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terça-feira, 5 de maio de 2009

JURID - Ação de indenização. Responsabilidade civil do médico. [05/05/09] - Jurisprudência


Ação de indenização. Responsabilidade civil do médico. Obrigação de meio. Laudo pericial. Conduta culposa.

Tribunal de Justiça de Minas Gerais - TJMG.

Número do processo: 1.0024.06.932945-6/006(1)

Relator: CLÁUDIA MAIA

Relator do Acórdão: CLÁUDIA MAIA

Data do Julgamento: 26/03/2009

EMENTA: AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO. OBRIGAÇÃO DE MEIO. LAUDO PERICIAL. CONDUTA CULPOSA. AUSÊNCIA. NEXO DE CAUSALIDADE INEXISTENTE. A exigência de que a apelação contenha "os fundamentos de fato e de direito" não impede a reiteração dos fundamentos expendidos perante o primeiro grau de jurisdição, desde que infirmados os termos da decisão recorrida. A responsabilidade do médico é circunscrita apenas ao dever de diligência em relação ao seu paciente. Trata-se de uma relação jurídica que pode ser definida como uma obrigação de meio, na qual a prestação exige apenas o emprego dos meios adequados para a sua realização e não a garantia em relação ao seu resultado. Ante a natureza técnica da matéria a ser dirimida nos autos, a prova pericial, efetivamente, ganha relevo e deve se sobrepor às demais. Não obstante inexista no ordenamento jurídico pátrio hierarquia de provas, não se vislumbra na presente hipótese razão concreta para ser adotada conclusão diversa daquela oriunda do laudo produzido em juízo, sob as valiosas garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa. Ausentes os elementos essenciais da responsabilidade civil - notadamente a conduta culposa e o nexo de causalidade - resta inequívoca a não configuração do dever de indenizar.

APELAÇÃO CÍVEL N° 1.0024.06.932945-6/006 - COMARCA DE BELO HORIZONTE - APELANTE(S): ZULMIRO LUIZ SANTOS DA MOTA - APELADO(A)(S): BIOCOR HOSPITAL DOENCAS CARDIOVASCULARES LTDA, MARCONDES SANTOS LIMA, ROSE MEIRE ROMANO - RELATORA: EXMª. SRª. DESª. CLÁUDIA MAIA

ACÓRDÃO

Vistos etc., acorda, em Turma, a 13ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, EM REJEITAR PRELIMINAR E NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.

Belo Horizonte, 26 de março de 2009.

DESª. CLÁUDIA MAIA - Relatora

NOTAS TAQUIGRÁFICAS

Assistiu ao julgamento pela apelada, a Dra. Carmen Godoy Vieira de Souza. Produziu sustentação oral pelo apelado Biocor Hospital Doenças Cardiovasculares Ltda., a Dra. Maria Clara Pereira Cardoso.

A SRª. DESª. CLÁUDIA MAIA:

VOTO

Trata-se de recurso de apelação interposto por ZULMIRO LUIZ SANTOS DA MOTA contra sentença proferida pelo Juízo da 14ª Vara Cível da comarca de Belo Horizonte que, nos autos de ação de indenização ajuizada pelo ora apelante contra BIOCOR HOSPITAL DOENÇAS CARDIOVASCULARES LTDA E OUTROS, julgou improcedentes os pedidos iniciais.

Nas razões recursais de fls. 729/735, o autor, primeiramente, reitera os fatos que ensejaram o ajuizamento da demanda. Afirma que, ainda que se considerem verdadeiros os fatos narrados pelos apelados, estes não poderiam realizar o transplante de um rim de baixa qualidade ou comprometido. Aduz que teria sido iludido pelos apelados, pois o fizeram acreditar que após o transplante de rim poderia ter uma vida normal. Ressalta a responsabilidade solidária do Hospital Biocor, uma vez que os atos irregulares foram praticados por seu corpo de funcionários e no próprio hospital. Reporta-se à Sindicância da Secretaria Municipal de Saúde e à denúncia oferecida pelo Ministério Público contra o responsável pelo laboratório do Biocor, tendo em vista a falsificação dos exames de histocompatibilidade. Conclui que, diante das irregularidades ocorridas no estabelecimento hospitalar supra, bem como pela promessa de recuperação da saúde, deveriam os apelados ser condenados a arcar com os danos materiais e morais que lhe foram causados. Por fim, requer o provimento do recurso.

Os apelados Biocor Hospital de Doenças Cardiovasculares Ltda, Marcondes Santos Lima e Rose Meire Romano apresentam contra-razões recursais às fls. 738/755, 756/765 e 766/776 respectivamente.

É o relatório.

Presentes os pressupostos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, CONHEÇO do recurso.

Inicialmente, o primeiro apelado Biocor Hospital de Doenças Cardiovasculares Ltda traz à baila preliminar de inépcia recursal, ao argumento de que o apelante não trouxe um fundamento sequer, seja fático, jurídico ou probatório, que pudesse abalar a validade da sentença.

O Código de Processo Civil, em seu art. 514, dispõe:

"Art. 514. A apelação, interposta por petição dirigida ao juiz, conterá:

I - os nomes e a qualificação das partes;

II - os fundamentos de fato e de direito;

III- o pedido de nova decisão".

Como se pode ver, para que o recurso de apelação seja admitido, exige-se, dentre outros requisitos, que a parte recorrente apresente os motivos de fato e de direito pelos quais se insurge contra a sentença.

A exigência de que a apelação contenha "os fundamentos de fato e de direito", pois, não impede a reiteração dos fundamentos expendidos perante o primeiro grau de jurisdição, desde que infirmados os termos da decisão recorrida.

Com a devida vênia, no caso em análise, a peça recursal atende a exigência disposta na lei e oferece a este órgão revisor a possibilidade de apreciar as questões ali postas.

Por via do recurso de apelação às fls. 729/735, o apelante insurge-se contra a r. sentença de origem, explicitando com clareza os fundamentos de fato e de direito atinentes à demanda.

Diversamente do alegado pelo primeiro apelado, considera-se que o apelante combateu devidamente a tese externada na sentença, na medida em que reiterou os fatos motivadores da propositura da demanda e, ainda, sustentou a presença dos elementos da responsabilidade civil.

Destarte, REJEITO a preliminar de inépcia do recurso de apelação eriçada nas contrarrazões apresentadas pelo primeiro apelado.

No mérito, a bem lançada sentença da lavra do eminente magistrado Estevão Lucchesi de Carvalho não merece reparos.

Como é cediço, a conduta culposa, o dano e o nexo de causalidade são elementos essenciais da responsabilidade civil. Sem essa trilogia, não há que se cogitar da existência de uma obrigação indenizatória.

Segundo Sérgio Cavalieri Filho:

"A partir do momento em que alguém, mediante conduta culposa, viola direito de outrem e causa-lhe dano, está-se diante de um ato ilícito, e deste ato deflui o inexorável dever de indenizar, consoante o artigo 927 do Código Civil. Pode-se conceituar a culpa como conduta voluntária contrária ao dever de cuidado imposto pelo Direito, com a produção de um evento danoso involuntário". (FILHO, Sergio Cavalieri. Programa de Responsabilidade Civil. 6ª edição. Ed. Saraiva: 2006).

Dessa forma, quando é causado um dano a alguém, deve-se buscar, primeiramente, a restauração ao estado em que se encontrava antes da ocorrência do ato ilícito. Entretanto, na maioria dos casos isto não é possível, fazendo-se necessária uma compensação monetária pelos danos sofridos a partir do pagamento de uma indenização.

O Código de Defesa do Consumidor, especificamente no §4º do art. 14, trata da responsabilidade do profissional liberal, prescrevendo que "a responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa".

Na espécie, na esteira do entendimento esposado na sentença, é de fundamental importância salientar que, ante a natureza eminentemente técnica da matéria a ser dirimida nos autos, a prova pericial, efetivamente, ganha relevo e deve se sobrepor às demais.

Para a apuração da responsabilidade civil dos apelados pelo transplante de rim realizado no apelante, faz-se imperioso o prestígio do substancioso laudo pericial de fls. 587/634, cabendo, por oportuno, a transcrição de alguns trechos, no que interessa:

"Como se pode notar, as figuras diagramáticas são semelhantes, mostrando que se trata de um mesmo perfil de histocompatibilidade.

As diferenças numéricas observadas pelo Autor na fls. 04 dos autos, tidas como divergentes, não o são. Os números divergentes representam uma determinação mais refinada (subtipos) de cada um dos antígenos".

(...)

"Substituindo os "splits" pelos seus antígenos correspondentes, encontraremos absoluta equivalência, comprovando a igualdade na determinação dos perfis de histocompatibilidade entre os três exames".

(...)

"Realizado exame de contraprova no laboratório Fleury (SP) e estudando e comparando os três exames, conclui-se que os resultados são equivalentes, não havendo erro na determinação do perfil de histocompatibilidade entre eles"

(...)

"Os exames pré-operatórios de histocompatibilidade realizados pelo Hospital Biocor não apresentam erro ou falsidade de resultado, sendo equivalente aos dois outros exames feitos como contraprova".

Como se pode ver, pela simples leitura das considerações exaradas pelo d. Perito Oficial, caem por terra as alegações iniciais de que o exame de histocompatibilidade realizado pelos apelados para o transplante de rim foi falsificado.

Em sentido diametralmente oposto ao alegado pelo apelante, existe absoluta compatibilidade entre os três exames realizados por laboratórios distintos.

Além disso, em que pese o sofrimento do apelante pela grave doença que o acomete, entende-se que não se pode atribuir aos apelados responsabilidade pelo insucesso do transplante de rim.

Da mesma forma, o laudo pericial foi categórico em afastar a culpa dos apelados pela rejeição do rim, se não, veja-se:

"Não recebeu rim incompatível. O rim transplantado apresentava razoável compatibilidade. Dentre os prováveis rececptores, o senhor Zulmiro era o que apresentava o melhor perfil de histocompatibilidade com o doador".

Posteriormente, em resposta aos quesitos complementares, o d. Perito Oficial afastou a possibilidade de o insucesso do transplante ter decorrido de isquemia do órgão:

"Este intervalo de 17 horas está dentro do limite considerado adequado para a realização do transplante, entretanto, quanto menor o intervalo entre a retirada e o implante tanto melhor".

(...)

"O transplante resultou em uma sobrevida de quase quatro anos do enxerto, comprovando o sucesso na escolha e execução do transplante. A sobrevida do órgão pode ter sofrido algum decréscimo devido ao tempo de isquemia, contudo, não se pode dizer que foi o único fator a contribuir para a rejeição crônica ocorrida após anos de implante".

Não obstante inexista no ordenamento jurídico pátrio hierarquia de provas, não se vislumbra na presente hipótese - especialmente tendo em vista a ausência de impugnação objetiva da conclusão exarada pelo Perito Oficial - razão concreta para adotar-se conclusão diversa daquela oriunda do laudo produzido em juízo, sob as valiosas garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa.

Ademais, é de fundamental importância destacar que a responsabilidade do médico é circunscrita apenas ao dever de diligência em relação ao seu paciente. Trata-se de uma relação jurídica que pode ser definida como uma obrigação de meio, na qual a prestação exige apenas o emprego dos meios adequados para a sua realização e não a garantia em relação ao seu resultado.

Ou seja, o médico deve empregar todos os esforços para zelar pela saúde e vida do seu paciente, independentemente do sucesso do tratamento.

A esse respeito elucida Ulderico Pires dos Santos:

"Sua responsabilidade decorre é de sua ação profissional manifestamente errônea, de sua omissão sobre o que deveria ser feito para evitar o mal e não o fez, porque a sua atuação não é de resultado e sim de meio, e também porque ao aceitar o cliente não assume com ele a obrigação de curá-lo, e sim de atuar com acerto e correção, ministrando-lhe o tratamento terapêutico ou operatório exigido pelo seu mal e indicado pela ciência médica" (A Responsabilidade Civil na Doutrina e na Jurisprudência, 1ª ed., Ed. Forense: 1984, pág. 79).

No caso vertente, analisando detidamente os autos, a prova colhida é uníssona no sentido de que os apelados não criaram falsa expectativa no apelante e empregaram os meios adequados para a realização do transplante, não podendo ser responsabilizados pelo resultado.

Em conclusão, ausentes os elementos essenciais da responsabilidade civil - notadamente a conduta culposa e o nexo de causalidade - resta inequívoco a não configuração do dever de indenizar.

Diante do exposto, com respaldo nos princípios do livre convencimento motivado e da fundamentação dos atos jurisdicionais, NEGO PROVIMENTO ao recurso, mantendo inalterada a sentença.

Custas recursais pelo apelante, suspensas na forma do art. 12 da Lei 1.060/50.

LC

Participaram do julgamento os Desembargadores: NICOLAU MASSELLI e ALBERTO HENRIQUE.

SÚMULA: REJEITARAM PRELIMINAR E NEGARAM PROVIMENTO À APELAÇÃO.

Data da Publicação: 05/05/2009




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