Anúncios


terça-feira, 26 de maio de 2009

JURID - Direito do consumidor. Dano físico causado por lâmina. [26/05/09] - Jurisprudência


Direito do consumidor. Responsabilidade civil. Dano físico causado por lâmina existente na lateral do fogão.

Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro - TJRJ.

Primeira Câmara Cível

Apelação Cível nº 7.576/2009

Apelante: JOSÉ ANTÔNIO NETO

Apelado: BSH CONTINENTAL ELTRODOMÉSTICOS LTDA.

Relator: Des. MALDONADO DE CARVALHO

DIREITO DO CONSUMIDOR. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO FÍSICO CAUSADO POR LÂMINA EXISTENTE NA LATERAL DO FOGÃO. DEFEITO DO PRODUTO. CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA NÃO COMPROVADA. DANO MORAL CARACTERIZADO. PROVIMENTO DO RECURSO.

DECISÃO MONOCRÁTICA

Trata-se de ação de reparação de danos proposta por JOSÉ ANTÔNIO NETO em face de BSH CONTINENTAL ELTRODOMÉSTICOS LTDA.

Alega o autor, em resumo, que adquiriu um fogão fabricado pela ré em 05/05/2007; que o mesmo foi entregue em sua residencia; que ao retirá-lo da embalagem para colocá-lo no local que lhe fora reservado, cortou sua mão direita, lesionando seu tendão flexor; que, em razão da gravidade do corte, submeteu-se a vários procedimentos médicos, além de seguidas sessões de fisioterapia; que está sem trabalhar em virtude do acidente; que a embalagem não trazia nenhuma advertência acerca da lâmina cortante na parte traseira do fogão; que o produto posto em circulação traz riscos ao consumidor; que tal atitude afronta os princípios da lei consumerista, além de caracterizar crime contra o consumidor. Requer a condenação do réu ao pagamento de indenização por danos morais, no valor equivalente a 300 (trezentos salários mínimos).

Às fls. 172/177, agravo de instrumento, na forma retida, da decisão que indeferiu a denunciação à lide a Seguradora Royal & Sunalliance, juntamente com a contestação.

Decisão, em juízo de retratação, deferindo o pedido de denunciação, às fls. 179.

Diante do não recolhimento das custas, sobreveio, às fls. 182, o indeferimento da denunciação à lide.

Pedido de reconsideração (fls.184/186) e interposição de novo agravo, na forma retida, da decisão que indeferiu a denunciação à lide por falta de recolhimento de custas (fls.188/192).

A sentença de fls. 211/212, julgando improcedente o pedido, condenou o autor ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, fixados em R$ 1.000,00, na forma do art. 20, § 4°, do CPC, posto tratar-se de culpa exclusiva da vítima.

Na sua apelação, arrazoada às fls. 215/216, alega o autor, resumidamente que o produto deveria trazer uma informação clara e ostensiva acerca da existência de uma lâmina altamente cortante capaz de causar lesões graves, em conformidade com o Código do Consumidor. Requer a reforma total da sentença.

Contra-razões às fls. 220/2038, requerendo a apreciação do agravo retido contra decisão que indeferiu a denunciação à lide por falta de recolhimento de custas, tendo em vista contrato de seguro existente entre as partes, a fim de assegurar o direito de regresso. No mérito, aduz a inexistência do dever de indenizar em razão de culpa exclusiva da vítima.

O autor é beneficiário da gratuidade de justiça.

É o relatório.

Com razão o apelante.

Conheço do agravo retido de fls. 188/192, ao teor literal do art. 523 do CPC, negando-lhe, porém, provimento.

Com efeito, em se tratando de denunciação da lide - demanda incidental -, deve o denunciante arcar com todos os ônus daí decorrentes, a fim de que possa o magistrado apreciar, posteriormente, o pedido de denunciação.

Logo, sendo recolhimento das custas processuais um pressuposto lógico para que o Juiz possa se manifestar sobre o que foi pela agravante-denunciante pleiteado, por correto se tem o indeferimento da denunciação ante a ausência de recolhimento das custas judiciais, conforme entendimento pacífico no âmbito do Tribunal de Justiça:

"AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. DENUNCIAÇÃO À LIDE. AUSÊNCIA DE RECOLHIMENTO DAS CUSTAS. REGULAR INTIMAÇÃO.A denunciação da lide é uma demanda incidental e, com tal, deve o denunciante arcar com todos os ônus inerentes à qualquer ação judicial, a fim de que possa o magistrado apreciar, posteriormente, o pedido de denunciação.O recolhimento das custas processuais é um pressuposto lógico para que o Juiz possa se manifestar quanto ao que foi pedido pela agravante-denunciante, tendo sido corretamente indeferida a denunciação ante a ausência de recolhimento das custas.Desprovimento do recurso. (2008.002.31692 - AGRAVO DE INSTRUMENTO DES. JORGE LUIZ HABIB - Julgamento: 17/02/2009 - DECIMA OITAVA CAMARA CIVEL)"

"Agravo de Instrumento.Decisão monocrática de rejeição à denunciação da lide oferecida pela agravante, em face do não recolhimento por ela das custas devidas, conforme determinado pelo juízo em decisão confirmada por este relator.Agravos de instrumento em RE e REsp pendentes de julgamento. Inexistência de efeito suspensivo em sede de recurso especial e extraordinárioRecurso a que se nega seguimento, nos termos do disposto no art. 557, caput, CPC. 2008.002.05299 - AGRAVO DE INSTRUMENTO DES. CELIO GERALDO M. RIBEIRO - Julgamento: 22/02/2008 - DECIMA CAMARA CIVEL"

"AGRAVO DE INSTRUMENTO. PEDIDO DE DENUNCIAÇÃO DA LIDE. NÃO RECOLHIMENTO DAS CUSTAS. INDEFERIMENTO. IMPROVIMENTO DO RECURSO.No caso presente, ordenado o recolhimento da custas não o fez o Agravante, preferindo por duas vezes ofertar Embargos de Declaração, contra o decidido. Em tais condições acertadamente indeferida foi a denunciação, até porque além de não ser obrigatória tem ao que parece o propósito de retardar o litígio. Nesse contexto já corretamente rejeitado pelo juízo.ACÓRDÃO (2007.002.19681 - AGRAVO DE INSTRUMENTO DES. CAETANO FONSECA COSTA - Julgamento: 19/09/2007 - SETIMA CAMARA CIVEL)"

Quanto ao mérito, registre-se, de pronto, que a relação entre as partes litigantes é de consumo, submetendo-se, pois, ao regramento do Código de Defesa do Consumidor.

Resume-se a controvérsia, pois, ao exame da apontada culpa exclusiva da vítima, causa de exoneração da responsabilidade civil nas relações de consumo.

Com efeito, a empresa ré, embora sustente a inexistência do defeito do produto, afirmando que o apelante foi negligente no seu manuseio, uma vez que o utilizou de forma inadequada, não logrou comprovar a culpa ou fato exclusivo da vítima.

Aliás, como de sabença, o novo regime jurídico reconhece, no que se refere aos vícios do produto ou do serviço, como objetiva a responsabilidade do fornecedor, desprezando, assim, a responsabilidade assente na culpa (subjetiva).

Na verdade, a doutrina brasileira vem, sob o foco da Teoria da Qualidade, dando ênfase ao dever geral a que se submetem todos os produtos e serviços que são postos em circulação ou prestados no mercado de consumo.(1)

A responsabilidade do fornecedor de produtos ou de serviços, portanto, concentra-se na existência de um defeito (falha na segurança) ou na existência de um vício (falha na adequação ou na prestabilidade).

Daí, seguindo a linha doutrinária da professora CLÁUDIA LIMA MARQUES, há toda uma evidência que o legislador brasileiro inspirou-se na idéia de garantia implícita do sistema da common law (implied warranty). Assim, o produto ou serviços prestados traria em si uma garantia de adequação para o seu uso e, até mesmo, uma garantia referente à segurança que deles se espera. Há efetivamente um novo dever de qualidade instituído pelo sistema do CDC, um novo dever anexo à atividade dos fornecedores.(2)

Trata-se, pois, de uma responsabilidade legal, onde o fornecedor, objetivamente, responde pelos danos causados pelo produto ou pelo serviço prestados de forma defeituosa, independentemente da aferição de sua imprudência, negligência ou imperícia mercadológica.

De fato, cuidando-se de responsabilidade objetiva, com fincas no Código do Consumidor, caberia ao fabricante, e não a vítima, comprovar a inexistência de defeito do produto, pois, nos termos da lei protetiva, este só não será responsabilizado "quando provar que, embora haja colocado o produto no mercado, o defeito inexiste" (art. 12, § 3º, do CDC).

No caso em exame, irrelevante se mostra a argumentação de que o fogão foi fabricado seguindo o padrão de qualidade exigido pelo mercado e órgãos de proteção ao consumidor.

Ora, se assim fosse, o apelante não teria sofrido lesão profunda no seu flexor da mão direita, impossibilitando-o de trabalhar por, aproximadamente, 05 meses, além de submeter-se a inúmeras cirurgias e sessões de fisioterapia. (fls. 12, 158/163 e 164).

Demais disso, a foto anexada aos autos, às fls. 20, comprova a existência de uma estrutura metálica afiada.

Verifica-se, ainda, que o fogão foi entregue em embalagem inadequada, não trazendo em suas laterais qualquer precaução ao seu manuseio (fls.21/23).

Ora, o simples fato de apresentar o produto uma lâmina cortante já é o suficiente para que o fornecedor promova uma advertência ostensiva capaz de alertar os consumidores, evitando-se, por conseguinte, acidentes como experimentado pelo apelante.

De mais a mais, o manual de instruções do produto não traz nenhum aviso acerca da presença da referida estrutura metálica na parte traseira do fogão (fls. 24)

Dúvidas, portanto, não pairam de que a existência de tal lâmina comprometeu à segurança do produto fabricado.

Aliás, como dispõe expressamente o art. 12 do CDC, "O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos".

Comprovado, pois, o acidente, o dano e o nexo de causalidade, a responsabilidade, por ser objetiva, não demanda outro qualquer exame ou, quiçá, maiores digressões.

É neste sentido, aliás, a jurisprudência deste Tribunal de Justiça:

RESPONSABILIDADE CIVIL - DANOS MORAIS, MATERIAIS E ESTÉTICOS - BOX BLINDEX - DEFEITO DO PRODUTO - MÁ PRESTAÇÃO DO SERVIÇO.- Ação Indenizatória objetivando as Autoras a reparação pelos danos materiais, morais e estéticos por elas sofridos em razão da quebra de um dos boxes blindex fabricado pela segunda Ré e instalado pela primeira Ré nos banheiros da residência de suas irmã e tia, respectivamente, e onda estavam hospedadas, cujos estilhaços causaram inúmeras lesões no corpo da segunda Autora.- Legitimidade da segunda Ré, fabricante do produto. Comprovação.- As Autoras enquadram-se na figura do consumidor por equiparação, nos moldes do art. 17 da referida Lei Consumeirista. Responsabilidade objetiva das Rés.Prova do fato, do dano e do nexo causal.- Rés que não lograram êxito em comprovar as excludentes de suas responsabilidades seja ela pelo fato do produto (segunda Ré) ou pelo fato do serviço (primeira Ré), inexistindo nos autos prova de que inexistiu o defeito reclamado e que o serviço não teria sido defeituoso e a culpa exclusiva da vítima ou terceiro, nos moldes dos arts. 12 e 14 do Código de Defesa do Consumidor.- Existência do dano material. Prova das despesas médicas e medicamentos. Apuração em liquidação de sentença.Dano estético indenizável. Valor arbitrado em R$ 5.000,00 (cinco mil reais).- Devida a verba indenizatória a título de dano moral, cujo valor foi fixado em R$ 14.000,00 (quatorze mil reais) para cada Autora, que atende aos critérios da razoabilidade e proporcionalidade.- Sentença parcialmente reformada.- Provimento parcial do primeiro recurso e improvimento dos segundo e terceiro apelos(2007.001.35656 - APELACAO DES. CAETANO FONSECA COSTA - Julgamento: 06/08/2008 - SETIMA CAMARA CIVEL )"

"Ação de obrigação de fazer cumulada com indenizatória por danos materiais e morais, com pedido de tutela antecipada.Relação de consumo.Aquisição de veículo zero quilômetro que com menos de um ano de uso veio a apresentar defeito no motor.Evento denominado calço hidráulico.Responsabilidade solidária do fabricante e do comerciante por dano decorrente de vício do produto que o tornou impróprio ou inadequado ao fim a que se destina.Incidência do artigo 18 do Código de Defesa do Consumidor.Rés que não lograram provar a ocorrência de culpa exclusiva da proprietária do veículo.Dano material comprovado.Dano moral configurado.Desprovimento dos recursos, rejeitadas as preliminares. (2008.001.29569 - APELACAO DES. MARIA HENRIQUETA LOBO - Julgamento: 27/08/2008 - SETIMA CAMARA CIVEL)"

"DIREITO DO CONSUMIDOR. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. DANO MATERIAL E MORAL. PRODUTO COM PRAZO DE VALIDADE VENCIDO. SUPERMERCADO. MAL À SAÚDE. REJEIÇÃO DE PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA. O fornecedor que oferece produto não durável e impróprio para o consumo (data de validade vencida) é diretamente responsável pelo dano causado ao consumidor. Para eximir-se de sua responsabilidade, deve o fornecedor demonstrar que, tendo fornecido o produto, o defeito inexiste ou a culpa é exclusiva do consumidor ou de terceiro, circunstância que não ocorreram na hipótese. Conduta ilícita, nexo causal e dano configurados. Indenização arbitrada em valor razoável e que não merece majoração. Conhecimento e desprovimento de ambos os recursos. (2008.001.38348 - APELACAO DES. ROGERIO DE OLIVEIRA SOUZA - Julgamento: 12/08/2008 - DECIMA OITAVA CAMARA CIVEL)"

Fixada a responsabilidade da ré, passa-se ao exame da verba reclamada.

De fato, o acidente e suas conseqüências, além do dano físico, geraram também o dano moral reclamado, sendo grave o suficiente para determinar a justa indenização em pecúnia.

A bem da verdade, os transtornos suportados pelo autor foram muito além do simples aborrecimento, já que o evento danoso, atingindo também a sua honra, justifica a indenização pleiteada como verba reparatória pelos danos morais que lhe foram causados.

Diante de tais condições, tem-se como provado o dano extrapatrimonial reclamado, pois, como aduz CAVALIERI FILHO, o dano moral está ínsito na própria ofensa, posto que decorre da gravidade do ilícito em si. Provado que a vítima teve a sua honra vilipendiada, nada mais ser-lhe-á exigido provar.

De outro viés, se a indenização, por um lado, visa reparar o dano causado, por outro busca desestimular a repetição da conduta ofensiva, exercendo, assim, a função pedagógica, como concebida pela escola francesa.

Todavia, o arbitramento do valor indenizatório por dano moral há de ajustar-se aos limites da lei, já que não atua como meio de enriquecimento, mas, em última análise, como satisfação pessoal da parte ofendida.

Conseqüentemente, à falta de critério objetivo ou legal, a indenização do dano moral deve fazer-se por arbitramento, com ponderação e racionalidade, levando-se em conta a natureza da lesão, as condições da vítima e o atuar ilícito do agente.

Há de orientar-se o juiz pelos critérios sugeridos pela doutrina e pela jurisprudência, com razoabilidade, curando, quando o caso não exigir sanção pecuniária predominantemente punitiva, para que não enriqueça a vítima à custa do injusto.

Por outro lado, tratando-se de ilícito contratual, o termo inicial da correção monetária é o da data do efetivo prejuízo, ou seja, deve a empresa apelada responder pela correção a partir da data em que ocorreu o acidente.

Quanto aos juros, por se tratar de relação contratual, o termo inicial é o da data da citação.

Por fim, o arbitramento da verba honorária, em razão de sucumbimento processual, está sujeita a critérios de valoração, perfeitamente delineados na lei processual (art. 20, § 3º, do CPC), entre o mínimo de 10% e o máximo de 20% sobre o valor da condenação.

A fixação de tal verba, como é de trivial sabença, deve levar em conta os critérios previstos na alínea 'a', 'b' e 'c' do citado artigo.

Daí, atento a tais princípios, a fixação no percentual mínimo, portanto, se mostra acertada.

Pelo exposto, autorizado pelos artigos 557, § 1º -A, do CPC, DOU PROVIMENTO ao recurso para, julgando procedente o pedido, condenar a ré ao pagamento de R$ 4.000,00 (quatro mil reais), a título de dano moral, corrigido monetariamente a partir desta data, acrescidos de juros de 1% ao mês a partir da citação, condenando-a, ainda, ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor da condenação.

Rio de Janeiro, 26 de fevereiro de 2008.

Desembargador MALDONADO DE CARVALHO
Relator

Certificado por DES. MALDONADO DE CARVALHO

A cópia impressa deste documento poderá ser conferida com o original eletrônico no endereço www.tjrj.jus.br.

Data: 13/03/2009 11:48:22

Local: Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro - Processo: 2009.001.07576 - Tot. Pag.: 7



Notas:

1 - BENJAMIN, Antônio Herman. Comentários ao Código de Proteção do Consumidor. São Paulo: Saraiva, arts. 12 a 27. [Voltar]

2 - MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor: o novo regime das relações contratuais. 4ª edição. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 985. [Voltar]




JURID - Direito do consumidor. Dano físico causado por lâmina. [26/05/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário