalização mensal de juros. Vedação. Súmula 121 do STF.


Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte - TJRN.

Processo: 2009.003111-2

Julgamento: 19/05/2009

Órgão Julgador: 1ª Câmara Cível

Classe: Apelação Cível

Apelação Cível nº 2009.003111-2

Apelante - HSBC Bank Brasil S/A - Banco Múltiplo

Advogado - Dr. Eduardo Gurgel Cunha

Apelado - Milson Costa da Silva

Advogado - Dr. Ednardo Gregório Alves de Azevedo

Relator - Juiz convocado Ibanez Monteiro da Silva

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO COM ANTECIPAÇÃO PARCIAL DOS EFEITOS DA TUTELA. CONTRATO DE FINANCIAMENTO. APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS. VEDAÇÃO. SÚMULA 121 DO STF. DECLARADA A INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 5º DA MEDIDA PROVISÓRIA Nº 2.170-36/2001 PELO PLENO DESTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA. VINCULAÇÃO. MULTA CONTRATUAL FIXADA EM 2% A.M. IRREPARÁVEL. INTELIGÊNCIA DO ART. 52, § 1º DO CDC. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível, em que são partes as acima identificadas, ACORDAM os Desembargadores integrantes da Primeira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, à unanimidade. de votos, conhecer da apelação e negar-lhe provimento, mantendo inteiramente a sentença recorrida, nos termos do voto do relator, parte integrante deste acórdão.

RELATÓRIO

Apelação Cível interposta pelo HSBC Bank Brasil S/A - Banco Múltiplo, contra a sentença proferida pelo Juízo da Primeira Vara Cível da Comarca de Ceará Mirim/RN, que julgou parcialmente procedente a Ação Revisional de Contrato com Pedido de Antecipação Parcial dos Efeitos da Tutela (Processo nº 102.07.002626-3) movida por Milson Costa da Silva.

Em suas razões recursais, às folhas 76/86, defende, em síntese, o apelante a necessidade de reforma da sentença proferida em primeiro grau, aduzindo a ausência de ilegalidade do contrato debatido, bem como a impossibilidade de descumprimento unilateral do disposto nos contratos de crédito, em razão do princípio do pacta sunt servanda.

Afirma ainda a legalidade da multa contratual prevista no contrato, aduzindo que esta tem natureza moratória/cominatória e não compensatória, não havendo portanto qualquer restrição à sua cumulação com a comissão de permanência.

Quanto à capitalização dos juros, diz que a decisão a quo afastou a sua incidência do contrato contrariando a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, alegando, ainda, que o STF "proclama que, apenas nos contratos bancários celebrados a partir de 31/03/2000, data da publicação da MP 1963-17, atualmente reeditada sob o nº 2170/2001, incide a capitalização mensal, desde que pactuada. 'No caso específico, verifica-se que o contrato foi celebrado em 26/7/2201', disse (Reps 791913)".

Ao final, pugna pelo provimento do apelo, no sentido de que seja reformada a decisão impugnada para afastar a condenação estabelecida nos autos, prevalecendo as cláusulas legalmente pactuadas.

Contra-razões apresentadas pelo apelado (folhas 91/95), na qual defende a manutenção da sentença apelada.

Instada a emitir parecer, a Procuradoria de Justiça abstém-se, por não abordar os autos tema que exija a intervenção do Ministério Público.

É o relatório.

VOTO

Conheço do recurso, por atendidas as condições de admissibilidade exigidas pela lei processual civil.

Cuida-se de Apelação Cível contra sentença proferida pelo Juízo da Primeira Vara Cível da Comarca de Ceará Mirim/RN, que julgou parcialmente procedente os pedidos formulados na ação revisional movida contra o banco ora apelante.

Argumenta o recorrente que o juiz, ao anular as cláusulas contratuais constantes do contrato de financiamento, estabelecendo novos parâmetros afrontou preceitos legais e jurisprudenciais dominantes relativos à matéria, vez que a relação contratual foi legal e livremente estabelecida.

Tenho por correta a decisão proferida pelo juízo de primeiro grau que, com base em princípios que regem a relação consumerista, embora entendendo razoável a taxa de juros praticada no contrato de financiamento em questão, reconheceu abusiva a sua capitalização mensal, anulando-a, e, bem assim, estabelecendo em caso de inadimplência, apenas a aplicação de juros moratórios de 1% a.m. e multa contratual de 2% a.m. sobre cada parcela vencida.

De início, oportuno ressaltar que com a edição da Súmula 297, o Superior Tribunal de Justiça pacificou o entendimento da aplicação do Código de Defesa do Consumidor às relações de consumo que envolvam entidades financeiras, cujo enunciado assim reza: "O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras".

Também, o Supremo Tribunal Federal, ao julgar improcedente a ADI n. 2591, anuiu o entendimento de que às instituições financeiras estão alcançadas pela incidência das normas do Código de Defesa do Consumidor.

Esse posicionamento vem sendo adotado de modo pacífico nesta Corte de Justiça.

Desse modo, há de se consignar a possibilidade de revisão pelo Poder Judiciário de cláusulas contratuais inseridas em contrato de financiamento bancário, tendo em vista que este se encontra subsumido aos princípios que regem as relações de consumo (Código de Defesa do Consumidor), com vista a preservar o equilíbrio entre as partes e a excessiva onerosidade ao consumidor, especialmente por se tratar de contrato de adesão, no qual, como se sabe, o princípio da autonomia da vontade se reduz à mera aceitação do conteúdo do contrato pelo aderente.

Plenificando-se a relação entre fornecedor e consumidor, consistente na prestação de um serviço, à luz do Direito do Consumidor (art. 6º, inc. IV; art. 39, inc. V; art. 51, IV, § 1º, e inciso II da Lei n. 8.078/1990), não se admite, em qualquer ajuste contratual, a subsistência de cláusulas reconhecidamente abusivas que asseguram vantagens excessivas para uma das partes em detrimento da outra, mesmo se estipuladas nos tratos de comum acordo, vez que o fornecedor (o Banco), abusando da hipossuficiência do consumidor, estabelece as condições que se lhes apresentam mais favoráveis, como é o caso desses autos.

Feitas essas considerações, passo, ao exame particularizado das questões ventiladas no apelo em apreciação.

I - CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS

A incidência da capitalização de juros na hipótese em exame não encontra respaldo no nosso ordenamento jurídico, devendo permanecer inalterada a determinação do seu afastamento pelo Juízo a quo.

O Superior Tribunal de Justiça vem entendendo que a capitalização mensal de juros, desde que pactuada, é legal a partir dos contratos de mútuo bancário celebrados a partir de 31 de março de 2000, data da primitiva publicação do art. 5º da Medida Provisória n. 1963-17/2000, atualmente reeditada sob o n. 2170-36/2001, cuja vigência se deve ao art. 2º da Emenda Constitucional n. 32, de 12 de setembro de 2001 (REsp 894.385/RS, relatora Ministra Nancy Andrighi, DJ de 16/4/2007; AgRg no REsp n. 878.666/RS, relator Ministro Hélio Quaglia Barbosa, DJ 9/4/2007).

Porém, não tem como aplicar esse entendimento, considerando as razões adiante expostas.

A prática de tal anatocismo se caracteriza quando ocorre a capitalização de juros (cobrança de juros sobre juros - capitalização composta) de forma diversa às permitidas pela legislação, o que está expressamente vedada pelo enunciado da Súmula 121 do Supremo Tribunal Federal, que proclama: "É vedada a capitalização de juros, ainda que expressamente convencionada".

O apelante sustenta a possibilidade da incidência da capitalização de juros no artigo 5º da Medida Provisória nº 2.170-36, de 23 de agosto de 2001, porém, o mencionado dispositivo não tem como ser aplicado à espécie, uma vez que o Tribunal Pleno desta Corte, por ocasião do julgamento da Argüição de Inconstitucionalidade em Apelação Cível n. 2008.004025-9/0002.00, declarou, à unanimidade de votos, a inconstitucionalidade do citado dispositivo, que autorizava a capitalização de juros pelas instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional, por ofensa aos artigos 192 e 62, § 1º, inciso III, ambos da Constituição Federal, cujo acórdão assim restou ementado:

"EMENTA: INCIDENTE DE INCONSTITUCIONALIDADE. ARTIGO 5º DA MEDIDA PROVISÓRIA N° 2170, DE 23 DE AGOSTO DE 2001. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. IMPOSSIBILIDADE. OBRIGATORIEDADE DE LEI COMPLEMENTAR PARA REGULAMENTAR O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL. ARTIGOS 192 E 62, § 1º, INCISO III, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DO DISPOSITIVO. PROCEDÊNCIA DO INCIDENTE". (TJRN, Arguição de Inconstitucionalidade em Apelação Cível n. 2008.004025-9/0002.00, rel. Des. Amaury Moura Sobrinho, jul. 08/10/2008).

O artigo 243 do Regimento Interno deste Tribunal estabelece que "A decisão declaratória ou denegatória da inconstitucionalidade, quando unânime, terá aplicação obrigatória para o futuro aos casos análogos, (...)."

Assim, diante do previsto no supracitado artigo, há se aplicar ao caso concreto o que foi decidido no mencionado incidente de inconstitucionalidade.

Ademais, a constitucionalidade desta Medida Provisória, que permite a capitalização mensal dos juros, vem sendo discutida pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, na ADI n. 2.316-1, cuja relatoria coube ao Ministro Sydney Sanches, que suspendeu a eficácia do artigo 5º, caput, e parágrafo único, e a decisão final encontra-se pendente de julgamento. Entretanto, embora não tenha sido concluído o julgamento da liminar da Medida Cautelar, o citado Relator deferiu a suspensão cautelar dos dispositivos impugnados com fundamentos na "aparente falta de urgência", objetivamente considerada, para a edição de medida provisória, e pela ocorrência do "periculum in mora inverso", sobretudo com a vigência indefinida da referida Medida Provisória desde o advento da EC 32/2001, com a possível demora do julgamento do mérito da ação.

Nesse sentido, vem decidindo as Câmaras Cíveis deste Tribunal:

"EMENTA: CIVIL. PROCESSO CIVIL. APELAÇÕES CÍVEIS. REVISÃO CONTRATUAL. LIMITAÇÃO DOS JUROS. TAXA SELIC. INAPLICABILIDADE. CAPITALIZAÇÃO DOS JUROS. INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 5º DA MEDIDA PROVISÓRIA Nº 2.170, DE 23 DE AGOSTO DE 2001.REPETIÇÃO DE INDÉBITO. NÃO CONFIGURAÇÃO. REVELIA. HONORÁRIOS PERICIAIS. JUSTIÇA GRATUITA. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. IMPROVIMENTO DOS RECURSOS." (TJRN, Apelação Cível n. 2008.012550-2, Primeira Câmara Cível, Rel. Des. Vivaldo Otávio, jul. 03/03/2009).

"EMENTA: CONSUMIDOR E DIREITO CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO. TUTELA ANTECIPADA. PRELIMINARES DE INÉPCIA DA INICIAL, NULIDADE DO JULGADO E CERCEAMENTO DE DEFESA SUSCITADAS PELO APELANTE. TRANSFERÊNCIA PARA O MÉRITO DA PRIMEIRA PRELIMINAR E REJEIÇÃO DAS DEMAIS. MÉRITO. INCIDÊNCIA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. SÚMULA 297 DO STJ. IMPOSSIBILIDADE DE CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 5º DA MEDIDA PROVISÓRIA Nº 2.170, DE 23 DE AGOSTO DE 2001, QUE AUTORIZAVA A CAPITALIZAÇÃO DE JUROS PELAS INSTITUIÇÕES INTEGRANTES DO SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL, PELO PLENÁRIO. VINCULAÇÃO DAS CÂMARAS AO ENTENDIMENTO DO ÓRGÃO PRINCIPAL DA CORTE.VERBAS SUCUMBENCIAIS FIXADAS EM CONSONÂNCIA COM O DISPOSTO NO ART. 20 DO CPC. CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO DO RECURSO." (TJRN, Apelação Cível n. 2008.011142-4, Segunda Câmara Cível, Rel. Des. Aderson Silvino, jul. 17/02/2009).

Destarte, decidiu com acerto o julgador a quo quando afastou a citada capitalização.

II - MULTA CONTRATUAL - CUMULAÇÃO COM A COMISSÃO DE PERMANÊNCIA

No que atine à fixação da multa contratual em 2% (dois por cento) a.m., impende consignar que a decisão do juiz a quo também não merece reparo, sendo despiciendas maiores considerações a respeito, porquanto coaduna-se com estabelecido no art. 52, § 1º, do Código de Defesa do Consumidor, o qual dispõe:

"Art. 52 - No fornecimento de produtos ou serviços que envolva outorga de crédito ou concessão de financiamento ao consumidor, o fornecedor deverá, entre outros requisitos, informá-lo prévia e adequadamente sobre:

(omissis).

§ 1º - As multas de mora decorrentes do inadimplemento de obrigações no seu termo não poderão ser superiores a dois por cento do valor da prestação.

(...)".

Da mesma forma, não há de se acolher o argumento do apelante no sentido de que não haver qualquer restrição da cumulação da multa contratual com a comissão de permanência, uma vez que, em contrário, mesmo existindo expressa previsão contratual da cobrança de comissão de permanência quando não houver cumprimento de qualquer das obrigações contratuais, esta se mostra ilegal, quando cumulada com os juros moratórios e a multa contratual

A questão, inclusive, encontra-se sumulada pelo Superior Tribunal de Justiça, nos seguintes termos:

Súmula 30: "A comissão de permanência e a correção monetária são inacumuláveis".

No mesmo sentido é a jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça, conforme se extrai da decisão que segue:

"RECURSO ESPECIAL. AGRAVO REGIMENTAL. CONTRATO BANCÁRIO. CAPITALIZAÇÃO MENSAL DOS JUROS. FUNDAMENTO CONSTITUCIONAL NÃO ATACADO POR RECURSO EXTRAORDINÁRIO. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA COBRANÇA CUMULADA COM OS DEMAIS ENCARGOS MORATÓRIOS. MORA. IMPOSSIBILIDADE. DESCARACTERIZADA. COBRANÇA DE ENCARGOS ILEGAIS.

I - Quanto à questão da capitalização de juros, entendeu o tribunal de origem que a Medida Provisória n. 2.170-36/2001 é inconstitucional, porque não atende aos requisitos do artigo 62 da Constituição Federal. Não obstante a fundamentação constitucional do acórdão, não houve a devida impugnação da matéria por meio de recurso extraordinário, o que atrai à espécie o óbice da Súmula 126 desta Corte.

II - É vedada a cobrança cumulada da comissão de permanência com juros remuneratórios, correção monetária e/ou juros e multa moratórios, nos contratos bancários.

III - (…).

Agravo improvido". (AgRg no REsp 854.113/RS, Rel. Ministro Sidnei Beneti, Terceira Turma, jul. em 26.06.2008).

Ante o exposto, conheço e nego provimento ao apelo, mantendo a sentença em todos os seus termos.

É como voto.

Natal, 19 de maio de 2009.

Desembargador EXPEDITO FERREIRA
Presidente

Doutor IBANEZ MONTEIRO (Juiz Convocado)
Relator

Doutora GERALDA FRANCINY PEREIRA CALDAS
10ª Procuradora de Justiça




JURID - Contrato de financiamento. Aplicação do CDC. [10/06/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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